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domingo, 8 de dezembro de 2019

BOLSONARO E A REELEIÇÃO



Jair Bolsonaro, por um fenômeno até agora não esclarecido pelos nossos esclarecedores de questões nacionais, foi o único político de primeira grandeza no Brasil a entender que, para a maioria dos brasileiros, a polícia é uma coisa boa e bandido é uma coisa ruim. Noves fora os rematados idiotas de sempre, todo mundo sabe que policiais erram, que podem tratar mal o público e não investigar nem reprimir como deveriam os crimes cometidos, além de eles próprios cometerem uma série intolerável de atos criminosos. Mas também é sabido que não existe um único caso de bandido que esteja a favor do cidadão — e que qualquer policial, no fim das contas, é melhor que qualquer criminoso. Daí a “oposição”, parte da mídia, “movimentos sociais” e "defensores dos direitos humanos" tomarem partido contra as forças da ordem e a favor das forças do crime. E se mostrarem indignados, depois, quando a população prefere o capitão caverna a assassinos, ladrões e estupradores.

Segundo J.R. Guzzo, a grande questão da política brasileira, hoje, é a perspectiva real de Bolsonaro ficar no seu cargo não só pelos três anos de mandato a que ainda tem direito por conta da eleição de 2018, mas até 31 de dezembro de 2026. E não adianta fazer de conta que não é isso. É precisamente isso. Fala-se de tudo — da descomunal importância do presidente da Câmara para o futuro do Brasil e do Sistema Solar, do que se passa a cada minuto do dia na cabeça do presidente do Senado, dos entreveros de Bolsonaro com o sistema de pontos nas multas de trânsito. Discutem-se novos partidos, velhos partidos, centrão, centrinho, os filhos do presidente e o futuro de Lula: o que mais o STF pode fazer por ele?

Há, todos os dias, a crise da manhã, a crise da tarde e a crise da noite, com ameaça real, direta e imediata à sobrevivência do governo. Há de tudo — menos a discussão aberta da única coisa que de fato interessa: até quando Bolsonaro vai ficar? O resto é o resto.

Não se trata de um “Quiz” de adivinhação. Se o presidente ficar ”X” tempo, a sociedade brasileira terá uma cara; se ficar “X” + “Y”, terá outra. Não é mudança de governo. É mudança de vida. Daqui a três anos, se as coisas continuarem a andar do jeito que estão andando, o Brasil será um país tão diferente do que é hoje, mas tão diferente, que praticamente nada do que se discute no momento terá qualquer significado prático para o dia a dia dos brasileiros.

Se a história for ainda além, e Bolsonaro receber um segundo mandato — bom, aí estaremos entrando em território absolutamente virgem. É uma perspectiva que assusta até o fundo da alma toda a ordem política, econômica e social que manda hoje no Brasil, como tem mandado há décadas, ou mais do que isso. Assusta porque traz o insustentável peso da mudança para os que não querem que nada mude — ou que só mude aquilo que lhes interessa mudar. Mudam o sistema psicológico, a “ideologia”, os hábitos intelectuais, os valores, os usos e costumes.

Quem está contente com o Brasil como ele foi até hoje não pode estar contente com o Brasil desconhecido que talvez esteja vindo aí pela frente. Qual poderia ser ele? É uma perda de tempo, como se sabe, ficar preocupado em excesso com o futuro, porque ele virá de qualquer maneira. O que dá para fazer é uma lista de realidades — e ir checando, uma por uma, se elas estão mudando para melhor ou para pior. A economia, por exemplo. Pelos fatos que podem ser vistos hoje — e não pelos sentimentos que você tem a respeito deles — a situação tende a melhorar ou piorar?

O país, no futuro próximo, vai ter um outro STF e uma outra Justiça. A máquina pública deixará de crescer como cresceu nos últimos 50 anos. O Brasil, forçosamente, vai estar mais integrado às cadeias mundiais de produção. O “investimento público” deixará de ter o tratamento sagrado que tem hoje. Não haverá novas empresas estatais. As pressões da maioria sobre os donos da vida pública vão aumentar — entre outras coisas, não há nenhuma hipótese de que as redes sociais se tornem menores e mais silenciosas do que são hoje.

Todas essas coisas somadas, e uma infinidade de outras, são positivas ou não? Faça suas contas. O fato é que ninguém pode esperar uma vida melhor se não houver mudança nenhuma no lugar onde ela se tornou ruim.

Com J.R. Guzzo

sábado, 31 de agosto de 2019

AMIGOS, AMIGOS, REELEIÇÃO À PARTE



Países não têm amigos, têm interesses. Mutatis mutandis, o mesmo vale para Bolsonaro — menos em relação a filhos, parentes e afins, naturalmente —, como se pode inferir da troca de farpas entre o capitão e seu ministro da Justiça, que, juntamente com o Posto Ipiranga que comanda a pasta da Economia, representa o alicerce do atual governo.

Quer outro exemplo? Então vamos lá. Durante a campanha, Bolsonaro e João Doria pareciam cantar no mesmo coral. Passados 11 meses das eleições, a impressão que se tem é de que ambos estão em plena disputa presidencial.

