Dizia eu na postagem anterior que com o afastamento do juiz
Sérgio Moro da 13ª Vara Federal do
Paraná, em Curitiba, os processos da Lava-Jato
que estavam sob sua pena serão conduzidos pela juíza substituta Gabriele Hardt, pelo menos até que o TRF-4 defina quem assumirá
definitivamente o posto. Assim, tanto o julgamento da ação envolvendo a cobertura
vizinha à residência de Lula, em São
Bernardo do Campo, e o terreno para a construção da nova sede do Instituto Lula, em São Paulo, quanto a
instrução do processo sobre o folclórico Sítio
Santa Bárbara, no município paulista de Atibaia, ficarão a cargo dessa
magistrada, que tem 42 anos, é formada em Direito pela Universidade Federal do
Paraná e juíza
substituta na 13ª Vara Federal desde 2014.
O convite feito pelo presidente eleito ao juiz Moro, para comandar superpasta da
Justiça, caiu como uma bomba no colo da petralhada. A folclórica Dilma Rousseff, por exemplo, do alto de sua parvoíce, relembrou
que o magistrado autorizou a gravação
e vazou sua conversa com Lula,
alimentando o processo de impeachment; condenou e determinou a prisão do
ex-presidente sem provas, inviabilizando sua candidatura; vazou a delação de Palocci a uma semana do 1º turno, com o
propósito de prejudicar tanto sua candidatura (de Dilma) ao Senado quanto a de Haddad
à Presidência, e agora anuncia que vai abandonar a magistratura para ser ministro
daquele cuja eleição ele (Moro)
viabilizou com suas decisões.
Rezam pela mesma cartilha a lunática presidente da ORCRIM e senadora rebaixada a deputada,
Gleisi Hoffmann — para quem “Moro será ministro de Bolsonaro depois de ser decisivo pra
sua eleição, ao impedir Lula de
concorrer” — e outros “próceres” petistas, como o também senador derrotado Lindbergh Farias, o deputado reeleito Paulo Pimenta, o próprio candidato
derrotado Fernando Haddad (que de
prócer não tem nada, mas enfim...), e por aí segue a procissão,
sempre entoando o cântico da vitimização, do golpe, e mais um sem-número de bobagens
que tais. A propósito, o presidente eleito declarou (sobre Moro chefiar o Ministério da Justiça) que “se o PT reclamou é porque a decisão foi
acertada”.
A irresignação dessa caterva é mais uma prova de que
seus interesses estão anos-luz distantes dos interesses republicanos. Aliás, o PT e seus satélites vêm prometendo fazer
a mais radical oposição ao próximo governo, além de cobrar urgência ao TSE na análise da ação que pede a
inelegibilidade de Bolsonaro (respaldada
numa matéria jornalística da Folha segundo
a qual empresas apoiadoras do candidato do PSL
teriam comparado pacotes de disparo de mensagens contra o PT por meio do aplicativo mensageiro WhatsApp). É lamentável, para dizer o mínimo, que o país seja
obrigado a aturar tamanha desfaçatez desses maus perdedores.
Uma semana antes do segundo turno, a revista IstoÉ publicou uma matéria de capa em
que comparava a campanha do "poste" de Lula
a um “Cavalo de Troia”. Mas a pergunta é: como alguém poderia acreditar que um imenso cavalo de madeira recheado de soldados fosse um inocente presente para uma cidade?
Observação: No âmbito da
informática, essa expressão remete a um programa malicioso, mas travestido em
aplicativo útil para ludibriar os incautos. A origem remonta à lenda do Cavalo de Tróia contada por Homero em seu poema “Ilíada”, segundo a qual um grande
cavalo de madeira, deixado pelos troianos às portas de Esparta, foi levado para dentro pelos gregos, que pensaram
tratar-se de um presente. Mais tarde, na calada da noite, os soldados que
estavam escondidos no interior do cavalo abriram os portões para o exército de Troia, que assim venceu a guerra.
