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sexta-feira, 6 de setembro de 2019

PEC DA PREVIDÊNCIA, JUDICIÁRIO, PGR, RAQUEL DODGE, LEI DE ABUSO DE AUTORIDADE, RENÚNCIA DE PROCURADORES EM BLOCO E O ORGULHO DE SER BRASILEIRO



Chamar este pobre país de "banânia" é elogiar, mas, convenhamos, seria deselegante (embora não totalmente impróprio) tratá-lo de "país de merda". Questões semânticas à parte, fato é que nossa "Pátria Amada, Brasil" perdeu em abril deste ano a 7ª posição no ranking das principais economias mundiais (que vinha mantendo desde 2005) e já nem figura mais entre as 29 nações mais ricas da lista do Business Insider. O "País do Futuro (que nunca chega)" tem os impostos, os juros, os automóveis, os pedágios, o combustível e a energia elétrica mais caros do mundo.

Como se não bastasse, o "Gigante Adormecido" (deitado eternamente em berço esplêndido) tem os políticos mais corruptos do mundo e é presidido atualmente pelo chefe de governo mais irracional do mundo, que acontece de ser também o mais impopular entre todos os que ocuparam esse cargo desde a redemocratização do "País do Futebol". E com a recente alta do dólar, nosso povo sofrido já nem pode mais ir à Disney conhecer o Pateta. Felizmente, basta ir a Brasília ou entrar nas redes sociais para ver vários.

A coisa fica ainda pior quando se foca a Justiça nesta terra de ninguém. Além de cega, essa senhora é surda e, não raro, corrupta: sobram "causos" de venda de sentenças envolvendo não só juízes de primeira instância, mas desembargadores e ministros das Cortes superiores. Claro que daí até suas meritíssimas excelências serem processadas, jugadas, condenadas e encarceradas vai uma longa distância.

Observação: Entre uma miríade de exemplos notórios, relembro o caso do desembargador Ivan Athié, presidente da 1ª Turma do TRF-2, que em março passado mandou soltar o Vampiro do Jaburu e seu comparsa, coronel Lima (para detalhes da vida pregressa do "Limão", como o policial militar reformado gosta de ser tratado, clique aqui). Athié  ficou afastado do cargo durante sete anos, devido a uma ação no STJ por estelionato e formação de quadrilha (em 2004). Um inquérito contra ele, com as mesmas acusações, foi arquivado em 2008 pelo STJ a pedido do MPF, que alegou não ter encontrado provas de que o desembargador tivesse proferido sentenças em conluio com advogados. O magistrado retornou às atividades em 2011, depois que o STF trancou a ação contra ele.

Falando em patacoadas, a usina de crises de plantão no Planalto criou mais um "mal estar internacional" ao criticar a ex-presidente do Chile e atual comissária da ONU para direitos humanos, Michelle Bachelet. Em pronunciamento sobre o governo brasileiro, Bachelet afirmou que observou "uma redução do espaço cívico e democrático, caracterizado por ataques contra defensores dos direitos humanos, restrições ao trabalho da sociedade civil e ataques a instituições de ensino”, e que, "desde 2002, o Brasil é um dos cinco países do mundo com o maior número de assassinatos de ativistas de direitos humanos".

Fiel ao seu estilo "bateu, levou", Bolsonaro devolveu: “Ela está acusando que não estou punindo policiais que estão matando muita gente no Brasil. Essa é a acusação dela. Ela está defendendo direitos humanos de vagabundos. Ela critica dizendo que o Brasil está perdendo seu espaço democrático. Senhora Michelle Bachelet, se não fosse o pessoal do Pinochet derrotar a esquerda em 73, entre eles seu pai, hoje o Chile seria uma Cuba. Eu acho que não preciso falar mais nada para ela”.

Cá entre nós, eu acho que a repercussão midiática — como de praxe — foi muito além do comentário do capitão, talvez pelo fato de ele ter citado nominalmente o pai de Michelle, general Alberto Bachelet, que foi torturado e morto durante a ditadura de Augusto Pinochet. Mas remexer nos escaninhos da história chilena não é bem a minha praia, e não convém ao sapateiro ir além das chinelas.

Voltando ao cenário jurídico-político tupiniquim, os ex-governadores do Rio, Anthony Garotinho e Rosinha Mateus, presos dias atrás com outros três suspeitos de participar de um esquema de superfaturamentos em contratos celebrados entre a Prefeitura de Campos dos Goytacazes (município fluminense do qual ambos foram prefeitos) e a construtora Odebrecht, foram soltos depois de passarem uma única noite na cadeia, graças à pronta intervenção do desembargador Siro Darlan, que lhes concedeu o habeas corpus durante o plantão judiciário na 7ª Câmara Criminal do TJ-RJ.

Além de ter carreira marcada por decisões controversas e de grande repercussão, Darlan é alvo de inquérito no STJ, que apura a venda de sentenças no fórum da capital. Antes de ser nomeado desembargador, em 2004, ele comandou, por mais de uma década, a 1ª Vara da Infância e da Juventude do Rio. Muitas de suas decisões geraram polêmicas. Como desembargador, em 2013, concedeu habeas corpus a sete dos nove envolvidos na invasão ao Hotel Intercontinental, em São Conrado, em 2010, quando o bando, armado com fuzis, pistolas e granadas, manteve 35 reféns, entre funcionários e hóspedes, por três horas. Na ocasião, uma pessoa morreu e seis ficaram feridas. Entre os beneficiados estava Rogério 157, que assumiu o comando do tráfico na Rocinha após a prisão do traficante Nem.