Pelo Facebook, o presidente acusou o governador de São Paulo de “mamar nas tetas” dos governos petistas ao comprar um jatinho financiado a juros subsidiados pelo BNDES. Dória, que já havia criticado o Bolsonaro dias atrás, por conta de suas posições em relação às queimadas na floresta Amazônica, deu o troco no mesmo dia: “Quero Lula e Dilma distantes, se possível do Brasil, até. Que fiquem onde estão, Lula na prisão e Dilma no ostracismo.”

Alexandre Frota, que recentemente trocou o PSL pelo PSDB, tomou as dores do padrinho: “É mais honesto e coerente empresários buscarem financiamento no BNDES do que [Bolsonaro] buscar dinheiro no Queiroz Investimento”, disse, referindo-se a Fabrício Queiroz, ex-assessor de zero um e amigo do presidente desde os tempos de antanho. O deputado também acusou o presidente de brigar sozinho, “como já brigou com o Rodrigo Maia, com o Davi Alcolumbre e comigo”. “Se tem alguém que está errado é quem trabalha para mudar a direção da Polícia Federal e da Receita Federal, quem mudou o Coaf, para segurar as investigações sobre o Flávio Bolsonaro.” E cá entre nós, não dá para discordar, talkey?

Nas últimas semanas, muito se falou que Bolsonaro estaria fritando seu ministro da Justiça — houve até quem atribuísse a essa fritura a fumaça que escureceu os céus de Sampa na segunda-feira 19. Para os palpiteiros de plantão, o presidente quer a demissão de Moro, mas este não quer sair. Ainda.

Observação: O problema tem a ver com a popularidade do ex-juiz da Lava-Jato; político nenhum que se preze deixa brotar no terreno do vizinho uma arvorezinha com potencial de fazer sombra no seu próprio quintal.

Doria acompanha atento o desenrolar dos acontecimentos. Segundo aliados, a vice-presidência numa chapa encabeçada pelo governador em 2022 pode ser a isca para fisgar Moro à sua equipe, quebrar um alicerce do bolsonarismo e formar o que os mais empolgados chamam de "dupla matadora". Ainda não houve convite formal ao ministro, mas diversos recados vêm sendo dados por interlocutores comuns dos dois. Na última terça-feira, ao ser questionado se gostaria de Moro em sua equipe, o governador respondeu com outra pergunta: "Quem não gostaria?". E completou: "Foi um grande juiz, é um grande ministro. Não há convite, há admiração".

Os ânimos entre o presidente e o ministro serenaram, mas o armistício pode ter data de validade. Moro manteve Maurício Valeixo como diretor-geral da PF; Bolsonaro defenestrou Ricardo Saadi da superintendência do órgão no Rio — onde zero um está em apuros —, e vem articulando a nomeação de um delegado, digamos, mais maleável. Se sua vontade prevalecer — e ele já deixou claro que está aí para interferir, ou seria um presidente-banana —, Valeixo não terá como continuar comandando a PF.

Sabe Deus até quando Sérgio Moro fabricará saídas honrosas em meio a essa torrente de desonras. Se Bolsonaro sancionar sem vetos a lei de abuso de autoridade, ignorando as recomendações do ministro, este terá de avaliar com quantos batráquios se faz a indigestão de um "patrimônio nacional", como o chefe se referiu a ele na última quinta-feira.

sexta-feira, 31 de maio de 2019

SÉRGIO MORO — O PREGO QUE SE DESTACA É O QUE LEVA A MARTELADA



Bolsonaro saiu fortalecido das manifestações do último domingo, mas quem brilhou mesmo foi o ministro Sérgio Moro, que é visto pela banda podre do Congresso como perseguidor de políticos — e que, por obra e graça dessa mesma banda podre, não só teve de engolir a perda do Coaf como também subscrever (juntamente com o presidente e os ministros Guedes e Lorenzoni) um pedido aos senadores para que votassem a MP 840 do jeito que ela passou na Câmara.

ObservaçãoMinistros do STF e integrantes do Centrão disseram à Folha de S. Paulo que a adesão à marcha bolsonarista deve ser “creditada em boa medida à figura do ministro Sergio Moro, que teria ‘salvado’ as manifestações pró-governo”. Nesse caso, que aprovem o pacote anticrime e mantenham Lula na cadeia.

Por que a coisa chegou a esse ponto? Porque o Planalto e o Legislativo andam às turras, e a medida provisória que redesenhou a Esplanada dos Ministérios e transferiu o Coaf para a pasta da Justiça e Segurança Pública perderia a validade se não fosse aprovada até a próxima segunda-feira (detalhes na postagem anterior). No apagar das luzes da última terça, o texto-base foi chancelado no Senado por 70 votos a 4, e o destaque que previa o retorno do Coaf para Moro foi rejeitado.

Observação: Uma ação apresentada pelo Podemos ao Supremo, visando levar o Coaf de volta ao ministério de Moro, foi sorteada para o ministro Edson Fachin, mas isso é outra história.

