Mostrando postagens com marcador Dora Kramer. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Dora Kramer. Mostrar todas as postagens

segunda-feira, 2 de setembro de 2019

BOLSONARO X MORO. É, MAS NÃO É MUITO!



Dizia eu no post do último sábado que só Deus sabe até quando o ministro Sérgio Moro continuará criando saídas honrosas para as desonras que Bolsonaro lhe impinge dia sim, outro também. Só Deus, o Diabo e o próprio Moro sabem com quantos batráquios se faz a indigestão de um "patrimônio nacional", como o capitão se referiu ao subordinado na última quinta-feira.

Pois bem. Dora Kramer diz que de bobo Moro não tem nada, ou não teria saído do anonimato de uma vara da Justiça Federal em Curitiba para a cena nacional como a grande estrela da operação que desmontou o esquema de corrupção na Petrobras e fez a casa de Lula cair. Portanto — prossegue a jornalista —, requer prudência a avaliação recorrente de que o ministro estaria se submetendo inocente e inutilmente a humilhações impostas pelo presidente Bolsonaro

Peço vênia para discordar. Moro criou sua reputação na 13ª Vara Federal do Paraná, e foi justamente por isso que Bolsonaro, quando ainda prometia travar uma cruzada contra a corrupção, convidou o magistrado a chefiar o ministério da Justiça no seu governo. O que motivou o hoje ex-juiz a abandonar uma carreira de mais de 20 anos na magistratura foi, primeiro, a possibilidade de levar adiante seu projeto anticrime e anticorrupção; segundo, a promessa de que teria carta branca para agir; terceiro, a perspectiva de ascender ao Supremo Tribunal Federal — sonho de todo juiz e até de que não o é; na composição atual da corte, somente Luiz Fux e Rosa Weber são juízes de carreira. Por algum motivo incerto e não sabido, essa promessa vem sendo negada, mas foi verbalizada publicamente por Bolsonaro em maio passado. Sabe-se que o capitão é useiro e vezeiro em desdizer o que disse e dizer que não disse nada do que disse (e depois fica puto quando o chamam de mentiroso), mas até aí morreu o Neves.    

Dora diz ainda que se espera de Sérgio Moro uma reação enérgica, que peça demissão ou ao menos responda ao chefe que lhe solapa a autoridade. Mas deixa indeterminado o sujeito da frase. Quem espera esse resultado? O presidente? A mídia? Os guerreiros mais poderosos são a paciência e o tempo. E Moro é um estrategista. Sempre foi. Quiçá ele tenha se arrependido de ter trocado o certo pelo duvidoso, mas as pontes foram queimadas e as caravelas, postas a pique. Como dizia meu finado pai, o jeito é sorrir e tocar pra frente.

Moro, prossegue Dora, vem seguindo os ensinamentos de Sun Tzu, isto é, usando a força do inimigo para derrotá-lo sem lutar, e a esta altura não iria a parte alguma demitindo-se ou exigindo um respeito que Bolsonaro não tem nem se dispõe a dar a ninguém de fora de seu círculo familiar e/ou bajulador (siga este link para conferir o texto na íntegra). Quanto a isso não há como discordar.

Bolsonaro também faz seus lances na coxia do palco onde exibe suas estridências. Diz que não liga para pesquisas, mas certamente não lhe passou despercebido o fato de ele registra uma desaprovação acima dos 50%, enquanto Moro e a Lava-Jato se mantêm no patamar de maioria em termos de aprovação. O presidente é obviamente amalucado, mas não é cego nem surdo e, quando lhe interessa, põe o pé no freio. Bem como Moro acelera na velocidade que lhe é conveniente. E assim seguem os dois num vaivém que, se não pode ser comparado ao xadrez, assemelha-se a um jogo de gato e rato em que se confundem e se alternam forças e vantagens de caça e caçador. 

