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domingo, 8 de dezembro de 2019

BOLSONARO E A REELEIÇÃO



Jair Bolsonaro, por um fenômeno até agora não esclarecido pelos nossos esclarecedores de questões nacionais, foi o único político de primeira grandeza no Brasil a entender que, para a maioria dos brasileiros, a polícia é uma coisa boa e bandido é uma coisa ruim. Noves fora os rematados idiotas de sempre, todo mundo sabe que policiais erram, que podem tratar mal o público e não investigar nem reprimir como deveriam os crimes cometidos, além de eles próprios cometerem uma série intolerável de atos criminosos. Mas também é sabido que não existe um único caso de bandido que esteja a favor do cidadão — e que qualquer policial, no fim das contas, é melhor que qualquer criminoso. Daí a “oposição”, parte da mídia, “movimentos sociais” e "defensores dos direitos humanos" tomarem partido contra as forças da ordem e a favor das forças do crime. E se mostrarem indignados, depois, quando a população prefere o capitão caverna a assassinos, ladrões e estupradores.

Segundo J.R. Guzzo, a grande questão da política brasileira, hoje, é a perspectiva real de Bolsonaro ficar no seu cargo não só pelos três anos de mandato a que ainda tem direito por conta da eleição de 2018, mas até 31 de dezembro de 2026. E não adianta fazer de conta que não é isso. É precisamente isso. Fala-se de tudo — da descomunal importância do presidente da Câmara para o futuro do Brasil e do Sistema Solar, do que se passa a cada minuto do dia na cabeça do presidente do Senado, dos entreveros de Bolsonaro com o sistema de pontos nas multas de trânsito. Discutem-se novos partidos, velhos partidos, centrão, centrinho, os filhos do presidente e o futuro de Lula: o que mais o STF pode fazer por ele?

Há, todos os dias, a crise da manhã, a crise da tarde e a crise da noite, com ameaça real, direta e imediata à sobrevivência do governo. Há de tudo — menos a discussão aberta da única coisa que de fato interessa: até quando Bolsonaro vai ficar? O resto é o resto.

Não se trata de um “Quiz” de adivinhação. Se o presidente ficar ”X” tempo, a sociedade brasileira terá uma cara; se ficar “X” + “Y”, terá outra. Não é mudança de governo. É mudança de vida. Daqui a três anos, se as coisas continuarem a andar do jeito que estão andando, o Brasil será um país tão diferente do que é hoje, mas tão diferente, que praticamente nada do que se discute no momento terá qualquer significado prático para o dia a dia dos brasileiros.

Se a história for ainda além, e Bolsonaro receber um segundo mandato — bom, aí estaremos entrando em território absolutamente virgem. É uma perspectiva que assusta até o fundo da alma toda a ordem política, econômica e social que manda hoje no Brasil, como tem mandado há décadas, ou mais do que isso. Assusta porque traz o insustentável peso da mudança para os que não querem que nada mude — ou que só mude aquilo que lhes interessa mudar. Mudam o sistema psicológico, a “ideologia”, os hábitos intelectuais, os valores, os usos e costumes.

Quem está contente com o Brasil como ele foi até hoje não pode estar contente com o Brasil desconhecido que talvez esteja vindo aí pela frente. Qual poderia ser ele? É uma perda de tempo, como se sabe, ficar preocupado em excesso com o futuro, porque ele virá de qualquer maneira. O que dá para fazer é uma lista de realidades — e ir checando, uma por uma, se elas estão mudando para melhor ou para pior. A economia, por exemplo. Pelos fatos que podem ser vistos hoje — e não pelos sentimentos que você tem a respeito deles — a situação tende a melhorar ou piorar?

O país, no futuro próximo, vai ter um outro STF e uma outra Justiça. A máquina pública deixará de crescer como cresceu nos últimos 50 anos. O Brasil, forçosamente, vai estar mais integrado às cadeias mundiais de produção. O “investimento público” deixará de ter o tratamento sagrado que tem hoje. Não haverá novas empresas estatais. As pressões da maioria sobre os donos da vida pública vão aumentar — entre outras coisas, não há nenhuma hipótese de que as redes sociais se tornem menores e mais silenciosas do que são hoje.

