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quarta-feira, 31 de julho de 2019

BOLSONARO É BOLSONARO. E PONTO FINAL.


Foi lamentável a maneira como o presidente Jair Bolsonaro tratou a questão do desaparecimento do pai de Felipe Santa Cruz, que agora pretende recorrer ao STF para “obter esclarecimentos” — como se nossa mais alta corte não tivesse nada mais importante para fazer do que se debruçar sobre as picuinhas do chefe do Executivo e as polêmicas geradas por seus pronunciamentos intempestivos. A declaração foi dada quando o capitão reclamava da OAB  — órgão do qual Felipe é presidente nacional — na investigação do caso de Adélio Bispo, o lunático inimputável: "Por que a OAB impediu que a PF entrasse no telefone de um dos caríssimos advogados [do Adélio]? Qual a intenção da OAB? Quem é essa OAB?", perguntou o presidente.

A coisa ficou pior depois que Bolsonaro, numa livre gravada na tarde de segunda-feira enquanto cortava o cabelo, apresentou uma versão dos fatos que colide frontalmente com a da Comissão da Verdade. Na manhã de ontem, após um café da manhã no Alvorada com Rodrigo Maia, o presidente se dirigiu aos jornalistas nos seguintes termos: “Vocês acreditam em Comissão da Verdade? Qual foi a composição da comissão da verdade, foram 7 pessoas indicadas por quem? Pela Dilma”. Questionado sobre a ação no STF iniciada por Santa Cruz, o presidente disse que é “direito dele”. E Falou ainda que não tem documentos que embasem o que comentou na última segunda feira: “O que eu sei é o que eu falei pra vocês. Não tem nada escrito, que foi isso ou foi aquilo… Meu sentimento era esse. Agora, você pode ver, a OAB não quer que se chegue aos mandantes da tentativa de homicídio minha”.

Dias antes, ao se manifestar sobre a portaria nº 666 do Ministério da Justiça e Segurança Pública — segundo a qual indivíduos envolvidos em atos de terrorismo, associação criminosa armada que tenha armas à disposição, tráfico de drogas, pessoas ou armas de fogo, pornografia ou exploração sexual infanto-juvenil e até torcidas de futebol com histórico de violência em estádios podem ser sumariamente deportadas —, o presidente negou que fosse algum tipo de retaliação, até porque a medida não atinge o criador do site panfletário proselitista The Intercept Brasil, mas, ainda segundo o presidente, Greenwald poderia “pegar uma cana aqui mesmo”. A conclusão é uma só: diga Bolsonaro o que disser, sempre haverá polêmica.

Sobre a Vaza-Jato, a atuação espúria do site panfletário e seus associados, que vêm divulgando a conta-gotas supostos diálogos mantidos entre Moro e Dallagnol, e entre este e outros procuradores da Lava-Jato, salta aos olhos tratar-se de uma edição claramente tendenciosa, repleta de ilações feitas a partir de trechos retirados do contexto com o nítido propósito de anular processos e ajudar a libertar o picareta dos picaretas. Lamentavelmente, alguns juristas se respaldam na hermenêutica para agregar à previsão constitucional que garante aos jornalistas o direito de preservar suas fontes o condão de acobertar criminosos. Mas num país em que 7% da população (cerca de 15 milhões e brasileiros) acreditam que a terra é plana, não se poderia mesmo esperar que o exercício intelectual fosse o esporte nacional.

Igualmente fantasiosa me parece a hipótese de Walter Delgatti Neto, tido como o chefe da quadrilha que invadiu quase 1000 telefones, a maioria dos quais pertencente a membros da mais alta cúpula deste projeto de banânia, ter agido de moto próprio e cedido graciosamente o produto do crime ao manipulador do conta-gotas mais temido do Brasil. Nem mesmo a finada Velhinha de Taubaté acreditaria em tamanha falácia (refiro-me à personagem criada por Luiz Fernando Veríssimo durante o governo os anos de chumbo, famosa por sua incrível ingenuidade e capacidade de acreditar piamente em tudo que lhe era dito pelos presidentes militares).

Resta saber se, uma vez comprovada a suspeita de que o hacker foi pago pelo trabalho (segundo um integrante do grupo, a ideia era vender o material ao PT), Verdevaldo foi cúmplice ou apenas cometeu um “antiético”. Seja como for, a motivação política ficou evidente quando veio à tona que Manuela D’Ávila, ex-candidata a vice pelo PCdoB na chapa do bonifrate de Lula em 2018, serviu de intermediária entre Delgatti e o site The Intercept. E tudo indica que o gringo trastejão já estava de posse do material quando entrevistou Lula na prisão. Na entrevista que deu a Monica Bergamo, da Folha, e Florestan Fernandes Jr, do El Pais, o petista disse que Moro, Dallagnol e sua turma seriam “desmascarados”, e semanas depois o Intercept pingou a primeira gota do seu veneno. Teria o molusco eneadáctilo se tornado clarividente devido à abstinência alcoólica ou será que um passarinho lhe revelou com antecedência o caminhão de merda que Verdevaldo tencionava despejar?  

Entre o dia em que se deu o primeiro contato entre Verdevaldo e Vermelho passaram-se quatro semanas. Ao publicar os diálogos, o dono do site declarou: “ficamos muitas semanas planejando como proteger a nós e nossa fonte contra os riscos físicos, riscos legais, riscos políticos, riscos que vão tentar sujar a nossa reputação.”

Em sua coluna n’O Globo, Merval Pereira especula se nas conversas de Dallagnol com outros procuradores, ou mesmo com Sérgio Moro, não havia um espaço para troca de informações sobre outros casos da Lava-Jato que não os relacionados a LulaDelgatti disse também que entrou nas conversas sobre a Operação Greenfield em Brasília, que apura desvios em fundos de pensão. Pelo seu relato, não encontrou nada de ilegal nas conversas, por isso não se interessou. Que estelionatário mais preparado, esse, que sabe onde há supostas irregularidades processuais e onde não há!

Voltando ao presidente, o que se vê é Bolsonaro sendo Bolsonaro. E isso dificilmente irá mudar. Depois de seis meses no cargo, o capitão ainda age como se estivesse em campanha, dando declarações “de palanque” endereçadas a sua base de apoiadores (os “bolsomínions”), conquanto devesse atuar em prol do restabelecimento da paz e se empenhar na aprovação de medidas que revertam a dura recessão que o país amarga desde a reeleição da nefelibata da mandioca. Aceitemos, se não de bom grado, ao menos com esforço de tolerância, que ele fale aos seus nichos eleitorais de forma a compensar a perda de apoio registrada pelas pesquisas entre o pessoal que votou nele por exclusão, motivado pela oportunidade de afastar o PT do poder. É um método. Conflituoso e muito semelhante ao artifício do “nós contra eles” de Lula, mas exitoso: seu eleitor de raiz está firme.

Segundo Dora Kramer, dadas as qualificações intelectuais de ambos, não se pode condenar o presidente por copiar o adversário de quem absorve os conceitos trocando-lhes os sinais antes de apresentá-­los à população, a fim de tentar obter o mesmo grau de sucesso conseguido pelo discurso da “quase lógica”, assim muito bem denominado pela cientista política Luciana Veiga. Ainda em 2005, quando era geral o encantamento com Lula — a ponto de serem celebradas suas exorbitâncias verbais, vistas como fruto de genialidade política —, a cientista pontuava: “O presidente usa argumentos que parecem lógicos segundo noções genéricas do cotidiano, embora não o sejam se cotejados com a precisão da realidade. Ele tem gosto especial por temas de menor relevância”.

À época, Luciana foi ignorada pelos meios de comunicação e pela comunidade acadêmica que hoje a ouvem a respeito do jeito Bolsonaro de ser. Não se toca no assunto nem se relembra o conteúdo da análise sobre Lula. A tal da quase lógica é a arte de dizer bobagens e/ou obviedades com jeito de coisa séria. No caso do atual mandatário, ainda há que acrescentar o gosto por decisões pautadas em irrelevâncias. Alguns temas até são importantes, mas perdem relevo e caem no esquecimento pela forma e pelo momento que Bolsonaro escolhe para a abordagem.

Um exemplo é a indicação de zero três para a embaixada em Washington, vaga desde abril, quando o diplomata Sergio Amaral decidiu retirar-se de cena por respeito a si e à carreira. Tantas são as resistências ao nome do deputado que muitos especulam se a ideia vai prosperar — eu acho que vai, porque Trump não se oporá à escolha, e o mesmo deverá acontecer (por motivos diversos, naturalmente) com os senadores que submeterão "o garoto" à sabatina de praxe, mesmo que o maior destaque em seu currículo seja ter fritado hambúrgueres numa lanchonete da rede Popeyes, que serve frango frito. A pergunta que não quer calar é: por que semear conflito justamente quando o governo deveria curtir o bom momento da aprovação da reforma da Previdência na Câmara? Para atrair as atenções voltadas para o deputado Rodrigo Maia é uma hipótese. Irrelevante, pois.

