Mostrando postagens com marcador procuradores. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador procuradores. Mostrar todas as postagens

domingo, 15 de setembro de 2019

ARAS, DIREIS, OUVIR ESTRELAS


Na esteira do que comentei no post da última quarta-feira, transcrevo a seguir a opinião sempre ácida — mas nem por isso menos divertida — do impagável Josias de Souza:

Augusto Aras, o indicado de Jair Bolsonaro para o posto de procurador-geral da República, iniciou uma peregrinação pelo Senado. Nos próximos dias, irá de gabinete em gabinete para pavimentar a aprovação do seu nome. A chance de o Senado rejeitar sua indicação é muito próxima de zero. Assim, não há muito o que bolsonaristas decepcionados e procuradores revoltados possam fazer além de lidar com a nova realidade.

No momento, o que mais preocupa é a atmosfera de instabilidade que se observa no Ministério Público Federal. A insatisfação vaza para fora do ambiente fechado dos gabinetes. Começa a se manifestar ao ar livre. Prudentemente, Aras evita entrar em bolas divididas. Assimilou em silêncio a enxurrada de críticas de colegas nas redes sociais. Não respondeu nem mesmo à nota oficial em que a Associação Nacional dos Procuradores da República classificou sua indicação como "retrocesso democrático e institucional".

O esperneio é livre e até compreensível. Ao ignorar a lista tríplice dos procuradores, Bolsonaro rompeu uma tradição de 16 anos. Mas é preciso ressaltar que o presidente não violou o texto constitucional. Esse jogo está jogado. Confirmando-se a aprovação de Aras no Senado, como parece muito provável, a bola terá que ser colocada no meio de campo. Vai começar uma nova partida.

A margem de manobra de Augusto Aras é grande, mas não é infinita. Se ele tentar fazer algo que se pareça com gol de mão, a corporação reagirá. Se a revolta com sua chegada serve para alguma coisa, é para mostrar que não parece haver disposição na Procuradoria para o convívio com um novo Geraldo Brindeiro, o engavetador-geral da era FHC.

Que assim seja.

Sobrando tempo, ouça também este comentário de Josias.

sexta-feira, 6 de setembro de 2019

PEC DA PREVIDÊNCIA, JUDICIÁRIO, PGR, RAQUEL DODGE, LEI DE ABUSO DE AUTORIDADE, RENÚNCIA DE PROCURADORES EM BLOCO E O ORGULHO DE SER BRASILEIRO



Chamar este pobre país de "banânia" é elogiar, mas, convenhamos, seria deselegante (embora não totalmente impróprio) tratá-lo de "país de merda". Questões semânticas à parte, fato é que nossa "Pátria Amada, Brasil" perdeu em abril deste ano a 7ª posição no ranking das principais economias mundiais (que vinha mantendo desde 2005) e já nem figura mais entre as 29 nações mais ricas da lista do Business Insider. O "País do Futuro (que nunca chega)" tem os impostos, os juros, os automóveis, os pedágios, o combustível e a energia elétrica mais caros do mundo.

Como se não bastasse, o "Gigante Adormecido" (deitado eternamente em berço esplêndido) tem os políticos mais corruptos do mundo e é presidido atualmente pelo chefe de governo mais irracional do mundo, que acontece de ser também o mais impopular entre todos os que ocuparam esse cargo desde a redemocratização do "País do Futebol". E com a recente alta do dólar, nosso povo sofrido já nem pode mais ir à Disney conhecer o Pateta. Felizmente, basta ir a Brasília ou entrar nas redes sociais para ver vários.

A coisa fica ainda pior quando se foca a Justiça nesta terra de ninguém. Além de cega, essa senhora é surda e, não raro, corrupta: sobram "causos" de venda de sentenças envolvendo não só juízes de primeira instância, mas desembargadores e ministros das Cortes superiores. Claro que daí até suas meritíssimas excelências serem processadas, jugadas, condenadas e encarceradas vai uma longa distância.

Observação: Entre uma miríade de exemplos notórios, relembro o caso do desembargador Ivan Athié, presidente da 1ª Turma do TRF-2, que em março passado mandou soltar o Vampiro do Jaburu e seu comparsa, coronel Lima (para detalhes da vida pregressa do "Limão", como o policial militar reformado gosta de ser tratado, clique aqui). Athié  ficou afastado do cargo durante sete anos, devido a uma ação no STJ por estelionato e formação de quadrilha (em 2004). Um inquérito contra ele, com as mesmas acusações, foi arquivado em 2008 pelo STJ a pedido do MPF, que alegou não ter encontrado provas de que o desembargador tivesse proferido sentenças em conluio com advogados. O magistrado retornou às atividades em 2011, depois que o STF trancou a ação contra ele.