Todas essas coisas somadas, e uma infinidade de outras, são positivas ou não? Faça suas contas. O fato é que ninguém pode esperar uma vida melhor se não houver mudança nenhuma no lugar onde ela se tornou ruim.

Com J.R. Guzzo

quarta-feira, 13 de novembro de 2019

SÓ FALTA MORRER PRA CANONIZAR... AMÉM



A composição do STF, que nunca foi grande coisa, ficou pior depois que Lula e Dilma fizeram oito nomeações. Mas nem todos os indicados pela parelha vermelha vestiram a toga por cima da farda. Tanto é assim que 3 dos 6 votos responsáveis pelo formidável coice que levamos na última quinta-feira foram proferidos por apaniguados dos ex-presidentes Sarney, Collor e FHC.

Sempre me chamou a atenção a obstinação dos garantistas de araque pela restauração do entendimento que vigeu durante míseros 7 anos das últimas 8 décadas. Aliás, antes da decisão da semana passada, a possibilidade da prisão após condenação em segunda instância foi debatida nada menos que três vezes nos últimos 4 anos — e mantida todas as vezes, ainda que por estreitíssima maioria. 

Irresignada, a ala vencida moveu mundos e fundos para rediscutir o tema tantas vezes quantas fossem necessárias para faze a balança pender pro seu lado, como os dois amigos que disputam no par ou ímpar quem paga a cerveja e o mau perdedor insiste em jogar de novo até sair vencedor. Mas o mais curioso é Gilmar Mendes perorar que (agora que ele conseguiu o que queria) o novo entendimento deve vale per omnia saecula saeculorum, como se a decisão tivesse sido tomada por unanimidade.    

O primeiro beneficiado suprema comédia foi justamente aquele em favor de quem se armou toda a fraude jurídica encenada nos últimos meses. Toffoli nem bem havia acabado de cuspir na cara dos brasileiros e seu ex-patrão já deixava voltava para São Bernardo a bordo do luxuoso jatinho comprado em 2013 por R$ 17,7 milhões pela empresa Brisair Serviços Técnicos Aeronáutica, do casal de apresentadores globais Luciano Huck e Angélica.

Com a decisão tomada pela facção pró-crime do STF — por maioria de um único e miserável voto dado justamente por um ex-funcionário do partido que mais roubou na história brasileira —, a utilização da incomparável coleção de privilégios oferecidos pela lei brasileira a réus da elite, que roubam e pagam chicaneiros de luxo com o dinheiro roubado, volta a permitir que essa caterva fique fora da prisão enquanto o dinheiro não acabar. Mas isso não quer dizer que essa gentalha voltou a dar as cartas. Podem estar soltos e rindo da cara dos 200 milhões de otários que precisam trabalhar para ganhar a vida — mas para roubar de novo precisam estar no governo, e no momento eles não estão no governo.

O essencial neste país, onde seis ministros da mais alta corte de justiça trabalham oficial e descaradamente em favor dos criminosos cinco estrelas, deixou de ser a luta contra a sua impunidade perpétua. O que realmente importa, pelo menos agora e no futuro imediato, é impedir que seja retomado o processo de privatização do Estado em benefício de um partido político, do mundo que gira em torno dele e dos magnatas que compram os seus favores. Esta distribuição geral do bem público para indivíduos, interesses e grupos privados vigora no Brasil desde sempre – mas nunca foi praticada de maneira tão aberta e tão agressiva como nos governos do presidente Lula e de sua sucessora.

Com J.R. Guzzo

domingo, 13 de outubro de 2019

LEGISLATIVO MUNICIPAL — É OU NÃO O FIM DA PICADA?