Vamos aprendendo que nada é tão insignificante que não mereça a atenção de Jair Bolsonaro. Discutir horário de verão em pleno mês de março enquadra-se perfeitamente no modelo. Assim como proposições inexequíveis por força da realidade. Nesse campo temos a transferência da embaixada brasileira de Telavive para Jerusalém, o pacto entre Poderes cuja finalidade seria levar Legislativo e Judiciário a obedecer ao Executivo e a criação de uma moeda conjunta (peso-real) com a Argentina.

Nada disso vai adiante, como não irão as ideias de transformar Angra dos Reis (RJ) numa nova Cancún ou de liberar Fernando de Noronha ao turismo predatório. Presidentes normalmente interferem quando há necessidade de um “freio de arrumação” no governo. Com Bolsonaro é diferente: ele está permanentemente com o freio de mão puxado no modo desarrumação.

terça-feira, 30 de julho de 2019

FATOS E VERSÕES NA REPÚBLICA DOS HACKEADOS

É bem possível — e até provável — que você esteja tão cheio de ler sobre este assunto quanto eu de escrever sobre ele, mas vamos lá: Todo fato tem pelo menos três versões: a sua, a minha e a verdadeira. Para não cair em contradições, convém afastar-se o mínimo possível da verdade. Mas Verdevaldo das Couves parece ter faltado à escola no dia que ensinaram essa lição. Na última sexta-feira, ao comentar no Twitter duas notícias sobre fatos que vieram à lume com a prisão do quarteto fantástico, o farsante vermelho não conseguiu decidir se seu contato inicial com o hacker que lhe passou o material roubado aconteceu antes, depois ou durante o ataque ao celular do ministro Sérgio Moro. E com a historieta publicada pela revista Veja desta semana, a versão de que a fonte era um whistleblower cai de vez por terra: a suposta mensagem publicada pela revista, repassada pelo The Intercept, mostra que o gringo intrujão sabia desde o início de que estava tratando com um criminoso. Mas a comédia de mau gosto não para por aí.

No script delirante assinado pelo trio assombro petista — Gleisi Hoffmann, Paulo Pimenta e Humberto Costa, todos políticos da melhor qualidade, cujos mandatos engrandecem nossas Casas Legislativas —, o partido dos picaretas acionou o STF e a PGR para pedir a prisão de Moro (veja aqui) e seu afastamento do Ministério da Justiça. É surreal!!!

O deputado Filipe Barros, do PSL, pagou na mesma moeda: na mesma sexta-feira o parlamentar protocolou na PGR um pedido de prisão temporária de Verdevaldo, o paladino impoluto. Segundo Barros, há fortes indícios de que o financiamento e a transmissão dos dados obtidos criminosamente colocam o dono do Intercept na posição de coautor dos crimes. Entrementes, Felipe Santa Cruz, o presidente lulista da OAB, disse à mais petista das colunistas da Folha de S. Verdevaldo que Morousa o cargo, aniquila a independência da PF e ainda banca o chefe de quadrilha ao dizer que sabe das conversas de autoridades que não são investigadas”. Os advogados se sentem representados por esse cavalheiro?

Ainda não acabou: Em 27 de abril, Lula, em entrevista a Monica Bergamo e a Florestan Fernandes Jr, disse que Moro seria “desmascarado”. Quarenta e três dias depois, o Intercept Brasil pingou a primeira gota de seu veneno ao revelar suposta troca de mensagens entre o ex-juiz da Lava-Jato e o coordenador da força-tarefa no Paraná. Teria o picareta dos picaretas adquirido poderes paranormais ou será que um passarinho lhe revelou com antecedência a maracutaia que ainda estava no forno?

Segundo o Estadão, semelhanças entre o filme em cartaz e os escândalos dos aloprados, da pasta rosa e do bunker do PT são gritantes: todos começaram com suspeitas de grandes conspirações internacionais e terminaram no quintal do vizinho — que no caso em tela acontece de ser o município paulista de Araraquara. Para quem não se lembra, o PT, quando no poder, usou e abusou da Abin para seus fins espúrios. Dilma, a inesquecível, chegou mesmo a colocar a agência de inteligência governamental para espionar o então juiz Sérgio Moro. Agora que não está mais no poder, quem não tem a Abin caça com hacker. Não fosse trágico, seria cômico.

No dia em que foram noticiadas a gravíssima invasão do celular do presidente da República e o roubo cinematográfico no aeroporto de Guarulhos, a manchete de Folha foi: “Deltan foi pago por palestra em empresa citada na Lava Jato”. No Jornal da Manhã da Jovem Pan, o acusado contou que se retirou da ação em que a empresa que o pagou tinha sido citada, mas a notícia foi mantida e reproduzida com o mesmíssimo viés e idêntico estardalhaço sensacionalista pelo Globo, levando Diogo Mainardi, d’O Antagonista, a constatar em artigo na Crusoé que “o jornalismo mancomunado com a bandidagem contamina e emporcalha todos nós”. Assino embaixo.

Em sua coluna no Estadão, o poeta, escritor e jornalista José Nêumanne recomenda esquecer essa denúncia vazia de palestra de Dallagnol ou o papo de estelionatário mequetrefe dizendo que hackeou telefones de autoridades em nome da justiça. O crime dessa quadrilha pé-de-chinelo é gravíssimo, pois ameaça as instituições democráticas e viola a privacidade dos cidadãos de bem. O duro martelo da lei deve cair sobre as cabeças dessa gentalha sem dó nem piedade.

Na mesmíssima sexta-feira, o Ministério da Justiça publicou a portaria nº 666, que dispõe sobre o “impedimento de ingresso, a repatriação e a deportação sumária de pessoa perigosa ou que tenha praticado ato contrário aos princípios e objetivos dispostos na Constituição Federal”. O texto cita como exemplos o terrorismo, a associação criminosa armada, o tráfico de drogas, a pornografia ou exploração sexual infanto-juvenil e a torcida com histórico de violência em estádios, e pode levar à deportação de Verdevaldo, o impoluto. 

Pulicada quatro dias depois da prisão dos hackers que invadiram cerca de 1000 celulares de autoridades, a medida foi criticada pelo bufão gringo, que acusa Sérgio Moro de "terrorismo". O ministro, por seu turno, afirma que as alterações feitas nas regras de imigração do País não “muda a generosidade da lei brasileira com imigrantes ou refugiados” e mantém proibida a expulsão de estrangeiros por “opinião política”, apenas permite a deportação sumária, acelerando a expulsão de suspeitos considerados perigosos.

Como bem assinalou Eliane Cantanhede em sua coluna, a realidade supera a ficção. Estamos vivendo uma sessão ininterrupta de cinema, intercalando filmes policiais, dramas e comédias pastelão, enquanto milhões de desempregados estão na rua da amargura e há uma guerrinha ideológica insana, quase infantil, entre uma esquerda acuada, deslocada da realidade, e uma direita simplória, mas ousada, cheia de si.

Quando hackers têm a audácia de violar os celulares e as conversas do presidente da República, dos presidentes da Câmara e do Senado, da PGR, de ministros do Supremo e do STJ, dos ministros da Justiça e da Fazenda, da líder do governo no Congresso, a gente começa a pensar que tudo é possível. No início das investigações, a PF tinha certeza de que o alvo era a força-tarefa da Lava-Jato. Agora, como se vê, a coisa vai muito além. 

Não se trata de uma obra de gênios da informática que atuam no ambiente internacional, nem de uma quadrilha sofisticada a serviço de governos ou grandes corporações. Ao contrário, os chefes de Poderes, as instituições, talvez as posições estratégicas e até questões sigilosas de Estado, podem, em tese, ter ficado à mercê de uma gangue cibernética de fundo de quintal. Vulnerabilidade inadmissível. 

Walter Delgatti, o “Vermelho”, que parece ser o chefe e mentor das operações criminosas, é um bandidinho com ficha policial manjada: roubo, estelionato, falsidade de documentos. Os demais movimentam volumes de dinheiro incompatíveis com suas rendas oficiais. Todos são simplórios, mas capazes de atacar o centro do poder federal e deixar muitas dúvidas. Por exemplo:  que uso Delgatti e seus comparsas poderiam fazer desse material que não vendê-lo a quem interessar pudesse? Falta descobrir esse "quem", e é exatamente nesse ponto que se misturam e se confundem perigosamente as versões. Mas ainda é cedo para tirar conclusões. 

