Contrariando as expectativas, mas fiel ao hábito de tomar
decisões que causam "frisson"
na mídia, Bolsonaro indicou com dez
dias de antecedência o substituto de Raquel
Dodge no comando da PGR —
instituição cuja importância o capitão já comparou com a da Rainha no jogo de Xadrez.
Ainda é cedo para dizer qualquer coisa além do nome do subprocurador
— Augusto Aras —, que ele não foi
pinçado da "listra tríplice" do Ministério Público e que a indicação parece
ter agradado mais aos petistas que à ala pró-Bolsonaro.
Segundo Josias de
Souza, desconsidera-se o fato de que, para prevalecer no intrincado
processo de escolha, Aras teve de
assumir compromissos que tornam seu hipotético petismo um problema secundário.
O que mais inquieta são as roldanas que o futuro procurador-geral traz
implantadas na cintura. Aras gira
conforme a conveniência, e tamanha maleabilidade política atiça os ânimos da
corporação dos procuradores num instante em que atual chefe da
Procuradoria-Geral enfrenta uma debandada: como eu comentei postagens atrás, o
staff criminal da PGR exonerou-se de
suas funções justamente porque farejou um odor de enxofre na movimentação da chefe
em fim de mandato.
Produzir insensatez é a marca registrada deste governo. Tem
sido assim há oito meses e assim será enquanto o capitão comandar esta nau de
insensatos. Entre suas mais recentes estultices está o vai-e-vem sobre o teto dos gastos — num dia, a revisão
do teto é um imperativo matemático, na manhã seguinte, o recuo nas redes
sociais. Outra é garantir que não vetaria senão o artigo que proíbe policiais de algemar presos, para logo depois admitir que as acolheria 9 das 10 sugestões apresentadas por Sérgio Moro. A
partir daí, a quantidade de vetos foi aumentando na proporção direta da
aproximação do vencimento do prazo. Num dia, o presidente disse que acolheria
todos os dez vetos; no dia seguinte, o cesto de vetos saltou para "quase
20"; na última quinta-feira, vetou 36 artigos de 19 dispositivos da lei.
Observação: Bolsonaro diz que seguiu orientações do seu centrão, um bloco de ministros que
inclui o ex-juiz da Lava-Jato. Quem
quiser que acredite. Em verdade, o presidente evoluiu em cena com a orelha
encostada no asfalto e os olhos grudados nas redes sociais. Notou que o passeio
pelo lado obscuro da política pode sair caro. A desfaçatez tem um custo. Para
que o capitão se reconcilie com seu discurso, falta tomar distância do filho
01, reacender as luzes do ex-Coaf e
abandonar o papel de estorvo da PF e do Fisco.
Incoerências assim que sugerem que o presidente — que,
durante a campanha, prometeu acabar com a reeleição — está mais preocupado com
as urnas do que com os cofres públicos. Aclamado pelos bolsomínions, que aplaudem tudo que ele diz com a beatitude retardada dos idiotas, o capitão infla seu ego gigantesco e se vê como um César contemporâneo, a quem basta apontar o polegar para baixo para transformar adversários, desafetos e inimigos reais e imaginários em comida de leão.
A três longos anos da próxima disputa presidencial, Bolsonaro e Dória estão em plena campanha. Unidos pelas correntes do antipetismo explícito em 2018, eles assim permaneceram até algum tempo atrás, quando sinais de distanciamento assomaram no horizonte, sobretudo pela dificuldade de o tucano se colocar como candidato sem antagonizar o atual presidente. Em junho, fizeram lado a lado uma demonstração de flexão de braço durante evento na zona sul de São Paulo; dias atrás, trocaram farpas pelas redes sociais.
A três longos anos da próxima disputa presidencial, Bolsonaro e Dória estão em plena campanha. Unidos pelas correntes do antipetismo explícito em 2018, eles assim permaneceram até algum tempo atrás, quando sinais de distanciamento assomaram no horizonte, sobretudo pela dificuldade de o tucano se colocar como candidato sem antagonizar o atual presidente. Em junho, fizeram lado a lado uma demonstração de flexão de braço durante evento na zona sul de São Paulo; dias atrás, trocaram farpas pelas redes sociais.
Bolsonaro chamou Doria de "ejaculação precoce"; Doria respondeu que foi criticado da
mesma maneira pelo presidiário Lula quando derrotou Haddad na disputa
pela prefeitura de Sampa em 2016. A primeira-dama de São Paulo, Bia Doria, disse que o capitão usa
"expressões chulas, que ferem e desrespeitam a família brasileira e a
importância do cargo que ocupa". Na mesma linha seguiu o ex-pesselista recém-convertido
a tucano Alexandre Frota: “O presidente é a broxada do ano e quer falar
de ejaculação precoce? Ele fantasia muito, tipo masturbação política”,
disse o deputado à Folha.
Bolsonaro, com
ciúmes da popularidade de Sérgio Moro — a quem ofereceu o ministério da
Justiça para agregar credibilidade à sua promessa de combater implacavelmente a
corrupção e os corruptos —, passou a ver no ex-juiz da Lava-Jato uma ameaça a sua reeleição. Moro, por sua vez, vive um inusitado paradoxo: popularíssimo na
sociedade, tornou-se impopular no gabinete do presidente da República, cujo
prestígio declina. Segundo o Datafolha,
a taxa de aprovação do ministro é 25 pontos maior do que a do chefe.
Governos em geral costumam ter um excesso de cabeças e
carência de miolos; o de Bolsonaro
em particular sofre do mesmo mal, só que opera com uma cabeça só. O capitão é o
tipo de político que segue a teoria da palmeira única, que não aceita a ideia
de dividir o gramado com outra palmeira, sobretudo se ela tem quase o dobro do
seu prestígio. E da inveja para o medo é um pulinho que pode transformar
neurose em realidade. Até outro dia, o sonho de Moro era fazer um bom trabalho no ministério e ganhar uma poltrona
no STF. Escanteado pelo chefe, passa
a enxergar na política sua melhor alternativa.
A mesma pesquisa que exibe a invejável popularidade do
ministro da Justiça dá conta de que outros ministros de Estado suplantam o em
popularidade. Paulo Guedes cravou
38% de aprovação, e Tarcísio de Freitas,
36%. No momento, além de ser um sub-Moro, Bolsonaro está empatado
com o ministro das queimadas, Ricardo
Salles (30%), e com o ministro do marxismo cultural, Abraham Weintraub (29%). Talvez fizesse um bem a si mesmo se
esquecesse 2022 e se concentrasse no essencial, que é a recuperação da
economia.