Como eu disse no post anterior, o julgamento do processo
sobre o Sítio de Atibaia pelo TRF-4 chegou a ser suspenso, foi
remarcado, e depois mantido por ordem do
ministro Edson Fachin. A sessão começou na manhã da quinta-feira e se
estendeu até o final da tarde. Afinal, vivemos tempos de votos intergalácticos, e o desembargador João Pedro Gebran Neto,
relator da Lava-Jato no TRF-4, demorou horas para concluir a
leitura do seu, que tinha mais de 350 páginas. Dias Toffoli, se lhe tivessem dado corda, provavelmente ainda
estaria explicando o dele, no caso do compartilhamento de informações de
transações suspeitas ligadas a investigações criminais sem prévia
autorização judicial. Aliás, esse julgamento também teve prosseguimento na tarde de ontem, quando foram colhidos os votos faltantes e estabelecido o placar de 8 votos a 3 — ao final, o presidente da Corte e relator do processo aderiu à maioria e retificou seu
voto, mudando o placar para 9 votos a 2 a favor do compartilhamento.
Com essa decisão, deixou de valer a liminar de Toffoli que, em julho, atendendo um pedido da defesa de Flávio Bolsonaro — feito dentro de um recurso apresentado por donos de um posto de gasolina em São Paulo — suspendeu ao menos 935 investigações. Em tese, foi esse recurso que os ministros julgaram, a despeito de a defesa do senador ter pegado carona no processo alegando que, a exemplo do que ocorreu em relação aos donos do posto, o MP-RJ teve acesso às informações de seu cliente sem autorização judicial. Toffoli, no entanto, parece achar que todo mundo é idiota, pois enfatizou diversas vezes que o caso do filho do pai não estava em discussão.
Segundo Josias de
Souza, a suprema montanha pariu o óbvio ao reconhecer que os órgãos de controle foram criados para controlar, e que, quando
submetidos a indícios de crimes, têm a obrigação de compartilhar os dados com
as autoridades encarregadas de investigar e denunciar criminosos. Dizia-se que
o STF cogitava restringir o
compartilhamento para proteger o cidadão. Proteção do cidadão tornou-se um
luxuoso eufemismo para conversa fiada. O texto da Constituição prestigia a
privacidade do cidadão, mas o escudo constitucional não pode ser erguido para
proteger criminosos. Sobretudo num país como o Brasil, em que a corrupção se
tornou endêmica.
O resultado do julgamento precisa produzir pelo menos duas consequências. A primeira, inquestionável, é o reconhecimento de que Toffoli fez uma lambança ao congelar a investigação contra Flávio Bolsonaro e outros 935 inquéritos. Na semana passada, ao proferir o voto mais longo e confuso da história da Corte, seu presidente se referiu à Receita e ao Coaf como fornecedores de material para "investigações de gaveta, que servem apenas para assassinar reputações" (deveria se desculpar pela generalização). A segunda consequência, ainda pendente de verificação, é o descongelamento dos inquéritos — o que envolve Flávio Bolsonaro e todos os demais.
Toffoli chamou de "lenda urbana" a informação de que o julgamento diz respeito também ao filho do presidente da República. Não tem nada a ver, disse ele. No Supremo, nada virou sinônimo de tudo. Zero Um precisa abandonar o cinismo das firulas jurídicas. Passa da hora de o filho do presidente levar meio quilo de explicações à balança da Justiça.
Com essa decisão, deixou de valer a liminar de Toffoli que, em julho, atendendo um pedido da defesa de Flávio Bolsonaro — feito dentro de um recurso apresentado por donos de um posto de gasolina em São Paulo — suspendeu ao menos 935 investigações. Em tese, foi esse recurso que os ministros julgaram, a despeito de a defesa do senador ter pegado carona no processo alegando que, a exemplo do que ocorreu em relação aos donos do posto, o MP-RJ teve acesso às informações de seu cliente sem autorização judicial. Toffoli, no entanto, parece achar que todo mundo é idiota, pois enfatizou diversas vezes que o caso do filho do pai não estava em discussão.
