Devido à morte de
Tancredo Neves, o maranhense José Ribamar Ferreira de Araújo Costa,
mais conhecido como José Sarney, presidiu
o Brasil de 22 de abril de 1985 a 15 de março de 1990, tornando-se o primeiro
presidente civil pós-ditadura.
Sarney
foi sucedido pelo Caçador de Marajás de
araque, que venceu o demiurgo de
Garanhuns no segundo turno do pleito de 1989 e sagrou-se o primeiro
presidente eleito pelo voto popular desde Jânio
Quadros (em 1960). Foi durante seu governo — de Sarney, não de Collor — que
a “Constituição Cidadã” (sobre a
qual falarei mais adiante) foi promulgada.
Foi somente em 1997, com as bênçãos
do então presidente Fernando Henrique,
que nossa Carta Magna deixou de proibir o chefe do Executivo e respectivo vice
de disputar a reeleição para mandatos consecutivos (mandatos não consecutivos
não são considerados como reeleição, daí porque Lula, de olho nas eleições de 2014, fez Dilma sua sucessora em 2010, mas a anta pegou gosto pelo poder e a mula
caiu do jegue). Aprovada a emenda da reeleição, FHC tornou a vencer Lula no primeiro turno, em 1998, e
conquistou seu ambicionado segundo mandato (durante o qual fez um governo de
merda, mas isso é outra conversa).
Importa dizer é que devemos ao grão-tucano a situação em que nos encontramos atualmente. Se a ideia era
copiar a Constituição norte-americana, que copiassem direito: segundo a 22ª Emenda
(Amendment XXII, no original em
inglês), aprovada pelo Congresso dos EUA em 1947 e ratificada em 1951, nenhuma
pessoa poderá ser eleita mais de duas vezes para o cargo de presidente. Nesses
termos, Lula, que esgoto os dois mandatos a que tinha direito, poderia gozar alegremente sua estada na carceragem da PF em Curitiba (ou no Complexo Médico-Penal
de Pinhais, ou em outro presídio qualquer) sem se preocupar com questões
inerentes à sucessão presidencial.
Costuma haver diferenças entre como as coisas são e como deveriam ser. É por isso que teremos de amargar mais três longas semanas —
com direito à volta dos debates e do horário político obrigatório — até que, se
não houver surpresas e Bolsonaro mantiver
a liderança, o esbirro do criminoso de Garanhuns seja devidamente despachado
para o buraco de onde jamais deveria ter saído.
Entrementes, divirtamo-nos
com as pesquisas. Aliás, chegou a ser hilária (para não dizer irritante) a
insistência dos âncoras da Globo (e de outras emissoras que acompanharam em
tempo real a apuração dos votos) em exibir o percentual de votos de Amoedo, Boulos, Daciolo, Eymael, Vera Lucia e companhia, quando o que interessava mesmo era a
possibilidade de o candidato do PSL liquidar a fatura já no primeiro turno (e faltou bem pouco!).
Não é uma simples
segunda-feira de primavera. Neste momento, já se sabe quem venceu o primeiro
turno das eleições e mais ainda: como se compõe o novo Congresso. [...] Imagino
que comece hoje uma discussão sobre as causas que levaram Bolsonaro a vencer o primeiro turno. E também a ampla distribuição
de culpa entre seus adversários. [...] Bolsonaro
foi o deputado mais votado no Rio, em 2014. Ele teve 464 mil votos, cerca de 6%
do total, um feito extraordinário em eleições proporcionais. Naquele momento,
ele já estava em ascensão batendo, principalmente, em duas teclas: corrupção e
segurança pública. Sua proposta em segurança tem uma vantagem sobre todas as
outras. Reconhece a limitação do Estado e envolve o indivíduo, que teria sua
própria arma. [...] Ainda vou escrever muito sobre Bolsonaro, inclusive sobre os 16 anos em que estivemos juntos em
algumas comissões da Câmara, divergindo nos costumes e concordando na denúncia
da corrupção. A grande dificuldade com Bolsonaro
é que, essencialmente, é anticomunista e tende a combater todas as lutas
lideradas pela esquerda, como se tivessem sido inventadas por ela. Ele tem
dificuldade em distinguir direitos humanos e exploração ideológica, movimento
das mulheres das visões radicais, meio ambiente e ameaça à propriedade privada
e, no caso amazônico, cobiça internacional. [...] Pessoalmente, sempre
conversei com Bolsonaro ao longo de
16 anos. Nos seus primeiros discursos na Câmara, ele pedia minha prisão porque
eu era um sequestrador do embaixador americano. Ele queria reproduzir o debate
sobre a luta armada. Os tempos eram outros, tínhamos um novo país para
construir. A esquerda me considera um traidor que ocupa um espaço na lata de
lixo da história. Sou aquele jogador que já foi do time e a torcida vaia sempre
que toca na bola. Mas esquerda e direita são forças missionárias que tentam
universalizar seu conceito de boa vida. Numa sociedade complexa como a nossa,
precisamos reconhecer as diferenças e navegar com cuidado, administrando os
problemas recorrentes. A ideia de um país dominado pela Bíblia ou pelo
“Capital” de Marx não deixa de ser
legítima. Apesar da importância que ambos dão aos seus textos, eles são apenas
um modesto guia. O mundo ultrapassa os velhos esquemas mentais. Ou, em
linguagem bem brasileira: o buraco é mais embaixo.
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