A CCJ do Senado
aprovou ontem o Projeto de Lei da prisão em segunda
instância. Rogério
Carvalho, do PT de Sergipe, foi
o único dos 23 senadores a votar contra a proposta — veja aqui como
cada parlamentar votou. Como se trata de um substitutivo, a proposta ainda terá de passar por nova votação na Comissão. Simone Tebet, presidente do colegiado, pautou o turno complementa para as 11 horas de hoje.
Por ter caráter terminativo, o projeto, se aprovado nos dois
turnos, seguirá direto para a Câmara — ou seja, se não houver apresentação de novas
emendas até a próxima sessão, nem será preciso que ele passe passar por
nova votação na CCJ. No entanto, segundo O
Antagonista, senadores do PT estão tentando reunir 9 assinaturas para apresentar um recurso que exigiria a análise do texto no
plenário, o que atrasaria ainda mais a análise do projeto (para mais detalhes,
clique aqui).
O Brasil assiste há seis anos uma corrida entre as
oligarquias corruptas e o aparato repressor. A Lava-Jato, por surpreendente e
inusitada, largou na frente. Mas o esforço anticorrupção foi perdendo terreno.
Nesse instante, a banda podre assumiu a dianteira. E as ruas ainda não
conseguiram esboçar uma reação à altura do retrocesso. Num contexto assim,
manifestações como as que ocorreram neste domingo são úteis, mas insuficientes
para deter o retrocesso. (veja comentário abaixo).
Mudando de pato para ganso: Segundo Josias de Souza, a última pesquisa Datafolha expõe alguns paradoxos. Na comparação com a pesquisa
realizada em agosto, o índice de aprovação da forma como o governo lida com a
corrupção caiu de 34% para 29%. Mas a gestão de Sergio Moro é aprovada por 53% dos brasileiros. Isso ocorre porque
a sujeira ao redor — do rolo do primogênito Flávio Bolsonaro ao laranjal do ministro do Turismo Marcelo Álvaro Antônio — essa sujeira
não grudou na imagem que o hoje ministro construiu como juiz da Lava-Jato.
Em movimento inverso, subiu de 20% para 25% a taxa de
aprovação do modo como o governo gerencia a Economia. A despeito disso, a aprovação
de Paulo Guedes, de 39%, é inferior
à de Damares, aprovada por 43% dos brasileiros. É preciso levar em conta,
porém, que o índice da ministra-pastora é anabolizado pela religião, pois a
pesquisa revela que o grosso de sua popularidade vem dos evangélicos
pentecostais. De resto, 39% de aprovação para um ministro da Economia,
associado a cortes e arrochos, não chega a ser uma má avaliação.
Atribui-se ao aroma de crescimento que começou a exalar do PIB o estancamento da sangria na
aprovação de Bolsonaro, que não só parou
de cair, mas subiu de 29% para 30%. Se a pesquisa serve para alguma coisa é
para mostrar ao capitão que ele deveria administrar melhor a língua, colocar as
encrencas em pratos limpos e se concentrar na Economia. A prosperidade do país
depende da Economia. A popularidade do presidente também. Não fica bem a um
candidato à reeleição ostentar uma aprovação de sub-Damares.
Na esteira do que comentei no post da última quarta-feira, transcrevo a seguir a opinião
sempre ácida — mas nem por isso menos divertida — do impagável Josias de Souza:
Augusto Aras, o indicado
de Jair Bolsonaro para o posto de procurador-geral da República, iniciou
uma peregrinação pelo Senado. Nos próximos dias, irá de gabinete em gabinete
para pavimentar a aprovação do seu nome. A chance de o Senado rejeitar sua
indicação é muito próxima de zero. Assim, não há muito o que bolsonaristas
decepcionados e procuradores revoltados possam fazer além de lidar com a nova
realidade.
No momento, o que mais
preocupa é a atmosfera de instabilidade que se observa no Ministério Público Federal. A insatisfação vaza para fora do
ambiente fechado dos gabinetes. Começa a se manifestar ao ar livre.
Prudentemente, Aras evita entrar em
bolas divididas. Assimilou em silêncio a enxurrada de críticas de colegas nas
redes sociais. Não respondeu nem mesmo à nota oficial em que a Associação Nacional dos Procuradores da
República classificou sua indicação como "retrocesso democrático e
institucional".
O esperneio é livre e
até compreensível. Ao ignorar a lista tríplice dos procuradores, Bolsonaro rompeu uma tradição de 16
anos. Mas é preciso ressaltar que o presidente não violou o texto
constitucional. Esse jogo está jogado. Confirmando-se a aprovação de Aras no Senado, como parece muito
provável, a bola terá que ser colocada no meio de campo. Vai começar uma nova
partida.
