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quarta-feira, 25 de setembro de 2019

EDIÇÃO EXTRAORDINÁRIA: JULGAMENTO IMPORTANTE NO STF



Quase ao mesmo tempo em que Lula termina de cumprir um terço da pena a que foi condenado pelo STJ no caso do tríplex, o plenário do Supremo julga hoje (acompanhe ao vivo) um caso semelhante àquele em que a 2ª turma anulou a condenação de Aldemir Bendine. A decisão, como todos se lembram, baseou-se numa tese estapafúrdia suscitada pela defesa do réu, segundo a qual suas alegações finais deveriam ter sido aparentadas antes das do delator, que também é réu no processo.

RelembrandoNo mês passado, por 3 votos a 1, a 2ª turma derrubou uma decisão de Moro que havia condenado Bendine a 11 anos de reclusão pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Foi a primeira vez que o Supremo anulou uma condenação de Moro, impondo uma das maiores derrotas da Lava-Jato até hoje, e também a primeira vez que a ministra Cármen Lúcia discordou de Fachin em julgamentos cruciais da Lava-Jato julgados na turma. Cármen se alinhou aos ministros Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski, mas ressaltou que o seu voto naquela ocasião considerou as peculiaridades do caso específico de Bendine, que foi obrigado entregar seus memoriais ao mesmo tempo que os delatores, embora houvesse solicitado prazo diferenciado. Com base na decisão que beneficiou Bendine, a defesa de Lula pediu à Corte que anule suas condenações, bem como uma ação que ainda não foi julgada na 13ª Vara Federal do Paraná, além de pedir que a alma mais honesta da galáxia seja posta em liberdade.

Agasalhar esse entendimento é absurdo, seja porque não há previsão legal que o ampare, seja porque em praticamente todas as ações criminais (originárias ou não da Lava-Jato) sempre foi dado às defesas o mesmíssimo prazo para as alegações finais, fossem os acusados delatores ou não — e jamais alguém, antes da defesa de Bendine, se insurgiu contra isso.

Se no plenário a maioria dos decisores acompanhar o entendimento da 2ª Turma, tanto os julgamentos de Lula quanto de vários outros condenados podem ser anulados e recomeçados do zero.

O TRF-4 deve julgar em breve o recurso de Lula contra a condenação no processo referente ao sítio de Atibaia, no qual juíza substituta Gabriela Hardt condenou o petralha a 12 anos e 11 meses de prisão. O desembargador João Pedro Gebran entregou seu voto no último dia 11, e o revisor Leandro Paulsen também já concluiu o seu, restando agora o presidente, Victor Luiz dos Santos Laus, marcar a data do julgamento.

Isso significa que Lula pode ser condenado novamente antes mesmo que os trâmites burocráticos para a progressão da pena sejam cumpridos, ou que seja mandado para casa e volte a cumprir a pena no regime fechado logo em seguida — a não ser que nesse meio tempo uma nova decisão do STF modifique a jurisprudência em vigor sobre o cumprimento provisório da pena após condenação em segunda instância.

Como salientou o juiz federal Marcelo Bretas, responsável pelas ações da Lava-Jato no RJ, “no processo criminal brasileiro sempre houve delatores e delatados, réus confessos que depõem contra corréus”. A interpretação inusitada da 2ª Turma, que equipara delatores a auxiliares da acusação, não encontra respaldo na nossa legislação penal. Tanto é assim que o TRF-4 e o STJ referendaram a decisão do então juiz Sérgio Moro, debalde os esperneio da defesa.

Por se tratar de um entendimento sui generis e sem precedentes, o ministro Edson Fachin, relator da Lava-Jato no Supremo, decidiu submeter ao plenário o HC do ex-gerente da Petrobras Marcio de Almeida Ferreira, cuja defesa argumenta que o réu sofreu grave constrangimento por não poder apresentar as alegações finais após a manifestação dos réus colaboradores.

A depender vontade do ministro Dias Toffoli, atual mestre de cerimônias do circo supremo, o imbróglio em questão ficaria ad kalendas græcas  (as calendas eram o primeiro dia do mês romano, quando as pessoas habitualmente realizavam seus pagamentos, e como elas não existiam no calendário grego, referir-se às "calendas gregas" é o mesmo que dizer "no dia de São Nunca").

Comenta-se que os ministros buscam uma forma de delimitar os efeitos da decisão que beneficiou o ex-presidente da Petrobras, sendo uma delas anular apenas sentenças em que o condenado pediu mais prazo e teve a solicitação negada pelo juiz, como ocorreu no caso específico de Bendine, evitando que centenas de investigados, réus e condenados se livrem da cadeia.

Segundo o jornal GGN, a maioria dos ministros tende a manter a regra adotada no julgamento de Bendine, mas limitando-a para evitar um “efeito cascata” sobre outras sentenças da Lava-Jato. No caso de Lula, por exemplo, a decisão da corte não deverá ter impacto sobre o processo do triplex, pois o molusco abjeto já foi condenado em 3 instâncias, mas poderia beneficiá-lo no caso sítio de Atibaia, que está em grau de recurso perante o TRF-4. Como dito, o fator limitante deve ser o de exigir que o réu tenha reclamado do rito processual (a questão das alegações finais) desde a primeira instância.