Em dezembro do ano passado, O GLOBO publicou que Darlan é suspeito de soltar presos durante plantões judiciais em troca de propina. Em dois casos investigados, detentos teriam sido beneficiados por decisões do desembargador. Num deles, foi anexada a colaboração premiada de um dos envolvidos, que afirmou ter ouvido de um dos presos sobre o pagamento a um intermediário do magistrado: R$ 50 mil para ser solto. Inicialmente, segundo o delator, o lance foi de R$ 120 mil, mas caiu para menos da metade dividido em duas parcelas.

Passando às boas notícias — se é que ainda as temos neste país: A CCJ do Senado não só aprovou, por 18 votos contra 7, relatório do senador Tasso Jereissati sobre a PEC da Previdência, como rejeitou os oito destaques apresentados para alterar o parecer do relator. A PEC paralela também foi aprovada em votação simbólica e por unanimidade. O texto principal segue para o plenário do Senado e, se aprovado, será promulgado. O ganho fiscal chegará na R$ 962 bilhões, mais R$ 350 bilhões se a PEC paralela for aprovada na Câmara e os estados e municípios aderirem à proposta que altera as regras da aposentadoria.

Bolsonaro anunciou ontem que deve acolher integralmente as sugestões de vetos do ministro da Justiça ao texto da Lei de Abuso de Autoridade, aprovada a toque de caixa, dias atrás, pelo Congresso. Segundo o portal G1, o capitão efetivamente votou 36 trechos de 19 artigos. Apesar dos esforços de Verdevaldo da Couves, da imprensa marrom (ou seria vermelha?), dos corruptos que pululam no Congresso e da banda podre da alta cúpula do Judiciário, Sérgio Moro continua muito popular, com 25 pontos de aprovação acima do presidente.

Por outro lado, segue envolta em brumas a nomeação do próximo Procurador-Geral da República (o mandato da atual termina no próximo dia 17). Há uma pressão política dos presidentes da Câmara e do Senado para que Raquel Dodge seja reconduzida ao cargo, o que desagradou membros da força-tarefa da Lava-Jato que atuam no DF, onde as coisas andam muuuuuuito mais devagar do que em Curitiba — até hoje, nenhum político com foro privilegiado foi mandado para a cadeia pelos 11 togados supremos, sem mencionar que a delação de Leo Pinheiro, da OAS, está parada há mais de um ano e outros processos e delações estão embolorando nos escaninhos da PGR.

Atualização: no finalzinho da tarde de ontem, o Augusto Aras foi escolhido pelo presidente para suceder a Raquel Dodge no comando da PGR. O subprocurador baiano tem 60 anos de idade e foi apadrinhado pelo ex-deputado federal Alberto Fraga, que é um dos políticos mais próximos de Bolsonaro. Aras era bem contado, mas caiu na bolsa de apostas depois que a imprensa divulgou que ele já defendeu o MST (em discurso na Câmara, em 2008) e promoveu jantares para petistas. Pelo mesmo motivo, enfrentou resistências no PSL, mas procurou parlamentares da legenda que têm proximidade com o capitão para tentar reverter o quadro. Funcionou. Sua indicação ainda precisa ser chancelada pelo Senado, mas o que importa mesmo é saber se foi uma boa escolha, considerando que a Lava-Jato e o combate à corrupção dependem diretamente da PGR  que o o próprio Bolsonaro comparou recentemente à Rainha no jogo de Xadrez

Na última quarta-feira, os procuradores Raquel Branquinho, Maria Clara Noleto, Luana Vargas, Hebert Mesquita, Victor Riccely e Alessandro Oliveira, integrantes da força-tarefa da Lava-Jato em Brasília, pediram demissão em bloco, alegando divergências de posicionamento com Raquel Dodge. Em nota, o grupo afirmou que o desligamento se deve a uma “grave incompatibilidade de entendimento dos membros da equipe” com a manifestação enviada pela PGR ao STF no dia anterior, quando Dodge pediu arquivamento preliminar de trechos do acordo de colaboração de Léo Pinheiro em que foram citados Rodrigo Maia e Ticiano Dias Toffoli, irmão ministro supremo Dias Toffoli.

Ao que parece, depois que a 2ª Turma do Supremo, decisão de anular a sentença do então juiz Sérgio Moro no caso do ex-presidente petista do BC e da Petrobrás, Aldemir Bendine, e devolver os autos à primeira instância, a Lava-Jato resolveu partir para a guerra. Para entender melhor esse imbróglio, convém ouvir que entende do assunto:

sexta-feira, 16 de agosto de 2019

A LAVA-JATO TORPEDEADA E A DISPUTA PELO COMANDO DA PGR


Só mesmo numa republiqueta de bananas que um expoente do que há de pior na política, réu em uma dezena de ações criminais e que continua solto porque a atual composição do STF é a mais medíocre de toda a história da Corte, ousa pedir a cabeça do coordenador da maior operação anticrime e anticorrupção da história e, o que é pior, tem chances reais de ser atendido.

Falo de Renan Calheiros, o cangaceiro das Alagoas, autor do projeto de medidas contra o abuso de autoridade, aprovado da última quarta-feira pela Câmara e, como já fora aprovado no Senado, segue agora para sanção presidencial. Trata-se de uma proposta oportunista, requentada a partir de um projeto apresentado em 2009 pelo então deputado Raul Jungmann, que nada tinha a ver com a Lava-Jato — que, à época, sequer existia. 

A ideia, então, era atualizar a legislação para conter os abusos de qualquer autoridade pública, mas o que levou essa proposta a ser desengavetada dez anos — e ser aprovada a toque de caixa, em votação secreta — é a motivação que importa nos dias de hoje: controlar a Lava-Jato, defender os congressistas de maneira geral e Renan, em particular. Da forma como foi aprovado, o texto retira da legislação seu caráter de proteção geral dos cidadãos e transforma o projeto em mero instrumento de bloqueio da ação dos órgãos de investigação e acusação, como o Ministério Público e a Receita Federal, além de constranger juízes.