Os efeitos que a queda da liminar terá no governo é coisa
que ainda iremos descobrir, já que o famigerado "Caso Queiroz" fede mais que peixe podre. Quanto à UIF (ex-Coaf), que Toffoli incluiu "de alegre" nesse julgamento, também se
formou maioria a favor do compartilhamento dos dados, mas não ficou decidido se
o Ministério Público pode encomendar
ao órgão informações de pessoas específicas para fins de investigação. Dado o
avançado da hora (devido, em grande medida, ao boquirrotismo dos eminentes ministros),
a regulamentação ficou para a sessão da próxima quarta-feira, 4.
O resultado do julgamento precisa produzir pelo menos duas consequências. A primeira, inquestionável, é o reconhecimento de que Toffoli fez uma lambança ao congelar a investigação contra Flávio Bolsonaro e outros 935 inquéritos. Na semana passada, ao proferir o voto mais longo e confuso da história da Corte, seu presidente se referiu à Receita e ao Coaf como fornecedores de material para "investigações de gaveta, que servem apenas para assassinar reputações" (deveria se desculpar pela generalização). A segunda consequência, ainda pendente de verificação, é o descongelamento dos inquéritos — o que envolve Flávio Bolsonaro e todos os demais.
Toffoli chamou de "lenda urbana" a informação de que o julgamento diz respeito também ao filho do presidente da República. Não tem nada a ver, disse ele. No Supremo, nada virou sinônimo de tudo. Zero Um precisa abandonar o cinismo das firulas jurídicas. Passa da hora de o filho do presidente levar meio quilo de explicações à balança da Justiça.
Voltando ao caso da badalhoca vermelha e seu folclórico Sítio Santa Bárbara, a decisão unânime
da 8ª Turma do TRF-4 me passou a
impressão de que, ao contrário dos ministros do STJ, os desembargadores não se curvaram à pressão de Gilmar Mendes et caterva. Para quem não se lembra, no dia 23 de abril passado, a 5ª Turma do STJ, criticada pela
Maritaca de Diamantino por "endossar
as decisões dos desembargadores do TRF-4 nos casos da Lava-Jato", reduziu
a pena do ex-presidente ladrão, antecipando sua progressão para o regime
semiaberto. Mas a subserviência foi desnecessária, pois o próprio Supremo se encarregou de rever sua
jurisprudência sobre a prisão após condenação em segunda instância, abrindo as
portas das celas de Lula, Dirceu e milhares de condenados que aguardavam
presos o julgamento de seus recursos nos tribunais superiores.
Com a decisão de ontem no TRF-4, o bocório de Garanhuns, que, além dos processos do tríplex e
do sítio, responde a outras oito ações na Justiça Federal do Paraná, São Paulo
e Distrito Federal, teve a pena aumentada pelo colegiado (de 12 anos e 10 meses
para 17 anos, 1 mês e 10 dias). Não voltará para a prisão imediatamente, devido
à estapafúrdia decisão do STF que
passou a proibir o cumprimento da pena após condenação por uma juízo colegiado,
mas basta o Supremo negar seus recursos
para que ocorra o trânsito em julgado da sentença condenatória (isso se a suprema
facção pró-crime não inventar moda, o que não é de todo impossível).
Cristiano Zanin, o engomadinho, deve embargar a decisão da 8ª Turma do TRF-4 e apelar ao STJ e STF, a exemplo do caso do tríplex, no qual impetrou mais de 100 recursos e chicanas protelatórias de todas as cores e sabores — e ainda alega que seu cliente não teve direito à ampla defesa naquele processo. Aliás, diante desse disparate, Raquel Dodge chegou mesmo a afirmar que o ex-presidente confunde “direito à ampla defesa” com “direito à defesa ilimitada, exercida independentemente de sua utilidade prática para o processo, em razão do mero ‘querer’ das partes”.
