Termina nesta sexta-feria a abjeta propaganda eleitoral obrigatória
e depois de amanhã, a aborrecente novela eleitoral edição 2018 — a mais
polarizada desde a redemocratização e com o nível da campanha em patamares abissais.
Na disputa
pelo Palácio dos Bandeirantes, as pesquisas apontam empate técnico entre João Doria e Márcio França, enquanto ambos disputam a tapa a preferência dos indecisos —
o primeiro, com um retumbante discurso antipetista e o segundo, tentando assobiar e chupar cana, acenando para a esquerda e, ao mesmo tempo, afagando os que não querem ver o PT nem pintado.
No pleito presidencial, o Capitão Caverna — que lidera as pesquisas com 57% dos votos válidos — “joga
parado” e tenta manter na coleira seus ferozes pitbulls, embora nem sempre
consiga controlar a própria língua.
Atualização: Segundo pesquisa Datafolha divulgada no início da noite de ontem, Bolsonaro tem 56% das intenções de voto
e Haddad, 44%. Não se sabe se essa
mudança de humor do eleitorado é uma tendência ou se tem a ver com as últimas
acusações contra o capitão — os entrevistados podem ter sido influenciados
pelas fake news que não se confirmaram, como a acusação de que o vice do capitão seria
um torturador, além do caso WhatsApp
e o vídeo de Eduardo Bolsonaro
falando no “fechamento do STF”. Os números
do Datafolha sugerem que a diferença,
que no levantamento anterior era de 18 pontos percentuais, caiu para 12, mas na
prática ela era de 9 e caiu para 6, pois cada ponto que um candidato ganha, o
outro perde em disputas polarizadas. Isso significa cerca de 5 milhões de votos
por dia para serem revertidos, e esse feito não foi conseguido nos últimos dias.
Na última quarta-feira, os advogados do capitão pediram o arquivamento da ação aberta pelo TSE para apurar as acusações de que
empresas compraram pacotes de disparos em larga escala de mensagens contra o PT e
a campanha de Haddad.
A alegação é
que a denúncia publicada pela Folha
é vazia, sem fundamento nem evidências de conduta ilegal, e que a coligação
rival, por estar muito atrás nas pesquisas, tenta criar um “fato político
inverídico e a partir daí produzir celeuma midiática” (segundo o Ibope/Estado/Globo, 73% dos entrevistados disseram não ter recebido críticas
ou ataques a candidatos via WhatsApp
na semana que antecedeu o primeiro turno).
Do outro canto do ringue, o fantoche do presidiário insiste
num debate ao vivo e em cores, sem o qual, ressalta ele, esta será a primeira vez que uma eleição presidencial chega ao final sem que
pelo menos um debate entre os postulantes ao Planalto seja realizado e transmitido ao vivo pela TV.
Bolsonaro compareceu a dois debates
antes do primeiro turno, mas foi alvo de um atentado e ficou hospitalizado por
semanas a fio. Agora, a despeito de os médicos terem deixado a decisão a seu
critério, ele se recusa estrategicamente a participar, dizendo, inclusive, que “quem conversa com poste é bêbado”.
Salvo melhor juízo, debates são importantes quando envolvem ideias e
projetos. No entanto, a julgar pelo que se viu nos embates entre os postulantes
ao governo de estado, a coisa provavelmente se resumiria a uma abjeta troca de acusações
e ofensas de parte a parte que não ajuda em nada o eleitor indeciso a definir
seu voto. Haddad pleiteou no TSE que
o debate marcado para esta sexta-feira, na Globo, fosse convertido em
entrevista, mas o pedido foi negado pelo ministro Sérgio Banhos.
Fernão Lara Mesquita,
em recente artigo publicado no Estadão
e reproduzido no blog Vespeiro, faz uma análise lúcida da
situação atual. Confira o excerto a seguir:
Sobre a semana de “Desespero” que passou, nada mais
a dizer. Sobre “ameaças à democracia” no país que caminha para os finalmentes
de uma lição exemplar sobre a real proporção da viagem na maionese de quem quer
que acredite que pode tornar-se dono dele e ditar-lhe regras, não há mais
qualquer preocupação. Arrancamo-nos do século 20 e, dele, ninguém nos pega
mais. Podemos voltar a dar-nos o luxo de pensar o futuro. Mas a verdade nos
libertará?