Em seu livro “A Marcha da
Insensatez”, a escritora e historiadora americana Barbara W. Tuchman, duas vezes laureada com o Prêmio Pulitzer, aborda um dos maiores paradoxos humanos: a insistência dos governos em adotarem
políticas contrárias aos próprios interesses. Em um texto fluido e
envolvente, ela destaca quatro conflitos históricos em que ações equivocadas
tiveram consequências desastrosas para milhares de pessoas: a Guerra de Troia, a reforma protestante, a independência
dos Estados Unidos e a Guerra do
Vietnã.
No Brasil dos nossos dias, às vésperas do segundo turno das
eleições mais conturbadas da história tupiniquim, o PT tentou apresentar à sociedade sua versão do Cavalo de Troia. Por trás do verde e amarelo que substituíram o
vermelho petista, o procurador do criminoso de Garanhuns tentou se dissociar da
imagem do outorgante (que de início procurou assimilar, até mesmo comendo o “s”
dos plurais em seus discursos) e se travestir num simpático ex-ministro da
Educação e ex-prefeito de São Paulo. Todavia, a sequência de erros administrativos
e o envolvimento de Lula e seu partido
nos escabrosos casos de corrupção que quase arruinaram o Brasil continuam
vívidos na memória de uma parte expressiva da população, daí a fraude vermelha ter sido derrotada por uma
diferença de quase 11 milhões de votos.
Contumaz em atribuir aos adversários os próprios erros e suas
consequências, o PT acusa o
presidente eleito de transformar o pleito em plebiscito, quando na verdade quem
fez isso foi o próprio PT. A ideia
de posar de democrata de última hora, apresentar-se como alguém capaz de
aglutinar os partidos de esquerda e pacificar a nação não funcionou, como não
funcionaram tantas outras estratégias petistas.
Na farsa inicialmente encenada,
o presidiário metido a candidato imaginava que a liderança nas pesquisas lhe outorgaria uma espécie de absolvição popular, coroando a tese de que “sua condenação não passou
de uma injustiça”. Mas falhou, continua preso, e seu preposto foi
derrotado por um candidato que, até não muito tempo atrás, não passava de um simples
deputado do baixo clero, para não dizer um ilustre desconhecido.
Por esse mesmo fantasioso caminho da redenção pelas urnas
seguiriam outros petistas enrolados com a Justiça, que também ganharam nas
urnas idêntica resposta à que foi dada ao fantoche de Lula. O formato
plebiscitário foi aceito, mas para derrotar o PT, como provaram os resultados das urnas no primeiro turno (quando
faltou pouco para Bolsonaro sagrar-se
presidente) e comprovaram no segundo.
O PT
apostava que prevaleceria na memória do eleitorado a lembrança do ascensão
econômica havida durante a primeira gestão de Lula, mas que o que prevaleceu foram a corrupção das gestões petistas
e crise gestada e parida pela imprestável gerentona de araque. O que se pretendia
esconder na barriga do Cavalo de Tróia
restou escancarado aos olhos da população (ou pelo menos da parcela pensante da
população).
Preso há quase sete meses na carceragem da PF em Curitiba, Lula transformou sua cela em comitê de campanha e recebeu
visitas frequentes de seu “poste” — numa sequência interrompida somente quando
o próprio presidiário lhe ordenou que só voltasse lá depois da vitória no segundo turno. Na prática, pouco mudou,
pois a ausência do contato pessoal entre o criador e a criatura foi suprida por
emissários do PT, que continuaram indo
a Curitiba, dia sim outro também, para receber instruções sobre os rumos da
campanha. Aliás, se o resultado da eleição tivesse sido outro, a presença de Lula no governo Haddad seriam favas contadas: preso, Lula governaria o país da mesma maneira que dirige seu apodrecido
partido; solto, certamente teria uma posição de destaque no Ministério de
seu poste.
