domingo, 17 de novembro de 2019

PRA QUEM GOSTA É UM PRATO CHEIO (CONTINUAÇÃO)


Falando em crimes, criminosos e em quem deveria inibi-los e combatê-los (mas faz exatamente o contrário, como bem salientou o juiz federal Marcelo Bretas, responsável pelo braço da Lava-Jato que atua no Rio de Janeiro), parlamentares do grupo Muda, Senado prometem intensificar a pressão sobre Davi Alcolumbre pela instalação da CPI da Lava-Toga e pela abertura de processos de impeachment contra ministros do STF.

A pressão aumentou depois que Dias Toffoli, que usurpou o poder de D. Bozo I, instituiu a ditadura da toga e sagrou-se tiranete (a coroação se deu quando ele ordenou que o Coaf lhe desse acesso a relatórios com dados sigilosos de cerca de 600 mil pessoas físicas e jurídicas), passando a presidir "de fato" esta republiqueta de bananas enquanto o "mito-late-mas-não-morde" cuida de interesse próprios, de seus filhos e da 33ª agremiação política que resolveu criar para si.


A política tupiniquim sempre foi um esgoto a céu aberto. Da feita que os candidatos se elegem para roubar e roubam para se reeleger, como nos sentirmos representados por essa caterva? No Executivo, perdemos a fé (se é que ainda nos restava alguma) antes mesmo de a renúncia de Jânio Vassoura Quadros abrir espaço para o golpe de Estado que resultaria em duas décadas de ditadura militar (aquela de que dizem sentir saudades saudades os que nasceram depois de 1985). E a morte de Tancredo Neves — eleito indiretamente, mas que representava a esperança dos brasileiros num futuro melhor — foi a gargalhada do diabo, pois promoveu de vice a titular o eterno donatário da capitania do Maranhão, um dos mais notórios ícones da abominável política coronelista tupiniquim.

As esperanças se renovaram em 1989, quando o autodeclarado Caçador de Marajás frustrou (ou retardou) a ascensão do eterno "presidente de honra" do partido dos trabalhadores que não trabalham, estudantes que não estudam e intelectuais que não pensam. Mas logo se viu que o santo de colhões roxos era de pau oco, tinha pés de barro e não passava de um populista tão desprezível quanto seu adversário, só que ocupava o outro extremo do espectro político-ideológico-partidário (e qualquer semelhança com o atual inquilino do Palácio do Planalto não é mera coincidência).

Daí veio Itamar, que, além de recriar o Fusca e posar para fotos ao lado da modelo sem calcinha Lilian Ramos, promulgou o Plano Real, cujo sucesso levou Fernando Henrique Cardoso a se eleger presidente, recriar a reeleição e se reeleger presidente desta republiqueta de Bananas, embora o número de coelhos que seria capaz de tirar da cartola tivesse se esgotado já em sua primeira gestão.

Depois vieram Lula e o mensalão do PT (edição revista, atualizada e aprimorada do mensalão tucano), que transformaram Judiciário, aos olhos dos desalentados cidadãos de bem deste desalentador país de merda, no último bastião das esperanças. Mas aí Lula, o podre, e Dilma, a quintessência da incompetência, nomearam os oito togados supremos que, somados aos ministros que ainda não haviam pedido o boné e pegado a bengala — Celso de Mello, que seus pares têm na condição de sapientíssimo e o ex-ministro Saulo Ramos, de um juiz de merdaMarco Aurélio, indicado por ninguém menos que seu primo Fernando Collor; e Gilmar Mendes, cuja indicação foi a obra prima ao contrário do grão duque tucano —, resultaram na pior composição de toda a história do tribunal (ainda pior depois que o dono da careca mais luzidia do planeta foi indicado pelo vampiro do jaburu para ocupara a vaga aberta com a morte de Teori Zavascki num mal explicado acidente aéreo).

O impeachment de Dilmanta, a inolvidável, e os avanços da Lava-Jato refrearam (em alguma medida e por um custo espaço de tempo) o apetite pantagruélico dos petralhas e companhia pelo dinheiro do Erário, mas as recentes investidas da fação pró-crime do STF em prol de seus bandidos favoritos ameaçam pôr a perder quase tudo que foi conquistado no último lustro.

Para Josias de Souza, a quem muito admiro e com cujas opiniões quase sempre concordo, foi constrangedora e triste a passagem por Brasília do grupo de trabalho da comissão antissuborno da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico. A missão da OCDE constrange porque os representantes da entidade percorreram gabinetes dos três Poderes para manifestar preocupação com os retrocessos que observam no Brasil em relação ao combate à corrupção. A visita entristece porque representa, na prática, uma espécie de atestado de óbito da Operação Lava-Jato e suas congêneres.

A morte é anterior a si mesma. Ela começa muito antes da abertura da cova. Percorre um lento processo. No caso da Lava-Jato, a operação morreu e não sabe. Ninguém disse ainda, talvez por pena, mas aquela operação em que, pela primeira vez desde a chegada das caravelas, o braço do Estado investigou, enjaulou e puniu poderosos da oligarquia política e econômica do Brasil, essa operação não existe mais. Foi boa enquanto durou.

A missão da OCDE acabou se transformando num cortejo fúnebre. Os visitantes foram de autoridade em autoridade para lamentar iniciativas recentes patrocinadas pela turma do abafa. Coisas como a lei de abuso de autoridades, o fim da prisão na segunda instância e o congelamento das investigações municiadas com dados do antigo Coaf. A atmosfera é de velório.

O velório reúne gente importante. Seguram a alça do caixão Jair Bolsonaro, o Centrão, o PT… O Supremo envia uma sequência de coroas de flores enquanto prepara a última pá de cal. Ela virá na forma da anulação de sentenças.

A morte às vezes funciona como um grande despertar. Mas a sociedade brasileira emite sinais de cansaço. Um cansaço que se parece com saudade de quem não teve a oportunidade de dizer adeus.