A conferir.

sexta-feira, 6 de setembro de 2019

PEC DA PREVIDÊNCIA, JUDICIÁRIO, PGR, RAQUEL DODGE, LEI DE ABUSO DE AUTORIDADE, RENÚNCIA DE PROCURADORES EM BLOCO E O ORGULHO DE SER BRASILEIRO



Chamar este pobre país de "banânia" é elogiar, mas, convenhamos, seria deselegante (embora não totalmente impróprio) tratá-lo de "país de merda". Questões semânticas à parte, fato é que nossa "Pátria Amada, Brasil" perdeu em abril deste ano a 7ª posição no ranking das principais economias mundiais (que vinha mantendo desde 2005) e já nem figura mais entre as 29 nações mais ricas da lista do Business Insider. O "País do Futuro (que nunca chega)" tem os impostos, os juros, os automóveis, os pedágios, o combustível e a energia elétrica mais caros do mundo.

Como se não bastasse, o "Gigante Adormecido" (deitado eternamente em berço esplêndido) tem os políticos mais corruptos do mundo e é presidido atualmente pelo chefe de governo mais irracional do mundo, que acontece de ser também o mais impopular entre todos os que ocuparam esse cargo desde a redemocratização do "País do Futebol". E com a recente alta do dólar, nosso povo sofrido já nem pode mais ir à Disney conhecer o Pateta. Felizmente, basta ir a Brasília ou entrar nas redes sociais para ver vários.

A coisa fica ainda pior quando se foca a Justiça nesta terra de ninguém. Além de cega, essa senhora é surda e, não raro, corrupta: sobram "causos" de venda de sentenças envolvendo não só juízes de primeira instância, mas desembargadores e ministros das Cortes superiores. Claro que daí até suas meritíssimas excelências serem processadas, jugadas, condenadas e encarceradas vai uma longa distância.

Observação: Entre uma miríade de exemplos notórios, relembro o caso do desembargador Ivan Athié, presidente da 1ª Turma do TRF-2, que em março passado mandou soltar o Vampiro do Jaburu e seu comparsa, coronel Lima (para detalhes da vida pregressa do "Limão", como o policial militar reformado gosta de ser tratado, clique aqui). Athié  ficou afastado do cargo durante sete anos, devido a uma ação no STJ por estelionato e formação de quadrilha (em 2004). Um inquérito contra ele, com as mesmas acusações, foi arquivado em 2008 pelo STJ a pedido do MPF, que alegou não ter encontrado provas de que o desembargador tivesse proferido sentenças em conluio com advogados. O magistrado retornou às atividades em 2011, depois que o STF trancou a ação contra ele.

Falando em patacoadas, a usina de crises de plantão no Planalto criou mais um "mal estar internacional" ao criticar a ex-presidente do Chile e atual comissária da ONU para direitos humanos, Michelle Bachelet. Em pronunciamento sobre o governo brasileiro, Bachelet afirmou que observou "uma redução do espaço cívico e democrático, caracterizado por ataques contra defensores dos direitos humanos, restrições ao trabalho da sociedade civil e ataques a instituições de ensino”, e que, "desde 2002, o Brasil é um dos cinco países do mundo com o maior número de assassinatos de ativistas de direitos humanos".

Fiel ao seu estilo "bateu, levou", Bolsonaro devolveu: “Ela está acusando que não estou punindo policiais que estão matando muita gente no Brasil. Essa é a acusação dela. Ela está defendendo direitos humanos de vagabundos. Ela critica dizendo que o Brasil está perdendo seu espaço democrático. Senhora Michelle Bachelet, se não fosse o pessoal do Pinochet derrotar a esquerda em 73, entre eles seu pai, hoje o Chile seria uma Cuba. Eu acho que não preciso falar mais nada para ela”.

Cá entre nós, eu acho que a repercussão midiática — como de praxe — foi muito além do comentário do capitão, talvez pelo fato de ele ter citado nominalmente o pai de Michelle, general Alberto Bachelet, que foi torturado e morto durante a ditadura de Augusto Pinochet. Mas remexer nos escaninhos da história chilena não é bem a minha praia, e não convém ao sapateiro ir além das chinelas.

Voltando ao cenário jurídico-político tupiniquim, os ex-governadores do Rio, Anthony Garotinho e Rosinha Mateus, presos dias atrás com outros três suspeitos de participar de um esquema de superfaturamentos em contratos celebrados entre a Prefeitura de Campos dos Goytacazes (município fluminense do qual ambos foram prefeitos) e a construtora Odebrecht, foram soltos depois de passarem uma única noite na cadeia, graças à pronta intervenção do desembargador Siro Darlan, que lhes concedeu o habeas corpus durante o plantão judiciário na 7ª Câmara Criminal do TJ-RJ.

Além de ter carreira marcada por decisões controversas e de grande repercussão, Darlan é alvo de inquérito no STJ, que apura a venda de sentenças no fórum da capital. Antes de ser nomeado desembargador, em 2004, ele comandou, por mais de uma década, a 1ª Vara da Infância e da Juventude do Rio. Muitas de suas decisões geraram polêmicas. Como desembargador, em 2013, concedeu habeas corpus a sete dos nove envolvidos na invasão ao Hotel Intercontinental, em São Conrado, em 2010, quando o bando, armado com fuzis, pistolas e granadas, manteve 35 reféns, entre funcionários e hóspedes, por três horas. Na ocasião, uma pessoa morreu e seis ficaram feridas. Entre os beneficiados estava Rogério 157, que assumiu o comando do tráfico na Rocinha após a prisão do traficante Nem.

