Antes do assunto do dia, relembro que Bolsonaro, como na fábula do Velho, o Menino e o Burro, será impiedosamente criticado, faça ele o que fizer, diga ele o que disser. Acho até que sua excelência não só se resignou como resolveu pendurar um alvo nas costas para facilitar o trabalho de seus detratores.
Num país com 13 milhões de desempregados, onde a sustentabilidade do governo depende da aprovação da polêmica (mas inevitável) reforma da Previdência e do não menos controverso (e igualmente indispensável) pacote de medidas anticrime e anticorrupção, é desalentador ver o chefe do Executivo preocupado com questões comezinhas, batendo boca com Caetano Velloso e Daniela Mercury e postando no Twitter, a pretexto de alertar seus quase 3,5 milhões de seguidores para “a pouca-vergonha em que se transformou o carnaval de rua brasileiro”, o vídeo pornográfico e de viés escatológico da última terça-feira, que pegou muito mal, inclusive no exterior .
Num país com 13 milhões de desempregados, onde a sustentabilidade do governo depende da aprovação da polêmica (mas inevitável) reforma da Previdência e do não menos controverso (e igualmente indispensável) pacote de medidas anticrime e anticorrupção, é desalentador ver o chefe do Executivo preocupado com questões comezinhas, batendo boca com Caetano Velloso e Daniela Mercury e postando no Twitter, a pretexto de alertar seus quase 3,5 milhões de seguidores para “a pouca-vergonha em que se transformou o carnaval de rua brasileiro”, o vídeo pornográfico e de viés escatológico da última terça-feira, que pegou muito mal, inclusive no exterior .
Não vou me aprofundar nesse assunto porque ainda não me restabeleci da síndrome do macaco (vide ilustração à esquerda), mas gostaria de lembrar ao presidente que se a reforma da Previdência não for aprovada, ou se for, mas desfigurada e desidratada pelas marafonas do Congresso, a sustentabilidade do seu quadriênio no comando desta Banânia vai pras cucuias. De pato-manco, bastava-nos Michel Temer na versão pós denúncia de Joesley (vade retro, Satanás!).
Em suma: Ou Carluxo dá uma trégua, ou o governo baixa as portas. Durante a história da República houve várias ocasiões em que família e política se misturaram, mas nada que chegasse nem perto do que se vê no governo Bolsonaro. O Brasil não é uma Monarquia e, portanto, o clã dos Bolsonaro não pode agir como se fosse a Família Real Britânica.
Minha ideia era dar sequência às considerações sobre o
atentado contra a vida de Bolsonaro,
que ontem completou seis meses e ainda não foi elucidado (a versão oficial é
que Bispo teria agido de moto
próprio, mas causa espécie um servente de pedreiro de viés esquerdista ser
defendido por uma banca de advocacia cujos honorários ele jamais poderia bancar
— com o perdão do trocadilho — e, na reta final das investigações, um
desembargado de viés esquerdista atuar para melar o jogo). Mas vivemos num país terceiro-mundista com aspirações
a grande nação, onde a política fede mais que nos demais (outro trocadilho
infame pelo qual peço perdão), a corrupção é metastática e os políticos
são venais a ponto de se ufanarem de ser honestos os que se mantêm fiéis ao
comprador. E dada a frequência com que novos assuntos disputam os holofotes com
os que já estão na ribalta, quem escreve sobre política não raro se vê obrigado
a desviar o foco — amanhã, se tudo seguir como planejado, voltaremos a
conversar sobre o esfaqueador celebridade.
Como se sabe, a 13ª
Vara Federal do Paraná, tida e havida como o “berço da Lava-Jato” e
notabilizada pela atuação do ex-juiz federal Sérgio Fernando Moro, ficou sob o comando da juíza
federal substituta Gabriela Hardt depois que Moro se exonerou, em novembro passado, para assumir o ministério da Justiça e
Segurança Pública. Sabe-se também que nesse interstício, ao julgar a ação que
trata do folclórico sítio em Atibaia — cuja propriedade de fato Lula vai negar até o fim de seus
imprestáveis dias —, a magistrada agraciou o desprezível petralha com mais 12
anos 11 meses de prisão. Aliás, cabe aqui abrir um parêntese para dizer que
achei admirável a nova postura do ex-governador fluminense Sérgio Cabral, que, condenado a quase 200 anos de prisão, mudou de
advogado e de estratégia, admitindo ter cometido os crimes pelos quais foi
condenado e atribuindo-os a seu “vício”
em dinheiro e poder. Fecho o parêntese.