É fato que os quatro detidos são peixes muito miúdos para serem os únicos ou mesmo os maiores responsáveis por um ataque de tal magnitude, mas ainda não dá para concluir se eles agiram por conta própria, para depois vender ou repassar o material a possíveis interessados, ou se receberam uma encomenda de grupos dispostos a botar fogo no circo, implodir as instituições. A PF está apurando se eles venderam essas informações e com qual motivação. Uma coisa é clara: eles não iam fazer isto de graça. E não fizeram, tanto que aparece dinheiro. O chefe do grupo disse que sua intenção era vender as informações hackeadas para o PT.

Também é fato que Brasília está de pernas para o ar e, até a conclusão das investigações, espera-se um festival de versões e acusações mútuas. Estamos em plena república dos hackeados. Salve-se quem puder.

quinta-feira, 25 de julho de 2019

PRESOS OS SUSPEITOS DO HACKEAMENTO QUE ABASTECEU O INTERCEPT COM O MATERIAL CRIMINOSO QUE O CONTA-GOTAS MAIS FAMOSO DO BRASIL VEM DIVULGANDO COM O APOIO DA IMPRENSA “CUMPANHÊRA”


A Polícia Federal prendeu nesta terça-feira quatro suspeitos de terem invadido os celulares do ministro Sérgio Moro, do desembargador do TRF-2 Abel Gomes, relator dos processos da Lava-Jato do Rio em 2ª instância, e de outras autoridades, jornalistas e afins. Na chamada Operação Spoofing, foram cumpridos mandados de busca e apreensão expedidos pelo juiz Vallisney de Souza Oliveira, da 10ª Vara Federal de Brasília, em sete endereços dos investigados em São Paulo, Araraquara e Ribeirão Preto. O inquérito está sendo conduzido pelo delegado Luiz Flávio Zampronha, que, em 2005 e 2006, presidiu o inquérito do Mensalão.

Observação: No âmbito da segurança digital, o termo “Spoofing” designa uma técnica de engenharia social que busca enganar uma rede ou pessoa fazendo-a acreditar que a fonte de uma informação espúria é confiável.

No início de junho, o Sérgio Moro informou à PF que seu telefone foi invadido depois que ele atendeu uma ligação proveniente do próprio número. O ex-juiz da Lava-Jato já afirmou que a invasão virtual foi realizada por um grupo criminoso organizado, cujo objetivo é invalidar condenações por corrupção e lavagem de dinheiro, interromper investigações em andamento ou “simplesmente atacar instituições”. Por conta da exploração sensacionalista das supostas mensagens trocadas com procuradores da força-tarefa, o ora ministro da Justiça foi submetido a duas longas sessões de inquisição, uma no Senado e outra na Câmara dos Deputados, durante as quais foi duramente achincalhado por parlamentares petistas e de outros partidos de esquerda.

Também em junho, Deltan Dallagnol relatou a amigos que um hacker teve livre acesso à sua conta no Telegram por pelo menos dois dias, e que tentou acessar também seus emails. Na mesma época o telefone de Rodrigo Janot foi hackeado, mas o invasor não teve sucesso porque o ex-PGR não atendeu às insistentes ligações nem acessou os códigos — segundo Janot, no final de abril um hacker tentou acessar, por mais de dez horas, tanto suas redes sociais quanto suas contas bancárias.

Em maio, Ronaldo Queiroz, ex-chefe de gabinete substituto do ex-procurador-geral, e dois ex-auxiliares de Janot relataram ao GLOBO que haviam sido vítimas de ataques, a exemplo de Eduardo El Hage, coordenador da Lava-Jato no Rio, que reagiu rapidamente à tentativa de invasão e impediu que seu celular fosse utilizado pelo invasor. Também foram hackeados os procuradores Januário Paludo, Danilo Dias e Andrey Borges de Mendonça. Em Curitiba, o procurador Paulo Galvão recebeu uma ligação no meio da noite e, sem atentar para o risco, seguiu as instruções do hacker. Quando se deu conta, o aparelho já havia sido invadido, mas não se sabe se o criminoso teve ou não tempo de copiar os dados.

Também em maio, a Lava-Jato em São Paulo confirmou que dois procuradores sofreram tentativa de hackeamento, mas perceberam a tempo e bloquearam os ataques. A ex-coordenadora Thaméa Danelon recebeu mensagens de que uma nova sessão do Telegram estava sendo aberta e derrubou a sessão quatro vezes. Delegados federais de São Paulo também sofreram tentativas de invasão: o telefone do conselheiro do CNMP Marcelo Weitzel, por exemplo, e enviou mensagens a José Robalinho, ex-presidente da Associação Nacional de Procuradores. O jornalista Gabriel Mascarenhas, repórter da coluna de Lauro Jardim, teve sua conta no Telegram invadida em 11 de maio, e o criminoso se passou por ele para enviar mensagens intimidadoras ao procurador regional da República Danilo Pinheiro Dias.

Os suspeitos que foram presos nesta terça-feira são Gustavo Henrique Elias Santos — que já respondeu por porte ilegal de arma —, sua mulher, SuelenWalter Delgatti Neto Danilo Cristiano Marques — conhecido em Araraquara pelo envolvimento em golpes na internet. De acordo com a PF, a gangue foi responsável por centenas de invasões a celulares de autoridades governamentais ou ligadas a elas. As investigações, que seguem em sigilo na Justiça Federal do DF, buscam apurar também o que foi feito com o material que não tem relação com a Lava-Jato. A PF ainda avalia se os presos serão transferidos para Brasília ou se permanecerão em São Paulo.

No último dia 22 foi a vez de Paulo Guedes ser hackeado — ele não usa o Telegram, mas o invasor criou uma conta para se passar pelo ministro. Na véspera, a deputada Joice Hasselmann relatou pelas redes sociais ter recebido ligações do seu próprio número (mais detalhes nesta postagem), e que mensagens foram enviadas a partir de sua conta no aplicativo para o jornalista Lauro Jardim.

De acordo com José Nêumanne, cair no conto de vigaristas que hackearam mais de mil telefones de autoridades e jornalistas, conforme revelou a PF ao desencadear a Operação Spoofing, foi o erro da mídia brasileira denunciado pelo ministro da Justiça, Sergio Moro. Para o jornalista de televisão Fernando Coelho, a imprensa ganhou poder usando astúcia de repórteres e o perde deixando-se manipular por escroques. Mário Sabino qualificou o episódio como a maior vergonha da História de nossos meios de comunicação. E os três estão certos (para ouvir o comentário na íntegra, clique aqui).

Segundo Merval Pereira, o alcance do ataque deixa claro que o crime nada tem de amador. A partir da certeza de que os suspeitos foram realmente os responsáveis, a PF deverá apurar quem contratou os hackers, quem os pagou e quem entregou o conteúdo ligado à Lava-Jato a Verdevaldo, bem como o que foi feito do material que não tem ligação direta com a força-tarefa.

segunda-feira, 15 de julho de 2019

A VAZA-JATO E AS ESTRIPULIAS DE VERDEVALDO



Em clima de Fla Flu, com torcidas opostas, vaias e fogos lançados do outro lado da margem por manifestantes contrários à sua presença na Feira Literária Pirata das Editoras Independentes, o jornalista americano Glenn Greenwald foi saudado como herói pela patuleia e opositores do governo Bolsonaro, ao som de uma versão hardcore de "Bella Ciao" — canção popular italiana que se tornou um símbolo da Resistência italiana contra o Fascismo durante a 2ª Guerra Mundial.

Mesmo diante da pressão, Greenwald avisou que não pretende sair do Brasil: "Sou casado com um brasileiro que eu amo mais do que tudo, nós temos dois filhos brasileiros que adotamos; somos uma família completa, cheia de amor e felicidade, como todos podem ser, inclusive os jovens LGBT neste país. Posso sair do país a qualquer momento, só que eu não estou fazendo isso, nem vou fazer. Porque 15 anos atrás eu me apaixonei pelo Brasil". E aproveitou a ocasião para revelar em que pé estão os trabalhos de apuração do The Intercept Brasil: "Estamos muito mais perto do começo do que do final. Temos muito mais para revelar. Quando perceberam a importância do material, todos os jornalistas do Brasil nos procuraram querendo trabalhar com a gente como parceiros. Todos, menos um: a Globo. Para os jornalistas da Globo, é um crime fazer jornalismo. Só com fascistas e racistas o Bolsonaro conseguiu ter 15% dos votos. O país pelo qual me apaixonei não é isso. Ele é feito de pessoas diferentes. Só a democracia pode unir esse país."