Por alguma razão, Bolsonaro não se empenhou como poderia (ou deveria) para manter o Coaf sob a asa de Moro. Mas insistir nessa questão aos 48 minutos do segundo tempo, como fizeram o Major Olimpio — que teimava em apresentar um destaque durante a votação da medida — e outros aliados do governo não seria a estratégia mais acertada. E de burro Jair Bolsonaro não tem nada. A despeito do que parece, a maioria dos “tiros no pé” que ele e seus filhos são acusados de dar tem um propósito, mas isso também é outra conversa.

Uma explicação que me ocorre para a inércia do presidente é o imbróglio envolvendo Fabrício Queiroz, ex-factótum do clã dos Bolsonaro e assessor do filho zero um, que veio à luz por obra e graça do Coaf — fortalecido por Moro nos 5 meses em que o conselho esteve sob seu comando. “Mas o Coaf ficou no governo, e Moro e Guedes jogam no mesmo time”, minimizam alguns. Talvez. Mas o ministro da Economia tem outras prioridades. Para bom entendedor...

Falando nessa novela Fabrício Queiroz/Flávio Bolsonaro, a situação do parlamentar se complica a cada novo e emocionante capítulo. Custa acreditar que ele não tivesse conhecimento do que seu então assessor fazia debaixo de seu nariz, para não mencionar a evolução patrimonial do próprio Flávio, proveniente, segundo ele, de negócios imobiliários (envolvendo 14 apartamentos e 23 salas comerciais). Essa verão é tão convincente quanto a de que os R$ 1.2 milhões que Queiroz movimentou entre 2016 e 2017 foram produto da compra e venda de carros usados. Aliás, fala-se que R$ 7 milhões passaram pela conta do dito-cujo nos últimos três anos, e que ele pagou R$ 133,5 mil em dinheiro vivo por uma cirurgia no Hospital Israelita Albert Einstein, mas isso é assunto para outra hora.

Em vez de apresentar uma contestação convincente, o primogênito do presidente da República tenta criar incidentes processuais — talvez por ser difícil defender o indefensável, como aprenderam a duras penas o ex-presidente Lula e seus advogados estrelados. Mesmo tendo fracassado em duas tentativas de barrar as investigações (primeiro no STF, depois no TJ-RJ), a defesa de Flávio tenta novamente derrubar a quebra dos sigilos bancário e fiscal de seu cliente, desta vez sob a alegação de que o pedido foi mal fundamentado. Mesmo que fosse bem sucedida (e tudo indica que não será), a estratégia não atenuaria as suspeitas que pairam sobre o político — que, ao posar de perseguido, só reforça a tese de que funcionava em seu gabinete na Alerj uma organização criminosa que praticava crimes de peculato e lavagem de dinheiro. Com bem lembrou Josias de Souza, já vimos esse filme com atores petistas, e verificou-se no final que não havia mocinhos no enredo.

Voltado a Sérgio Moro: Ao lhe prometer a próxima vaga que surgir no STF, Bolsonaro alivia a dor das caneladas que o ministro vem levando dia sim, outro também — dentre outros exemplos, cito o pacote de medidas anticrime e anticorrupção, que deveria tramitar em paralelo com a PEC previdenciária, mas está parado e corre o risco de ser diluído em meio a um conjunto de medidas sugeridas tempos atrás pelo togado supremo Alexandre de Moraes.

A permanência do ex-juiz da Lava-Jato no ministério agrega credibilidade ao governo do capitão, como ficou claro nas manifestações do último domingo. Por outro lado, a despeito das negativa, o presidente tenciona, sim, disputar a reeleição, caso as reformas essenciais sejam aprovadas e a economia deslanche. E ninguém é bobo de regar uma sementinha plantada no terreno do vizinho que tenha tamanho potencial de fazer sombra em seu próprio quintal.

      

domingo, 18 de novembro de 2018

SOBRE BOLSONARO, O FIM DA REELEIÇÃO E A EXONERAÇÃO DE SÉRGIO MORO



Para o jornalista J.R. Guzzo, diretor editorial do grupo EXAME e membro do Conselho Editorial da Abril, o reajuste reivindicado pelos ministros do STF e avalizado pelo Senado “é uma coisa de submundo, uma expressão de tudo o que existe de pior nesse Brasil velho, subdesenvolvido, concentrador de renda, corrompido até o fundo da alma, trapaceiro, parasita, que faz a nossa desgraça de todos os dias. Bolsonaro estaria começando muito mal, realmente, se não tivesse falado nada. Os 58 milhões de votos que recebeu foram contra isso, não a favor”.

Ao contrário de boa parte da mídia, Guzzo não vê quiproquó nenhum na transição do governo moribundo de Temer para a futura gestão de Bolsonaro. Na sua avaliação, o presidente eleito vem se comportando como um presidente eleito que daqui a pouco mais de um mês vai chefiar o governo — a gestão Temer já está tirando as medidas para lhe fazerem o caixão, e não dá para esperar até o enterro para só então começar o trabalho. Ele também concorda com Bolsonaro sobre o país ter direitos demais e empregos de menos: “O presidente eleito está apenas apresentando um fato — que já foi dito por um monte de gente boa, um monte de vezes, e reflete exatamente a palhaçada hipócrita dos nossos 10 milhões de leis, ou sabe lá Deus quantas. Criam direitos para tudo que se possa imaginar, quase sempre pagos com dinheiro do contribuinte — dinheiro que na maioria das vezes simplesmente não existe na vida real. Boa parte não pode ser desfrutada pelos beneficiários, e outra parte é pura safadeza para encher o bolso da casta mais alta do serviço público”.