Falando em patacoadas, a usina de crises de plantão no Planalto criou mais um "mal estar internacional" ao criticar a ex-presidente do Chile e atual comissária da ONU para direitos humanos, Michelle Bachelet. Em pronunciamento sobre o governo brasileiro, Bachelet afirmou que observou "uma redução do espaço cívico e democrático, caracterizado por ataques contra defensores dos direitos humanos, restrições ao trabalho da sociedade civil e ataques a instituições de ensino”, e que, "desde 2002, o Brasil é um dos cinco países do mundo com o maior número de assassinatos de ativistas de direitos humanos".

Fiel ao seu estilo "bateu, levou", Bolsonaro devolveu: “Ela está acusando que não estou punindo policiais que estão matando muita gente no Brasil. Essa é a acusação dela. Ela está defendendo direitos humanos de vagabundos. Ela critica dizendo que o Brasil está perdendo seu espaço democrático. Senhora Michelle Bachelet, se não fosse o pessoal do Pinochet derrotar a esquerda em 73, entre eles seu pai, hoje o Chile seria uma Cuba. Eu acho que não preciso falar mais nada para ela”.

Cá entre nós, eu acho que a repercussão midiática — como de praxe — foi muito além do comentário do capitão, talvez pelo fato de ele ter citado nominalmente o pai de Michelle, general Alberto Bachelet, que foi torturado e morto durante a ditadura de Augusto Pinochet. Mas remexer nos escaninhos da história chilena não é bem a minha praia, e não convém ao sapateiro ir além das chinelas.

Voltando ao cenário jurídico-político tupiniquim, os ex-governadores do Rio, Anthony Garotinho e Rosinha Mateus, presos dias atrás com outros três suspeitos de participar de um esquema de superfaturamentos em contratos celebrados entre a Prefeitura de Campos dos Goytacazes (município fluminense do qual ambos foram prefeitos) e a construtora Odebrecht, foram soltos depois de passarem uma única noite na cadeia, graças à pronta intervenção do desembargador Siro Darlan, que lhes concedeu o habeas corpus durante o plantão judiciário na 7ª Câmara Criminal do TJ-RJ.

Além de ter carreira marcada por decisões controversas e de grande repercussão, Darlan é alvo de inquérito no STJ, que apura a venda de sentenças no fórum da capital. Antes de ser nomeado desembargador, em 2004, ele comandou, por mais de uma década, a 1ª Vara da Infância e da Juventude do Rio. Muitas de suas decisões geraram polêmicas. Como desembargador, em 2013, concedeu habeas corpus a sete dos nove envolvidos na invasão ao Hotel Intercontinental, em São Conrado, em 2010, quando o bando, armado com fuzis, pistolas e granadas, manteve 35 reféns, entre funcionários e hóspedes, por três horas. Na ocasião, uma pessoa morreu e seis ficaram feridas. Entre os beneficiados estava Rogério 157, que assumiu o comando do tráfico na Rocinha após a prisão do traficante Nem.

Em dezembro do ano passado, O GLOBO publicou que Darlan é suspeito de soltar presos durante plantões judiciais em troca de propina. Em dois casos investigados, detentos teriam sido beneficiados por decisões do desembargador. Num deles, foi anexada a colaboração premiada de um dos envolvidos, que afirmou ter ouvido de um dos presos sobre o pagamento a um intermediário do magistrado: R$ 50 mil para ser solto. Inicialmente, segundo o delator, o lance foi de R$ 120 mil, mas caiu para menos da metade dividido em duas parcelas.

Passando às boas notícias — se é que ainda as temos neste país: A CCJ do Senado não só aprovou, por 18 votos contra 7, relatório do senador Tasso Jereissati sobre a PEC da Previdência, como rejeitou os oito destaques apresentados para alterar o parecer do relator. A PEC paralela também foi aprovada em votação simbólica e por unanimidade. O texto principal segue para o plenário do Senado e, se aprovado, será promulgado. O ganho fiscal chegará na R$ 962 bilhões, mais R$ 350 bilhões se a PEC paralela for aprovada na Câmara e os estados e municípios aderirem à proposta que altera as regras da aposentadoria.