Em dezembro do ano passado, O GLOBO publicou que Darlan é suspeito de soltar presos durante plantões judiciais em troca de propina. Em dois casos investigados, detentos teriam sido beneficiados por decisões do desembargador. Num deles, foi anexada a colaboração premiada de um dos envolvidos, que afirmou ter ouvido de um dos presos sobre o pagamento a um intermediário do magistrado: R$ 50 mil para ser solto. Inicialmente, segundo o delator, o lance foi de R$ 120 mil, mas caiu para menos da metade dividido em duas parcelas.

Passando às boas notícias — se é que ainda as temos neste país: A CCJ do Senado não só aprovou, por 18 votos contra 7, relatório do senador Tasso Jereissati sobre a PEC da Previdência, como rejeitou os oito destaques apresentados para alterar o parecer do relator. A PEC paralela também foi aprovada em votação simbólica e por unanimidade. O texto principal segue para o plenário do Senado e, se aprovado, será promulgado. O ganho fiscal chegará na R$ 962 bilhões, mais R$ 350 bilhões se a PEC paralela for aprovada na Câmara e os estados e municípios aderirem à proposta que altera as regras da aposentadoria.

Bolsonaro anunciou ontem que deve acolher integralmente as sugestões de vetos do ministro da Justiça ao texto da Lei de Abuso de Autoridade, aprovada a toque de caixa, dias atrás, pelo Congresso. Segundo o portal G1, o capitão efetivamente votou 36 trechos de 19 artigos. Apesar dos esforços de Verdevaldo da Couves, da imprensa marrom (ou seria vermelha?), dos corruptos que pululam no Congresso e da banda podre da alta cúpula do Judiciário, Sérgio Moro continua muito popular, com 25 pontos de aprovação acima do presidente.

Por outro lado, segue envolta em brumas a nomeação do próximo Procurador-Geral da República (o mandato da atual termina no próximo dia 17). Há uma pressão política dos presidentes da Câmara e do Senado para que Raquel Dodge seja reconduzida ao cargo, o que desagradou membros da força-tarefa da Lava-Jato que atuam no DF, onde as coisas andam muuuuuuito mais devagar do que em Curitiba — até hoje, nenhum político com foro privilegiado foi mandado para a cadeia pelos 11 togados supremos, sem mencionar que a delação de Leo Pinheiro, da OAS, está parada há mais de um ano e outros processos e delações estão embolorando nos escaninhos da PGR.

Atualização: no finalzinho da tarde de ontem, o Augusto Aras foi escolhido pelo presidente para suceder a Raquel Dodge no comando da PGR. O subprocurador baiano tem 60 anos de idade e foi apadrinhado pelo ex-deputado federal Alberto Fraga, que é um dos políticos mais próximos de Bolsonaro. Aras era bem contado, mas caiu na bolsa de apostas depois que a imprensa divulgou que ele já defendeu o MST (em discurso na Câmara, em 2008) e promoveu jantares para petistas. Pelo mesmo motivo, enfrentou resistências no PSL, mas procurou parlamentares da legenda que têm proximidade com o capitão para tentar reverter o quadro. Funcionou. Sua indicação ainda precisa ser chancelada pelo Senado, mas o que importa mesmo é saber se foi uma boa escolha, considerando que a Lava-Jato e o combate à corrupção dependem diretamente da PGR  que o o próprio Bolsonaro comparou recentemente à Rainha no jogo de Xadrez

Na última quarta-feira, os procuradores Raquel Branquinho, Maria Clara Noleto, Luana Vargas, Hebert Mesquita, Victor Riccely e Alessandro Oliveira, integrantes da força-tarefa da Lava-Jato em Brasília, pediram demissão em bloco, alegando divergências de posicionamento com Raquel Dodge. Em nota, o grupo afirmou que o desligamento se deve a uma “grave incompatibilidade de entendimento dos membros da equipe” com a manifestação enviada pela PGR ao STF no dia anterior, quando Dodge pediu arquivamento preliminar de trechos do acordo de colaboração de Léo Pinheiro em que foram citados Rodrigo Maia e Ticiano Dias Toffoli, irmão ministro supremo Dias Toffoli.

Ao que parece, depois que a 2ª Turma do Supremo, decisão de anular a sentença do então juiz Sérgio Moro no caso do ex-presidente petista do BC e da Petrobrás, Aldemir Bendine, e devolver os autos à primeira instância, a Lava-Jato resolveu partir para a guerra. Para entender melhor esse imbróglio, convém ouvir que entende do assunto:

sexta-feira, 30 de agosto de 2019

SER BRASILEIRO — COMO PASSAR DA VERGONHA À REPULSA NAS ASAS DE UMA SIMPLES DECISÃO DO STF



José Nêumanne frisou em sua coluna que o ministro-deus Gilmar Mendes tem participado ativamente — se não como protagonista, no mínimo como cúmplice — de todas as decisões do STF pelas quais os cidadãos de bem deste país sentem repulsa. E na última terça-feira não foi diferente.