Algumas pessoas parecem ter nascido com o único propósito de atazanar a vida alheia. E Verdevaldo se destaca entre os membros dessa seleta confraria. A propósito da Vaza-Jato, escreveu Diogo Mainardi na revista eletrônica Crusoé:

A imprensa resistiu ao AI-5, mas não vai resistir a Glenn Greenwald. Como é que a Veja, depois de denunciar a gatunagem lulista por mais de dez anos, sendo retaliada por aquela gente, pode compartilhar mensagens obtidas por criminosos, com o único propósito de enterrar a Lava-Jato e tirar da cadeia Lula e seus comparsas? Como é que a Folha, que sempre se vangloriou de sua autonomia, pode sucumbir às imposturas militantes de um bando de piratas, que manipula e falseia o produto de um crime para inocentar os membros de uma quadrilha? Os leitores vão castigá-los duramente. E o descrédito vai se espalhar para todos os lados.

O complexo de vira-latas dos jornalistas brasileiros permite que o aventureiro americano passe o dia inteiro no Twitter, arrotando platitudes sobre a liberdade de imprensa, como um novo Thomas Jefferson. Mas ele não é nada disso. Depois de quatro semanas de intenso agitprop, o plano de Verdevaldo para desmoralizar a Lava-Jato e libertar o chefe da ORCRIM está se revelando um fiasco. E o motivo é um só: Sergio Moro e Deltan Dallagnol, ao contrário dos bandidos que eles prenderam, fizeram tudo certinho, sem atropelar a lei.

O AI-5 de Verdevaldo não tem DOI-CODI nem pau-de-arara: a imprensa entregou-se espontaneamente a seu algoz. Se os jornalistas quiserem, posso torturá-los ainda mais, contando o que vai ocorrer a partir de agora. Em primeiro lugar, a PF vai prender o responsável pelos ataques aos telefones celulares dos procuradores de Curitiba. Em seguida, sua rede de contatos também será revelada. Quando esses nomes vierem à tona, a trama lulista vai explodir espetacularmente. Eu sei disso porque é o que vem se repetindo há quatro anos e meio. Já vimos essa história: criminosos muito poderosos se mobilizam para destruir a Lava-Jato, advogados bombardeiam a imprensa com falsos vazamentos e pareceres de juristas coniventes, ministros do STF tentam intimidar Sergio Moro e, no fim, os bandidos terminam na cadeia. Desta vez, porém, há uma novidade: o golpe partiu da imprensa. E ela, tristemente, vai se espatifar.

Um mês antes das eleições americanas de 2016, Greenwald publicou com um colega uma matéria no site The Intercept, criado por ele em 2013. Com o título “Exclusivo: novo vazamento de e-mails revela relação próxima da campanha de Clinton com a imprensa”, o texto expunha o conteúdo de mensagens trocadas entre a equipe da candidata democrata Hillary Clinton e jornalistas. Entre as táticas usadas para manipular a imprensa, citava-se o oferecimento de bebidas e comida para jornalistas em reuniões para transmitir informações e sugestões de entrevistados para os programas de televisão. A fonte dos dados, segundo o site, identificava-se como Guccifer 2.0 — um nome já conhecido.

Dois dias antes, o Departamento de Segurança Interna e o diretor de Inteligência Nacional dos Estados Unidos soltaram um comunicado dizendo-se convictos de que o governo russo estava por trás dos roubos de e-mails de cidadãos e instituições americanas, incluindo de organizações políticas. “As revelações recentes de e-mails supostamente hackeados em sites como DCLeaks.com e Wikileaks, e pela identidade online Guccifer 2.0, são consistentes com os métodos e motivações russos”, dizia a nota. “Nós acreditamos que somente oficiais de alto nível da Rússia poderiam ter autorizado essas atividades.”

O alerta não deteve Greenwald, mesmo em plena campanha eleitoral. Na matéria do Intercept, ele se explicava: “Na sexta-feira, autoridades do governo de Barack Obama alegaram que os funcionários de alto nível da Rússia foram responsáveis por este e outros ataques, embora não tenham fornecido nenhuma evidência para essa afirmação”. Nem a origem criminosa dos documentos nem o interesse evidente de quem forneceu os dados — agente russos — evitaram a publicação da matéria.

O padrão parece ter se repetido no Brasil. Na divulgação das conversas entre Sergio Moro e os procuradores da Lava-Jato, Greenwald também não se importou com a forma como o material fora obtido (se é mesmo que ele não sabe) ou com o óbvio direcionamento dos alvos: somente juízes e investigadores envolvidos em decisões desfavoráveis aos acusados pela Lava-Jato tiveram seus dados vazados. Ao ser perguntado por Crusoé sobre essa seletividade, respondeu: “Qualquer sugestão de que eu me oponho à Lava-Jato é totalmente ridícula”.

Os métodos de Greenwald se encaixam naquilo que é conhecido como “jornalismo ativista”, “jornalismo de oposição” ou “jornalismo de choque”. A prática usa as premissas que regem a profissão — como a preservação da fonte e a busca do interesse público — para atingir apenas rivais. Seu sobrenome até deu origem a um verbo em inglês: “greenwalding”. Em 2016, o termo entrou no site Urban Dictionary, em que os leitores elencam acepções para as palavras e votam nas melhores. Uma das mais populares é: pinçar um conteúdo e tirá-lo do contexto com o objetivo de difamar alguém”.

Os alvos de Greenwald são todos aqueles que, em sua visão de mundo, abusam de sua condição de poder. Trata-se de um grupo eclético, que inclui o Partido Democrata, as elites, o jornal The Washington Post, a Globo, os ricos (embora seja financiado por um bilionário), o FBI, a CIA, Israel, o Reino Unido, o ex-procurador especial dos Estados Unidos Robert Mueller, o presidente brasileiro Jair Bolsonaro e a operação Lava-Jato quando o alvo é o PT. “Moro e os procuradores da Lava-Jato são figuras altamente controversas aqui e no mundo — tidos por muitos como heróis anticorrupção e acusados por tantos outros de ser ideólogos clandestinos de direita, disfarçados como homens da lei apolíticos. Seus críticos têm insistido que eles exploraram e abusaram de seus poderes na Justiça com o objetivo político de evitar que Lula retornasse à Presidência e destruir o PT”, diz o Intercept no texto elaborado para justificar a publicação das mensagens roubadas de Deltan Dallagnol.

O gosto pelo enfrentamento, que Greenwald destila quase diariamente em sua conta do Twitter com mais de 1 milhão de seguidores, aflorou ainda em 2005, quando ele criou um blog e começou a criticar a presença militar americana no Iraque. No ano seguinte, ainda na condição de advogado constitucionalista e blogueiro, publicou o livro Como um patriota deveria atuar. O título fazia referência ao Patriot Act, criado pelo presidente George W. Bush como resposta aos ataques terroristas de 11 de setembro de 2001. A obra tornou-se um best-seller.

Nos anos seguintes, Greenwald escreveu mais quatro livros. O sucesso editorial abriu as portas para a autoria de colunas no site americano Salon e, mais tarde, no jornal inglês The Guardian. No final de 2012, ele foi procurado por Edward Snowden, um hacker que havia trabalhado na NSA. Snowden entregou a ele documentos que mostravam como as agências americanas vigiavam cidadãos nos Estados Unidos e no resto do planeta, inclusive no Brasil. O material foi publicado por diversos veículos do mundo. Um jornalista do The Washington Post também recebeu material para produzir uma matéria. A experiência, contudo, incomodou Snowden.

No livro Sem lugar para se esconder, Greenwald conta como Snowden reagiu ao ver o Washington Post executando seu ofício. “Em vez de reportar a história rapidamente e de forma agressiva, o Washington Post montou um grande time de advogados, que estava fazendo todo tipo de pedido e dando todo tipo de advertências terríveis. Para a fonte (Snowden), isso mostrou que o Post, em relação ao que ele acreditava ser uma oportunidade jornalística sem precedentes, estava sendo dominado pelo medo em vez de convicção e determinação”, escreve Greenwald. Snowden então fez um pedido: “Agora eu realmente quero que você seja a pessoa que vai reportar isso. Eu o tenho lido há muito tempo e sei que você será agressivo e não terá medo em fazer isso”. Greenwald respondeu: “Eu estou pronto e ansioso. Vamos decidir agora o que preciso fazer”.

Pela divulgação do material de Snowden, Greenwald ganhou o Prêmio Pulitzer de jornalismo em 2014, ao lado do Guardian e do Post. Mas a má experiência em negociar a publicação com veículos da imprensa o levou, ainda em 2013, a pensar em fundar o site The Intercept, em que ele teria mais liberdade para divulgar seu material (os contratos assinados para as colunas no Salon e no Guardian estabeleciam que Greenwald publicaria sem ter de se submeter a um editor).