A margem de manobra de
Augusto Aras é grande, mas não é
infinita. Se ele tentar fazer algo que se pareça com gol de mão, a corporação
reagirá. Se a revolta com sua chegada serve para alguma coisa, é para mostrar
que não parece haver disposição na Procuradoria para o convívio com um novo Geraldo Brindeiro, o engavetador-geral
da era FHC.
Interrompo a sequência sobre os processos de Lula para fazer mais algumas
considerações sobre o “circo marimbondo” do Intercept e o show de horrores protagonizado na terça-feira por parlamentares
de esquerda que, como eu disse no post anterior, não valem o que comem, muito
menos o que lhes pagamos para, supostamente, nos representarem. E o mesmo
raciocínio se aplica a alguns “monstros sagrados” da imprensa — esses, felizmente, não
pagamos diretamente —, que botam lenha nessa fogueira insana, bem como a
conspícuos membros da nossa mais alta corte — estes, infelizmente, são pagos por
nós — que, a pretexto de homenagear a Constituição com seu garantismo de araque,
contribuem para que criminalistas estrelados, regiamente pagos com dinheiro da
corrupção, valem-se de todo tipo de chicanas procrastinatórias para eternizar os processos contra seus clientes.
Todo mundo tem direito a suas opiniões, mas não a seus
próprios fatos. Elio Gaspari vem crucificando
sistematicamente o ministro SérgioMoroem
suas colunas (bem escritas, mas claramente tendenciosas). Numa delas, e diz acreditar que a permanência do ex-juiz no Ministério da Justiça ofende
a moral, o bom senso e a lei da gravidade, que suas conversas impróprias com o
procurador Dallagnol enodoaram a Lava-Jato e fragilizaram a condenação
imposta a Lula pelo tríplex do
Guarujá, e que sua postura arrogante obriga muitos daqueles que
gostariam de defendê-lo a fazer papel de bobos.
Já Josias de Souza
nos oferece uma avaliação menos apaixonada e mais realista. Segundo ele, o sistema político
brasileiro apodreceu e a Lava-Jato
apressou o processo de degeneração. O PT
e as legendas que gravitam na órbita de Lula mostram-se incapazes de lidar com o tema da moralidade. Estão
fabricando um adversário político de grande potencial. Ao atacar o ex-juiz da Lava-Jato, o petismo e sua turma criam
um pesadelo do qual talvez tenham dificuldades para acordar mais tarde. Moro voltou ao Congresso e repetiu na
Câmara as explicações que dera dias atrás no Senado. Os deputados foram bem
mais agressivos do que os senadores. O
bloco lulista equipou-se para constranger o interrogado. Em termos jurídicos, a
inquirição da CCJ da Câmara, a
exemplo do interrogatório do Senado, teve importância nula. A relevância da
sessão foi política. Os deputados trataram Moro
como um ex-juiz suspeito de parcialidade. Não se deram conta de que estavam
diante de um potencial candidato.
Observação: O presidente da CCJ, Felipe Francischini, descartou convidar o ministro novamente a participar da comissão. “Na CCJ, nunca mais. Não vai ter Moro na CCJ nunca mais. “Qualquer pedido de convocação não vai prosperar na minha comissão. Eu estarei pessoalmente em cada comissão para tentar obstruir essa convocação.”
Para medir o efeito da agressividade dos
deputados é preciso frequentar não o Congresso, mas o boteco. A reputação dos
inquisidores de Moro é a soma dos
palavrões que inspiram na mesa do bar. Ali, o ex-juiz vai ganhando a cada
ataque a aparência de uma alternativa eleitoral.
O Antagonista
resume a história de maneira magistral: Há a lanchonete de Gaspari, onde se fala mal de Sergio
Moro, e o boteco de Josias de Souza.
Os botecos são mais numerosos do que as lanchonetes.
A edição revista e atualizada da caça às bruxas no Senado,
não só foi ineficaz para acuar o ministro pelo conteúdo das mensagens
atribuídas a ele vazadas por Glenn Greenwald,
mas também útil para o ministro falar sobre seu trabalho à frente da pasta e
defender o pacote anticrime e anticorrupção que enviou ao Congresso. Houve até
espaço para defender, por um breve instante, a reforma da Previdência. Moro foi ajudado pelos argumentos
usados pelos senadores que quiseram encurralá-lo. E pelo passado dos senadores.
Renan Calheiros, do MDB de Alagoas, tentou implicá-lo a
casos em que ele não atuou, como o da JBS,
em uma fala que irritou os colegas por ter se demorado mais do que devia. Paulo Rocha reclamou do julgamento do
mensalão, em que Moro atuou como
magistrado auxiliar, mas o senador do PT
do Paráfoi absolvido — o que contraria
a tese de perseguição da Justiça contra o partido de Lula. Jaques Wagner
criticou a divulgação de gravações feitas de conversas telefônicas do
ex-presidente e do sensacionalismo das ações da Lava-Jato. Para tanto, o senador do PT da Bahia teve de recordar que ele próprio foi alvo de uma
mandado de busca e apreensão.