Também como parte da estratégia de transformar a eleição em
plebiscito, Lula tentou emplacar Dilma como senadora, para que, com a
legitimidade outorgada pelos eleitores mineiros, continuasse defendendo as “realizações”
de seu governo e a narrativa de que seu impeachment foi um golpe — falou-se até
que ela seria a nova presidente do Senado. Mais uma vez, porém, “faltou combinar
com os russos”: a anta não foi eleita e o poste foi varrido pelo
tsunami antipetista e antilulista representado pelos 57,8 milhões de votos
obtidos por Jair Messias Bolsonaro.
Engana-se redondamente quem acha que o PT aprendeu a lição. Mesmo derrotado por um sentimento majoritário
antilulista, a associação criminosa travestida de partido tenta manter
a liderança da esquerda brasileira anunciando uma oposição sem trégua ao novo
governo. Haddad, pasmem, continua
insistindo no ramerrão da “prisão injusta” de Lula. A presidente nacional da legenda, Gleisi Hoffmann, chegou mesmo a dizer, na véspera do segundo turno, que o indulto seria o presente ideal para o criminoso de Garanhuns (que completava
73 anos naquele dia).
As urnas deixaram bem claro o que pensam do discurso
petista 57.797.847 eleitores, a exemplo do que fizeram o senador
Cid Gomes (“
Lula tá preso, babaca, vai fazer o quê?”) e o rapper
Mano Brown, que mijaram no chope dos
petistas ao denunciar os “equívocos” cometidos pela
ORCRIM e seu distanciamento do povo. Mas quem pôs a cereja no bolo
foi
Ciro Gomes,
ao
declarar seu rompimento com o PT — que muito provavelmente ficará
isolado na condição de oposição radical a qualquer preço (detalhes
nesta
postagem). O ex-governador do Ceará sinaliza que fará uma oposição mais
equilibrada — até onde isso lhe for possível, dado seu notório temperamento explosivo
—, que pode render frutos para sua liderança.
Em última análise, a única chance
de o PT voltar a se colocar como
grande esperança do povo brasileiro seria um retumbante fracasso do governo Bolsonaro, mas isso já é outra conversa.
Por essa e outras, o partido jogará no “quanto pior, melhor”, como sempre fez
ao não votar em Tancredo Neves para
presidente, não apoiar o governo de transição de Itamar Franco, não assinar a Constituição
de 1988, não apoiar o Plano Real,
e por aí vai.
Agora, diante do convite (e respectiva aceitação) feito a Moro para comandar a pasta da Justiça, a seita maldita, temendo pelo
próprio rabo, alardeia uma suposta parcialidade do juiz Moro contra Lula — o
que também tem precedentes: em em 1989, depois de ter sido derrotado por Collor no segundo turno da primeira
eleição direta pós redemocratização, o partido acusou o
presidente eleito de estar pagando favores (depois que Collor convidou Francisco
Rezek, ministro do STF que
coordenara a eleição como Presidente do TSE,
para a pasta das Relações Exteriores). Guardadas as devidas proporções, é isso que o PT faz agora, em mais uma lunática
teoria conspiratória que vê na nomeação do magistrado a “prova cabal” de
parcialidade na condução dos processos contra Lula. Mas basta ter olhos e isenção de ânimo para ver que é perfeitamente
natural um candidato eleito em grande parte por defender a luta contra a corrupção
e apoiar a Lava-Jato convidar o símbolo maior desse combate para
integrar seu ministério .
Haveria muito mais a dizer, mas vejo agora que o texto já ficou longo demais. Para encerrar, relembro apenas que a partir de janeiro
Moro deverá controlar a
Polícia Federal, a
Polícia Rodoviária Federal, a
Controladoria-Geral
da União e parte do
Coaf — hoje
atrelado ao Ministério da Fazenda. Sua agenda será
“anticorrupção” e “anticrime
organizado”, segundo o presidente eleito, que prometeu ao escolhido
“total liberdade”
para indicar o primeiro escalão do que chamou de “
superministério”, além de “
caminho
aberto” para ser
indicado ao Supremo Tribunal
Federal em 2020, na vaga que será aberta pelo atual ministro
Celso de Mello.
Petralhada, tremei!