Regida pela batuta de Cármen Lúcia — nomeada por Lula e que tem peninha do “bom velhinho que já sofreu demais na cadeia", —, a 2ª Turma reeditou seus recentes tempos de predomínio do trio “Deixa que eu solto” — com Gilmar, Lewandowski e o retirado Toffoli, que em setembro passado trocou assumiu a presidência da Corte. Aproveitando-se da ausência do decano da Corte, que convalesce de uma pneumonia, o terceto notável, ora integrado também pela presidente da Turma, derrotou o relator Fachin e passou por cima de qualquer previsão legal para cancelar a condenação do corrupto Bendine.

Em assim decidindo, o trio assombro legislou — já que nada existe na lei brasileira que determine que o réu seja o último a se defender quando há delatores entre os outros condenados. Como salientou o ex-ministro supremo Carlos Velloso, a Lei de Organizações Criminosas não exige períodos distintos para as alegações finais de delatores e delatados: “Nem o Código Penal, nem a lei da colaboração premiada fazem esta distinção que o Supremo adotou. Penso que não é possível o tribunal, invocando o direito de defesa, ampliar norma processual”.
  
Em seu voto, Gilmar Mendes, o inigualável, aproveitou o embalo para destilar seu veneno contra Sérgio Moro, Dallagnol e a Lava-Jato (da qual ele era admirador confesso enquanto seus alvos não fossem os tucanos). Se esta republiqueta de bananas fosse uma democracia que desse ao respeito, exigir-se-ia que Mendes se afastasse do julgamento por suspeição. Mas num país falido, onde o presidente da república impõem condições para aceitar a esmola oferecida pelo G7 para ajudar a combater os incêndios na Amazônia, não se poderia esperar coisa muito diferente. 

Observação: Em 2016, quando o plenário manteve a condenação de soldados ouvidos antes da acusação num processo penal militar, Gilmar disse que anular a sentença produziria “um quadro de instabilidade”. Na época, a maioria dos ministros decidiu que, dali em diante, os militares também deveriam depor por último no processo, assim como ocorre com os civis, embora o Código de Processo Penal Militar determinasse a oitiva no início. Assim, processos já julgados não seriam afetados. Ao votar pela manutenção dessas condenações, disse Gilmar: “Garantias que são importantíssimas, como a garantia do contraditório e da ampla defesa, do devido processo legal, é claro, têm um forte caráter institucional. Significa dizer: a toda hora, elas são passíveis de aprimoramento. E isso acontece. Agora, não significa que aquilo que foi praticado no passado era ilegítimo, ilegal”. Desta vez, porém, a excelência das excelências votou de forma diferente, não ao garantir que o réu se defendesse após seus delatores, mas ao anular uma condenação já estabelecida.

Analistas e palpiteiros de plantão dizem que o processo do sítio de Atibaia, que resultou na segunda condenação de Lula, é igual ao de Bendine. Não é. A defesa do ex-presidente do Banco do Brasil e da Petrobras questionou a decisão do então juiz Moro sobre os prazos das alegações finais quando o processo ainda estava na primeira instância — antes, portanto, de a sentença ser proferida. 

No caso do molusco abjeto, Zanin, o fabuloso, não tomou esse cuidado, dando a entender que, ao menos nesse ponto específico, a defesa não se sentia prejudicada, e agora quer que o mesmo entendimento seja aplicado no processo envolvendo o terreno do Instituto Lula e a cobertura vizinha à do petralha em SBC, que está prestes a ser julgado pelo juiz Luís Antonio Bonat.

A PGR está tentando conter os danos. Uma alternativa, segundo a Folha, é requerer aos ministros que um processo só possa ser revisto se a defesa do réu pediu, ainda na primeira instância, para se manifestar por último, e seu pedido foi negado. Foi isso que ocorreu com Bendine. Outra possibilidade seria tentar restringir as anulações a casos em que o delator efetivamente apresentou em suas alegações finais alguma prova ou acusação nova, não tratada nas fases anteriores da tramitação da ação penal e, portanto, não conhecida formalmente pelos demais acusados.

O fato é que os advogados de Lula e de outros condenados na Lava-Jato exultaram com a decisão da 2ª Turma. Choverão pedidos de isonomia valendo-se da anulação da sentença de Bendine como paradigma. É a velha política tomando o seu espaço de volta, com o empenho de Rodrigo Maia, Gilmar Mendes, Lula e até Jair Bolsonaro — que, para sair desta lista, precisa vetar integralmente a lei de abuso de autoridade.

Conforme eu publiquei dias atrás, o STF é visto hoje mais como um agente político do que como uma corte constitucional. É compreensível, portanto, que se multipliquem pedidos de impeachment contra seus membros. Lamentavelmente, todos foram barrados pelos presidentes do Senado da vez — emboloram nos escaninhos da Casa nada menos que 34 petições, sendo 11 contra Mendes, 10 contra Toffoli e, dos outros 9 ministros. A única que escapa até agora é Cármen Lúcia, mas, a julgar pelo modo como a ministra atuou na última terça-feira, isso pode mudar em breve.

Observação: Dizer que o STF combate a corrupção é piada. Enquanto Moro condenou cerca de 159 corruptos a mais de 2200 anos e colocou na cadeia o picareta dos Picaretas, o juiz Marcelo Bretas sentenciou o ex-governador do Rio, Sérgio Cabral, a mais de 200 anos de prisão, os togados supremos condenaram um único político lalau (o ex-deputado Nelson Meurer, que ainda nem foi preso). Se não falta letargia aos ministros, sobra-lhes cara de pau. Falar em excessos da Lava-Jato, quando quem cometeu excessos foi a quadrilha de Lula e companhia, que saqueou o país, é muita hipocrisia, muito cinismo, muita desfaçatez!