O brasileiro trabalha 153 dias por ano, em média, só para pagar impostos, e a somatória de tributos municipais, estaduais e federais consome 41,80% de sua renda. Boa parte do que é arrecadado pelos municípios e a eles repassado se esvai pelo ralo do funcionalismo.

Cidades com menos de 1 milhão de habitantes podem ter entre 9 e 21 vereadores (a título de comparação, São Paulo, que é a maior e mais populosa cidade do Brasil, ocupa 1.521 km2, tem cerca de 13 milhões de habitantes e conta com 55 vereadores). Santa Cruz de Minas (MG), com 3 km2 de área, é o menor dos 5.570 municípios tupiniquins. Bora (SP) é 40 vezes maior, mas sua população (800 habitantes) é dez vezes menor. Ambos contam 9 vereadores.

O salário do vereador varia conforme o número de habitantes e a receita do município. O valor é calculado levando-se em conta a Lei Orgânica do Município e a Constituição Federal; dependendo do tamanho da cidade, suas excelências podem ganhar entre 20% e 75% do salário de um deputado estadual. A Constituição determina que o total gasto com a remuneração dos vereadores não ultrapasse 5% da receita do município, e que a Câmara Municipal não pode gastar mais de 70% da sua receita com a folha de pagamento, incluindo os gastos com subsídios dos nobres edis. Mas isso nem sempre é observado, e a diferença é coberta com repasses estaduais e federais, cuja destinação deveria ser bem outra.

Em tese, o vereador representa os interesses da população do município. Suas principais funções são fiscalizara a atuação do prefeito e apresentar (e votar) projetos de lei e emendas à legislação em vigor. Em síntese, os edis representam, no âmbito municipal, o mesmo papel dos deputados em nível estadual. Na prática, todavia, a maioria deles — como a maioria dos demais políticos — se elege para roubar e rouba para se reeleger.

Entre 30 de setembro e o último dia 4, o Jornal da Band apresentou a série “Vereadores para quê?”. Quem se der ao trabalho de pesquisar irá encontrar os vídeos no YouTube. Recomendo assistir. Talvez nas eleições do ano que vem a gente possa melhorar um pouco a qualidade do nosso legislativo e, nas subsequentes, fazer o mesmo nas esferas estadual e federal. Isso se até lá ainda houver um Brasil no mapa.

Ainda sobre a novela do ingresso (ou não ingresso, melhor dizendo) do Brasil na OCDE:

Em nota, o governo americano reitera o apoio ao pleito brasileiro de entrar na OCDE, mas insinua que falta algo ao país. A insinuação está nas entrelinhas do trecho que elogia "os esforços contínuos do Brasil em relação às reformas econômicas, melhores práticas e conformidade com as normas" da OCDE. Ora, se é assim, porque a Casa Branca deu aval à Argentina? Não é preciso ser um gênio ou economista para entender três coisas:

1) A economia brasileira, por pior que seja, está em melhores condições do que a economia argentina. Portanto, não foi por falta de reformas econômicas que o apoio dos Estados Unidos não veio;

2) Se a Argentina, às voltas com o caos financeiro e a perspectiva de reviravolta política, pode ingressar no clube dos ricos, é óbvio que o selo de membro da OCDE não transformaria o Brasil em país desenvolvido nem no universo paralelo de Bolsonaro;

3) O Brasil faria melhor se baixasse o facho e permanecesse membro da OMC, usufruindo de todas as vantagens tarifárias concedidas aos países em desenvolvimento.

Sobre as manifestação dos esquerdopatas, que pedem "Justiça para Lula", assistam ao clipe a seguir:

 

sábado, 3 de agosto de 2019

O DESTEMPERO BOLSONARIANO E OUTRAS CONSIDERAÇÕES


A Justiça Federal do DF decidiu converter em preventivas as prisões temporárias dos quatro suspeitos de envolvimento na invasão de celulares de autoridades, que estão presos desde a semana passada, quando a PF deflagrou a Operação Spoofing. A propósito, o chefe do bando, Walter Delgatti Neto, é réu por ter aplicado um golpe de R$ 623 mil no Itaú, em 2017, quando desbloqueou 44 cartões de crédito para fazer compras. Mas ele garante que hackeou autoridades e jornalistas de graça, por patriotismo e senso de justiça. Como disse Millôr Fernandes, “desconfio de todo idealista que lucra com seu ideal”.