Em cinco anos de existência, a Lava-Jato contabilizou 2.252 anos, 4 meses e 25 dias de condenações para 159 réus (veja mais números na figura ao lado). Mas nem tudo são flores nesse jardim. No entanto, desde que foi deflagrada, em 17 de março de 2014, ela vem sendo bombardeada por todos os lados. De alguns meses a esta parte, vazamentos espúrios de mensagens supostamente trocadas entre o ex-juiz Sérgio Moro e o coordenador da força-tarefa em Curitiba, Deltan Dallagnol, e deste com outros procuradores, vêm fornecendo farta munição para a banda podre do Congresso e do Judiciário. 

Diante de reportagens segundo as quais ministros do STF estariam pressionando Raquel Dodge para afastar Dallagnol, a PGR, em nota, disse que o procurador tem garantia constitucional de não ser afastado dos processos da Lava-Jato, dos quais é o promotor natural, atuando em conjunto com os demais membros da força-tarefa designados pela procuradoria-geral. No último dia 12, Dodge prorrogou por mais um ano o "prazo de validade" da operação — que acabaria no mês que vem, quando se encerra também o mandato de Dodge, caso o presidente não a reconduza ao cargo.

A cada dois anos, a Associação Nacional de Procuradores da República faz uma eleição em que cerca de 1.300 procuradores votam naqueles que mais gostariam que comandasse a PGR. Os três nomes mais votados são submetidos ao presidente da República, que geralmente escolhe o primeiro da lista, embora não seja obrigado a tal (ao indicar Raquel Dodge, o ex-presidente Temer optou pelo segundo nome, mas isso agora não vem ao caso), podendo até mesmo indicar um procurador que não esteja incluído nessa lista tríplice. Bolsonaro está indeciso, tendo mesmo afirmado que o cargo do chefe do MPF é mais importante que o seu próprio, e que é preciso escolher o candidato cujo perfil atenda várias exigências — e que não seja barrado, depois, pelo Senado, a quem compete chancelar a indicação presidencial. 

Observação: Na lista deste ano, os três procuradores mais votados são Mário Bonsaglia, Luíza Frischeisen e Blal Dalloul. Dodge preferiu não disputar a eleição e tentou se cacifar junto ao governo, mas especula-se que Bolsonaro descartou reconduzi-la ao cargo para um segundo mandato depois que ela pediu providências em relação a zero três, que o papai presidente quer porque quer nomear para a embaixada do Brasil nos Estados Unidos.

Voltando à Lava-Jato, o próximo dia 27 pode ser decisivo para a sobrevivência da operação. Nesse dia, a 2ª Turma do STF vai retomar o julgamento do habeas-corpus do presidiário de Curitiba. Como a ministra Cármen Lúcia acompanhou o voto do relator, Edson Fachin, contrário ao pedido da defesa do ex-presidente ladrão, e considerando como deverão votar Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski, o decano Celso de Melo deverá ser o fiel da balança. Façam suas apostas (e suas orações). Paralelamente, o CNMP deverá julgar a tentativa de reabrir um processo disciplinar contra Deltan Dallagnol, e a coincidência dos dois julgamentos pode ser explosiva, caso os resultados sejam percebidos pela opinião pública como uma tentativa de frear a força-tarefa.

No julgamento do HC de Lula, a alegação da defesa é a suposta parcialidade do então juiz Sérgio Moro, mas o recurso foi apresentado antes de Verdevaldo das Couves e seu Interpret entrarem em ação. A defesa do petralha apensou o material espúrio aos autos do processo, como a lembrar os ministros de sua existência — como os arquivos digitais foram obtidos de maneira ilegal e não foram periciados, eles "não estão nos autos e, portanto, não estão no mundo", como se costuma dizer nos meios jurídicos. Isso significa que não possível usar essa suposta "troca de mensagens tóxicas" para embasar um pedido de anulação do julgamento que condenou o molusco repulsivo. Mesmo assim, diz Merval Pereira, "eles pairam sobre as cabeças dos ministros como almas do outro mundo, que não existem, mas assustam", e, portanto, podendo ou não ser usados no julgamento, eles têm potencial para contaminar a decisão dos magistrados.

O caso envolvendo Dallagnol é igualmente preocupante. A representação formulada pelos conselheiro Leonardo Accioly, Eric Venâncio, Luiz Fernando Bandeira de Mello e Gustavo Rocha se baseia nos diálogos publicados, e foi arquivada monocraticamente pelo corregedor Rochadel pelo fato de serem imprestáveis como prova. Acontece que Accioly e Venâncio pediram a reabertura do caso, para que o plenário decida. O parecer do relator será apresentado no dia 27, quando também será votado pelo Conselho de 12 membros, 6 dos quais são do Ministério Público.

Ainda segundo Merval, tudo indica que não há maioria para punir Dallagnol, mas alguns membros do Conselho terão que se submeter ao Senado para renovação dos mandatos, e esse pode ser um fator de pressão ponderável, já que o Congresso, a OAB, e o STF estão mancomunados para frear a Lava-Jato, e todos eles têm representantes no Conselho. Os próprios membros do Ministério Público decidirão sob forte estresse. Processos disciplinares podem resultar em punições que vão de advertência a expulsão do Ministério Público, mas é possível que, no caso de Dallagnol, a coisa não vá além de uma simples advertência. A questão que possível não quer dizer provável.   

Dallagnol e seus companheiros de Curitiba vêm ressaltando a importância da opinião pública à Lava-Jato para frear a ação da banda podre do Congresso e do Judiciário. Está sendo convocada para o próximo dia 25 uma manifestação nacional de apoio a Sérgio Moro e a Dallagnol, e contra a libertação de Lula. Ao mesmo tempo, há um movimento no Senado para abrir uma CPI já apelidada de Lava-Toga. Como a atribuição de processar togados supremos é dos senadores, essa é uma reação política que visa contrabalançar a pressão contra Moro e os procuradores de Curitiba.

O ex-juiz da Lava-Jato continua sendo o ministro mais popular do atual governo, e o coordenador da força-tarefa em Curitiba, embora considerado pelo presidente “um esquerdista tipo PSOL”, tem apoio até de seus seguidores para ser indicado ao cargo de procurador-geral da República. Todavia, segundo os palpiteiros de plantão, Moro pediu a Bolsonaro que indicasse Dallagnol, mas o capitão teria se recusado. Em uma das mensagens divulgadas pelo Interpret e seus satélites, Dallagnol e os demais procuradores de Curitiba teria demonstrado falta de respeito pela autoridade de Raquel Dodge, que é próxima de Gilmar Mendes e desagrada os procuradores por não dar encaminhamento célere às delações premiadas, como fazia Rodrigo Janot. A delação de Leo Pinheiro, por exemplo, até hoje não foi encaminhada para o STF para homologação.

quinta-feira, 18 de julho de 2019

PIOR QUE ISSO, SÓ DOIS DISSO


Ao suspender até novembro todas as investigações baseadas em dados fiscais repassados pelo Coaf e pela Receita Federal ao MP sem autorização judicial, o presidente do supremo circo aperta o cerco (perdão pelo trocadilho) às investigações da Lava-Jato.

Outro desserviço ao combate à corrupção nos presta o corregedor nacional do Ministério Público, Orlando Rochadel Moreira, ao investigar  procurador Deltan Dallagnol, a pedido do PT, com base nas últimas revelações do site Intercept Brasil — ou seja, com base em provas ilícitas. Segundo O Antagonista, ao desconsiderar em sua decisão a ilegalidade da invasão dos celulares, Moreira abre a caixa de Pandora, pois trata como prova válida os diálogos e, baseando-se na versão publicada, pede explicações ao coordenador da Lava-Jato em Curitiba e outros integrantes da força-tarefa. Segundo essa sumidade, as conversas "revelariam que os citados teriam se articulado para obter lucro mediante a realização de palestras pagas e obtidas com o uso de seus cargos públicos", esquecendo-se, muito convenientemente, de que as palestras estão autorizadas pelo Conselho Nacional de Justiça e pelo próprio Conselho Nacional do Ministério Público.

Quando nada, isso serviu para despertar a Procuradora Geral da República, cujo mandato termina daqui a dois meses. Há tempos que Raquel Dodge andava meio “letárgica”, mas o episódio serviu para que ela despertasse para a vida e saísse em defesa da Lava-Jato (depois de uma reunião de mais de três horas com Dallagnol e um grupo de outros sete procuradores de Curitiba, Dodge declarou seu apoio à atuação deles na força-tarefa. Aliás, a inércia de Dodge e o fato de ela ter segurado delações como a de Leo Pinheiro levaram o procurador José Alfredo de Paula Silva, coordenador da Lava-Jato na PGR, pedisse demissão (na última sexta-feira).

Voltando a Toffoli, que parece nome de bala-puxa, mas não é, a liminar concedida no recurso do senador Flavio Bolsonaro, que está sendo investigado pelo MPF do Rio, abrange toda e qualquer investigação em andamento no país e, segundo o procurador Eduardo Al Hage, coordenador da Lava-Jato no Rio, atinge praticamente todas as apurações de lavagem de dinheiro. Ao suspender processos e inquéritos abertos com base em dados da Receita ou do Coaf, o todo-poderoso presidente do STF ignorou decisão do plenário da Corte, que, em 2016, confirmou a permissão de a Receita poder acessar informações bancárias sem autorização judicial.

O Ministério Público pede rotineiramente que seja feito o compartilhamento de dados para investigações, e a Lava-Jato tem trabalhado em sintonia com a equipe especial de fraudes da Receita Federal. O STF deveria ter analisado o caso em março, com repercussão geral, à luz de um recurso do MP contra decisão do TRF-3 (SP) que afirmou ser ilegal o uso de dados sigilosos em investigações sem autorização judicial. Mas Toffoli adiou o julgamento para novembro. Até lá, vale essa decisão monocrática — mais uma decisão funesta tomada durante um recesso do Judiciário; só para ficar nos exemplos mais recentes, em julho do ano passado o plantonista-petista do TRF-4, Rogério Favreto, mandou soltar o criminoso Lula; a segunda foi em dezembro, quando o ministro Marco Aurélio concedeu uma estapafúrdia liminar que, não tivesse sido prontamente cassada por Toffoli, resultaria a libertação de mais de 170 mil condenados em segunda instância que aguardam na cadeia o julgamento de seus recursos.

Toffoli reconhece que a jurisprudência do STF é a favor do compartilhamento sem necessidade de autorização judicial. Tanto que no início do ano considerou importante, reafirmada a jurisprudência, impor limites objetivos aos órgãos de fiscalização na transferência automática de informações sobre movimentação bancária e fiscal dos contribuintes em geral ao MP. O assunto voltou à baila recentemente, quando uma investigação sobre o ministro Gilmar Mendes vazou para órgãos de imprensa (ou semideus togado ficou indignado, e deve ser o terceiro ministro a votar contra o compartilhamento de dados sem autorização judicial; no julgamento anterior, em 2016, somente Marco Aurélio e Celso de Melo votaram contra, restando vencidos por 9 a 2).

O mesmo Toffoli que ontem suspendeu a permissão monocraticamente também votou a favor em 2016. Se permanecer essa proibição, as investigações sobre fraudes financeiras ficarão seriamente prejudicadas até novembro, quando o plenário deve julgar o caso definitivamente.

ATUALIZAÇÃOToffoli deve divulgar hoje uma nota oficial esclarecendo o alcance de sua decisão sobre o compartilhamento de provas em processos de investigação de crimes financeiros. Merval Pereira lembra que o ministro suspendeu todas as investigações no país, baseadas em dados financeiros entregues ao Ministério Público ou a Polícia Federal pelos órgãos de controle, como Coaf e Receita Federal, sem autorização judicial. Para mais detalhes, sigam este link e ouçam o comentário de Merval em sua participação no CBN Brasil desta quinta-feira.

Com Merval Pereira

domingo, 11 de novembro de 2018

SOBRE GILMAR MENDES, SÉRGIO MORO E O CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA



Gilmar Mendes, com sua inigualável soberba e vocação inata para laxante, tornou-se inimigo público dos cidadãos de bem e se transformou no “sonho de consumo” dos criminalistas estrelados que defendem bandidos do colarinho-branco em nossos tribunais superiores. Antes defensor ferrenho da prisão após condenação em segundo instância, o divino virou a casaca e, a pretexto de uma fantasiosa cruzada contra as prisões preventivas alongadas (sobretudo no âmbito da Lava-Jato), vem acolhendo toda sorte de pedidos de habeas corpus, notadamente de criminosos cuja prisão foi decretada pelo juiz federal Marcelo Bretas, responsável pelos processos da Operação no Rio de Janeiro. 

Como era de se esperar, seguiram-no outros integrantes do Jardim do Éden — apelido polo qual a segunda turma ficou conhecida pelos defensores de corruptos e corruptores do primeiro escalão depois que Mendes, Toffoli e Lewandowski passaram a emparedar sistematicamente o ministro Fachin, relator da Lava-Jato no Supremo. Para não chover no molhado, recomendo a quem interessar possa a releitura desta postagem e da seguinte.

Se volto a focar no dublê de magistrado e representante do Altíssimo neste Val de Lágrimas, é porque a procuradora-geral da República pediu no último dia 5 a suspensão das decisões que revogaram as prisões provisórias do ex-governador tucano do Paraná, Beto Richa, de investigados na operação Rádio Patrulha e de outras pessoas que pediram a extensão da medida. Na petição, a Raquel Dodge afirma que os habeas corpus foram analisados pelo ministro em decorrência de ter sido ele o relator da Arguição por Descumprimento de Preceitos Fundamentais 444, que resultou na proibição do instituto da condução coercitiva, e que, ao apresentar uma petição individual no âmbito da ADPF, Richa valeu-se de subterfúgios processuais para “escolher” o julgador.

Richa alegou que a medida, determinada em 1ª Instância, era, na verdade, condução coercitiva travestida de prisão temporária. Três dias após sua prisão, Gilmar Mendes mandou soltá-lo e soltar também os demais acusados na operação Rádio Patrulha — decisão que resultou, ainda, na proibição da condução coercitiva.

Para a PGR, a decisão viola o devido processo legal, pois o ministro relator reforçou que, sempre que julgar estar diante de prisão eivada de “manifesta ilegalidade ou teratologia”, conhecerá de novos pedidos de liberdade ajuizados diretamente nos autos da ADPF 444, o que, na prática, equivale a permitir que tal autoridade julgadora escolha os casos que apreciará, sejam eles oriundos de qualquer parte do país. Dodge disse ainda que a decisão impugnada não representa ato isolado de afronta ao devido processo legal e ao juiz natural, não se restringindo a macular, apenas, o procedimento no qual foi concedida a liberdade de Beto Richa, mas também de se apoiar em fundamento aplicável a inúmeros e incontáveis outros casos — a rigor, a todas as prisões provisórias do país que, na avaliação do ministro relator da ADPF 444, sejam manifestamente ilegais, o que equivale a destacar que o Mendes poderá ser o relator de todas elas, e que a ofensa aos princípios do devido processo legal e do juiz natural, bem como às regras de distribuição de competência, pode ser reiterada e constante. Demais disso, pediu o impedimento de Gilmar Mendes para analisar outros habeas corpus do caso, devendo tais recursos serem distribuídos aleatoriamente entre os ministros do STF.

Tanto a PGR quanto o Ministério Público do Estado do Paraná haviam recorrido da decisão, em 18 de setembro. O ministro Luiz Fux foi o escolhido para apreciar os 2 mandados de segurança contra habeas corpus concedido a Beto Richa. Em 5 de outubro, ao julgar os recursos, Mendes manteve a decisão anterior — pela liberdade dos investigados —, afirmando tratar-se de ordens de prisões “ilegais e teratológicas” (na ocasião, o irmão de Beto Richa, José Richa Filho, foi solto), e que eventuais pedidos que não tiveram relação com o objeto dos autos e que não tiverem indícios de ilegalidade ou teratologia não seriam acatados e seguiriam para distribuição.

Mudando de pato pra ganso: após visitar Lula na prisão, a presidente nacional da ORCRIM, Gleisi Hoffmann, afirmou que seu amado líder está bem, mas ficou indignado com a escolha de Sérgio Moro para o Ministério da Justiça e Segurança Pública. "Ao invés de apresentar prova contra mim, aceita ser ministro", teria dito Lula, nas palavras da dirigente petista. Até aí, nenhuma surpresa: Lula e sua curiola não veriam provas contra si e seu espúrio partido nem que elas saltassem e lhes mordessem a bunda. No entanto, veem no convite de Bolsonaro a Moro um plano sinistro, onde um juiz parcial, movido por interesses escusos, sentencia um ex-presidente inocente para depois ser galardoado com o prêmio vindo das mãos do arqui-inimigo do PT.

Não sei o que essa gente anda cheirando ou fumando, mas o efeito é devastador! Só que contra fatos não há argumentos, e alguns fatos retiram a credibilidade desse enredo, a saber: 1) a condenação de Lula pelo TRF-4; 2) as sucessivas derrotas de Lula nas cortes superiores; 3) a incerteza de vitória de Bolsonaro à época da condenação. Sustentar a narrativa petista também exigiria um notável descaramento. Até porque, se a nomeação para o STF de um advogado do PT, à época feita por Lula, não foi considerada parcial, como poderia sê-lo a nomeação de um juiz — que, processualmente, não representa a parte — para um cargo não-vitalício?

"Nós precisamos saber desde quando está feito este acerto entre Moro e Bolsonaro", questionou a indigesta Gleisi Hoffmann. "Nós reiteramos que o Conselho Nacional de Justiça paute a denúncia que fizemos como bancada, do vazamento do grampo com a presidenta Dilma, que impediu Lula de ser ministro". Já a defesa de Lula emitiu nota condenando a decisão de Moro de aceitar o convite de Bolsonaro para chefiar o futuro Ministério da Justiça e Segurança Pública. "A decisão de Moro prova 'definitivamente o que sempre afirmamos: Lula foi processado, condenado e encarcerado sem que tenha cometido crime, com o claro objetivo de interditá-lo politicamente'", diz o texto, citando ainda uma reportagem da Folha de S.Paulo em que o vice do presidente eleito, general Hamilton Mourão, declarou que o convite a Moro foi feito ainda durante a campanha eleitoral.

O PT pediu ao corregedor nacional de Justiça, ministro Humberto Martins, que Moro seja impedido de assumir outro cargo público até o CNJ concluir a investigação de sua conduta no episódio. Martins, determinou que o juiz federal apresente, no prazo de 15, esclarecimentos sobre sua indicação. Na última terça-feira (6), Moro afirmou que o convite para ser ministro nada tem a ver com o processo que envolve o ex-presidente Lula. A ação foi julgada por ele em 2017, quando não havia qualquer expectativa de que o então deputado Bolsonaro fosse eleito presidente.

Moro já afirmou que não "inventou" o depoimento do ex-ministro Antonio Palocci, que não houve de sua parte "qualquer intenção de influenciar as eleições gerais de 2018", e que, apesar das críticas de petistas, não pode pautar sua vida com base em fantasia, em álibi falso de perseguição política. "O ex-presidente Lula foi condenado e preso por ter cometido um crime. O que houve foi uma pessoa que lamentavelmente cometeu um crime e respondeu na Justiça", argumentou o magistrado, além de ressaltar que políticos de diversos partidos foram condenados no âmbito da Lava-Jato.

A conduta de Moro também é analisada no episódio da liminar concedida pelo desembargador Rogério Favreto, do TRF-4, que determinou a soltura de Lula durante o recesso de meio de ano do Judiciário. O corregedor marcou para 6 de dezembro os depoimentos de Moro, Favreto e dos desembargadores João Pedro Gebran Neto e Thompson Flores para tratar sobre o caso. Todos serão ouvidos no mesmo dia, em audiências separadas.

quarta-feira, 1 de agosto de 2018

PGR RECORRE DA DECISÃO QUE SOLTOU JOSÉ DIRCEU



Segundo o Estadão, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, recorreu, na última segunda-feira, 30, da decisão da 2ª Turma do STF que, no final de junho, mandou soltar ex-ministro José Dirceu. Como todos devem estar lembrados, o petralha foi condenado Lava Jato a 30 anos de prisão pelos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e participação em organização criminosa.

No documento, a procuradora-geral sustenta que o julgamento possui vícios relativos tanto às regras processuais quanto à fundamentação adotada na concessão do habeas corpus. A origem do pedido não foi um HC, mas uma petição apresentada ao relator após julgamento que indeferiu uma reclamação, o que deixa claro que o curso regimental foi totalmente atípico. Além disso, ela argumenta que houve omissão quanto ao contraditório e ao respeito ao devido processo legal, uma vez que o Ministério Público não foi intimado para se manifestar sobre a pretensão, e que a peça que sustentou a decisão — o acordão condenatório do TRF4 — nem sequer foi apresentado pela defesa para embasar o pedido.

Segundo Raquel Dodge, houve omissão quanto às regras de competência do STF para suspensão cautelar. De acordo com o Código de Processo Civil e as Súmulas 634 e 635 do Supremo, pedido com pretensão cautelar para a concessão de efeito suspensivo a recurso extraordinário é cabível quando a admissibilidade já tenha sido analisada pelo tribunal de origem, o que não ocorreu no caso de Dirceu. Além disso, ela registra que foi desrespeitada a Constituição Federal, que estabelece os casos em que o STF é competente para processar e julgar originariamente habeas corpus, e contesta as alegações contidas na reclamação apresentada pelo paciente — peça de apenas oito páginas, com elementos frágeis, como a argumentação de que o crime de corrupção passiva estaria prescrito.

Dirceu foi condenado pela prática de corrupção em cinco contratos. Nesse caso, conforme detalha a procuradora, a consumação do delito se deu entre 2009 e 2013, quando ocorreu o recebimento das vantagens indevidas, e não no momento da assinatura dos contratos, como sustentou a defesa. Também não houve erro na dosimetria da pena quanto aos crimes de lavagem de dinheiro e corrupção passiva porque os delitos antecedentes à lavagem foram formação de cartel e fraude à licitação.

Em outro trecho do recurso — embargos de declaração com efeitos infringentes —, Raquel Dodge destaca a gravidade de consequências provocadas por decisões em que se verifica desrespeito a ritos, regras e normas, com o propósito de devolver a liberdade a réu condenado em dupla instância: “Ao se permitir que decretos prisionais de 1º e 2º graus sejam revistos diretamente por decisão da última instância do Poder Judiciário, como ocorreu neste caso, em especial no bojo das atuais ações penais de combate à macrocriminalidade, cria-se o senso de descrença no devido processo legal, além de se gerar a sensação de que, a qualquer momento, a sociedade pode ser surpreendida com decisões tomadas completamente fora do compasso procedimental previsto na ordem jurídica”.

Vamos ver como o ministro Édson Fachin se pronunciará a propósito.

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sexta-feira, 22 de setembro de 2017

O DESTINO DE TEMER NAS MÃOS DOS PROXENETAS DO PARLAMENTO. OUTRA VEZ.

O mundo dá voltas, a história se repete, e quem não aprende com os erros do passado está fadado a tornar a cometê-los indefinidamente.

Há pouco mais de um mês, assistimos a um espetáculo circense de quinta categoria, protagonizado na Câmara Federal, que teve como apoteose o sepultamento da denúncia contra o presidente Michel Temer ― que gastou bilhões de reais para saciar o apetite pantagruélico dos proxenetas do Parlamento e suas quengas amestradas. Ao que tudo indica, teremos um repeteco, ainda que com produção mais pobre, porque já não dinheiro para o governo pagar o michê das marafonas. Mas o resultado deverá ser o mesmo.

No início da noite da última quarta-feira, a ministra Cármen Lúcia suspendeu a sessão que decidia se a segunda e derradeira flechada de Janot contra Temer será submetida à Câmara, onde os parlamentares já estão se mobilizando para escolher relator e membros da CCJ ― e os “presentinhos” que querem ganhar em troca de livrar o rabo do presidente da Banânia.

Especulava-se que 4 ministros poderiam votar a favor da defesa ― que pugna pela suspensão da denúncia até que sejam esclarecidos os indícios de irregularidade envolvendo as delações da JBS/J&F ―, mas, dentre os que já se posicionaram, somente o inevitável Gilmar Mendes divergiu do relator.

Dias Toffoli discordou em parte, com base na convicção de que a denúncia não pode ser aceita caso se baseie em fatos ocorridos antes de Temer assumir a presidência ― mas disse que falava “em tese”, e não quis analisar o mérito, pois o relator tampouco o fizera. Ricardo Lewandowski e Alexandre de Moraes seguiram integralmente o voto de Fachin, estabelecendo uma maioria a favor de enviar a denúncia ― embora tenham manifestado suas preocupações com os “desvios” das delações premiadas.

A votação será retomada na tarde de hoje, quando os ministros Marco Aurélio Mello, Celso de Mello e a presidente Carmem Lucia devem proferir seus votos ― e, espera-se, acompanhar a maioria. Mesmo assim, quatro ministros potencialmente divergentes antecipam o próximo embate no plenário da Corte, sobre a possibilidade de anulação das provas das delações, especialmente os áudios da JBS. O tema não estava em discussão na sessão de ontem, mas Gilmar Mendes, o supremo, não se furtou a suscitar a questão ― e só não conseguiu levar o debate adiante porque Carmem Lucia lembrou-o de que o tema não estava na pauta, embora reconhecesse que o Supremo tem um encontro marcado com o assunto. A propósito, o ministro Alexandre de Moraes afirmou que os novos áudios da JBS revelam desvio de finalidade na colaboração, e que, em tese, isso poderia até mesmo levar à anulação total ― tanto do acordo quanto das provas.

Pelo visto, o próximo embate no STF já está definido.

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segunda-feira, 18 de setembro de 2017

SOBRE RAQUEL DODGE NA PGR


A posse da nova procuradora-geral da República, Raquel Dodge, acontece na manhã de hoje e marca o fim de um dos mandatos mais intensos da instituição. Ela substitui Rodrigo Janot, que ocupou o cargo por dois mandatos, e a troca de comando acontece num momento de alta tensão, com a Lava-Jato incomodando 11 de cada 10 políticos e o presidente desta Banânia denunciado pela segunda vez, desta feita por formação de quadrilha e obstrução da Justiça.

A cerimônia de posse foi antecipada (das 10 para as 8 horas desta manhã) para contar com a participação do Temer ― líder do QUADRILHÃO DO PMDB na Câmara ―, que viaja mais tarde para os EUA. Janot não comparecerá à posse da sucessora, não só por ter considerado descortesia o prosaico convite que lhe foi enviado por email, mas também pelo fato de ambos serem tradicionais opositores na PGR.

Embora tenha dito que daria total apoio à Lava-Jato, Dodge resolveu dar um prazo de 30 dias para a saída da atual equipe da força-tarefa, que foi nomeada por seu antecessor ― a informação é da revista Época. Durante as eleições para a PGR, ela havia afirmado que todos integrantes da equipe de Janot estavam convidados a permanecer.

Pessoas próximas de Raquel Dodge dizem que, em seu discurso de posse, ela criticará vazamentos; ressaltará os danos de condenações midiáticas; defenderá o respeito ao devido processo legal e levantará a bandeira da harmonia entre os Poderes. A colegas do Judiciário, ela explicou que a decisão de criar uma estrutura para revisar delações não tem conexão com caça às bruxas ― ela quer encontrar lacunas para novas investigações e diz ter medo que, só com os relatos, as acusações não parem de pé. A pauta, decerto, agrada aos investigados, entre eles Michel Temer, que nomeou Dodge.

Ângelo Villela, preso pela PF e acusado de ter recebido propina da JBS, disse à Folha que Rodrigo Janot se referia a Dodge como “a bruxa”. E acrescentou: “Está no meu celular, que foi apreendido”. Aliás, em sua entrevista à Folha, o procurador afirmou que Janot tentou derrubar Michel Temer para impedir a posse de Dodge.

A luta de Janot para manter seu grupo no comando da PGR é um fato inquestionável. Mas igualmente inquestionável é o fato de Joesley Batista realmente ter repassado uma montanha de dinheiro imundo para os operadores de Michel Temer, Lula e Aécio Neves.

domingo, 2 de julho de 2017

A GREVE GERAL E A ESCOLHA DE TEMER

Como era de se esperar, a tal “greve geral” do último dia 30 repetiu o fiasco da anterior, ocorrida em 28 de maio passado.

Aqui em Sampa o transporte público funcionou normalmente, ou quase isso; não havendo “adesão obrigatória”, o resultado foi o que se viu: com a possível exceção da Avenida Paulista, onde alguns milhares de pessoas protestaram contra as reformas e pediram a saída de Michel Temer, apenas atos isolados com bloqueios parciais de algumas vias públicas e pontos de rodovias próximos à entrada da cidade foram registrados ― vale salientar que esse tipo de tumulto é promovido agitadores mercenários, não por populares. Somente umas poucas agências bancárias funcionaram de forma precária; no geral, o atendimento ao público foi normal.

Houve também protestos dos metalúrgicos na Rodovia Anchieta, mas a adesão foi pequena e a via não demorou a ser liberada ao tráfego. Em resumo: os pelegos da esquerda agonizante, maior braço do PT no Brasil, perdeu a força e a razão de ser. Se continuam “protestando”, é porque o fim do imposto sindical deixará 300 mil vagabundos de 12 mil sindicatos sem a teta onde eles têm mamando desde sempre.

Mudando de pato para ganso, o primeiro presidente denunciado por corrupção no exercício do cargo em toda a nossa história escolheu Raquel Dodge para substituir Rodrigo Janot no comando da PGR. A subprocuradora, segundo lugar na lista tríplice da Associação Nacional dos Procuradores da República, com 587 votos (o primeiro foi Nicolao Dino, que conseguiu 621 dos 1.108 votos) (Dodge teve 587 votos), é tida como “anti Janot” e conta com a simpatia de José Sarney, Renan Calheiros, Moreira Franco e Gilmar Mendes, o que é preocupante, ainda mais porque diversos procuradores da Lava-Jato ameaçaram deixar os cargos se Dodge for confirmada na chefia.

Para entender melhor: Quem substituir Janot chefiará pelos próximos dois anos o Ministério Público da União, que abrange os ministérios públicos Federal, do Trabalho, Militar, do Distrito Federal e dos estados, cabendo-lhe representar o MP junto ao STF e STJ, propor ações diretas de inconstitucionalidade e ações penais públicas, criar forças-tarefa para investigações especiais e conduzir as investigações da Lava Jato que envolvem políticos com foro privilegiado, além de desempenhar a função de procurador-geral Eleitoral. Raquel Dodge não é alinhada a Rodrigo Janot, que trava um embate histórico com Temer e cujo mandato vai até setembro, mas, como dito linhas atrás, mantém boas relações com Gilmar Mendes, amigo do presidente e crítico recorrente dos métodos da Lava-Jato. Paixões e convicções à parte, a subprocuradora, que ingressou no MPF em 1987, é Mestre em Direito pela Universidade de Harvard (EUA), membro do Conselho Superior do Ministério Público pelo terceiro biênio consecutivo, foi Coordenadora da Câmara Criminal do MPF, atuou na equipe que redigiu o I Plano Nacional para Erradicação do Trabalho Escravo no Brasil, na Operação Caixa de Pandora e, em primeira instância, na equipe que processou criminalmente Hildebrando Paschoal e o Esquadrão da Morte.

O próprio Janot tem se esforçado para evitar essa deserção. Para ele, isso seria fazer o jogo de Gilmar Mendes, que quer provocar a cizânia e rachar a Lava-Jato ― o ministro tem conhecimento de rusgas antigas, decorrentes do comportamento da subprocuradora à frente da Operação Caixa de Pandora, que, apesar do bom começo e das provas robustas, não resultou nas condenações desejadas. Se debandarem, os procuradores livrarão a nova chefe do desgaste político de afastá-los mediante um processo de “fritura”, sem mencionar que investigações sigilosas em andamento serão interrompidas, o que interessa somente aos que desejam esse desmonte repentino.

Embora a escolha de Raquel seja vista como uma maneira de conter os “possíveis excessos da Lava-Jato”, a força-tarefa conta com o apoio da maioria dos brasileiros (segundo o Ipsos, 96% da população deseja que a investigação se estenda a todos os partidos). Demais disso, a própria candidata já disse que “a atuação do Ministério Público Federal não pode retroceder nem um milímetro sequer”. Não que isso garanta muita coisa, até porque nenhum dos postulantes à vaga se arriscaria a se posicionar abertamente de maneira diferente. Mesmo assim, Randolfe Rodrigues, um dos mais atuantes senadores da oposição, ponderou que o fato de ser a segunda mais votada não desabona Raquel, e que Temer ter indicado alguém da lista tríplice, mesmo quebrando a tradição de escolher o mais votado, não significa que o que foi conquistado pelo Ministério Público terá algum tipo de reversão.

Observação: Segundo o ESTADÃO, a força-tarefa da Lava-Jato no Paraná declarou publicamente seu apoio à Dodge e reiterou seu compromisso de “dar fiel cumprimento a suas responsabilidades institucionais, especialmente lutando contra a corrupção, o desvio de recursos públicos, a criminalidade organizada e a lavagem de dinheiro”.

Raquel Dodge será sabatinada no Senado no próximo dia 12 ― e não teve ter dificuldade para ter sua indicação aprovada, considerando que 1/3 dos senadores é alvo de investigações na Lava-Jato. Chama a atenção, no entanto, o açodamento do governo em confirmar a indicação o quanto antes, pois Janot só deixará o cargo em Setembro. Por que, então, não deixar a sabatina para agosto, depois do recesso parlamentar de meio de ano?

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