O individualismo absoluto que norteia as decisões do Supremo — onde cada decisor age como se fosse dono da verdade e de seu próprio tribunal — produz o único caso mundialmente conhecido de uma democracia constituída por 13 poderes: o Executivo, o Legislativo e os 11 semideuses togados. E o clima entre os togados não é dos melhores. Não bastassem os bate-bocas entre Gilmar Mendes e Luís Roberto Barrosonum deles, Barroso acusou o colega de ser “uma pessoa horrível, uma mistura do mal com atraso e pitadas de psicopatia” —, Fux e Toffoli quase não se falam.

O presidente da Corte é do grupo "garantista", que dissemina alegremente a impunidade a pretexto de resguardar o direito dos réus, ao passo que o vice defende a prisão antecipada dos condenados em nome do combate à impunidade. Segundo matéria publicada na revista Época (cuja leitura eu recomendo), o grupo de Fux é chamado pejorativamente pelo outro time de "iluministas".

A relação entre Fux e Toffoli está a tal ponto estremecida que ex-militante petista e ora presidente da Corte não quis dividir o plantão do recesso de julho com o vice, como sói acontecer a cada seis meses, preferindo ficar responsável por todas as decisões urgentes do período, inclusive aquela que, a pretexto de proteger Flávio Bolsonaro, o magistrado enterrou o Coaf.

Como disse Rui Barbosa certa vez, cabe ao Supremo errar por último. Mas os três votos que inovaram a interpretação da lei para anular pela primeira vez um julgamento da Lava-Jato — usando uma criatividade que até o momento era atribuída apenas ao “direito de Curitiba”, na expressão jocosa de (sempre ele) Gilmar Mendes — não representam a opinião de todos os magistrados, e em algum momento o caso deverá ser enfrentado pelo plenário. 

Diante da má repercussão do julgamento, a 2ª Turma pode explicitar no acórdão que os efeitos da decisão só se produzem nos processos posteriores, ou seja, não se estendendo a casos anteriores em que a defesa não alegou cerceamento em recurso ainda na primeira instância.

De acordo com Merval Pereira, a anulação da condenação de Bendine com base nessa "nova interpretação" só deveria ser possível em situações em que os advogados dos réus pediram para falar depois dos delatores antes de ser proferida a sentença e tiveram seus recursos negados pelo juiz de primeira instância, pelo TRF-4 e pelo STJ. A defesa de Lula não tomou esse cuidado nos dois julgamentos em que o petista foi condenado, e, portanto, não poderia ser beneficiada pela jabuticaba suprema.

Dada a controvérsia que a decisão da última terça-feira causou, era previsível que o ministro Fachin, relator da Lava-Jato no STF, encaminhasse ao plenário o recurso da PGR. Será a única maneira de esclarecer se essa criatividade jurídica conta com o respaldo da maioria dos ministros da Corte. Se fosse a 2ª Turma a julgar recurso, o resultado dificilmente seria diferente, a menos que Cármen Lúcia, que surpreendeu a todos com seu voto bizarro, defendesse a tese de que a decisão tomada na última terça-feira se restringe ao caso de Bendine. Mas Mendes e Lewandowski dificilmente mudariam seu entendimento, e uma vez que o decano está licenciado, o placar de 2 a 2 ainda beneficiaria o réu.

Observação: Fachin determinou também — sabiamente, na minha avaliação — que a 13º Vara Federal de Curitiba refizesse os passos finais da instrução processual na ação que Lula responde sobre o terreno e apartamento em SBC, evitando que a sentença seja futuramente contestada e anulada mais adiante, se esse merdeira não for revertida o quanto antes pelo plenário do Supremo. Em abono à minha tese, transcrevo trecho do despacho do ministro: “Enfatizo, ademais, que não se trata de constatação de mácula à marcha processual. Nada obstante, considerando o atual andamento do feito, em que ainda não se proferiu sentença, essa providência revela-se conveniente para o fim de, a um só tempo, adotar prospectivamente a compreensão atual da Corte acerca da matéria, prevenindo eventuais irregularidades processuais, até que sobrevenha pronunciamento do Plenário”.

A Lava-Jato vem incomodando poderosos desde 2014, e por isso é bombardeada por todos os lados. De início, os petardos vinham do Legislativo, onde boa parte dos parlamentares é composta de investigados, denunciados ou réus. De uns tempos a esta parte, porém, tanto a banda contaminada do Judiciário quanto o próprio Executivo vêm colaborando para emparedar a força-tarefa, que amargou sua primeira grande derrota no Supremo

Outros reveses — como o fim da condução coercitiva e a contenção da prisão preventiva — foram superados na prática do dia a dia, mas agora, depois que a Vaza-Jato do Intercept de Verdevaldo das Couves revelou detalhes pessoais dos investigadores — que, mesmo não comprovados e obtidos de maneira criminosa, fomentaram uma rejeição que já vinha latente em alguns togados e era verbalizada sem firulas por Gilmar Mendes.