Cristiano Zanin, o engomadinho, deve embargar a decisão da 8ª Turma do TRF-4 e apelar ao STJ e STF, a exemplo do caso do tríplex, no qual impetrou mais de 100 recursos e chicanas protelatórias de todas as cores e sabores — e ainda alega que seu cliente não teve direito à ampla defesa naquele processo. Aliás, diante desse disparate, Raquel Dodge chegou mesmo a afirmar que o ex-presidente confunde “direito à ampla defesa” com “direito à defesa ilimitada, exercida independentemente de sua utilidade prática para o processo, em razão do mero ‘querer’ das partes”.
Fato é que, mesmo condenado em três instâncias no caso do
tríplex e em duas no do sítio, o fiduma de Garanhuns, continua solto,
debochando dos juízes de carreira que o apenaram, já que o STF, que articulou sua libertação, há muito que deixou de ser
composto por juristas de renome. Segundo José
Nêumanne, o que há por lá são empregadinhos que abrem portas e carregaram
pastas dos chefões das organizações criminosas da política e da gestão pública,
recompensando seus ex-superiores com a impunidade na prática. E é bem por aí.
Na visão sempre abalizada de Merval Pereira, o combate à corrupção ganhou duas batalhas judiciais na última quarta-feira.
No TRF-4, a condenação de Lula por unanimidade, com aumento da pena
e dos dias-multa determinados pela juíza substituta Gabriela Hardt, que respondeu temporariamente pela 13ª Vara Federal
do Paraná até que o juiz federal Luiz Antônio
Bonat fosse efetivado no posto. No STF,
quando se formou maioria favorável ao compartilhamento de dados
pelos órgãos de fiscalização com o Ministério Público e a Polícia federal
sem prévia autorização judicial.
Os dois casos são emblemáticos, diz Merval, porque superam obstáculos impostos no embate que se trava
há algum tempo sobre a amplitude ou limitação da Operação Lava-Jato e assemelhadas. O resultado do julgamento em Porto Alegre é mais importante, dada a
decisão unânime de não fazer o processo retornar às alegações finais da
primeira instância. Segundo os desembargadores, ainda que a decisão do STF sobre a ordem das alegações finais
deva ser respeitada, é preciso demonstrar o prejuízo causado ao não permitir
que os réus falem depois dos delatores. Ainda não foram definidos os limites dessa
decisão. O procurador-geral Augusto Aras
defende que ela não se estenda processos já encerrados, e ministra Cármen Lúcia, no seu voto, concordou
com a tese de que os réus devem apresentar as alegações finais antes dos
delatores, mas, para que haja nulidade em sentenças já proferidas, é preciso que
demonstrem que foram prejudicados. Existe a possibilidade de o Supremo limitar o alcance da decisão,
beneficiando somente réus que pediram, ainda na primeira instância, o direito
de apresentar seus memoriais por último, e que provarem que foram prejudicados
por não terem sido atendidos.
Cá entre nós e a torcida do Flamengo, querer que os juízes de primeira instância "adivinhassem"
que um belo dia o Supremo tiraria da
cartola uma aleivosia de tal calibre seria um completo absurdo, mesmo em se
tratando a facção pró-crime dos togados supremos. Isso sem mencionar que o
próprio ministro Dias Toffoli
sugeriu a seus pares que os casos deveriam ser analisados individualmente e só
haveria anulação da sentença quando e se os réus comprovassem prejuízo real ao
exercício da ampla defesa — o que não aconteceu no processo do demiurgo de
Garanhuns. O presidente do TRF-4,
desembargador Carlos Eduardo Thompson
Flores, disse em seu voto que o STF
terá de enfrentar uma questão que a Suprema Corte dos Estados Unidos já
enfrentou, decidindo há anos que uma medida que atinja processos já concluídos
só vale a partir da sua promulgação, sem retroceder, para não causar
insegurança jurídica.