Sobre Bolsonaro insistir em dizer respeitará a Constituição, o jornalista pondera que não resta alternativa, pois a todo momento o presidente eleito é cobrado a propósito. Aliás, na solenidade de comemoração dos 30 anos da Constituição — que Ulysses Guimarães, líder da resistência civil à ditadura militar, chamava de “cidadã” —, ouviram-se muitas juras hipócritas e muitas loas à Carta Magna, mas o fato é que ela tem de ser respeitada porque está em vigor e não existe outra, cabendo ao novo governo, ou cumprir tudo o que está escrito lá, ou aprovar no Congresso reformas que mudem o seu texto.

Guzzo também critica a medida provisória encaminhada por Michel Temer — e avalizada pelo Senado — que entrega de mão-beijada benesses às montadoras de automóveis. Segundo ele, o Brasil vem sendo governado há décadas com a mentalidade, os métodos e as ações de governantes que ganham a vida por meio do crime, mas, mesmo assim, um Congresso e um resto de governo que estarão sepultados no dia 1.º de janeiro de 2019 jamais deveriam ter o direito de fazer isso — não por estarem criando problemas para “o governo Bolsonaro”, como diz a imprensa, mas porque o contribuinte vai pagar por cada centavo disso tudo nos próximos anos. Se o presidente eleito conseguirá ou não desarmar as bombas de efeito retardado deixadas pelas gestões do PT e do PMDB, só o tempo dirá. Entretanto, estaria de bom tamanho se ele pudesse desarmar metade delas, pois em geral não se desarma nenhuma. 

Quanto ao fim da reeleição (defendido por Bolsonaro), Guzzo diz ser uma excelente notícia para o Brasil e para o próprio Bolsonaro, lembrando que FHC, Lula e Dilma, notórios democratas antifascistas, colocaram seus governos e o erário a serviço permanente da própria reeleição, e o primeiro a adotar uma atitude diferente é justamente o “militar autoritário, totalitário, defensor das ditaduras, etc. Se a ideia prosperar, será um belo cala-boca na oposição, nos intelectuais, nos artistas de novela e no New York Times.

Em atenção a quem não sabe ou não se lembra, abro um parêntese para dizer que a reeleição não foi fruto da tal “Constituição Cidadã”, mas de uma emenda constitucional que deu chance ao então presidente Fernando Henrique de ser o primeiro mandatário a disputar uma reeleição no Brasil — deu para entender ou quer que eu desenhe?

Nossa atual Carta Magna foi promulgada em 1988, durante o (nada saudoso) governo do macróbio maranhense José Ribamar Ferreira de Araújo Costa, vulgarmente conhecido no mundo do crime, digo, da política, como José Sarney, que se tornou presidente civil desta Banânia pós-ditadura com à morte de Tancredo Neves. O que a Assembleia Nacional Constituinte estabeleceu foi o presidencialismo como forma de governo e o mandato de 5 anos para o presidente da República (daí a razão do infausto governo Sarney ter se estendido até março de 1990), vencida a oposição, que se dividia entre os que propunham quatro anos para todos os presidentes, inclusive o presidente em exercício, e os que desejavam um mandato de cinco anos para o futuro, porém mais curto para Sarney. Pesquisas da época registraram a preferência da população pelo mandato de quatro anos, que passaria a vigorar em 1997.

A PEC da reeleição, aprovada em segundo turno no Senado por 62 votos a favor, 14 contra e 2 abstenções, numa sessão solene que durou apenas 9 minutos, estendeu o “benefício” também a governadores e prefeitos. Depois da promulgação, o então presidente do Senado, Antonio Carlos Magalhães (vulgo “Toninho Malvadeza”), o então presidente da Câmara, Michel Temer, foram ao Palácio do Planalto entregar o texto da emenda ao então presidente Fernando Henrique Cardoso. A certeza de que a aprovação da emenda fortalecia o presidente em exercício foi ratificada pelo então presidente do Senado: “Pela liderança que tem, é um candidato forte à reeleição”, declarou ACM, e afirmou que a tendência era que seu partido, o PFL (que em março de 2007 passou a se chamar Democratas e teve como primeiro presidente da nova sigla Rodrigo Maia, atual presidente da Câmara), mantivesse o apoio a FHC nas eleições de 1998, o que incluía a permanência de Marco Maciel como candidato a vice. Fecho o parêntese. 

Para concluir, transcrevo trecho do pedido de exoneração do juiz Sérgio Moro, futuro ministro da Justiça e Segurança Pública:

Houve quem reclamasse que eu, mesmo em férias, afastado da jurisdição e sem assumir cargo executivo, não poderia sequer participar do planejamento de ações do futuro governo. Assim, venho, mais uma vez registrando meu pesar por deixar a magistratura, requerer a minha exoneração do honroso cargo de juiz federal da Justiça Federal da 4ª Região, com efeitos a partir de 19/11/2018, para que possa então assumir de imediato um cargo executivo na equipe de transição da Presidência da República e sucessivamente ao cargo de Ministro da Justiça e da Segurança Pública. Destaco meu orgulho pessoal de ter exercido durante 22 anos o cargo de juiz federal e de ter integrado os quadros da Justiça Federal brasileira, verdadeira instituição republicana”.