Ainda que não revelem nenhuma irregularidade jurídica nas decisões tomadas, as mensagens vazadas expõem os intestinos da força-tarefa, suscitando questões morais que não deveriam interferir no julgamento, mas interferem. E há quem atribua esse incômodo à inusitada mudança de procedimento da ministra Cármen Lúcia.

quinta-feira, 29 de agosto de 2019

AINDA SOBRE A ESTAPAFÚRDIA ANULAÇÃO DA CONDENAÇÃO DE ALDEMIR BENDINE



A postagem de hoje foca a decisão estapafúrdia (mais uma) do STF, que na última terça-feira anulou o julgamento do ex-presidente do BB e da Petrobrás Aldemir Bendine, abrindo espaço para uma enxurrada de pedidos análogos, inclusive por parte da defesa de certo ex-presidente petralha — cuja soltura, de alguma maneira, qualquer que seja ela, parece ter se tornado prioridade zero para alguns membros da nossa mais alta Corte de Justiça. Como eu tive outros assuntos para tratar no dia de ontem, faltou-me tempo para estudar melhor o tema em tela e tecer considerações mais circunstanciadas (tenciono preencher as lacunas no post de amanhã, caso não aconteça nenhuma outra catástrofe). Dito isso, vamos em frente.

Quando era juiz de primeira instância, Moro condenou Bendine e vários outros réus usando o mesmo critério que ora foi contestado pela 2ª turma dos supremos togados (vencido o voto do relator, ministro Luís Edson Fachin, e ausente o decano Celso de Mello, que está se recuperando de uma pneumonia). Note que tanto o TRF-4 quanto o STJ já haviam referendado a decisão emanada da 13ª VF do Paraná, a despeito de a defesa sustentar que o réu deveria ter tido o direito de apresentar suas “alegações finais” depois dos delatores, réus como ele, pois estes teriam se transformado em “assistentes de acusação”, e a lei garante que a defesa tenha a palavra final, depois da acusação. 

Observação: Isso é balela: os réus continuam sendo réus, apenas obtêm determinadas vantagens (como uma pena mais branda) por terem colaborado com a Justiça. Demais disso, só agora, depois que a Lava-Jato estar ativa e operante por mais de 5 anos, e de ter produzido os resultados que produziu graças, em boa medida, às delações premiadas, é que o Supremo resolve, do nada, entender que as regras do jogo precisam ser mudadas? Para mim, isso fede a oportunismo barato.  

Moro rejeitou a tese da defesa por absoluta "falta de previsão legal, forma ou figura em Juízo”. Segundo ele, “a lei estabelece prazo comum para a apresentação de alegações finais, ainda que as defesas não sejam convergentes, e não cabe à Justiça estabelecer hierarquia entre acusados, todos com igual proteção da lei”. 

Aliás, todos os julgamentos de processos da Lava-Jato presididos por ele enquanto juiz da 13ª Vara Federal do Paraná certamente seguiram o mesmo critério, segundo o qual “o acusado colaborador não se despe de sua condição de acusado no processo, apenas opta, com legitimidade, por defender-se com a pretensão de colaborar com a Justiça". Acolher o requerimento da defesa de Aldemir Bendine seria o equivalente a estabelecer uma hierarquia entre os acusados, distinguindo-os entre colaboradores e não colaboradores, com a concessão de privilégios aos últimos por não terem colaborado. 

É no mínimo um absurdo anular uma sentença com base em filigrana processual sem base legal. A decisão da turma causou espécie, tanto porque não há na lei exigência que a sustente — uma vez que o instituto da delação premiada ainda é novo na nossa legislação penal —, quanto pelo fato de a ministra Cármen Lúcia não ter seguido o voto do relator, e, sim, se alinhado com Mendes e Lewandowski

Observação: Para que um processo seja anulado, o CPP exige demonstração cabal de prejuízo para a defesa do réu, e os doutos decisores da 2ª Turma, com exceção do relator e do enfermo, entenderam que o fato de dar o mesmo prazo para todos os réus, quando alguns eram delatores, feriu os direitos de Bendine.

Na avaliação dos procuradores da Lava-Jato, essa lamentável decisão abre brecha para outros casos, devendo, pois, ser questionada o quanto antes e pacificada pelo plenário da Corte. A PGR está providenciando um pedido nesse sentido, visando ao menos tentar minimizar um possível efeito cascata em outros julgamentos de réus sentenciados por corrupção e demais crimes.

A defesa de Lula entrou nesta quarta-feira com mais um pedido de habeas corpus STF para anular a sentença a 12 anos e 11 meses de prisão, imposta pela juíza Gabriela Hardt no processo do sítio de Atibaia e a condenação imposta por Moro, a 9 anos e 6 meses no caso do triplex (que depois viria a ser reduzida pelo STJ a 8 anos e 10 meses). Se você tem estômago forte, leia a entrevista que esse dejeto de camiranga concedeu à BBC um dia depois que a 2ª turma dos urubus proferiu sua esdrúxula decisão.

Raquel Dodge solicitou que o grupo de trabalho da Lava-Jato no STF discuta as alternativas jurídicas para um eventual recurso. A atual coordenadora das investigações penais na PGR, Raquel Branquinho, ficou de reunir o grupo para estudar o assunto. Uma das estratégias é levantar precedentes de outros julgamentos do STF para ver como os ministros se posicionaram contra esse mesmo argumento utilizado pela defesa de Bendine.