A empreitada digital começou muito bem. Em 2013, o Intercept recebeu 500 mil dólares do bilionário iraniano Pierre Omidyar, fundador do site de leilões eBay e do PayPal. Nos primeiros anos de vida, os salários da equipe do Intercept foram custeados por Omidyar e pelo rendimento das ações de suas empresas. Entre 2014 e 2017, Greenwald recebeu 1,6 milhão de dólares da First Look Media, de Omidyar. Seu salário em 2015, segundo matéria do jornalista Charles Davis, publicada na Columbia Journalism Review, chegou a 518 mil dólares ao ano, ou 43 mil dólares por mês.

Três anos depois da divulgação dos materiais de Snowden, o Intercept ganhou os holofotes com a divulgação dos e-mails da campanha de Hillary Clinton, juntamente com o Wikileaks, do australiano Julian Assange — que recentemente foi obrigado a sair da embaixada do Equador, em Londres, onde estava refugiado desde 2012, para evitar ser extraditado ou para a Suécia, onde é acusado de estupro, ou para os Estados Unidos, onde é acusado de espionagem. A Justiça do Reino Unido deve enviá-lo para os Estados Unidos. Com Snowden e Assange, Greenwald forma um trio decidido e sempre disposto a defender Vladimir Putin. Snowden hoje vive refugiado na Rússia e mantém contato frequente com Greenwald. “Eu acho que a razão para que Putin tenha aceitado Snowden na Rússia é porque ele simplesmente gostou da ideia de aparecer como um protetor dos direitos humanos contra os Estados Unidos”, disse Greenwald a Ian Parker, jornalista da revista The New Yorker.

Dos três ativistas, Greenwald é o que tem a língua mais afiada. Para cada abuso ou crime cometido a mando de Putin, o americano cria uma história para relativizar o fato. Ou, então, afirma que as evidências não são suficientes para culpar Moscou. Um ex-espião russo e sua filha foram envenenados com Novichok, na Inglaterra, no ano passado? Para Greenwald, os cientistas britânicos mentiram quando disseram que a substância havia sido produzida na Rússia. E atacar rivais políticos é o que fazia também o ex-presidente americano Barack Obama com o uso de drones militares no Oriente Médio. Russos derrubaram um avião de passageiros da Malaysia Airlines que sobrevoava a Ucrânia, em 2014? Greenwald tuitou que a Marinha americana também abateu um avião iraniano em 1988.

No afã de livrar os russos, Greenwald, que é de esquerda, chegou até mesmo a se aproximar de veículos de imprensa favoráveis ao presidente americano Donald Trump. Tudo para argumentar que não houve conluio entre os russos e a campanha do republicano, em 2016. Greenwald chamou as matérias sobre um possível conluio de “histeria russofóbica”. Ao mesmo tempo, passou a atacar impiedosamente o ex-procurador-geral Robert Mueller, que foi responsável pela investigação do caso. “Mesmo que ele (Trump) tenha feito acordos estranhos com a Rússia, eu ainda acho que é do interesse geral não ensinar uma geração inteira, que está se interessando por política pela primeira vez, que os russos são demônios”, disse ele à New Yorker.

Além de preservar Putin, Greenwald é simpático a grupos terroristas muçulmanos, como o Estado Islâmico, a Al Qaeda, o Hamas e o Hezbollah. Em uma conferência de socialistas em Chicago, em 2012, ele disse: “Nós temos organizações na lista de terrorismo que não são nem remotamente uma ameaça para os Estados Unidos, como o Hezbollah e o Hamas. Eles não estão de forma alguma tentando ferir americanos. São devotados a proteger seus cidadãos contra o estado de Israel. Apesar disso, é um crime nos Estados Unidos fazer qualquer coisa que seja entendida como apoio material ao Hezbollah e ao Hamas”. Em 1983, só para lembrar, membros do Hezbollah explodiram dois caminhões-bomba no Líbano e mataram 307 militares que estavam no país como força de paz. Desses, 241 eram americanos.

Para Greenwald, terroristas são as democracias do Ocidente. “Os Estados Unidos, o Reino Unido e seus aliados mataram repetidamente civis muçulmanos na última década (e antes disso), mas os defensores desses governos insistem que isso não pode ser ‘terrorismo’ porque são os combatentes, não civis, que são os alvos. Será que está certo pensar que, quando nações ocidentais matam continuamente civis muçulmanos, isso não é terrorismo, mas quando os muçulmanos matam soldados ocidentais, isso é terrorismo?”, escreveu ele no Guardian, em maio de 2013.

O Brasil entrou na vida de Greenwald principalmente por questões pessoais. Em 2005, o americano conheceu o jovem David Miranda, então com 20 anos, na região da rua Farme de Amoedo, na praia de Ipanema. Casaram-se pouco tempo depois. Miranda, que deixou a escola aos 13 anos, fez supletivo e depois se formou em comunicação, tornou-se mundialmente conhecido por ter sido interrogado por nove horas no aeroporto de Heathrow, em Londres. Ele foi pego transportando documentos de Snowden para Greenwald. Ao chegar ao Brasil, começou uma campanha pedindo para a então presidente Dilma Rousseff conceder asilo a Snowden, sem sucesso.

Em 2016, Miranda elegeu-se vereador no Rio de Janeiro pelo PSOL. No ano passado, tentou a Câmara dos Deputados. Com 17 mil votos, tornou-se primeiro suplente da bancada do PSOL. Quando o deputado federal Jean Wyllys, também do PSOL, decidiu deixar o Brasil alegando ameaças de morte, Miranda ocupou seu lugar.

Miranda e Greenwald compartilham uma casa perto da favela da Rocinha e a mesma visão de mundo. “Eu e meu marido estivemos juntos no caso do Snowden e nós lutamos contra os governos mais poderosos do mundo e a CIA, a NSA, o Reino Unido… Estávamos sendo ameaçados o tempo todo”, disse Greenwald, em entrevista para o site Agência Pública, dois dias depois da divulgação das mensagens roubadas do celular de Deltan Dallagnol e que teriam sido entregues ao Intercept por “fonte anônima”. Na mesma entrevista, Greenwald aproveitou para atacar veículos de imprensa brasileiros. Ele afirmou que a “grande mídia” estava trabalhando para a Lava-Jato. Não é um argumento muito diferente do que ele usou contra a imprensa americana, mas com sinal trocado. Ele diz que os veículos do seu país estavam a serviço dos democratas, em 2016. “Quando a grande mídia transforma Moro e a força-tarefa em deuses ou super-heróis, torna-se inevitável o que aconteceu. Os jornalistas pararam de investigar e questionar a Lava-Jato e simplesmente ficaram aplaudindo, apoiando e ajudando”, disse ele. “A Globo foi para a força-tarefa uma aliada, amiga, parceira, sócia. Assim como a força-tarefa da Lava-Jato foi o mesmo para a Globo.”

No dia seguinte, a Globo emitiu um comunicado revelando que, apesar dos ataques, Greenwald procurara a empresa no dia 29 de maio para propor uma nova parceria: divulgar as mensagens de Dallagnol a Sergio Moro. O advogado e a TV já tinham trabalhado juntos em 2013 na publicação dos documentos de Snowden. Mas, numa conversa na redação do Fantástico, Greenwald se recusou a dar informações sobre o conteúdo do material que dizia possuir e da sua origem — “uma grande bomba a explodir”. Sim, ele queria fechar a parceria sem que a Globo soubesse antes o que ele tinha em mãos. Por isso, a conversa não foi adiante.

Uma vez publicadas as matérias no Intercept, prossegue o comunicado, um representante do site ainda procurou a emissora para oferecer uma entrevista. Também não deu certo. Na sequência, vieram os ataques de Greenwald à Globo. “O comportamento de Greenwald nos episódios aqui narrados permite ao público julgar o caráter dele”, diz a nota.

A Folha de São Verdevaldo, agora, espalha mensagens de Deltan Dallagnol para sua mulher. O novo traque, que levanta suspeitas sobre um projeto que nem foi realizado, invade a esfera privada do procurador da Lava-Jato, à procura de algo para emporcalhá-lo. O resultado só emporcalha os autores do golpe: em sua reportagem sobre as palestras de Dallagnol, a Folha logicamente tentou encontrar algum fragmento de conversa capaz de constranger Sérgio Moro, mas acabou obtendo o efeito contrário. 

Há uma única mensagem enviada pelo coordenador da força-tarefa ao ex-juiz da Lava-Jato, em que o procurador diz: “Caro, o Edilson Mougenot [fundador da Escola de Altos Estudos em Ciências Criminais] vai te convidar nesta semana pra um curso interessante em agosto. Eles pagam para o palestrante 3 mil. Pedi 5 mil reais para dar aulas lá ou palestra, porque assim compenso um pouco o tempo que a família perde (esses valores menores recebo pra mim… é diferente das palestras pra grandes eventos que pagam cachê alto, caso em que estava doando e agora estou reservando contratualmente para custos decorrentes da Lava-Jato ou destinação a entidades anticorrupção)…”. 