Bolsonaro anunciou ontem que deve acolher integralmente as sugestões de vetos do ministro da Justiça ao texto da Lei de Abuso de Autoridade, aprovada a toque de caixa, dias atrás, pelo Congresso. Segundo o portal G1, o capitão efetivamente votou 36 trechos de 19 artigos. Apesar dos esforços de Verdevaldo da Couves, da imprensa marrom (ou seria vermelha?), dos corruptos que pululam no Congresso e da banda podre da alta cúpula do Judiciário, Sérgio Moro continua muito popular, com 25 pontos de aprovação acima do presidente.

Por outro lado, segue envolta em brumas a nomeação do próximo Procurador-Geral da República (o mandato da atual termina no próximo dia 17). Há uma pressão política dos presidentes da Câmara e do Senado para que Raquel Dodge seja reconduzida ao cargo, o que desagradou membros da força-tarefa da Lava-Jato que atuam no DF, onde as coisas andam muuuuuuito mais devagar do que em Curitiba — até hoje, nenhum político com foro privilegiado foi mandado para a cadeia pelos 11 togados supremos, sem mencionar que a delação de Leo Pinheiro, da OAS, está parada há mais de um ano e outros processos e delações estão embolorando nos escaninhos da PGR.

Atualização: no finalzinho da tarde de ontem, o Augusto Aras foi escolhido pelo presidente para suceder a Raquel Dodge no comando da PGR. O subprocurador baiano tem 60 anos de idade e foi apadrinhado pelo ex-deputado federal Alberto Fraga, que é um dos políticos mais próximos de Bolsonaro. Aras era bem contado, mas caiu na bolsa de apostas depois que a imprensa divulgou que ele já defendeu o MST (em discurso na Câmara, em 2008) e promoveu jantares para petistas. Pelo mesmo motivo, enfrentou resistências no PSL, mas procurou parlamentares da legenda que têm proximidade com o capitão para tentar reverter o quadro. Funcionou. Sua indicação ainda precisa ser chancelada pelo Senado, mas o que importa mesmo é saber se foi uma boa escolha, considerando que a Lava-Jato e o combate à corrupção dependem diretamente da PGR  que o o próprio Bolsonaro comparou recentemente à Rainha no jogo de Xadrez

Na última quarta-feira, os procuradores Raquel Branquinho, Maria Clara Noleto, Luana Vargas, Hebert Mesquita, Victor Riccely e Alessandro Oliveira, integrantes da força-tarefa da Lava-Jato em Brasília, pediram demissão em bloco, alegando divergências de posicionamento com Raquel Dodge. Em nota, o grupo afirmou que o desligamento se deve a uma “grave incompatibilidade de entendimento dos membros da equipe” com a manifestação enviada pela PGR ao STF no dia anterior, quando Dodge pediu arquivamento preliminar de trechos do acordo de colaboração de Léo Pinheiro em que foram citados Rodrigo Maia e Ticiano Dias Toffoli, irmão ministro supremo Dias Toffoli.

Ao que parece, depois que a 2ª Turma do Supremo, decisão de anular a sentença do então juiz Sérgio Moro no caso do ex-presidente petista do BC e da Petrobrás, Aldemir Bendine, e devolver os autos à primeira instância, a Lava-Jato resolveu partir para a guerra. Para entender melhor esse imbróglio, convém ouvir que entende do assunto:

terça-feira, 19 de março de 2019

O JUDICIÁRIO A SERVIÇO DA JUSTIÇA — CONCLUSÃO



Segundo a revista eletrônica Crusoé, o presidente do STF, Dias Toffoli, teria se irritado com um artigo publicado em O Antagonista, na última quarta-feira, no qual o procurador Diogo Castor salientou que os cargos nos tribunais eleitorais são preenchidos por indicações políticas, e por isso teria anunciado a criação do tal inquérito para investigar calúnias contra a honorabilidade da corte e de seus membros e familiares. “Esse assassinato de reputações que acontece hoje nas mídias sociais, impulsionado por interesses escusos e financiado sabe-se lá por quem, deve ser apurado com veemência e punido no maior grau possível”, afirmou o ministro ao Estado. “Isso está atingindo todas as instituições e é necessário evitar que se torne uma epidemia.”, disse o ministro.