Também disso não há como discordar.

quinta-feira, 8 de novembro de 2018

CRÍTICA E AUTOCRÍTICA



Ainda convalescendo dos efeitos da “síndrome do macaco”, venho enfrentando alguma dificuldade para desenvolver postagens sobre o atual cenário político. Assim, ainda de ressaca da análise circunstanciada que apresentei nas duas últimas postagens sobre o presidente eleito e sobre o estapafúrdio pedido da defesa de Lula para anular o julgamento do processo em que o molusco foi condenado, resolvi, na postagem de hoje, apenas transcrever mais um texto brilhante de Dora Kramer e uma tirada do igualmente impagável Augusto Nunes. Começando pelo último:

Manuela d'Ávila corre o risco de levar um triplo puxão de orelhas de Haddad, de Gleisi e do chefão presidiário. A deputada do PCdoB — eterno satélite do PT —, vice do poste que Lula fabricou e Jair Bolsonaro pulverizou, saiu-se, numa entrevista à Globo, com a seguinte pérola:

“O Ciro teve uma participação brilhante no primeiro turno e ele foi quem viabilizou também, com seu elevado percentual de votos, o segundo turno. Ciro não contribuiu para nossa derrota. Ele contribuiu para a existência do segundo turno com a campanha que fez até o último dia em alta intensidade. Ele cometeu um equívoco em não se envolver no segundo turno”.

Agora o texto de Dora Kramer:

Ainda sob os efeitos do azedume geral, pode ser difícil pensar em produzir limonadas a partir da colossal quantidade de limões encruados nas almas e entalados nas gargantas país afora. Não falo de pacificações ao molde de conversões forçadas por um bom-mocismo de ocasião. Tampouco me refiro a pregações por união nacional mediante a interferência da figura de um pacificador, dada a semelhança com o anseio por um salvador.

Tudo isso é mito. Civilizatório, realista e institucionalmente pedagógico é o aprendizado do exercício do contraditório dentro das balizas do bom-senso. A eleição de Jair Bolsonaro, do jeito e pelas razões (ainda a ser completamente desvendadas e catalogadas) que ocorreu, põe o Brasil diante de uma preciosa oportunidade de subir de patamar na qualidade das relações entre governantes e governados.

Por paradoxal que soe, esse caminho foi aberto pelo ambiente de acirramento extremo que vem tomando conta do país já há algum tempo e que chegou aos píncaros durante a campanha eleitoral. Tivemos um processo inédito do qual resultou uma situação também sem precedentes. Nenhuma das eleições anteriores, desde a retomada do voto direto para presidente, produziu uma vitória que aborrecesse com tanta estridência tal volume de eleitores. O mesmo teria ocorrido caso o vencedor fosse o oponente, diga-se.

Somados os votos dados ao derrotado com a manifestação dos que preferiram não se posicionar (já expressando aí uma posição), grosso modo tivemos um contingente de praticamente metade do eleitorado habilitado. Isso significa que o eleito já inicia sua trajetória sob intenso mau humor social. Ruim? Depende da perspectiva. Se a ideia é que governos novos precisam ter aceitação unânime para se legitimar e conseguir trabalhar, a resposta é sim, bem ruim.

Podemos, contudo, adotar outro ponto de vista, aquele segundo o qual a existência de uma substanciosa massa crítica no país melhora a sociedade, aumenta o grau de consciência de cidadania e alimenta a noção de que governos existem para servir à coletividade, e não para servir-se dela com apropriação indevida do dinheiro de todos e da captura de consciências. Nesse caso, a existência de uma oposição social vigorosa é benéfica. Já vimos o que a subserviência a mitologias da propaganda oficial fez nos governos do PT.

Estabeleceu-se a lógica da criminalização da crítica, e, com isso, os então locatários do poder sentiram-se desobrigados de qualquer autocrítica. Quando tentaram voltar, depararam com uma força antagônica cujas fundações foram fincadas no pecado original do elogio à unanimidade. Não fosse isso, talvez as coisas tivessem tomado outro rumo em decorrência da vigilância e das exigências rigorosas da sociedade.

Jair Bolsonaro não terá a vida boa de Luiz Inácio da Silva no tocante à aceitação impune por longo período. E querem saber, senhoras e senhores? É ótimo que assim seja.