Além de não ter nada contra Moro (o estoque de traques de Verdevaldo parece ter chegado ao fim), a mensagem isenta também Dallagnol, explicando claramente o destino dos recursos de suas palestras.

Alguma dúvida de quem é o vilão nessa história?

segunda-feira, 8 de julho de 2019

NOVAS PUBLICAÇÕES DA VAZA-JATO E OUTRAS CONSIDERAÇÕES


Em pareceria com o site ultraesquerdista de Glenn Greenwald, a Folha soltou neste domingo mais uma leva de “mensagens tóxicas” atribuídas a Sérgio Moro e procuradores da Lava-Jato. Desta vez a acusação é de que foram discutidas estratégias para vazar informações sigilosas da delação da Odebrecht sobre a Venezuela durante o recrudescimento do regime de Nicolás Maduro

Pegando carona nesse circo de horrores, o oráculo de festim Datafolha — cujas sondagens eleitorais feitas em 2018 apontavam para a vitória do fantoche de Lula sobre Bolsonaro e a eleição da ex-presidanta Dilma para o Senado por Minas Gerais — ora afirma que seus mapas astrais indicam que 58% dos entrevistados que tiveram conhecimento dos diálogos de Moro com os procuradores da Lava-Jato reprovam a conduta do hoje ministro da Justiça. Talvez as entrevistas tenham sido realizadas defronte ao Instituto Lula ou ao Sindicato dos Metalúrgicos de SBC, mas para a maioria dos analistas políticos, palpiteiros de plantão e assemelhados, os ataques a Moro fizeram crescer a sua popularidade e habilitaram-no a disputar (com chances reais de vencer) a eleição presidencial em 2020. Josias de Souza escreveu em sua coluna do último dia 2 que, ao apontar supostos excessos do ex-juiz, o PT e as legendas que gravitam na órbita de Lula ainda não notaram, mas estão fabricando um adversário político de grande potencial, criando um pesadelo do qual talvez tenham dificuldades para acordar mais tarde.

A revista Veja, que ora engrossa a ala do replicadores do material vazado pelo Intercept — proveniente de uma “fonte anônima” —, publicou na edição desta semana uma longa matéria de capa assinada por Glenn Greenwald, Edoardo Ghirotto, Fernando Molica, Leandro Resende e Roberta Paduan. Esse pool de repórteres investigativos afirma que uma nova leva de diálogos demonstram que Moro alertou Dallagnol para o fato de o MPF não ter incluído uma informação considerada importante por ele na denúncia de um réu, e a partir daí “investiga” julga e condena o procedimento do ex-juiz na condução dos processos da Lava-Jato em Curitiba.

No editorial, a revista assegura que, ao contrário daqueles que fomentam o ódio ou se aproveitam dele, seus compromissos não são com pessoas ou partidos, que sempre foi — e continua — a favor da Lava-Jato, que a luta contra a corrupção tem sido um dos pilares de sua história, mas que os diálogos publicado nessa edição violam o devido processo legal, pedra fundamental do estado de direito e, portanto, como veículo de mídia responsável, não pode apoiar posturas como essa. A meu ver, sua mudança de viés jornalístico não demora a refletir no número de assinantes — entre os quais se inclui este obscuro articula — , que tende a se igualar em breve ao de eleitores do PSTU ou do PC do B. O que é uma pena, pois Veja sempre foi implacável com os crimes cometidos por Lula e pelo PT, como comprovam as dezenas de matérias de capa publicadas ao longo das últimas décadas, sem mencionar a famosa entrevista com Pedro Collor, publicada em 1992, que foi decisiva para o impeachment do ex-caçador de marajás de araque, hoje senador pelo PTB de Alagoas, réu na Lava-Jato e aliado de Lula

Dora Kramer, cuja coluna quase sempre vale a leitura, pondera que a nova leva de mensagens “toxicas” requer uma avaliação diferenciada sobre a repercussão na decisão a ser tomada pelo STF sobre a suspeição dele no caso Lula/triplex e na reação da opinião pública. A reportagem feita em parceria com o site Intercept não “bate” da mesma maneira nesses dois ambientes. Na Justiça, pode ser que os diálogos influenciem a posição dos ministros — embora o voto do decano Celso de Mello, considerado crucial, já estivesse pronto antes da publicação desta sexta-feira, 5, sempre pode haver mudanças de posições até a decretação do resultado do julgamento. Além disso, diz Dora, a situação de Moro pode se complicar, não porque as mensagens mostrem produção de provas falsas, mas devido à evidência de que o juiz teria atuado como ministro de instrução, figura inexistente na nossa legislação.

Já na opinião pública, e aqui entramos no terreno político, nada indica que possa haver maiores danos além dos já provocados entre aqueles que questionam a posição de Moro desde que ele aceitou ser ministro da Justiça. Seu núcleo de apoiadores mais fiéis não se abala com isso. Ao contrário, ignora o valor dos ritos legais e celebra o papel de justiceiro. Esses dois agrupamentos não “conversam” entre si. 

Um Moro popular não significa um Moro imune à lei — Lula é popular e está preso com mais de dez processos nas costas. Não há, por isso, risco a “desmonte” da Lava-Jato semelhante ao que ocorreu com a operação Mãos Limpas na Itália. De certo, conclui a jornalista, temos apenas o fato de que Moro não poderá ambicionar uma vaga no STF, e que, se quiser seguir na vida pública, sua única opção é a via político-partidária-eleitoral, cujos desmandos combateu como juiz.

Vamos ver até onde essa merdeira vai chegar.

domingo, 7 de julho de 2019

O ESTRANHO BILIONÁRIO QUE FINANCIA OS ATAQUES CONTRA MORO



Pela lógica, Pierre Omidyar, o engenheiro que criou ouro puro ao desenhar o site de leilões eBay, deveria estar do lado de Sérgio Moro e de todos os brasileiros engajados no combate ao veneno cruel da corrupção.

O bilionário americano nascido em Paris de pais iranianos quer fazer o bem, segundo seus propósitos declarados. E tem 13 bilhões de dólares para bancar seus desejos, aparentemente contraditórios.

Pierre detesta aparecer, mas é um pouquinho vaidoso — usa uma foto de muitos anos atrás no Twitter. E deu o próprio nome a uma das organizações mais importantes que criou, a Omidyar Network.

É ambicioso também: através da “rede global de inovadores, empreendedores, tecnologistas, militantes, investidores, ativistas e organizações comprometidas em enfrentar os assuntos mais prementes de nosso tempo”, pretende mudar o mundo influenciando em áreas importantes.

Segue quatro “imperativos estratégicos”: reimaginar o capitalismo, melhorar a vida de quem precisa através da “tecnologia benéfica”, identificar assuntos emergentes que moldarão o futuro e expandir a capacidade humana.

Quem fala em “reimaginar” o capitalismo já está fora do debate dos adultos. Exceto, claro, se tiver 13 bilhões de dólares.

A linguagem meio infantilizada das organizações bancadas pelo bilionário é meio new age por um bom motivo: Omidyar, nascido com o nome persa de Parvaz, é da escola californiana de budismo, provavelmente por influência da mulher, Pamela Kerr. Obviamente, não um budista qualquer. Omidyar banca viagens, palestras e outras atividades do Dalai Lama.

O nome foi afrancesado para Pierre porque ele nasceu em Paris, onde os pais foram estudar. O pai seguiu carreira como cirurgião e a mãe como pesquisadora de linguística. Separaram-se depois que se mudaram para os Estados Unidos.

A influência global de Omidyar tem diferentes ramos. O jornalístico é o que mais interessa aqui. Como George Soros, ele contribui para diversos sites e organizações com profissionais de alto nível , jornalistas, ativistas ou ambos, para disseminar suas ideias.

Mas, ao contrário do americano de origem húngara, financiador de causas chamadas progressistas, como a liberação das drogas e a reforma penal em favor de criminosos, sem contar a eleição de políticos simpáticos a elas, Omidyar participa diretamente de projetos jornalísticos próprios.

O alinhamento ideológico também não é tão claro quanto o de Soros. Omidyar já foi acusado de neoliberal, um dos xingamentos máximos na escala esquerdista, e de agir em conluio com a inteligência americana na época das convulsões na Ucrânia.

Também não desfruta de boa reputação nos meios bancados pela Rússia, como a RT (ex-Russian TV) e o site Sputnik. Ambos são bons sinalizadores ideológicos: incentivam todo e qualquer tipo de antiamericanismo, o que de imediato esclarece o posicionamento dos “players”.