Nem a Velhinha de Taubaté para acreditar nessa falácia, no patriotismo de Verdevaldo, na honestidade de Lula e na ponte que partiu toda essa cambada de fidumas. Dito isso, segue o baile:

Dizia Ricardo Boechat que se pode morrer de várias maneiras no jornalismo, menos de tédio. Com efeito. É impossível fugir a essa dura realidade. Sobretudo quando se escreve sobre o cenário político nacional: você nem bem termina de redigir um artigo e novos acontecimentos já o transformam em matéria vencida.

Depois da posse do presidente em meio à novela do caso Queiroz, o rompimento da barragem do Córrego de Feijão desviou o foco da mídia. Na sequência, para ficar somente nos casos mais notórios, vieram o incêndio do Ninho do Urubua exoneração de Gustavo Bebiannoo escândalo escatológico do Golden Showera denúncia de estupro apresentada por Najila Trindade contra Neymar Cai-Cai — que deu em nada; o jogador não será indiciado e a suposta vítima pode responder por crime de denunciação caluniosa — a Vaza-Jato de Verdevaldo e a escolha de zero três para ocupar a Embaixada do Brasil nos EUA, sem mencionar toda sorte de crises geradas pela guerra de egos entre Bolsonaro e Rodrigo Maia durante a claudicante tramitação da PEC Previdenciária e de um sem-número de pronunciamentos infelizes do capitão, que ainda age como se estivesse em plena campanha eleitoral.

Ter um presidente sem tramela, mordaça ou “freio de arrumação” é um teste para nossa incipiente democracia (a mordaça é sugestão do ministro Marco Aurélio, que bem poderia tomar ele próprio uma colherada desse remédio). Mas esperar que Bolsonaro mude sua natureza é o mesmo que acreditar na Fada do Dente ou na inocência de Lula. Nem a finada Velhinha de Taubaté!

A maneira “desrespeitosa” com que o capitão tratou o “desaparecimento” do ativista político Fernando Santa Cruz, pai do atual presidente lulista da OAB — que não é flor que se cheire, quando mais não seja por ter dito em entrevista à Folha de S. Verdevaldo que “Sergio Moro usa o cargo, aniquila a independência da PF e ainda banca o chefe de quadrilha ao dizer que sabe das conversas de autoridades que não são investigadas”, além de injuriar uma colega advogada insinuando que ela é uma “prostituta”, assim como a mãe de tantos outros colegas de profissão — continua dando pano pra manga. E o mesmo se aplica à resposta dada a jornalistas por Bolsonaro ao ser perguntado sobre a chacina no Centro de Recuperação Prisional de Altamira, no Pará “Perguntem às vítimas dos que morreram lá o que elas acham e depois eu respondo”.

Feitos por cidadãos comuns num balcão do boteco, comentários como esses seriam toleráveis, mas são indesculpáveis quando vêm de um presidente da República (qualquer que seja ele). Pode-se dizer que o capitão se espelha em Trump, e que suas frases destemperadas o aproximam dos bolsominions. Porém, ao fazer como Lula e o PT, cujas narrativas são direcionadas à patuleia que segue cegamente a seita do inferno (e, portanto, não precisa ser convencida de nada), Bolsonaro frustra milhões de eleitores que votaram nele justamente para evitar o retorno dessa caterva ao poder. As reformas estruturais, fundamentais para um recomeço de crescimento econômico, não podem ficar ameaçadas por arroubos personalistas de quem continua no palanque, obcecado por destruir adversários reais ou imaginários.