Observação: A insegurança jurídica criada pelas
jurisprudências de ocasião de alguns ministros supremos é tão ou mais assustadora
que os disparates de Jair Bolsonaro &
Filhos. Felizmente, se Deus quiser o Diabo deixar, estaremos livres do
decano no ano que vem, de Marco Aurélio
Mello em 2020 e de Rosa Weber e Ricardo Lewandowski em 2023. Isso se a
PEC da bengala não for revogada ou se o imprevisível tiver voto decisivo
na assembleia dos acontecimentos; basta lembrar que Teori Zavascki, indicado por Dilma em 2012, continuaria ministro até
2023 se não tivesse morrido numa mal explicada queda de avião em janeiro de 2017.
Enfim, caso o Congresso aprove a prisão após a condenação em segunda instância, o que parece bem
encaminhado, o crápula de nove dedos voltará para a cadeia, pois os
anos de condenação dos dois processos serão somados, e ele precisaria cumprir
1/6 do total antes de progredir para o regime semiaberto, sem mencionar os demais processos, cujas prováveis condenações podem elevar sua pena a mais de 200 anos.
Na avaliação sempre ácida, mas eivada de um requintado senso de humor, do jornalista e comentarista político Josias
de Souza, o TRF-4 foi implacável
com Lula devido ao sem-número de
evidências de que o ex-presidente petralha se corrompeu. Ao pendurar no pescoço da cascavel uma segunda medalha de corrupto, o colegiado deixou no ar uma dúvida
incômoda quanto à adequação do nome do tribunal que representa a última
instância do Judiciário brasileiro: STF
ou STL? Supremo Tribunal Federal ou Supremo
Tribunal do Lula? A dúvida não é impertinente. Ao contrário, é plenamente
justificável.
Não fosse pela recente decisão do Supremo de revogar a regra que permitia a prisão de condenados na segunda instância, Lula estaria nesse momento fazendo a mala para retornar à cadeia. Graças ao Supremo, esse risco foi substituído pelo velho cenário em que os condenados com dinheiro para pagar advogados recorrem em liberdade até o infinito ou a prescrição dos crimes — o que chegar primeiro. Generoso, o pedaço do STF que compõe o STL ainda ofereceu à defesa do criminoso a possibilidade de requerer a anulação do processo. Fez isso ao determinar que réus delatados devem falar por último nos processos, depois de tomar conhecimento das alegações finais dos delatores. Os advogados pediram a anulação, mas o TRF-4 negou. Prevaleceu o entendimento segundo o qual os juízes não poderiam adivinhar que o Supremo criaria uma nova regra, que não estava prevista em nenhuma lei, para beneficiar os condenados.
Não fosse pela recente decisão do Supremo de revogar a regra que permitia a prisão de condenados na segunda instância, Lula estaria nesse momento fazendo a mala para retornar à cadeia. Graças ao Supremo, esse risco foi substituído pelo velho cenário em que os condenados com dinheiro para pagar advogados recorrem em liberdade até o infinito ou a prescrição dos crimes — o que chegar primeiro. Generoso, o pedaço do STF que compõe o STL ainda ofereceu à defesa do criminoso a possibilidade de requerer a anulação do processo. Fez isso ao determinar que réus delatados devem falar por último nos processos, depois de tomar conhecimento das alegações finais dos delatores. Os advogados pediram a anulação, mas o TRF-4 negou. Prevaleceu o entendimento segundo o qual os juízes não poderiam adivinhar que o Supremo criaria uma nova regra, que não estava prevista em nenhuma lei, para beneficiar os condenados.
Os advogados de Lula
vão recorrer. Os recursos chegarão ao STF.
Ou ao STL. Hoje, o combate à corrupção
no Brasil depende dos humores do Supremo
Tribunal do Lula.