A juíza substituta Gabriela Hardt assumiu os processos que correm no âmbito da Lava-Jato na primeira instância paranaense, como aquele em que depôs, na última terça-feira, o ex-presidente petralha e hoje hóspede compulsório da carceragem da PF em Curitiba. Gabriela é substituta e ficará encarregada das ações até o TRF-4 nomear o substituto de Moro.

Pelo menos 232 juízes federais titulares poderão se candidatar, aí incluídos todos os titulares que atuam no âmbito do TRF-4 (que abrange os Estados de Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul). No topo da lista estão, pela ordem, os juízes federais Luiz Antônio Bonat (Curitiba), Taís Schilling Ferraz (Porto Alegre), Marcelo de Nardi (Porto Alegre), Alexandre Gonçalves Lippel (Porto Alegre), Hermes Siedler da Conceição Júnior (Porto Alegre), Eduardo Vandré Oliveira Lema Garcia (Santa Cruz do Sul), Altair Antônio Gregorio (Porto Alegre) e Loraci Flores de Lima (Santa Maria).Todos ingressaram no TRF-4 no mesmo dia, quatro anos depois de Moro, que ingressou como titular no tribunal em 24 de novembro de 1998.

O processo interno de seleção, denominado remoção, deverá durar um mês. Uma vez publicado o edital, os juízes titulares deverão apresentar suas candidaturas nos dez dias seguintes. O critério de seleção será baseado na antiguidade, ou seja, no tempo de atuação do magistrado como juiz titular e, depois, como juiz substituto. Em caso de empate, será utilizado o critério de colocação no concurso público. Neste critério de classificação, o juiz Luiz Antônio Bonat, da 21.ª Vara Federal de Curitiba, aparece na primeira colocação. Se nenhum juiz titular apresentar candidatura, a vaga será aberta em um edital de promoção aos juízes federais substitutos, que poderão concorrer à cadeira pelos mesmos critérios de antiguidade e colocação no concurso público.

Dito isso, dou a postagem por encerrada. Bom domingo a todos.

terça-feira, 9 de outubro de 2018

FALTAM 19 DIAS PARA O SEGUNDO TURNO — E AGORA, JOSÉ?



Devido à morte de Tancredo Neves, o maranhense José Ribamar Ferreira de Araújo Costa, mais conhecido como José Sarney, presidiu o Brasil de 22 de abril de 1985 a 15 de março de 1990, tornando-se o primeiro presidente civil pós-ditadura. 

Sarney foi sucedido pelo Caçador de Marajás de araque, que venceu o demiurgo de Garanhuns no segundo turno do pleito de 1989 e sagrou-se o primeiro presidente eleito pelo voto popular desde Jânio Quadros (em 1960). Foi durante seu governo — de Sarney, não de Collor — que a “Constituição Cidadã” (sobre a qual falarei mais adiante) foi promulgada. 

Foi somente em 1997, com as bênçãos do então presidente Fernando Henrique, que nossa Carta Magna deixou de proibir o chefe do Executivo e respectivo vice de disputar a reeleição para mandatos consecutivos (mandatos não consecutivos não são considerados como reeleição, daí porque Lula, de olho nas eleições de 2014, fez Dilma sua sucessora em 2010, mas a anta pegou gosto pelo poder e a mula caiu do jegue). Aprovada a emenda da reeleição, FHC tornou a vencer Lula no primeiro turno, em 1998, e conquistou seu ambicionado segundo mandato (durante o qual fez um governo de merda, mas isso é outra conversa). 

Importa dizer é que devemos ao grão-tucano a situação em que nos encontramos atualmente. Se a ideia era copiar a Constituição norte-americana, que copiassem direito: segundo a 22ª Emenda (Amendment XXII, no original em inglês), aprovada pelo Congresso dos EUA em 1947 e ratificada em 1951, nenhuma pessoa poderá ser eleita mais de duas vezes para o cargo de presidente. Nesses termos, Lula, que esgoto os dois mandatos a que tinha direito, poderia gozar alegremente sua estada na carceragem da PF em Curitiba (ou no Complexo Médico-Penal de Pinhais, ou em outro presídio qualquer) sem se preocupar com questões inerentes à sucessão presidencial.

Costuma haver diferenças entre como as coisas são e como deveriam ser. É por isso que teremos de amargar mais três longas semanas — com direito à volta dos debates e do horário político obrigatório — até que, se não houver surpresas e Bolsonaro mantiver a liderança, o esbirro do criminoso de Garanhuns seja devidamente despachado para o buraco de onde jamais deveria ter saído. 