Na RT, em fevereiro passado, ele foi descrito como “grande patrocinador da mudança de regime” – expressão que significa interferência política em países que a Rússia quer para sua esfera de influência, desde a Ucrânia até a Síria.

A reportagem cita um obscuro site de Minnesota chamado MintPress, financiado pela família palestina de origem jordaniana Muhawesh. Estranhamente, para um órgão que defende a Síria de Bashar Assad e a Venezuela de Nicolás Maduro, a série de reportagens do site sobre Omidyar é boa, uma vez eliminado o viés ideológico.

O mais interessante é o gráfico sobre a rede de Omidyar. Um dos nódulos é a Luminate, organização-mãe das atividades filantrópicas que incluem o Poynter Institute (faculdade de jornalismo na Flórida, proprietária do jornal Tampa Bay), Bellingcat (um site investigativo que, ao contrário do Intercept, ao qual chegaremos em breve, dá uma canseira nos russos) e o Consórcio Nacional de Repórteres Investigativos (conhecido pela divulgação dos Panama Papers).

Apesar da bem sucedida tática de não aparecer, é fato conhecido que Omidyar “viu a luz” quando o operador de inteligência Edward Snowden divulgou a esmagadora quantidades de dados desviados da NSA, a agência americana de espionagem virtual. Ficou abalado, ironicamente, com os riscos para a privacidade dos cidadãos — totais, por sinal: não existe quem não possa ser invadido por operadores estatais, criminosos supranacionais, hackers, crackers e até o filho da vizinha que passa o dia inteiro sentado na frente do computador.

Pensou em comprar o Washington Post, mas foi batido pelo dez vezes mais rico Jeff Bezos. Em lugar disso, criou a First Look Media, o guarda-chuva do Intercept. Contratou jornalistas conhecidos, como Glenn Greenwald (ex-Guardian, jornal que também recebe patrocínio de Omidyar e lá ganhou um Pulitzer pelas reportagens sobre o gigantesco vazamento), Laura Poitras (diretora do documentário sobre Snowden) e Jeremy Scahill (ex-The Nation).

“Podemos nos dar ao luxo de fazer uma coisa diferente porque temos por trás um tipo de apoio com recursos infinitos”, disse Greenwald à revista New York para uma reportagem sobre Omidyar. Mesmo depois da criação do site, Greenwald nunca tinha se encontrado pessoalmente com o misterioso Omidyar, embora o considerasse o tipo de “bilionário normal e amigável” antes de ser abalado pelo caso Snowden.

É nessa reportagem que aparece a “conversão” do dono do eBay. Obamista apaixonado e grande contribuidor da Fundação Clinton, ele mudou de lado. Supostamente, mas a tal ponto que todas as informações roubadas por Snowden, asilado na Rússia para não ser preso e julgado por espionagem nos Estados Unidos, hoje estão sob o guarda-chuva de Omidyar.
Imaginem o poder que um cofre dessas dimensões dá a um único homem, protegido pela fortuna que fez aos 31 anos e movido pela missão de mudar o mundo.

Quando foi lançado, o Intercept era essencialmente voltado contra os órgãos de inteligência dos Estados Unidos. Greenwald ficou mais conhecido nos Estados Unidos depois que Donald Trump foi eleito e oposição democrata, espicaçada pela maioria dos órgãos de imprensa, passou a atribuir a sua vitória a algum tipo de conspiração com os russos.

Ao assumir com brilhante agressividade a narrativa contrária, Greenwald virou uma espécie de herói da direita trumpista. Substituiu as entrevistas a programas “progressistas” de canais a cabo, dadas de terno, gravata e bermudas quando estava no Rio, por entrevistas à Fox News, considerada a besta-fera pela esquerda, e similares.

Uma breve interrupção: Omidyar, seu financiador, também bancou um ramo da direita antitrumpista representada por Bill Kristol. No seu site sobre jornalismo, um projeto da Vox Media chamado The Coral Project (“Como os corais, criamos as estruturas para permitir às comunidades prosperar”, é a definição new age), a missão é descrita assim: “Aumentar a confiança do púbico no jornalismo, aperfeiçoar a diversidade de vozes e experiências nas reportagens, fortalecer o jornalismo tornando-o mais relevante na vida das pessoas, criar um diálogo online mais seguro e produtivo”.

Pois é, um sujeito que usa esse tipo de linguagem é o financiador do Intercept, cujas reportagens sobre mensagens vazadas de Sergio Moro e Deltan Dallagnol recorrem, só para dar um exemplo da militância, a termos assim: “Os diálogos revelados pelo Intercept mostram que a Lava-Jato desfilava como uma deusa grega da ética na sociedade, mas atuava à margem da lei na alcova”. “O processo foi corrompido, comprometendo o julgamento das instâncias superiores. Qualquer interpretação diferente dessa está fadada ao ridículo e cairá na lata de lixo da história.”

O que Omidyar acharia disso como exemplo de texto que contribui para “fortalecer o jornalismo” e aumentar a confiança do público?

São atividades jornalísticas completamente diferentes divulgar mensagens vazadas, mesmo que tenham origem criminosa, e fazer campanha declarada e cerrada contra Moro e Dallagnol, com o objetivo de anular julgamentos de conhecidos condenados.

Sem falar nos conflitos de interesses. Como o Intercept cobriria, com os recursos infinitos propiciados por Omidyar, vazamentos comprometedores para o PT e o PSOL feitos pelo marido jornalista de um deputado do PSL? Tendo o mesmo deputado chegado ao cargo como suplente, via saída do país do titular por medo de ameaças de morte?

E será que Omidyar dorme o sono dos justos em sua casa encantada numa praia no Havaí sabendo da contribuição ativa que está dando para a impunidade dos responsáveis por uma rede de corrupção que se espalhou do Brasil para países vizinhos, sugando os recursos dos mesmos pobres de sempre?

“Vocês devem ter notado que gosto de voar abaixo do radar”, já disse o bilionário sobre sua aversão a aparecer. A turma que ele está ajudando também gostava.

Texto de Vilma Gryzinski.

Para concluir:

sábado, 6 de julho de 2019

A CERTEZA DA REVISTA VEJA SOBRE A PARCIALIDADE DE SÉRGIO MORO NÃO É FATO INCONTROVERSO, MAS SIM OPINIÃO; PORTANTO, NÃO É JORNALISMO, MAS SIM TORCIDA.



Depois de repercutir como verdadeiras as conversas atribuídas a Sérgio Moro e procuradores da Lava-Jato, a Folha reconheceu em editorial que elas podem ser falsas e criminosas — e “podem”, no vocabulário da Folha, significa “são”. Para quem não se lembra, antes das últimas eleições a Folha denunciou o “escândalo do WhatsApp”, sugerindo que Bolsonaro fazia campanha ilegal; semanas após o resultado da eleição, reconheceu que não havia nenhuma prova que sustentasse o que ela mesma havia publicado.

O que há de incontroverso no monumental imbróglio produzido pelo site esquerdista The Intercept Brasil ou “The Interpret”, como Alexandre Borges chama ironicamente o site ultraesquerdista de Glenn Greenwald —, que anunciou um tiro de bazuca e deu um tiro de festim (a montanha pariu um rato, ou melhor, uma ninhada de ratos, todos petistas, naturalmente) — é o alto grau de parcialidade de suas matérias, compradas e revendidas por outros veículos de comunicação que, a não ser em seus editoriais, deveriam se limitar a informar o leitor, e não a torceu ou tomar partido.

Observação: O que se vê não é um trato jornalístico sincero, imparcial e factual, mas uma montagem tendenciosa, feita pelo americano militante Glenn Greenwald e seus esbirros, visando encaixar as supostas conversas comprometedoras em sua moldura pré-definida de grande conluio contra a autoproclamada alma viva mais honesta do Brasil”, como fica claro nesta matéria.

Parece não haver limites para o caradurismo de Veja, que agora se aliou ao time de pseudodefensores da imparcialidade na condução de processos judiciais e julgamentos de criminosos (siga este link para conferir a matéria de capa da edição desta semana). Causa espécie essa mudança de postura  como também a de Gilmar Mendes, o divino, que foi um dos maiores defensores da prisão após condenação em segunda instância e de uns tempos a esta parte passou a soltar condenados a torto e a direito, a pretexto de travar uma batalha contra as prisões preventivas excessivamente alongadas e outras supostas irregularidades cometidas no âmbito da Lava-Jato. Mas isso já e outra conversa.