Observação: O senador Flávio Arns, da Rede do Paraná, é o 29º parlamentar a assinar o novo requerimento da CPI da Lava-Toga, que será protocolado hoje no Senado (eram necessárias 27 assinaturas). “Minha decisão foi motivada pelo grande sentimento de frustração vivenciado pela sociedade brasileira nos últimos dias, principalmente diante do risco de retrocesso em relação à Lava-Jato”, justificou o parlamentar, em nota. Já o senador Flávio Bolsonaro ainda não assinou o requerimento. Sua assessoria informou que ele está “avaliando” o pedido, e evitou dizer qual decisão ele tomará. Ontem, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, disse não existir a menor hipótese de ele levar adiante qualquer tentativa de investigação contra o Supremo neste momento, pois a Lava-Toga criaria um embate desnecessário entre Legislativo e Judiciário. Alcolumbre também minimizou o efeito dos pedidos de impeachment contra ministros STF e disse que “uma crise institucional agora não fará bem ao Brasil". Entrementes, entre uma decisão suprema e outra, Dias Toffoli vem articulando a criação de uma frente parlamentar de apoio ao Judiciário, visando neutralizar os avanços da turma que quer botar a Lava-Toga na rua. Se isso explica porque o zero um e outros parlamentares enrolados com a Justiça relutam em apoiar a CPI... bem, para bom entendedor, pingo é letra.

Para a deputada Janaína Pascoal, “os ministros são agentes públicos como outros quaisquer. Eles também precisam dar satisfação. Às vezes, os ministros reagem como se fossem intocáveis, inalcançáveis, acima de quaisquer autoridades. Isso não é verdade. Eles estão sujeitos a fiscalizações e críticas de outros agentes públicos.” (…) “Um jornalista que escreve uma matéria pode receber críticas. Mas os magistrados querem se colocar num Olimpo que não é real. Não pode ser real.”

O presidente Jair Bolsonaro se manifestou indiretamente sobre a decisão do STF que fixou a competência da Justiça Eleitoral para julgar crimes comuns ligados ao caixa 2. Ele retuitou um vídeo em que seu filho Eduardo, o zero três, pede apoio ao pacote anticrime de Sergio Moro. Clique aqui para assistir.

Ao cumprimentar Toffoli pela iniciativa, Gilmar Mendes, seu antigo mentor, vituperou ataques contra os procuradores da Lava-Jato e a proposta de criar uma fundação para gerir parte de uma multa bilionária paga pela Petrobras. “Não quero cometer perjúrio, mas o que se pensou com essa fundação do Deltan Dallagnol? Foi criar um fundo eleitoral? Era para isso? Imagina o poder. Quantos blogues teriam? Quanta coisa teria à disposição? Se eles estudaram em Harvard, não aprenderam nada. São uns cretinos”, disse Gilmar, referindo-se ao currículo de Deltan. Também de acordo com o O Antagonista, o principal alvo dessa caça à bruxas é o procurador Deltan Dallagnol, coordenador da Lava-Jato em Curitiba, embora outros integrantes da força-tarefa e os auditores da Receita Federal que iniciaram uma investigação sobre as transações financeiras de sua mulher, Roberta Rangel, e do casal Gilmar e Guiomar Mendes também estejam na mira.

A investigação do STF é vista por procuradores como uma forma de intimidar o Ministério Público. Ainda nesta sexta-feira, Raquel Dodge solicitou informações sobre o inquérito ao ministro Alexandre de Moraes, designado relator da ação. Na avaliação da procuradora-geral, o caso tem potencial para comprometer a imparcialidade do Judiciário, já que a função de investigar não faz parte da competência do Supremo. “Os fatos ilícitos, por mais graves que sejam, devem ser processados segundo a Constituição”, afirmou ela. Toffoli rebateu e disse que, além de haver previsão regimental para abertura do inquérito, o CPP estabelece que toda investigação deve ser supervisionada por um juiz.

Dallagnol disse que a decisão do Supremo pode fechar a janela de combate à corrupção política que se abriu há cinco anos, quando se iniciou o operação força-tarefa. Segundo ele, as defesas dos criminosos já estão se movimentando; a 13ª Vara Federal em Curitiba vem recebendo pedidos de declinação de competência (para que os casos da Lava-Jato sejam remetidos para a Justiça Eleitoral). Antes do julgamento, o decano da Lava-Jato, Carlos Fernando Santos Lima, já alertava para os efeitos da decisão: "É quase inacreditável que haja uma intenção real de se tomar essa decisão. Porque podem jogar cinco anos no lixo, por uma questão técnica sem relevância." Dodge disse não ver risco de anulação das ações em andamento e já julgadas, mas entende que é preciso avaliar tudo isso com muito cuidado e não perder o foco. 