Entrementes, divirtamo-nos com as pesquisas. Aliás, chegou a ser hilária (para não dizer irritante) a insistência dos âncoras da Globo (e de outras emissoras que acompanharam em tempo real a apuração dos votos) em exibir o percentual de votos de Amoedo, Boulos, Daciolo, Eymael, Vera Lucia e companhia, quando o que interessava mesmo era a possibilidade de o candidato do PSL liquidar a fatura já no primeiro turno (e faltou bem pouco!).

Sobre Bolsonaro, segue trecho de uma postagem publicada ontem no Blog do Gabeira:

Não é uma simples segunda-feira de primavera. Neste momento, já se sabe quem venceu o primeiro turno das eleições e mais ainda: como se compõe o novo Congresso. [...] Imagino que comece hoje uma discussão sobre as causas que levaram Bolsonaro a vencer o primeiro turno. E também a ampla distribuição de culpa entre seus adversários. [...] Bolsonaro foi o deputado mais votado no Rio, em 2014. Ele teve 464 mil votos, cerca de 6% do total, um feito extraordinário em eleições proporcionais. Naquele momento, ele já estava em ascensão batendo, principalmente, em duas teclas: corrupção e segurança pública. Sua proposta em segurança tem uma vantagem sobre todas as outras. Reconhece a limitação do Estado e envolve o indivíduo, que teria sua própria arma. [...] Ainda vou escrever muito sobre Bolsonaro, inclusive sobre os 16 anos em que estivemos juntos em algumas comissões da Câmara, divergindo nos costumes e concordando na denúncia da corrupção. A grande dificuldade com Bolsonaro é que, essencialmente, é anticomunista e tende a combater todas as lutas lideradas pela esquerda, como se tivessem sido inventadas por ela. Ele tem dificuldade em distinguir direitos humanos e exploração ideológica, movimento das mulheres das visões radicais, meio ambiente e ameaça à propriedade privada e, no caso amazônico, cobiça internacional. [...] Pessoalmente, sempre conversei com Bolsonaro ao longo de 16 anos. Nos seus primeiros discursos na Câmara, ele pedia minha prisão porque eu era um sequestrador do embaixador americano. Ele queria reproduzir o debate sobre a luta armada. Os tempos eram outros, tínhamos um novo país para construir. A esquerda me considera um traidor que ocupa um espaço na lata de lixo da história. Sou aquele jogador que já foi do time e a torcida vaia sempre que toca na bola. Mas esquerda e direita são forças missionárias que tentam universalizar seu conceito de boa vida. Numa sociedade complexa como a nossa, precisamos reconhecer as diferenças e navegar com cuidado, administrando os problemas recorrentes. A ideia de um país dominado pela Bíblia ou pelo “Capital” de Marx não deixa de ser legítima. Apesar da importância que ambos dão aos seus textos, eles são apenas um modesto guia. O mundo ultrapassa os velhos esquemas mentais. Ou, em linguagem bem brasileira: o buraco é mais embaixo.

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sexta-feira, 30 de março de 2018

CANDIDATURA DE TEMER VAI PARA O ESPAÇO



Eu pretendia tecer alguns comentários sobre o “drama” da prisão após condenação em segunda instância, mas fatos novos me fizeram mudar o foco desta postagem para o naufrágio da quimérica candidatura de Temer à reeleição. Então, passo ao assunto sem mais delongas.

Nas interceptações telefônicas da Operação Patmos, a PF flagrou uma articulação entre Rodrigo Rocha Loures ― o “homem da mala” de Temer, lembram-se? ― e um executivo da Rodrimar, visando à publicação de um decreto presidencial que poderia favorecer a empresa concessionária de áreas no Porto de Santos (litoral paulista). Além disso, em maio do ano passado, os investigadores flagraram uma conversa em que Temer e Loures falavam sobre a ampliação do período para as empresas explorarem áreas portuárias de 25 para 35 anos, prorrogáveis até 70 anos (mais detalhes em O GLOBO).

Na manhã de ontem, a Polícia Federal prendeu 6 pessoas envolvidas no caso, que vem sendo investigado a partir da delação da JBS. Dentre eles estão José Yunes, advogado e amigo do presidente há mais de 50 anos, o coronel João Batista Lima Filho, também amigo de Temer (há mais de 3 décadas), e Wagner Rossi, ex-ministro da agricultura (os demais detidos são Antonio Celso Grecco, dono da Rodrimar, e Milton Ortolan, auxiliar de Rossi). As prisões são temporárias e foram autorizadas por Luis Roberto Barroso, do STF, a pedido da PGR (o ministro Barroso é relator do inquérito que apura a MP dos Portos, na qual Temer é suspeito de ter recebido propina em troca de benefícios a empresas do setor portuário, dentre as quais Rodrimar).

Ricardo Saud, ex-diretor de relações institucionais do grupo J&F, afirmou em sua delação que Rocha Loures mantinha uma parceria com a Rodrimar, e que essa parceria seria tão sólida que o então assessor de Michel Temer chegou a indicar um diretor da empresa para receber, em seu nome, propinas da J&F

Tudo isso nos leva às seguintes considerações:

1) As flechadas de Janot contra Temer, escudadas pelas marafonas da Câmara (em troca de cargos e bilhões de reais em verbas parlamentares), não foram meros “delírios” do ex-procurador-geral Rodrigo Janot, nem tampouco uma retaliação contra o presidente ― que foi o grande articulador e maior beneficiário do impeachment da anta vermelha). Afinal, quem comanda a PGR desde setembro do ano passado é Raquel Dodge, e por indicação direta do próprio Michel Temer.