Sobre a matéria veiculada por Veja, o ministro reafirmou que não reconhece a autenticidade de supostas mensagens obtidas por meios criminosos e que podem ter sido adulteradas total ou parcialmente, lamentou que reportagem tenha se recusado a encaminhar cópia do material antes da publicação e tenha condicionado sua apresentação à concessão de uma entrevista, o que considerou impróprio. Para mais detalhes, clique aqui.

Dias atrás, em entrevista ao site SUL 21, Lula, o picareta dos picaretas, teve a cara-de-pau de dizer que Moro deveria se afastar do cargo por conta da divulgação das revelações de Greenwald e seus vassalos. Segundo ele, o ex-juiz "está se transformando em um boneco de barro" e, tal como Dallagnol, deveria “mostrar que é um homem decente entregando o celular dele à Polícia Federal, que é subordinada a ele”. Vale lembrar que Lula jamais considerou Moro um homem decente, e que o hoje ministro, nas audiências em que participou na Câmara e no Senado, afirmou ter entregado seu telefone à PF para perícia após ser alvo de uma tentativa de ataque hacker.

Também dias atrás, a defesa do petralha, comandada pelo advogado Cristiano Zanin Martins, pediu ao STF a suspensão do terceiro processo contra seu cliente na JF do Paraná, que está prestes a ser julgado pelo juiz Luís Antônio Bonat, que assumiu o lugar de Sérgio Moro à frente da 13ª Vara Federal do Paraná, em Curitiba. Com o desespero batendo às portas — como se depreende dos mais de 60 recursos baseados na suposta parcialidade de Moro —, o advogado engomadinho de Lula sustenta que a defesa não teve acesso ao acordo de leniência firmado entre a Odebrecht e o MPF. Bonat deve decidir sobre essa chicana após ouvir o MPF e a Odebrecht e, na sequência, proferir a sentença.

Em outra frente, Zanin afirma que Leo Pinheiro, cujo depoimento foi considerado peça-chave para a condenação de Lula no caso do tríplex, “fabricou uma versão para incriminar se cliente em troca de benefícios negociados com procuradores". Em carta escrita de próprio punho e enviada à Folha, porém, o ex-presidente da OAS reiterou que não foi coagido a coisa alguma. Pelo visto, sem elementos sólidos que fundamentem suas chicanas, resta ao criminalista recorrer ao jus sperniandi.

Observação: A carta de Leo Pinheiro é devastadora para Lula e para a própria Folha, pois desmonta a reportagem do último domingo, fabricada a partir das mensagens roubadas à Lava-Jato e repassadas pelo Intercept. Pinheiro reafirmou o pagamento de propinas ao ex-presidente: “Preciso dizer que as reformas não foram um presente. Os empreendimentos da Bancoop assumidos pela OAS apresentavam grandes passivos ocultos, com impostos, encargos que não deveriam ser assumidos pela OAS. Em paralelo, João Vaccari cobrava propina de cada contrato entre OAS e Petrobras. Combinei com Vaccari que todos os gastos do triplex e sítio seriam descontados da propina. Repito, esse encontro de contas está provado por uma mensagem minha trocada na época dos fatos, devidamente juntada no processo e ainda pelo depoimento do diretor da empresa. (...) As obras do sítio e no triplex tinham custos relevantes e eram devidamente contabilizadas. Documentos internos da OAS provaram no processo que as despesas das duas obras eram lançadas em centros de custos próprios, com uma referência ao ex-presidente (Zeca Pagodinho) e as divisões ‘praia’ e ‘sítio’”. Tudo isso foi corroborado por inúmeras provas materiais — planilhas, emails, ordens de pagamento -, encontradas pela PF e anexadas ao processo. Ademais, outros delatores, não citados nas mensagens apresentadas pela Folha, confirmaram o relato de Léo Pinheiro. Se o objetivo da reportagem era fornecer elementos para a defesa de Lula, a Folha quebrou a cara.

Em 2013, quando começou a advogar para a famiglia Lula da Silva, Zanin era mais um entre centenas de advogados endinheirados de São Paulo a usar ternos caros e circular em carros importados pelas ruas dos Jardins. “Engomadinho demais”, disse Lula a Roberto Teixeira — seu compadre e hoje parceiro de acusações na Lava-Jato —, quando este lhe indicou o criminalista como interlocutor para assuntos jurídicos. O primeiro caso importante que Zanin assumiu na famiglia foi o do passaporte diplomático concedido a Luís Cláudio Lula da Silva, e a partir daí sua proximidade com o capo di tutti capi  aumentou na mesma proporção que a ficha criminal do ex-presidente. De “engomadinho”, o criminalista passou a ser tratado por “Cris”, e é nele que o petista aposta suas fichas para deixar a cadeia — como apostou para disputar a presidência nas eleições de 2018.

Voltando ao que eu dizia sobre o desespero bater à porta, reportagem da revista IstoÉ dá conta de que, depois de visitar Lula na cadeia, em maio, ex-ministro da Fazenda Luiz Carlos Bresser-Pereira tuitou que o ex-presidente estava “em ótima forma física e psíquica” e que tencionava se casar quando saísse da prisão. Muita gente acreditou nessa balela, e logo os holofotes se voltaram para a socióloga Rosângela Silva, a Janja, com quem Lula namorava alegremente na cela da PF do Paraná. Agora, porém, sabe-se que a felicidade era farsesca, e que o presidiário mais famoso do Brasil está desesperado: há 14 meses atrás das grades, o petista receia apodrecer na cadeia depois que o STF rejeitou a liminar que o colocaria em liberdade e adiou para agosto o julgamento do mérito do habeas corpus. “Bateu o pânico em Lula”, dizem amigos próximos ao ex-presidente. E razões para isso não faltam, já que a qualquer momento o juiz Bonat pode sentenciá-lo a mais 12 anos de prisão.

O pedido da defesa para que as “conversas tóxicas” atribuías a Moro e Dallagnol fossem incluídas no pedido de soltura de Lula pode se tornar um tiro no pé. A prevalecer o FUMUS BONI IURIS, o material obtido por meios criminosos e cuja autenticidade não foi comprovada será considerado imprestável como prova e não podar ser levado em consideração pelas supremas togas, sem mencionar que o entendimento de que as supostas conversas comprometeriam a imparcialidade de Moro e sua atuação nos processos contra Lula é, no mínimo, controverso. Sabe-se que os ministros Fachin e Cármen Lúcia são contrários a soltura do petralha, e que Mendes e Lewandowski são a favor. Resta saber como se posicionará o decano Celso de Mello, que no último dia 25 votou contra a concessão da espúria liminar proposta por Gilmar, que, se acolhida, concederia liberdade ao paciente até que o do HC fosse julgado.

Na semana passada, Dias Toffoli disse que fechou a pauta do ano e a rediscussão da prisão após condenação em segunda instância não foi contemplado. “Pode até haver uma janela para discutir o tema, mas ele não está na pauta”, disse o presidente da Corte, que parece propenso a deixar a questão para 2020, botando mais água no chope da petralhada. Vale lembrar que Lula já foi condenado em terceira instância no caso do tríplex, restando-lhe apenas acalentar a esperança de obter o direito à prisão domiciliar, já que, por questões de logística e de segurança, o regime semiaberto não é uma opção.

Observação: A morosidade da Justiça brasileira é desalentadora. Para piorar, mesmo condenado em dois processos e respondendo a outros oito, Lula é considerado réu primário até que pelo uma das sentenças condenatórias transite em julgado. No Brasil, a primariedade é ligada ao processo, e não à realidade, à reiteração criminosa. Para alguns togados supremos isso é homenagear a Constituição, mas na verdade esse entendimento favorece a impunidade e permite que políticos e empresários corruptos paguem milhões em honorários a criminalistas estrelados (com o dinheiro da corrupção, o que só agrava o quadro) para, mediante apelos, recursos, embargos e toda sorte de chicanas protelatórias, eternizar a tramitação dos processos.

Também é esperado para os próximos meses a decisão do TRF-4 sobre os recursos interpostos pelas partes no caso do sítio em Atibaia. Em fevereiro, a juíza substituta Gabriela Hardt condenou o ex-presidente a 12 anos e 11 meses de prisão — e o MPF pediu o aumento da pena. O destino do molusco está nas mãos do desembargador João Pedro Gebran Neto, que, no julgamento do tríplex, foi o responsável por aumentar da pena do petista de 9 anos e 6 meses para 12 anos e 1 mês. Assim sendo, ainda que consiga a hipotética liberdade em agosto, Lulalalau voltará para a cadeia tão logo sua condenação seja confirmada pelo TRF-4, e pode ficar por lá até completar 86 anos, caso o diabo não requisita sua imprestável alma antes disso.

Para entender melhor essa merdeira, ouça o que diz Luiz Nassif:


Sobrando um tempinho, assista ao vídeo a seguir: