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sexta-feira, 6 de setembro de 2019

PEC DA PREVIDÊNCIA, JUDICIÁRIO, PGR, RAQUEL DODGE, LEI DE ABUSO DE AUTORIDADE, RENÚNCIA DE PROCURADORES EM BLOCO E O ORGULHO DE SER BRASILEIRO



Chamar este pobre país de "banânia" é elogiar, mas, convenhamos, seria deselegante (embora não totalmente impróprio) tratá-lo de "país de merda". Questões semânticas à parte, fato é que nossa "Pátria Amada, Brasil" perdeu em abril deste ano a 7ª posição no ranking das principais economias mundiais (que vinha mantendo desde 2005) e já nem figura mais entre as 29 nações mais ricas da lista do Business Insider. O "País do Futuro (que nunca chega)" tem os impostos, os juros, os automóveis, os pedágios, o combustível e a energia elétrica mais caros do mundo.

Como se não bastasse, o "Gigante Adormecido" (deitado eternamente em berço esplêndido) tem os políticos mais corruptos do mundo e é presidido atualmente pelo chefe de governo mais irracional do mundo, que acontece de ser também o mais impopular entre todos os que ocuparam esse cargo desde a redemocratização do "País do Futebol". E com a recente alta do dólar, nosso povo sofrido já nem pode mais ir à Disney conhecer o Pateta. Felizmente, basta ir a Brasília ou entrar nas redes sociais para ver vários.

A coisa fica ainda pior quando se foca a Justiça nesta terra de ninguém. Além de cega, essa senhora é surda e, não raro, corrupta: sobram "causos" de venda de sentenças envolvendo não só juízes de primeira instância, mas desembargadores e ministros das Cortes superiores. Claro que daí até suas meritíssimas excelências serem processadas, jugadas, condenadas e encarceradas vai uma longa distância.

Observação: Entre uma miríade de exemplos notórios, relembro o caso do desembargador Ivan Athié, presidente da 1ª Turma do TRF-2, que em março passado mandou soltar o Vampiro do Jaburu e seu comparsa, coronel Lima (para detalhes da vida pregressa do "Limão", como o policial militar reformado gosta de ser tratado, clique aqui). Athié  ficou afastado do cargo durante sete anos, devido a uma ação no STJ por estelionato e formação de quadrilha (em 2004). Um inquérito contra ele, com as mesmas acusações, foi arquivado em 2008 pelo STJ a pedido do MPF, que alegou não ter encontrado provas de que o desembargador tivesse proferido sentenças em conluio com advogados. O magistrado retornou às atividades em 2011, depois que o STF trancou a ação contra ele.

Falando em patacoadas, a usina de crises de plantão no Planalto criou mais um "mal estar internacional" ao criticar a ex-presidente do Chile e atual comissária da ONU para direitos humanos, Michelle Bachelet. Em pronunciamento sobre o governo brasileiro, Bachelet afirmou que observou "uma redução do espaço cívico e democrático, caracterizado por ataques contra defensores dos direitos humanos, restrições ao trabalho da sociedade civil e ataques a instituições de ensino”, e que, "desde 2002, o Brasil é um dos cinco países do mundo com o maior número de assassinatos de ativistas de direitos humanos".

Fiel ao seu estilo "bateu, levou", Bolsonaro devolveu: “Ela está acusando que não estou punindo policiais que estão matando muita gente no Brasil. Essa é a acusação dela. Ela está defendendo direitos humanos de vagabundos. Ela critica dizendo que o Brasil está perdendo seu espaço democrático. Senhora Michelle Bachelet, se não fosse o pessoal do Pinochet derrotar a esquerda em 73, entre eles seu pai, hoje o Chile seria uma Cuba. Eu acho que não preciso falar mais nada para ela”.

Cá entre nós, eu acho que a repercussão midiática — como de praxe — foi muito além do comentário do capitão, talvez pelo fato de ele ter citado nominalmente o pai de Michelle, general Alberto Bachelet, que foi torturado e morto durante a ditadura de Augusto Pinochet. Mas remexer nos escaninhos da história chilena não é bem a minha praia, e não convém ao sapateiro ir além das chinelas.

Voltando ao cenário jurídico-político tupiniquim, os ex-governadores do Rio, Anthony Garotinho e Rosinha Mateus, presos dias atrás com outros três suspeitos de participar de um esquema de superfaturamentos em contratos celebrados entre a Prefeitura de Campos dos Goytacazes (município fluminense do qual ambos foram prefeitos) e a construtora Odebrecht, foram soltos depois de passarem uma única noite na cadeia, graças à pronta intervenção do desembargador Siro Darlan, que lhes concedeu o habeas corpus durante o plantão judiciário na 7ª Câmara Criminal do TJ-RJ.

Além de ter carreira marcada por decisões controversas e de grande repercussão, Darlan é alvo de inquérito no STJ, que apura a venda de sentenças no fórum da capital. Antes de ser nomeado desembargador, em 2004, ele comandou, por mais de uma década, a 1ª Vara da Infância e da Juventude do Rio. Muitas de suas decisões geraram polêmicas. Como desembargador, em 2013, concedeu habeas corpus a sete dos nove envolvidos na invasão ao Hotel Intercontinental, em São Conrado, em 2010, quando o bando, armado com fuzis, pistolas e granadas, manteve 35 reféns, entre funcionários e hóspedes, por três horas. Na ocasião, uma pessoa morreu e seis ficaram feridas. Entre os beneficiados estava Rogério 157, que assumiu o comando do tráfico na Rocinha após a prisão do traficante Nem.

Em dezembro do ano passado, O GLOBO publicou que Darlan é suspeito de soltar presos durante plantões judiciais em troca de propina. Em dois casos investigados, detentos teriam sido beneficiados por decisões do desembargador. Num deles, foi anexada a colaboração premiada de um dos envolvidos, que afirmou ter ouvido de um dos presos sobre o pagamento a um intermediário do magistrado: R$ 50 mil para ser solto. Inicialmente, segundo o delator, o lance foi de R$ 120 mil, mas caiu para menos da metade dividido em duas parcelas.

Passando às boas notícias — se é que ainda as temos neste país: A CCJ do Senado não só aprovou, por 18 votos contra 7, relatório do senador Tasso Jereissati sobre a PEC da Previdência, como rejeitou os oito destaques apresentados para alterar o parecer do relator. A PEC paralela também foi aprovada em votação simbólica e por unanimidade. O texto principal segue para o plenário do Senado e, se aprovado, será promulgado. O ganho fiscal chegará na R$ 962 bilhões, mais R$ 350 bilhões se a PEC paralela for aprovada na Câmara e os estados e municípios aderirem à proposta que altera as regras da aposentadoria.

Bolsonaro anunciou ontem que deve acolher integralmente as sugestões de vetos do ministro da Justiça ao texto da Lei de Abuso de Autoridade, aprovada a toque de caixa, dias atrás, pelo Congresso. Segundo o portal G1, o capitão efetivamente votou 36 trechos de 19 artigos. Apesar dos esforços de Verdevaldo da Couves, da imprensa marrom (ou seria vermelha?), dos corruptos que pululam no Congresso e da banda podre da alta cúpula do Judiciário, Sérgio Moro continua muito popular, com 25 pontos de aprovação acima do presidente.

Por outro lado, segue envolta em brumas a nomeação do próximo Procurador-Geral da República (o mandato da atual termina no próximo dia 17). Há uma pressão política dos presidentes da Câmara e do Senado para que Raquel Dodge seja reconduzida ao cargo, o que desagradou membros da força-tarefa da Lava-Jato que atuam no DF, onde as coisas andam muuuuuuito mais devagar do que em Curitiba — até hoje, nenhum político com foro privilegiado foi mandado para a cadeia pelos 11 togados supremos, sem mencionar que a delação de Leo Pinheiro, da OAS, está parada há mais de um ano e outros processos e delações estão embolorando nos escaninhos da PGR.

Atualização: no finalzinho da tarde de ontem, o Augusto Aras foi escolhido pelo presidente para suceder a Raquel Dodge no comando da PGR. O subprocurador baiano tem 60 anos de idade e foi apadrinhado pelo ex-deputado federal Alberto Fraga, que é um dos políticos mais próximos de Bolsonaro. Aras era bem contado, mas caiu na bolsa de apostas depois que a imprensa divulgou que ele já defendeu o MST (em discurso na Câmara, em 2008) e promoveu jantares para petistas. Pelo mesmo motivo, enfrentou resistências no PSL, mas procurou parlamentares da legenda que têm proximidade com o capitão para tentar reverter o quadro. Funcionou. Sua indicação ainda precisa ser chancelada pelo Senado, mas o que importa mesmo é saber se foi uma boa escolha, considerando que a Lava-Jato e o combate à corrupção dependem diretamente da PGR  que o o próprio Bolsonaro comparou recentemente à Rainha no jogo de Xadrez

Na última quarta-feira, os procuradores Raquel Branquinho, Maria Clara Noleto, Luana Vargas, Hebert Mesquita, Victor Riccely e Alessandro Oliveira, integrantes da força-tarefa da Lava-Jato em Brasília, pediram demissão em bloco, alegando divergências de posicionamento com Raquel Dodge. Em nota, o grupo afirmou que o desligamento se deve a uma “grave incompatibilidade de entendimento dos membros da equipe” com a manifestação enviada pela PGR ao STF no dia anterior, quando Dodge pediu arquivamento preliminar de trechos do acordo de colaboração de Léo Pinheiro em que foram citados Rodrigo Maia e Ticiano Dias Toffoli, irmão ministro supremo Dias Toffoli.

Ao que parece, depois que a 2ª Turma do Supremo, decisão de anular a sentença do então juiz Sérgio Moro no caso do ex-presidente petista do BC e da Petrobrás, Aldemir Bendine, e devolver os autos à primeira instância, a Lava-Jato resolveu partir para a guerra. Para entender melhor esse imbróglio, convém ouvir que entende do assunto:

sábado, 17 de agosto de 2019

QUANDO QUERO VER O PATETA, VOU À DISNEY, NÃO A BRASÍLIA



Em 16 de março de 1990 — uma sexta-feira —, um dia depois de ter tomado posse, o primeiro presidente eleito pelo voto direto após quase 30 anos — 21 dos quais sob a ditadura militar que o atual presidente diz jamais ter existido — decretou feriado bancário e anunciou um pacote de medidas econômicas que incluía o confisco dos depósitos bancários e das até então intocáveis cadernetas de poupança dos brasileiros. Os saques na conta corrente e na poupança foram limitados a NCz$ 50 mil, e o restante do dinheiro ficaria retido por 18 meses, rendendo juros de 6% ao ano mais correção monetária. No caso dos fundos de curto prazo e do overnight (refúgio de parte da classe média diante da “inflação galopante”), poderiam ser sacados somente 20% ou NCz$ 25 mil, o que fosse maior, pagando ainda tributação de 8% sobre o valor retirado.

Ao fim do feriado bancário de três dias, longas filas se formaram nas agências, e os bancos não tinham dinheiro suficiente para cobrir saques dos clientes. Como nosso povo é useiro e vezeiro em fazer piadas com a própria desgraça, uma anedota que logo correu o país (de boca em boca, pois ainda não havia redes sociais) era mais ou menos assim: "Após horas na fila para sacar seus NCz$ 50 mil, um sujeito resolveu matar o presidente, mas volta à fila poucos minutos mais tarde. Perguntado por que havia desistido, ele respondeu: A fila para matar Collor está muito maior."

Fiz essa breve introdução porque agora, quase 30 depois do funesto Plano Collor, figuras de destaque nos poderes Judiciário e Legislativo fazem fila para mandar calar-se o chefe do Executivo. Em abril, quando Bolsonaro interferiu na política de preços da Petrobras, FHC mandou-lhe o seguinte recado: "Tomara que os que pouco sabem aprendam ou calem. No mês passado, diante de mais uma declaração pra lá de infeliz do capitão, o ministro supremo Marco Aurélio Mello disse que “apenas criando um aparelho de mordaça” Bolsonaro poderia parar de proferir o que chamou de incivilidade e grosseria. Dias atrás, o tucano Tasso Jereissati, relator da PEC previdenciária no Senado, disse: "quanto mais ele [Bolsonaro] ficar calado, melhor, que aí as coisas fluem com mais tranquilidade, sem criar nenhum ponto de atrito", e a emedebista Simoni Tebet, presidente da CCJ do Senado, lhe fez eco: "toda vez que Bolsonaro ofende a classe política, joga as redes sociais contra o Congresso, ele acaba atrapalhando”.

Calado, o mais turbulento na galeria de presidentes brasileiros é um poeta; quando abre a boca, é um pateta. Mas como esperar que Bolsonaro se cale se antes de entrar na política ele já exibia sinais de impetuosidade, desrespeito pelos limites e ânsia de protagonismo? Se foram atos de indisciplina que o levaram a deixar o Exército? Para quem não se lembra, em 1986, quando tinha 31 anos, Bolsonaro publicou na revista Veja um artigo em que reclamava do soldo, e foi punido com 15 dias de prisão e um processo disciplinar. No ano seguinte, também em protesto contra os baixos salários, planejou explodir bombas de baixa potência em quartéis e academias. O assunto foi resolvido discretamente e o insurreto, absolvido de todas as acusações. Mas sua carreira militar terminou ali.

Há uma identidade de valores, de estilo e de estratégia entre Donald Trump e Jair Bolsonaro, mas este não é cria daquele: muito antes de saber quem era Trump, o capitão já dizia que FHC devia ser fuzilado e que Maria do Rosário não merecia ser estuprada porque era feia. Ambos são fenômenos, mas fenômenos independentes, surgidos e aprimorados cada um por si, como signos do tempo. Um dia vão acabar, como tudo acaba, mas estão vivos e desconfia-se que em ascensão. Tanto um como o outro têm chances reais de se reeleger.

A uma semana do segundo turno das eleições, o capitão deu a seguinte declaração: “O que eu pretendo é fazer uma excelente reforma política, acabando com o instituto da reeleição, que começa comigo caso seja eleito, e reduzindo um pouco, em 15% ou 20%, a quantidade de parlamentares”. Passados quase nove meses, não fez nem uma coisa nem outra. Picado pela mosca azul, passou a entremear suas estultices primeiro com insinuações, depois com declarações de que é, sim, candidatíssimo à reeleição. Mas nada garante que não seja abatido em seu voo de galinha antes mesmo de terminar este mandato. Ao que tudo indica, já houve articulações nesse sentido, mas que o "pacto institucional" costurado por Dias Toffoli, o sonhador, impediu de avançar.

Quase 30 anos no baixo clero da Câmara consagraram Bolsonaro na política do ultraje. A postura de enfrentamento é da sua natureza. Recuos e tentativas conciliatórias há — ninguém vem sendo mais useiro e vezeiro em desdizer o que disse (e até o que não disso) do que nosso capitão —, mas parecem carecer de sinceridade. Bolsonaro age às vezes age como um estrategista de alto coturno e noutras, como um parlapatão irresponsável. Há quem veja sua beligerância atávica, no velho estilo estudantil “não levo desaforo para casa”, como um papel que ele interpreta, mas o mais provável é que isso faça parte da sua personalidade, e nada poderá muda-lo. É como na fábula do Sapo e o Escorpião, onde este convence aquele a levá-lo nas costas até o outro lado do rio, argumentando que ambos morrerão se ele o aguilhoar, mas tasca-lhe o ferrão assim mesmo, porque é incapaz de agir contra sua natureza.

A PEC da Previdência, vista como a maior vitória política de Bolsonaro até o momento, não foi aprovada na Câmara devido aos esforços  do chefe do Executivo, mas apesar de seu empenho em melar a tramitação da proposta. Em outras circunstâncias, seria a hora de comemorar e vislumbrar um céu de brigadeiro nas relações com o Congresso rumo à aprovação de outras pautas importantes, mas o que se vê no horizonte são nuvens carregadas. A já folclórica incontinência verbal do presidente, sua capacidade de produzir crises quase diárias e a ausência de uma estratégia para formar uma base de apoio não permitem tanto otimismo. Enfim, a ver.

quinta-feira, 11 de julho de 2019

BOLSONARO E A PEC DA PREVIDÊNCIA


Contrariando uma das muitas promessas que fez durante a campanha, Bolsonaro não só desistiu de propor o fim da reeleição como também resolveu disputá-la em 2022. O sucesso da empreitada depende de vários fatores e sua previsibilidade é nula, visto que muita água vai rolar até lá. Os índices de aprovação do governo, segundo as mais recentes pesquisas (detalhes no post anterior), orbitam os 30%. Com apenas um terço dos votos válidos, nenhum disputante vence eleições majoritárias (para prefeito, governador e presidente da República), onde se elege quem obtém maioria absoluta (se não no primeiro turno, fatalmente no segundo, quando então a disputa se limita aos dois candidatos mais votados no pleito anterior).

Claro que muita coisa pode mudar nos próximos 3 anos, e nada garante que seja para melhor. Mesmo assim, o presidente parece não se dar conta de que boa parte dos votos que obteve em 2018 não veio dos bolsomínions, mas dos antipetistas — e é bom lembrar que o fato de alguém ser inimigo do seu inimigo não significa necessariamente que é seu amigo.

Observação: No presidencialismo de coalizão, governar exige dividir espaço com o Congresso, que, como se sabe, não é movido a patriotismo. Mas é bom não confundir o que chamamos pejorativamente de “toma-lá-dá-cá” com a fórmula adotada por Lula, que instituiu o mensalão e o petrolão para sustentar seu nefasto projeto de eternizar o lulopetismo no poder.

Mesmo tendo passado 30 como deputado do baixo clero, o Bolsonaro presidente parece cultivar a mais profunda aversão pelo “é dando que se recebe”, e assim conta apenas com o apoio dos parlamentares do PSL — partido nanico até as últimas eleições, mas que multiplicou por 50 sua presença na Câmara e se tornou, da noite para o dia, a maior bancada da Casa. Só que os deputados pesselistas não têm atuado como base do governo. Muitos deles não demonstram o menor respeito pelas decisões da cúpula do partido e pelas demandas do Planalto, e alguns deixam claro que seu único propósito na Câmara é defender as corporações que julgam representar, em especial a dos profissionais de segurança pública.

O problema da Previdência não vem de hoje, mas, nem FHC, nem Lula, nem Dilma nem Temer tiveram peito resolvê-lo. Para além de algumas tímidas tentativas, todos ele simplesmente a coisa com a barriga, levando o déficit chegar ao ponto que chegou e o atual governo sem alternativa que não propor essa espinhosa reforma. Só que o capitão nunca se empenhou verdadeiramente em defendê-la, embora o futuro do seu governo e sua eventual reeleição dependam dela. 

Depois de cruzar a Praça dos Três Poderes e entregar a proposta ao presidente da Câmara, Bolsonaro pôs-se a repetir que havia feito sua parte e que “a bola estava com o Congresso”, afastou-se das negociações e se dedicou a fomentar picuinhas, hostilizar Rodrigo Maia — de quem podermos não gostar, mas cujo empenho temos de reconhecer —, fritar ministros e promover enfrentamentos tanto desnecessários quanto indesejáveis. Instado a ajudar na articulação para reinserir Estados e municípios, o presidente não moveu uma palha, mas bastou ser chamado de "traidor" por policiais para se apressar a trabalhar pela concessão de aposentadoria especialíssima à corporação amiga e, para desassossego de Paulo Guedes e da equipe econômica, vem se empenhando em levar o esforço às últimas consequências. Porém, ao intervir para tentar garantir aos policiais federais e à Polícia Rodoviária regras mais brandas, fora da emenda principal, ele contribui para a obstrução da votação e coloca em risco a própria economia de que seu governo tanto necessita para dar início à Nova Previdência.

A oposição — magote de esquerdistas e boçais insensíveis ao fato de que, mesmo não sendo uma panaceia, a aprovação da reforma é a única alternativa para a Economia deixar a UTI com vida — tem feito diabo para obstruir a tramitação, e ainda que não some nem 150 votos, faz um barulho danado. Alguns dizem que a oposição está cumprindo seu papel, mas, convenhamos, fazer oposição responsável é uma coisa e agir como essa cáfila vermelha age é outra bem diferente. E como se isso já não bastasse, o capitão, antipetista e antiesquerdista, ajuda “o inimigo” ao se tornar um grande estorvo para a tramitação da PEC — cuja aprovação, volto a frisar, definirá o sucesso do seu governo e quiçá sua reeleição.

Bolsonaro monta uma armadilha para si mesmo, pois cada emenda apresentada abre espaço para discussões que consomem tempo valioso, pondo em risco a votação final — inclusive dos destaques — antes do próximo dia 18, quando o Congresso entra em recesso. E não faltam oportunista que se aproveitem da sua iniciativa para incluir outros agentes de segurança no pacote da PF, como guardas penitenciários e municipais, bem como retirar os professores da reforma. Esse seria o pior dos mundos, pois desidrataria ainda mais a reforma.

Paralelamente, os governadores insistem na inclusão de servidores de Estados e Municípios, o que não conta com o apoio da maioria dos deputados e pode reduzir a economia de R$ 1 trilhão prevista para os próximos 10 anos — montante inferior ao desejado por Paulo Guedes, mas, mesmo assim, ainda aceitável. É por isso que Rodrigo Maia quer deixar essa questão fora do bojo da reforma e tratar dela mais adiante, de preferência numa emenda constitucional cuja tramitação começaria no Senado.

Aos trancos e barrancos, a coisa vai caminhado. A despeito da tramitação conturbada — afora a exigência do pedaço fisiológico do Congresso, que condiciona o voto à liberação de verbas orçamentárias, há o desejo dos partidos de oposição de obstruir as sessões, esticando a corda até o último instante — o texto-base aprovado na Comissão Especial da Câmara foi chancelado no plenário, em primeiro turno, por 379 votos a 131. Há 18 destaques para serem apreciados, mas Rodrigo Maia — indiscutivelmente o pai biológico da criança — está confiante de que a aprovação em segundo turno aconteça ainda esta semana, ficando para depois do recesso apenas o escrutínio do Senado. A impressão que se tem é de que a maioria dos deputados ou se conscientizou da necessidade da emenda, ou votará a favor para não ser responsabilizada pelo agravamento da crise econômica. 

Oposição é necessária e faz bem à democracia, mas a oposição brasileira frequenta o debate previdenciário sem demonstrar sua utilidade. Há espaço no Congresso para o surgimento de uma nova oposição, menos venenosa e mais propositiva, mas ainda não surgiu força capaz de ocupar o vazio.

Bolsonaro é, ao mesmo tempo, o grande estorvo e o maior beneficiário da reforma cujos impactos na Economia o capitalizarão politicamente, embora o verdadeiro pai da criança seja o Presidente da Câmara. Mesmo assim, o estorvo poderá jactar-se de ser a mãe, e de ter parido o filho sem recorrer ao toma-lá-dá-cá, ainda que isso não seja exatamente verdade: emendas parlamentares e outras bondades para garantir votos no plenário da Câmara vêm sendo distribuídas a toque de caixa nos últimos dias.

Como dizia Ulysses Guimarães, “em política, quem prepara a refeição nem sempre come o melhor bocado”.

domingo, 2 de junho de 2019

A ECONOMIA, AS REFORMAS E OUTRAS CONSIDERAÇÕES



Na definição do ex-presidente do Banco Central Affonso Celso Pastore, o cenário atual é de depressão pós-recessão. Mas o rótulo é o que menos importa. Importante mesmo é o fato é que a situação está uma merda. Isso na visão dos otimistas — na dos pessimistas, vai faltar merda.

Para reverter os efeitos deletérios dos 13 anos e meio de lulopetismo e do final melancólico do mandato-tampão do vampiro do Jaburu — que hoje é réu em meia dúzia de ações criminais e já foi preso preventivamente duas vezes —, os três reis magos tupiniquins, cientes de que a carroça anda melhor se os burros puxam na mesma direção, uniram esforços em busca da estrela guia, que vem a ser um pacto institucional em prol das reformas previdenciária e tributária, da revisão do pacto federativo, da desburocratização da administração pública e do aprimoramento de uma política nacional de segurança pública. Mas a proposta — que foi apresentada meses atrás pelo ministro Dias Toffoli, ora presidente do STF — vem suscitando preocupação no meio jurídico, inclusive no próprio STF, por consistir num acordo envolvendo temas que podem ser futuramente julgados como controversos pelo colegiado do tribunal.

Se o Supremo deixasse de prestigiar causídicos estrelados que veem a prática da advocacia como um exercício de procrastinação para evitar que processos cheguem ao final; se Bolsonaro deixasse o Twitter de lado e passasse a exercer o cargo para o qual foi eleito; se os parlamentares se desgrudassem do ranço da Constituição Cidadã, promulgada no auge da ressaca pós-ditadura militar por políticos deslumbrados pelo poder, talvez nada disso fosse necessário. Mas não adianta chorar o leite derramado.

Bolsonaro ficou visivelmente satisfeito com o apoio das ruas, mas respaldo popular, mesmo que seja fundamental (como descobriram a duras penas os ex-presidentes CollorDilma e Temer), não basta para o chefe do Executivo fazer passar mudanças sem investir no convencimento das instituições encarregadas de transformá-las num processo democrático. 

Como se viu na última semana, a banda podre da Câmara tirou o Coaf das mãos de Sérgio Moro, com o propósito de evitar que o fortalecimento do órgão antecipe o acerto de contas dos políticos corruptos com a Justiça criminal. Maus políticos, sobretudo os fanáticos da esquerda e os fisiologistas do "Centrão", também investiram contra o Executivo com golpes como orçamento impositivo, tornando evidente o uso torpe da lei para proteger quem a infringe. Paulinho da Força — defensor de uma reforma previdenciária desidratada, para não fortalecer Bolsonaro e contribuir para sua reeleição — quer agora restaurar a escravidão do trabalhador formal aos sindicatos com a volta da obrigatoriedade da “contribuição” de um dia de trabalho por ano, e luta por um Estado Novo parlamentar, substituindo a representação popular por um regime corporativista. Elmar Nascimento outro chefão do Centrão e líder do DEM, disse que, para dar um mínimo de estabilidade ao país, é preciso ignorar o governo.

“O Coaf continua no governo”, afirmou o presidente — o mesmo que, na última sexta-feria, afirmou que "está na hora de termos um ministro evangélico no Supremo, acreditem se quiserem! No caso do Coaf, assiste razão a sua excelência, mas essa história está longe de acabar. O Podemos entrou com uma ação no STF para contestar a decisão da Câmara, aprovada pelo Senado a pedido do próprio Bolsonaro — sem o que a MP 870, que redesenhou a Esplanada dos Ministérios, certamente teria caducado (resta saber se da cartola do ministro Edson Fachin, sorteado para relatar a ação, vai sair pombo ou coelho).

O presidente Jair Bolsonaro poderia ter evitado o remanejamento do Coaf, mas o fato é que foi um relatório do Coaf que abriu a Caixa de Pandora que havia no gabinete do então deputado estadual e ora senador Flávio Bolsonaro — o zero um, que também se revelou um mago da especulação imobiliária — ao trazer a lume as movimentações financeiras suspeitas de Fabrício Queiroz (que, sabe-se agora, movimentou mais de R$ 7 milhões nos últimos três anos e pagou R$ 133,5 mil em dinheiro vivo por uma cirurgia a que se submeteu no final do ano passado).

Na avaliação de José Nêumanne, a questão do Coaf foi uma tempestade "em pires d’água", já que uma simples portaria do ministro-chefe da Casa Civil poderia liquidar a fatura sem MP. A questão é que Onyx Lorenzoni é veterinário, e a conclusão é de que faltou um rábula no Planalto.

Resumo da ópera: A aprovação da reforma da Previdência são favas contadas, pois o Congresso não vai querer ser responsabilizado por impedir o país de sair do buraco. O mérito desse “convencimento” é, em grande medida, do próprio presidente da República, com sua crítica permanente aos congressistas, ao  toma lá dá  cá. Mas também é fato que a postura beligerante e troglodita de Bolsonaro cria uma situação constrangedora que em  nada favorece a relação entre os Poderes.

Enfim, não se pode ter tudo.