Dodge precisa esperar a 2ª Turma disponibilizar o acórdão do julgamento, para só então contestar os argumentos. A estratégia em análise seria ingressar com embargos de declaração — instrumento jurídico que não tem o condão de reverter o resultado do julgamento, mas é usado para elucidar pontos obscuros ou controversos da decisão. Assim, a PGR poderia tentar delimitar o alcance da decisão e evitar que ela atinja os demais processos da Lava-Jato (as defesas de Dirceu e Vaccari avaliam pedir anulação das condenações de seus clientes essa decisão absurda).  

quarta-feira, 28 de agosto de 2019

STF, BENDINE, LULA, RODRIGO MAIA E A DELAÇÃO DA ODEBRECHT


A 2ª Turma do STF anulou por 3 votos a 1 a sentença (proferida pelo então juiz Sérgio Moro) que havia condenado o ex-presidente do BB e da Petrobrás Aldemir Bendine a 11 anos de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. O voto vencido foi do relator, ministro Luís Edson Fachin, e o que não houve, do decano Celso de Mello (que não participou do julgamento devido a uma pneumonia).

A tese dos advogados do réu, de que entregar seus memoriais ao mesmo tempo em que delatores da Odebrecht apresentaram suas acusações caracteriza cerceamento de defesa, foi agasalhada por Mendes, Lewandowski e Cármen Lúcia. Com isso, os autos deverão baixar à primeira instância para que a etapa final da instrução processual seja refeita e a 13ª Vara Federal do Paraná (agora sob a pena do juiz Luís Antonio Bonat) profira nova sentença — da qual as partes podem recorrer, e assim por diante.

Vale lembrar que o recurso de Bendine já havia sido julgado pelo TRF-4, a pena de 11 anos, reduzida para 7 anos e 9 meses, mas a condenação, mantida, e, portanto, poderia ser executada em breve com base na decisão do STF que autoriza a prisão após o fim dos recursos em segunda instância.

O entendimento dos 3 togados supremos retrocitados foi de que, mesmo não estando previsto em lei, o interrogatório e a apresentação de alegações finais do investigado delatado deveriam ter sido feitos ao final do processo, após os delatores da Odebrecht terem entregado suas manifestações, sob pena de infringir o princípio constitucional da ampla defesa. Nem seria preciso dizer que essa decisão abre um precedente perigoso, pois os chicaneiros estrelados que defendem a corja de rapinadores do erário certamente pleitearão o mesmo que a defesa de Bendine. No entanto, caso a 1ª Turma decida de maneira diferente, a divergência terá de ser pacificada pelo plenário da Corte. A ver o que resultará de mais essa "hermenêutica suprema".

Last but not least: o julgamento de uma reclamação da defesa do presidiário mais famoso da galáxia, envolvendo o processo que trata do terreno do Instituto Lula e da cobertura vizinha à do petralha em SBC, também estava na pauta de ontem, mas os ministros deram prioridade a outras ações — até porque o decano Celso de Mello, que seria o fiel da balança, está licenciado (Fachin e Cármen já votaram contra o pleito da defesa e Mendes e Lewandowski certamente votarão a favor). Caberá à presidente da turma definir outra data para o julgamento (também está pendente a análise de outros recursos do morfético de Garanhuns, um dos quais questiona a imparcialidade de Sergio Moro no caso do tríplex do Guarujá, mas isso já é outra conversa).

Mudando de pato para ganso:

Andamos bem de presidentes neste arremedo de banânia. No Executivo, temos um parlapatão que fala mais que deve sobre o que não deve rejeita a oferta do G7, que se prontificou a dar 20 milhões de euros para ajudar a combater as queimadas na Amazônia, como estivesse brotando dinheiro a mancheias do erário tupiniquim. E não fica nisso, naturalmente, mas é escusado descer a detalhes, já que as últimas postagens foram todas dedicadas a esse tema.

No Legislativo, o presidente do Senado e do Congresso é David Alcolumbre, que derrotou o Golias das Alagoas, Renan Calheiros, com 42 votos dos 81 senadores (curiosamente, ao final do escrutínio havia 82 votos na urna).

Relembrando: em 2016, o ministro Marco Aurélio apeou liminarmente  o então presidente do Senado, o que, por absurdo, paralisou os trabalhos na Câmara Alta do Congresso Nacional. Era como se nada ali funcionasse sem a presença do senador alagoano réu no STF por crime de peculato e investigado em pelo menos mais 11 processos, oito dos quais no âmbito da Lava-Jato , que, para piorar, apoiado pela mesa diretora da Casa, resolveu simplesmente não acatar a decisão do Judiciário, como se sua deposição fosse uma opção, e não uma determinação da um ministro da nossa mais alta Corte de Justiça.

O Cangaceiro das Alagoas foi sucedido por Eunício de Oliveira, outro prócer da oligarquia política nordestina que é dono de uma capivara respeitável, e que foi chutado pelos eleitores quando tentou renovar seu mandato de senador no ano passado.  

Voltando a Alcolumbre, o senador amapaense é investigado em dois inquéritos no STF por supostas irregularidades relacionadas à campanha de 2014 e já foi alvo de outras investigações, como as da Operação Pororoca (que trata de superfaturamento de obras no Amapá), e as da Operação Miquéias (sobre fraudes na Previdência de prefeituras). Que em 2009, como deputado, conseguiu aprovar um projeto de lei para homenagear seu tio Alberto Alcolumbre, acrescentando o nome do parente ao título do Aeroporto de Macapá.