Já a especialista em direito eleitoral Carla Karpstein afirma haver, sim, risco de anulação dos processos, tanto nas cortes comuns quanto na Justiça Eleitoral — nesta, porque os advogados vão dizer que as provas são nulas porque não foram produzidas ali; naquela, vão argumentar que houve nulidade porque a Justiça não tinha competência para julgar caixa 2 nos casos que já foram decididos ou estão em tramitação.

Três entidades que representam os procuradores saíram em defesa de membros da força-tarefa atacados por Gilmar Mendes e alvos de investigação no Supremo. A Conamp, maior e principal entidade de promotores e procuradores em todo o País repudiou nesta sexta, 15, o feroz ataque de Gilmar aos integrantes da força-tarefa e as críticas ao acordo firmado pela Lava-Jato com a Petrobrás para tentar reverter 80% dos recursos da multa que a estatal pagará a autoridades dos Estados Unidos. Curiosamente, partiu de Raquel Dodge o pedido para o STF suspendesse o acordo que criava o fundo de R$ 2,5 bilhões. O presidente da Associação Nacional de Procuradores, José Roberto Robalinho, disse ao Estado que há pelo menos dois pontos questionáveis no procedimento adotado pela PGR — sem analisar no mérito em si a ação apresentada.

Observação: A decisão do STF veio quando o pessoal da Lava-Jato buscou ganhar poder. Sem ouvir ninguém, nem Raquel Dodge, os procuradores montaram um esquema em que a Petrobras lhes entregou parte da multa que pagou nos EUA, mas liberada para uso no Brasil, para ser gerenciada por uma fundação de luta contra a corrupção, sob seu controle. Quem decide onde aplicar recursos é o Governo eleito, não os procuradores. O STF se mobilizou e a própria Raquel Dodge entrou na Justiça contra o acordo.

O fato é que a ação da procuradora-geral gerou uma crise interna no MPF. Os procuradores Pablo Coutinho Barreto e Vitor Souza Cunha — chefes da Secretaria de Perícia, Pesquisa e Análise —, que atuavam em uma secretaria vinculada ao gabinete de Raquel, pediram demissão, o que foi recebido pela categoria como um protesto. Ainda na sexta-feira, os procuradores da Lava-Jato elaboraram documento no qual trazem esclarecimentos acerca do acordo firmado entre o MPF e a Petrobras. O documento é endereçado ao juiz Federal da 13ª Vara Federal em Curitiba, e pede que as informações sejam encaminhadas também ao ministro Alexandre de Moraes, que determinou a suspensão do acordo.

Ao mesmo tempo em que é bombardeada a partir de Brasília, a Lava-Jato sofre um esfriamento natural em Curitiba, seu epicentro. Lá, Lula já foi condenado duas vezes e está encarcerado há onze meses. Parte dos empresários já foi solta; alguns, como Marcelo Odebrecht, graças à delação premiada. Seguem detidos próceres do PT e MDB, como o ex-tesoureiro João Vaccari Neto e o ex-deputado Eduardo Cunha. Com a saída de Moro e o fim da substituição temporária por Gabriela Hardt, a 13ª Vara Federal passou a ser comandada desde o início do mês pelo juiz Luiz Antonio Bonat, que herdou cerca de 1.700 procedimentos, de ações penais a inquéritos ainda em andamento. Nada, porém, que possa fazer mais barulho e causar mais surpresa do que os casos dos tempos áureos da operação. O frenesi daqueles tempos também está longe de se repetir. As operações ostensivas, aquelas que antes ocorriam todas as sextas, foram se tornando mais esparsas.

Os números obtidos pela força-tarefa do Paraná, ao longo destes cinco anos, restam impressionantes. Ao todo, 2.476 procedimentos de investigação foram instaurados e, em decorrência deles, houve 155 prisões preventivas, 183 delações e a condenação de 155 pessoas a exatos 2.242 anos de prisão. Hoje, o principal flanco de apurações está na Lava-Jato do Rio, que implodiu a quadrilha que saqueou o estado sob o comando de Sérgio Cabral (já foram realizadas cerca de 200 prisões em 30 operações) e ainda tem fôlego para novas e importantes fases.

De acordo com Deltan Dallagnol, a despeito do horizonte turvo, a operação precisa avançar. Ele lembrou que, no próximo dia 10 de abril, a corte pode impor mais uma derrota à investigação, ao julgar se réus condenados em segunda instância, como Lula, devem começar a cumprir pena imediatamente. “Faremos todo o possível dentro da lei para seguir nosso trabalho, mas receio que a janela de combate à corrupção que se abriu há 5 anos tenha começado a se fechar. Está fora da esfera de atribuição de procuradores de primeira instância mudar isso.” A conferir.