2) O inquérito pode até se limitar aos envolvidos que foram presos na manhã de ontem, mas é provável que chegue ao próprio presidente, na forma de uma terceira denúncia contra ele no Congresso. No entanto, faltando 7 meses para as eleições e 9 para a troca de comando, dificilmente teremos outro processo de impeachment. 

3) Por outro lado, a prisão de pessoas tão próximas ao presidente terá consequências desastrosas sobre seu projeto de concorrer à reeleição ― o que, para alguém com a popularidade de Michel Temer, mesmo antes desse incidente já era uma possibilidade tão remota quanto a de um burro voar. 

Observação: Disse o jornalista Valdo Cruz, do G1, que “o cenário inviabilizaria completamente qualquer pretensão de [Temer] disputar a reeleição”, e que "a notícia pegou de surpresa o governo, que, até a noite da última quarta-feira, estava totalmente voltado para as negociações da reforma ministerial e reorganização da base".

Outros detalhes sobre o caso não foram revelados porque as investigações correm em segredo de Justiça, mas deverão vir à público na semana que vem, depois que o Congresso e o Judiciário retornarem ao trabalho. Vamos continuar acompanhado.

E viva o povo brasileiro, majoritariamente composto por apedeutas, analfabetos e ignorantes, que, supostamente capacitados a votar, não perdem uma única chance de fazer as piores escolhas.

Bom feriadão e uma excelente Páscoa a todos.

EM TEMPO: A IMAGEM A SEGUIR NÃO TEM NADA A VER COM O TEMA DESTA POSTAGEM, MAS COMO HÁ MESES QUE EU DEIXEI DE PUBLICAR O TRADICIONAL HUMOR DE SEXTA-FEIRA, VÁ LÁ QUE SEJA:


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segunda-feira, 5 de março de 2018

AINDA SOBRE TEMER, REELEIÇÃO E INTERVENÇÃO FEDERAL



Continuando de onde paramos na postagem anterior:

Tanques e soldados nas ruas não são novidades para os cariocas, mas, para que tenha chances reais de produzir resultados substantivos, a intervenção federal precisa ir bem além, começando por deixar claro de onde virão os recursos, quem vai pagar o quê, e como. Demais disso, é fundamental que se faça uma devassa nas polícias civil e militar e na administração dos presídios, e que se exerça um controle efetivo sobre o abundante afluxo de armas e drogas ― é bom não esquecer que as autoridades não conseguem barrar nem mesmo a entrada de celulares nas penitenciárias.

Isso é só o começo, mas já é muita pedra no caminho do general-interventor, que foi escalado para comandar uma operação cujas únicas preparações foram uma reunião do presidente com ministros de sua cozinha e outra com o marqueteiro Elsinho Mouco. Aliás, para o marqueteiro de Temer, empurrar a bandeira do combate à criminalidade dá ao presidente condições de disputar o voto dos mais pobres e dos eleitores que simpatizam com a candidatura de radical de direita Jair Bolsonaro. “O Temer jogou todas as fichas na intervenção (...). Ele já é candidato”, disse Mouco ao colunista Bernardo Mello Franco, de O GLOBO.

Temer desconversa, até porque disputar a reeleição com índices abissais de aprovação popular e a imagem associada a malas de dinheiro nas mãos e em apartamentos de amigos próximos é coisa de napoleão de hospício. Mas vivemos num país onde a ignorância campeia solta e o candidato preferido pelos desculturados é um criminoso condenado... então, por que não tentar? O momento não poderia ser melhor: com um primeiro lugar vago (só a militância vermelha ainda não vê que a Lei da Ficha-Limpa tornou Lula inelegível e que sua prisão pode ser decretada assim que o TRF-4 julgar os benditos embargos declaratórios-protelatórios, o que deve acontecer ainda neste mês), um segundo com proposta de voltar 30 anos no relógio da história e um terceiro disputado por um aglomerado de pigmeus ciscando em torno de migalhas.

Temer parece estar convencido de que deve entrar na disputa, e se enrola na bandeira da segurança pública para continuar no jogo. Mais do que se reeleger, porém, importa-lhe mesmo é chegar às urnas com cacife suficiente para negociar seu apoio em troca de alguma espécie de salvo conduto na Lava-Jato para si e os seus.

Pesquisas realizadas em janeiro situavam Temer no mesmo patamar de Henrique Meirelles e Rodrigo Maia, que patinam em torno de 1%. Na sexta-feira pós-Carnaval ― logo após o anúncio da intervenção, portanto ― uma enquete realizada pelo IBOPE a pedido do governo deu conta de que 82% dos entrevistados aprovavam o decreto presidencial. Isso bastou para que o humor do presidente mudasse do desânimo com o sepultamento da reforma da Previdência para a euforia com a intervenção. Impulsionado por esse vento de cauda, Temer empacotou 15 medidas ― tidas, agora, como prioritárias ― e as defendeu como solução para aumentar a produtividade da economia. A maioria delas, no entanto, parte de projetos que tramitam há tempos no Congresso e, a julgar pela fragilidade do governo, deverá continuar engavetada. O próprio Rodrigo Maia disse que essas medidas eram “café frio e velho”, e que o Congresso vai voltar o que julgar importante. E Eunício Oliveira seguiu pela mesma linha: “A pauta do Congresso quem faz somos nós; não é o governo que faz a pauta aqui”.  