Ainda que a linguagem do capitão não seja exatamente “presidencial”, não se pode perder de vista que o sistema prisional tupiniquim está falido. Em sua fala, Bolsonaro foi na contramão da “criminolatria”, hoje tão em moda no Brasil, onde o foco do sistema penitenciário é o relaxamento de prisões, o abrandamento das penas e a “ressocialização” dos criminosos. Os presídios se transformaram e universidades do crime, onde entram batedores de carteira e saem assaltantes, latrocidas, estupradores ou coisa pior.

O ex-ministro Raul Jungmann já havia feito esse diagnóstico, e Moro vem se empenhando em reverter o quadro com seu pacote de medidas anticrime, mas a banda podre do Congresso e do Judiciário se aliam a criminalistas “garantistas” visando criminalizar o ex-juiz da Lava-Jato e os integrantes da força-tarefa, bem como buscar artimanhas legais para devolver à liberdade o ex-presidente criminoso que, nunca é demais lembrar, está preso há quase 16 meses e deve ser condenado novamente numa das sete ações penais em que é réu e ainda não foi julgado. Mas isso é conversa para outra hora.

domingo, 2 de dezembro de 2018

AINDA SOBRE O “INSULTO PRESIDENCIAL”



Durante o julgamento do indulto assinado por Temer em 2017 — providencialmente interrompido pelo pedido de vista do ministro Luiz Fux —, o relator, ministro Luís Roberto Barroso, expôs face diabólica do autor do decreto que perdoou 80% das penas dos larápios, livrando-os até do pagamento de multas:

O presidente da República foi denunciado duas vezes, por corrupção passiva e obstrução de justiça, e é investigado em dois outros inquéritos por corrupção e lavagem de dinheiro”, recordou o magistrado, ele próprio responsável por um dos inquéritos correm contra Michel Temer no Supremo. E prosseguiu: “Um ex-presidente da República foi condenado por corrupção passiva; dois ex-chefes da Casa Civil foram condenados criminalmente, um por corrupção ativa e outro por corrupção passiva; o ex-ministro da Secretaria de Governo da Presidência da República está preso, tendo sido encontrados em apartamento supostamente seu R$ 51 milhões.”

Do Executivo federal, Barroso saltou para o Legislativo e para os governos estaduais:

Dois ex-presidentes da Câmara dos Deputados foram presos, um deles já condenado por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e evasão de divisas; um presidente anterior da Câmara dos Deputados foi condenado por peculato e cumpriu pena; mais de um ex-governador de Estado se encontra preso sob acusações de corrupção passiva e outros crimes; um senador, ex-candidato a presidente da República, foi denunciado por corrupção passiva (...) Depois de tudo isso, para provar que o crime compensa, o Executivo concede indulto a essa gente e o Supremo chancela? Que mensagem vamos passar? Que país estamos criando? De que lado da história queremos estar?

O cheiro de enxofre foi sentido em Curitiba:

A Lava-Jato está em vias de sofrer a maior derrota de sua história”, postou o procurador Deltan Dallagnol no Twitter.

E com efeito: confirmando-se o placar pró-corruptos, Temer estará liberado para editar no Natal de 2018 um novo decreto de indulto tão ou mais benevolente que o do ano passado. A força-tarefa de Curitiba estima que a decisão premiaria com o perdão das penas e das multas pelo menos 21 condenados da Lava-Jato.

O mandato-tampão de Michel Temer é a vivência do abismo, e o que distingue o momento atual é a união ativa de forças que não estão dispostas a viver no abismo:

Nos últimos tempos, houve uma expressiva reação da sociedade brasileira, que deixou de aceitar o inaceitável”, constatou o ministro Barroso em seu voto. ”Onde se vai no Brasil hoje se vê uma imensa demanda por integridade, por idealismo e por patriotismo. E essa é a energia que muda paradigmas e empurra a história. A reação da sociedade impulsionou mudanças importantes de atitude que alcançaram as instituições, a legislação e a jurisprudência.”

A tentativa de Michel Temer de premiar corruptos é parte de uma ofensiva daquilo que Barroso chama de “pacto oligárquico”. Nas palavras do ministro, o Brasil não é atrasado por acaso. “Somos atrasados porque o atraso é bem defendido”, declarou.