Em 2013, ainda como deputado, Alcolumbre usou verba de gabinete para abastecer seus carros no posto de gasolina Salomão Alcolumbre e Cia. Ltda., que também pertence a um parente seu. Que, em recente entrevista à revista Veja, disse que não vai levar adiante a CPI da Lava-Toga nem dar andamento aos pedidos de impeachment de ministros do STF — emboloram nos escaninhos do Senado nada menos que 34 petições, sendo 11 contra o semideus togado Gilmar Mendes e 10 contra o atual presidente da Corte, Dias Toffoli; dos outros 9 togados supremos, a única que escapa é a ministra Cármen Lúcia.

Observação: Vale lembrar que Toffoli levou bomba (não uma, mas duas vezes seguidas) em concursos para a magistratura — ou seja, um sujeito não pode ser juiz nem na comarca de Arroio dos Ratos preside o mais alto tribunal de Justiça deste país.

No Judiciário, para além do que eu mencionei parágrafos atrás, preside o STF um petista que não despiu o uniforme de militante quando vestiu a toga de ministro, cujo currículo se limita a uma interminável fieira de relevantes serviços prestados ao PT: Toffoli foi advogado do Sindicato dos Metalúrgicos de SBC, consultor jurídico da CUT e assessor jurídico do PT e de José Dirceu. Atuou como advogado nas campanhas de Lula em 1998, 2002 e 2006 e como subchefe para assuntos jurídicos da Casa Civil da presidência da República. Em 2007, foi promovido ao cargo de Advogado Geral da União, que exerceu até 2009, quando, mais uma vez graças a Lula, preencheu a vaga aberta com a morte do ministro do STF Menezes Direito.

Sua indicação foi (mais) uma demonstração cabal da falta de noção do picareta dos picaretas sobre a dimensão do cargo de ministro. Sem currículo, sem conhecimento, sem luz própria, Toffoli foi buscar apoio em Gilmar Mendes, que é quem melhor encarna a figura do velho coronel político. Já consolidado no novo habitat, passou a emular os piores hábitos do novo padrinho a arrogância incontida, a grosseria, a falta de limites, o uso da autoridade da forma mais arbitrária possível. Em 2005, quando Roberto Jefferson denunciou o MensalãoToffoli trabalhava na Casa Civil e respondia diretamente a José Dirceu, apontado como chefe do esquema o que inacreditavelmente não o impediu de, anos mais tarde, participar do julgamento da ação penal 470, nem de votar pela absolvição de Dirceu.

Em 2015, pouco depois da divulgação da primeira “lista de Janot”, Toffoli pediu transferência para a segunda turma, que ficaria responsável pelos processos da Lava-Jato. Foi ele quem sugeriu que casos não relacionados diretamente à Petrobras fossem tirados do juiz federal Sergio Morolivrando por tabela o rabo da senadora Gleisi Hoffmann. Também foi ele o autor do pedido de vista que interrompeu a votação da limitação do foro privilegiado de políticos quando já se havia formado maioria a favor. A Lava-Jato chegou a bafejar seu cangote quando Léo Pinheiro mencionou, em sua proposta de delação, que a OAS havia executado reformas em sua casa. Mas a informação vazou, Janot (notório admirador do lulopetismo) rodou a baiana e o acordo nunca chegou a ser firmado. Aliás, a Lava-Jato também descobriu que um consórcio suspeito de firmar contratos viciados com a Petrobras chegou a repassar R$ 300 mil ao escritório de advocacia de Roberta Gurgel, esposa de Toffoli — o próprio Toffoli foi sócio do escritório até 2007, mas deixou a sociedade antes de os pagamentos começarem.

Quanto à Câmara Federal, também é escusado relembrar as virtudes de Eduardo Cunha. Basta dizer que o ex-todo-poderoso presidente da Casa está preso desde 2016 — em maio passado, ele foi transferido do Complexo Médico-Penal de Pinhais, na região metropolitana de Curitiba, para o presídio de Bangu 8, no Rio de Janeiro, para que cumprisse mais próximo da família a pena de 14 anos e seis meses de prisão a que foi condenado na Lava-Jato. Quem lhe sucedeu no comando da lojinha foi Rodrigo Maia, vulgo Bolinha — ou Botafogo, que é como ele era identificado nas planilhas do departamento de propinas da Odebrecht. Em relatório conclusivo, a PF lhe atribuiu os crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e caixa dois (e três) a partir de investigações que envolvem delação da empreiteira no âmbito da Lava-Jato (Maia teria recebido R$ 350 mil nas eleições de 2010 e 2014). No último dia 23, o ministro Fachin deu prazo de 15 dias para a PGR oferecer denúncia ou solicitar o aprofundamento das investigações.
 
Segundo Fausto Macedo publicou em sua coluna no Estadão, Maia é a peça-chave no jogo político que envolve na Câmara projetos de grande impacto e interesse do governo e do ministro Sérgio Moro, como o pacote anticrime e a Lei do Abuso de Autoridade, que provoca desconforto entre promotores, juízes e delegados. A conclusão da PF que coloca Maia contra a parede ocorre em meio ao clima nervoso que paira entre delegados da corporação e o presidente da República (para ler a coluna na íntegra, clique aqui).

Para mais detalhes, assista a este clipe (avance até a marca dos 10 minutos e acompanhe a partir daí):