Não é fácil mensurar o número de brasileiros que acreditam em soluções militares. Por outro lado, é impossível negar que população vem sendo sistematicamente insultada por decisões de um STF que presta vassalagem a condenados por corrupção, é feita de trouxa por uma caterva de deputados e senadores da pior catadura, tem seus direitos mais básicos violados por criminosos e vê o Judiciário soltar quem deveria estar preso ou manter fora da prisão quem deveria estar lá dentro.

Enfim, tanto no caso da intervenção quanto no da sucessão presidencial, sobram perguntas e faltam respostas. Vamos acompanhar e torcer pelo melhor.

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domingo, 4 de março de 2018

TEMER PRESIDENTE? DE NOVO?



Enquanto articulava a deposição da gerentona de festim, Michel Temer acenava com um governo reformista e um ministério de “notáveis”. Quando assumiu o posto, prometeu enxugar a máquina pública, começando por extinguir ao menos 10 ministérios. Cortou apenas seis (e depois criou outros três, o que nos deixa com 29 pastas, três a menos do que tínhamos quando Dilma foi penabundada), e sua equipe de notáveis se revelou uma notável agremiação de corruptos ― que foram caindo feito moscas, à razão de um por mês, devido a suspeitas de corrupção.

Num primeiro momento, quando gozava de invejável apoio parlamentar, o presidente conseguiu aprovar as PECs do Teto dos Gastos, da Legislação Trabalhista e do Ensino Médio. Só que empacou justamente na mais importante, notadamente por não ter sido capaz de esclarecer a população da necessidade da reforma da Previdência e, consequentemente, de reunir os 308 votos necessários à sua aprovação na Câmara. 

A perspectiva de uma derrota fragorosa forçou o governo a diversos adiamentos, e depois de passar meses afirmando que a provação da PEC era uma questão de vida ou morte ― até porque as despesas com folha de pagamento e aposentadoria consomem 70% do orçamento e continuam subindo acima da inflação ―, Temer e seus acólitos se resignaram em deixar o tudo ou nada para depois do Carnaval. Estranhamente, porém, resolveram abandonar de vez o projeto e apostar todas as fichas na intervenção federal no Rio de Janeiro. Mas vamos por partes. 

A derrocada de Michel Temer começou com a divulgação da famigerada reunião clandestina com Joesley Batista, que teve efeitos arrasadores para um governante tido como ilegítimo e carente de apoio popular. Para piorar, a partir daquele episódio, seus aliados de ocasião, membros da notória banda podre do Congresso, passaram a exigir mais e mais benesses para apoiar o governo, aproveitando-se do fato de o presidente estar disposto a tudo para escapar das folclóricas “flechadas” de Janot

Tudo somado e subtraído, o reformista que almejava entrar para a história como “o cara que recolocou o Brasil nos trilhos do crescimento” tornou-se o primeiro presidente da nossa história a ser denunciado, no exercício do cargo, por crimes comuns (corrupção, associação criminosa e obstrução da Justiça).

É de se reconhecer que o Brasil melhorou significativamente desde a deposição da anta vermelha, que a inflação e a taxa básica de juros caíram a patamares inéditos, que o PIB voltou a crescer ― cerca de 1%, o que pouco, mas é muito se comparado com o descalabro havido durante o governo Dilma ― e que os índices do desemprego, se não baixaram, ao menos deixaram de subir. Por outro lado, se o sepultamento das denúncias marcou o início da segunda fase do governo Temer ― pautada por uma agenda reformista, necessária, mas altamente impopular ―, a intervenção no RJ inaugurou uma terceira, focada no populismo explícito, o que é uma guinada surpreendente, considerando que Temer sempre disse que a aprovação popular lhe era indiferente. Mas para tudo existe uma explicação.

O desânimo com o sepultamento da reforma da Previdência deu lugar à euforia com a intervenção federal no Rio, onde o problema da violência não começou durante o Carnaval, mas as cenas exibidas pela TV durante a folia facilitaram a decisão, que foi enfaticamente estimulada pelo ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência, Moreira Franco, para quem Temer teria pouco a perder se a medida não funcionasse e tudo a ganhar se ela desse certo. 

O "x" da questão é que a intervenção foi decretada sem um mínimo de planejamento, pegando de surpresa tanto o governador Pezão (que, a meu ver, deveria ter sido afastado) quanto os presidentes da Câmara e do Senado, sem mencionar o próprio interventor, que optou pelo silêncio durante a cerimônia em que a medida foi anunciada, talvez para disfarçar sua total perplexidade.

Para não estender demais este texto, continuaremos no próximo post. Tenham todos um ótimo domingo.

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