Aqui não se discute o combate ou não à corrupção. Eu entendo que independentemente do voto de casa um dos ministros, todos queiram combater a corrupção”, retrucou Alexandre de Moraes, tentando afastar de sua calva a carapuça que o colega lançara pouco antes sobre o plenário:

O indulto dá incentivos errados para as pessoas erradas e cria o cenário para sermos o paraíso de corruptores, corruptos, peculatários, prevaricadores, fraudadores de licitações’, dissera Barroso. (…) Claro que ninguém diz que é a favor da corrupção. Todo mundo é contra. Mas, em seguida, encontra um fundamento formal para liberar a farra.”

Noutro trecho do seu voto, Barroso soara ainda mais cáustico:

Também aqui há risco do mesmo discurso. Claro, eu sou contra a corrupção. Mas não posso impedir o presidente da República de exercer suas competências. O mal geralmente vem travestido de bem. Mas quem tem olhos de ver e coração de sentir, sabe quem é quem. E cada um escolhe o lado da história em que deseja estar. Só não dá para querer estar dos dois lados ao mesmo tempo: dizer que é contra a corrupção e ficar do lado dos corruptos.”

A esse ponto chegou o Supremo Tribunal Federal. Num momento em que o brasileiro se esforça para sair do abismo, a banda podre da corte máxima do Judiciário brasileiro revela-se disposta a jogar terra em cima. Alguns magistrados ainda não se deram conta, mas estão enterrando a própria noção de supremacia. Muito mais do que a constitucionalidade do decreto de Temer, o julgamento do indulto decide que tipo de tribunal o Supremo deseja ser.

Com Josias de Souza.

domingo, 22 de abril de 2018

DE VOLTA ÀS ADCs



Depois que o PEN desistiu da ação declaratória de constitucionalidade ― para não dar a impressão de que o objetivo era tirar Lula da cadeia ―, o PCdoB veio com a sua, capitaneada pelo advogado Celso Bandeira de Mello, ligado a movimentos de juristas que condenam os métodos do juiz Sérgio Moro e dos procuradores da Lava-Jato.

Cabe à presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, pautar o julgamento, embora nada impeça o relator, ministro Marco Aurélio Mello, de levar pedido “em mesa”, ou seja, forçar sua discussão, independentemente da vontade da presidente. Mello não suscitou expressamente essa possibilidade, e Cármen Lúcia, para quem seria prematuro rever a posição da Corte neste momento, sobretudo porque essa jurisprudência foi firmada há menos de 2 anos, vem “empurrando a coisa com a barriga” (é difícil imaginar alguém como ela, que pesa pouco mais de 40 quilos, empurrando alguma coisa com a barriga, mas enfim...).   

Chegam a ser irritantes a insistência do ministro vira-casaca Gilmar Mendes em alardear que “mudou de ideia” ― em 2016, o ministro “vira-casaca” integrou a maioria que firmou a jurisprudência favorável à antecipação do cumprimento da pena ― e a obstinação de Marco Aurélio em forçar a rediscussão de um tema tão delicado num momento tão inoportuno. É óbvio que essa questão só voltou à tona devido à prisão de Lula e ao fato de uma ala do STF (a dos ministros “pseudo garantistas”) estar fazendo o possível e impossível para encontrar uma maneira de livrar esse criminoso da cadeia.

Rosa Weber, ao proferir seu voto no julgamento do HC de Lula, deu uma aula de como o Estado de Direito necessita de “estabilidade”, não podendo se sujeitar a “variações frívolas”. Se isto aqui fosse um país sério, a defesa da ministra ao princípio da colegialidade seria não só aplaudida, como também seguida por todos os ministros da Corte. Só que alguns têm egos gigantescos, outros, interesses ocultos e inconfessáveis...

Resumo da ópera: O veto à prisão em segunda instância é um desserviço, uma ameaça ao cidadão de bem. 

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