Sem dúvida, somente a verdade nos poderá
libertar. Mas se será desta vez ou não que a “conheceremos”, essa é a dúvida
que, resolvida a eleição, ainda remanesce. Há uma promessa de olhar para o
quadrante onde os problemas de fato estão na economia e em outras vertentes não
totalmente desprovidas de importância no espaço aberto entre a história real e
a narrativa do drama brasileiro. Não é pouco, considerado o ineditismo e a
distância que tomamos da realidade, mas é só o que há.
Atacar questões como as da Previdência e do resto
do sistema de privilégios e colonização do Estado [...] é um imperativo de
sobrevivência. Os 0,5% da população empregados pelo Estado, que os outros 99,5%
sustentam, consomem integralmente os 40% do PIB que o Estado toma à Nação e
mais o que contrata de dívida por ano nas costas dela sem nenhuma contrapartida
de merecimento. [...] Os 63 mil assassinados por ano são a forma final que essa
fatura assume depois de vir espalhando miséria no corpo e na alma do Brasil
pelo caminho afora. Isso vai ter de parar. Vai ter de voltar para trás. Não há
mais escolha.
Mas tudo isso ainda são efeitos. A causa de tudo
ainda é a política. Tudo o mais que nos atropela é decorrência direta da
inexistência de um sistema real de representação do País real no País oficial e
da inexpugnável blindagem dos mecanismos de decisão contra qualquer
interferência da massa dos excluídos, da plebe, da ralé também dita
“eleitorado”. Os países são feitos para quem tem a última palavra no seu
processo de tomada de decisões. E muito pouca coisa para além dessa verdade é
verdade no blablablá com que nos engambelam desde Tiradentes. Existe democracia
se e quando há uma ligação aferível dos representados de cada representante
eleito e estes dispõem de instrumentos efetivos para impor a sua lei àqueles. É
simples assim. Tem o poder quem tem o poder de demitir. É isso que decide se o
país será construído pelos representantes eleitos para eles próprios e para “os
seus” ou para o povo, para os eleitores.
Hoje a dúvida sobre para quem é feito o Brasil é
zero. É dado à plebe, à ralé, ao eleitorado ir às urnas a cada quatro anos,
como irá mais uma vez domingo, mas daí por diante e até a próxima eleição, em
mais quatro anos, ele estará totalmente excluído da discussão do seu próprio
destino. [...] E, no entanto, passa batida, como a expressão da mais pura
verdade estabelecida, a afirmação, diariamente repetida pela situação e pela
oposição e amplificada pelos “contra” e pelos “a favor”, de que tocar em
qualquer desses privilégios seria “altamente impopular”. É um resumo eloquente
da extensão da imunodeficiência nacional à mentira.
A mera exposição honesta e didática das parcelas
que compõem a miséria do Brasil conduzirá à libertação do nó cego de mentiras
que mantêm atadas as contas públicas. [...] Mas até aí estaremos falando apenas
de manter viva a galinha dos ovos de ouro. E de assegurar a disputa pelo
“direito” de ser o primeiro a colhê-los. O lugar de honra do panteão dos heróis
da História continuará vago até que chegue quem seja honesto o bastante para
fazer a reforma política que tornará impossível que, “como regra, a mentira
esteja acima de tudo no nosso meio político”, seja quem for o eleito da vez
para fazer o seu turno “lá”. [...] Voto distrital puro para garantir a
fidelidade da representação do País real no País oficial e para tornar
operacional mudar com segurança no ritmo da necessidade, direito de retomada de
mandatos e referendo das leis dos Legislativos a qualquer momento para lembrar
sempre quem é que manda, eleições de retenção de juízes para prevenir marchas à
ré. Eis a verdade que nos libertaria.
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