Enfim, a atuação da juíza Hardt nos processos da Lava-Jato, que era provisória, terminou nesta Quarta-feira de Cinzas, quando Luiz Antonio Bonat,
de 64 anos de idade e 24 de carreira (maior tempo em toda a jurisdição do TRF-4), voltou das férias e assumiu o cargo.
Bonat nasceu em
Curitiba, formou-se em Direito pela Universidade Federal do Paraná e ingressou
na Justiça Federal em 1993. Atuou na 1ª Vara de Foz de Iguaçu, na 3ª Vara
Criminal de Curitiba e na 1ª Vara Federal de Criciúma (SC). Antes de assumir o
lugar de Moro, ele atuava como
juiz titular da 21ª Vara da Justiça Federal do Paraná, e embora seja 18
anos mais velho que seu predecessor, teve uma carreira algo semelhante à dele.
Depois de atuar em Foz do Iguaçu, onde ocupou seu primeiro posto de juiz, Bonat trabalhou na 3ª Vara Federal de
Curitiba, e ali, ainda como juiz substituto, tomou algumas das primeiras
decisões do caso Banestado, no qual Moro também atuou. No escândalo de
gestão fraudulenta no banco estatal paranaense, praticada por funcionários
públicos, políticos e doleiros, estava envolvido Alberto Youssef, o pivô da Lava-Jato.
Durante a atuação no caso, o magistrado tornou réu o ex-governador de Sergipe João
Alves Filho, acusado de obter empréstimos fraudulentos para sua construtora
— Alves Filho apelou para o Superior
Tribunal de Justiça, em Brasília, que arquivou a ação penal. Mas a sentença de
Bonat que alcançou a maior notoriedade no mundo jurídico foi proferida na
Comarca de Criciúma, em Santa Catarina, em 2002, quando — pela primeira vez na
história da Justiça brasileira — uma empresa foi condenada por crime ambiental.
De origem italiana, filho de sapateiro, Bonat começou a trabalhar na adolescência, quando ingressou no
colégio técnico de contabilidade. Cursou a faculdade no turno da noite e
especializou-se em direito público. Em 1978, antes de se formar, prestou
concurso para técnico do Judiciário federal, e nunca mais saiu dos tribunais
federais. Definido como “discretíssimo” e “reservadíssimo”, o magistrado vive
confortavelmente, mas sem ostentação — com a possível exceção da poderosa Harley-Davidson em que circula por
Curitiba, “uma paixão antiga” segundo um familiar declarou à Veja, mediante a promessa de não ser citado
nominalmente. “Ninguém comentava o nome dele, foi uma surpresa, mas o jurisdicionado e a imprensa podem ficar tranquilos: é muito competente, sério e dedicado, e não faz nada com a intenção de aparecer”, disse a juíza federal Vera Lúcia Ponciano, da 6.ª Vara Civil de Curitiba.
Ao assumir o gabinete mais famoso da Justiça federal
brasileira, Bonat herdará 2.145
causas em andamento, entre ações penais, pedidos de prisão, de habeas corpus e
outros procedimentos judiciais. Como titular, ele terá de encarar cerca de 1,7
mil dessas pendengas, das quais cerca de 40 são oriundas da Lava-Jato — um levantamento da
força-tarefa, atualizado em 15 de fevereiro, mostrava que o balanço era de 88
acusações criminais contra 420 pessoas, sendo que em 49 delas já houve
sentenças nos crimes de corrupção, crimes contra o sistema financeiro
internacional, tráfico de drogas, formação de quadrilha e lavagem de dinheiro.
Restavam, portanto, 39 processos da Lava-Jato
para julgamento, entre os quais o que envolve a cobertura duplex vizinha ao
apartamento em que Lula morava em
SBC e o terreno comprado pela Odebrecht
para a construção nova sede do seu Instituto.
Observação: Prestes
a completar cinco anos (no próximo dia 17), a maior investigação de corrupção
da história do país ainda produz manchetes. Há pouco, sua sexagésima fase
estremeceu o ninho tucano com a prisão de Paulo
Preto, operador do PSDB. E a PF
acaba de intimar o ex-presidente Lula,
preso em Curitiba, a depor no dia 22, no inquérito baseado na polêmica delação
de seu ministro Antonio Palocci.
Em artigos científicos, Bonat
defendeu posições parecidas com as de Moro
ao falar sobre crimes de corrupção e lavagem de dinheiro. Em relação à Lava-Jato, antecipou que manterá, do
modo como tem sido desde o início da operação, a observância do que determina a
legislação quanto aos processos em andamento, manifestando-se apenas nos autos.
É considerado linha-dura, mas justo e sensato. A conferir.