As comparações feitas pelo material do Intercept com as gravações de Lula
e de outros casos famosos do jornalismo, como o escândalo de Watergate e dos papéis do Pentágono, na imprensa americana,
também foi favorável ao juiz. Moro
lembrou mais de uma vez que as conversas telefônicas foram autorizadas
judicialmente, e o sigilo foi levantado em uma decisão em que ele justificou o
ato, não “se escondendo atrás de hackers”, como acusou o site de fazer. Moro aproveitou a comparação com os
casos mais famosos de investigação do jornalismo americano para lembrar que
tanto a cobertura de atos ilegais do governo Nixon a partir de um arrombamento no conjunto Watergate quanto a divulgação de relatórios de um analista da CIA apontando a impossibilidade de os
Estados Unidos derrotarem o Vietnã eram baseados em fontes de informação
identificadas. E os jornalistas envolvidos publicavam as informações assim que
as recebiam, não anunciando que iriam fazê-lo “a conta-gotas”, como lembrou ser
a estratégia do Intercept.
Tendo estabelecido essas diferenças, o ministro repetiu que
houve sensacionalismo na divulgação de mensagens que, se verdadeiras, não mostram
irregularidades. Robusteceu a tese de que o problema não são as mensagens, mas
o ataque de hackers contra integrantes da Lava-Jato,
que atuam também para atingir outras autoridades e jornalistas. A defesa da Lava-Jato e de seus resultados acabou
por levar a pedidos de atenção ao pacote anticrime que está no Senado. Os
parlamentares chegaram a falar com o ministro de outras ações da pasta, como a violência
nos presídios do Amazonas ou o problema da imigração venezuelana que estaria
tendo impacto na violência em Roraima.
A inquisição a que o Sérgio Moro foi submetido na última
quarta-feira, na CCJ do Senado, deve
se repetir na Câmara na próxima semana. Como era esperado, desafetos do ministro vêm se aproveitando da situação
— no STF, no Congresso e até mesmo
no interior do governo — para instigá-lo politicamente e, ao mesmo tempo,
pugnar por providências no âmbito dessas instituições. Criminalistas que
defendem os denunciados pelo MPF de
Curitiba e apenados pelo então juiz da 13ª Vara Federal do Paraná exploram os
diálogos para tentar anular condenações e processos pendentes, parecendo não se lembrar, muito convenientemente, de que o
material divulgado pelo site esquerdista The Intercept foi obtido de forma
criminosa e vem sendo divulgado a conta-gotas de maneira tendenciosa.
Imagina-se — porque ainda não há provas concretas — que o PT, a esquerda e até parlamentares
investigados, denunciados e réus na Lava-Jato
estejam por traz desse “escândalo” sensacionalista. Por uma série de motivos que já detalhei em outras postagens,
esse material, pela forma como foi obtido e publicado, deveria ter como destino
a lata do lixo, mas continua repercutindo, dando ânimo à oposição e robustecendo a narrativa que trata Lula como preso político e usa os “inocentes
úteis” como massa de manobra para promover manifestações de rua convocadas,
supostamente, em defesa da Educação, contra a reforma da Previdência ou por uma
greve geral.
A comprovação pelas investigações da PF de que a captação ilegal dos diálogos é apenas parte de uma ação
coordenada contra a Lava-Jato,
atingindo membros do Judiciário em diversos graus, deu nova conotação
política ao episódio. Silvio Meira,
um dos maiores especialistas em tecnologia da informação e professor emérito da
Universidade Federal de Pernambuco, diz que “ninguém fez isso sozinho, não aconteceu por acaso, tem um desenho por
trás. Havia gente que estava explicitamente dedicada, gastando imaginação,
competência técnica, tempo e dinheiro para chegar a essa informação”. Ensina o especialista que o Telegram, que passou a ser muito usado no Brasil depois que o WhatsApp ficou fora do ar por questões judiciais, pode ser seguro quando as mensagens são criptografadas, mas para isso é preciso que o usuário habilite a encriptação no seu terminal, ou elas seguem abertas e podem ser lidas por pessoas não autorizadas.
Abel Gomes, desembargador do TRF-2 que julga os processos da Lava-Jato no Rio, colocou o dedo na
ferida: “Por que os hackers têm mirado
apenas autoridades que deram decisões desfavoráveis aos investigados da Lava-Jato?” Também a juíza substituta Gabriela Hardt, que respondeu pela
13ª Vara Federal do Paraná no período entre a exoneração de Moro e a nomeação do juiz federal Luiz Antonio Bonat, foi hackeada e
denunciou que essa manobra ilegal contra membros do Judiciário é um atentado à
segurança do Estado brasileiro.
A origem do aplicativo também é um mistério. Telegram
é o nome da empresa russa criada pelos irmãos Durov — que também criaram o Facebook russo VKontakte. Numa operação um
tanto misteriosa, essa empresa foi vendida a outro grupo digital russo, após o que os
irmãos deixaram o país e foram para Berlim, de onde também saíram reclamando
que as autoridades alemãs não deram visto de trabalho para o seu time — time que
hoje ninguém sabe exatamente onde está (a empresa é tocada a partir de Dubai, os demais funcionários estariam
espalhados pelo mundo e o paradeiro da infraestrutura da companhia é incerto e
não sabido).
Ainda na avaliação de Meira,
essa crise chama a atenção para um problema brasileiro, qual seja o fato de que
as autoridades não disporem de um sistema de troca de mensagens ou telefone
protegido contra ataques de cibercriminosos. O uso do Twitter é um hábito que Bolsonaro
copiou de seu ídolo, Donald Trump, mas
o presidente norte-americano só usa o Twitter
oficial quando trata de assuntos do governo — até porque o uso de meios
particulares já deu muita dor de cabeça a Hillary
Clinton, que, quando secretária de Estado na gestão de Obama, usava seu endereço eletrônico privado mesmo para assuntos governamentais,
quando deveria usar o email oficial (@state.gov). Mas os EUA são os EUA e o Brasil é o Brasil. Nesta
republiqueta de bananas, o ataque em massa a diversos membros do MPF e do
Judiciário, notadamente no Paraná e no Rio, sugere uma monumental
conspiração com o objetivo de acabar com a Lava-Jato — operação que, nas palavras do ministro Edson Fachin, é uma realidade que mudou a
estrutura do combate à corrupção no Brasil.
No Jovem Pan Morning
Show desta quinta-feira, Caio Coppola ponderou que um Congresso com 3% de aprovação popular, infestado de
ratos, vermes e parasitas, não tem moral para atacar a conduta de Sérgio Moro. O que se tem, segundo ele,
é um homem honesto se explicando por crimes que não cometeu perante um conjunto
de especialistas na arte da corrupção. Caio sugere que Moro se dirija aos parlamentares — que, gostemos ou não,
foram eleitos e, portanto, representam os idiotas que votaram neles — pelos
nomes de código que os identificavam nas planilhas de propina do Setor de Operações Estruturadas da
Odebrecht, e lembra que, nos cinco minutos que teve para questionar o
ministro durante a sessão na CCJ, o senador Oriovisto Guimarães, do Podemos,
estabeleceu uma comparação entre ética e legalidade.
O pensamento ético, segundo o parlamentar, avalia as ações
humanas na perspectiva de “bem” e “mal”; no pensamento legal, a clivagem é
entre dentro e fora da lei. Para ele, o pensamento ético é permeado por
questionamentos e não é composto por certezas absolutas, que são mais filhas da
fé do que da razão. Em sua análise, a ética está “um degrau acima da lei” e, para ilustrar essa tese, cita a possibilidade de existirem “canalhas
legalistas” e o exemplo da escravidão, que era imoral, embora fosse legal. Disse ainda o senador que o país claramente se divide em dois momentos — antes e depois da Lava-Jato —, e que, além da atuação de
juízes, policiais e procuradores, a operação também é fruto da incapacidade do
brasileiro em continuar vivendo sob um regime patrimonialista, onde há
cumplicidade entre empresários e políticos corruptos. Por fim, ele citou o
jurista Luis Alberto Warat, que
separa neutralidade de imparcialidade e diz ser impossível haver neutralidade
por parte dos julgadores, e pediu a Moro
que respondesse se seus atos seguiram a
imparcialidade exigida constitucionalmente.
O ministro ponderou que as partes envolvidas no processo
legal são seres humanos que carregam em si valores e princípios “que vão sempre de alguma maneira influenciar
na tomada de atos e decisões no curso do processo”. Sobre a imparcialidade —
ou seja, a capacidade do magistrado de proferir decisões segundo as leis e
provas, independente de que sejam as partes —, Moro reafirmou que isso foi mantido na operação Lava-Jato desde o início. Em sua
réplica, o senador disse estar “plenamente convencido da imparcialidade de Sergio Moro”. Para não prolongar demais
esta postagem, veja detalhes no vídeo a seguir:
Até semanas atrás, o Telegram
era pouco conhecido no Brasil, mas ganhou notoriedade devido a esse furdunço
todo. O Intercept, que divulgou as supostas trocas de mensagens envolvendo o ministro, afirma que obteve os
diálogos de uma fonte anônima antes de possíveis invasões ilegais. De novo,
para não encompridar ainda mais este texto, vou deixar para abordar as
diferenças entre o Telegram e o Facebook numa próxima oportunidade.