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sexta-feira, 28 de setembro de 2018

SEM NEXO — Ou: ELEIÇÕES 2018 -- SE CORRER O BICHO PEGA; SE FICAR...


O que aconteceria num país que teve quase catorze anos seguidos da mais ruinosa administração econômica que se possa imaginar, com direito à maior recessão na história de sua economia?

Além das repetidas tentativas de suicídio econômico, armou-se ao longo desse período o que provavelmente tenha sido o mais alucinante sistema de corrupção jamais visto na administração pública mundial. A máquina do Estado foi privatizada em favor dos partidos que apoiavam os governos, primeiro o do ex-presidente Lula e depois o de Dilma Rousseff.

Milhares de cargos públicos foram entregues a militantes do PT e outros coletivos de esquerda. Bilhões de reais desapareceram do Tesouro Nacional e foram acabar nos bolsos de dirigentes de “movimentos sociais”, ONGs, governantes de países estrangeiros que não se submetem à lei internacional, ditadores africanos, filhos de ditadores africanos que são pegos na alfândega do Brasil com malas abarrotadas de dinheiro vivo.

O ex-presidente está na cadeia, condenado a doze anos por corrupção e lavagem de dinheiro. Estão presos ex-ministros, diretores de estatais e outros barões do seu governo, quase todos réus confessos — e por aí afora. Muito bem. A única resposta possível para a pergunta feita no parágrafo inicial, dentro da lógica comum, é a seguinte: na primeira eleição que aparecesse, os responsáveis diretos pelas calamidades descritas acima receberiam da maioria dos eleitores uma ordem clara de cair fora do governo e ficar o mais longe possível dele, de preferência para sempre. Mas o país dessa história é o Brasil, e no Brasil as coisas raramente fazem nexo.

O problema não está tanto no comportamento do eleitorado, que segundo as “pesquisas de intenção de voto” põe numa situação privilegiada, quase de favorito, o candidato que promete abertamente ressuscitar a catástrofe dos governos Lula e Dilma. Num eleitorado em que a maioria dos 150 milhões de votantes não têm nenhum preparo para escolher nada, qualquer farsante, bem treinado para mentir mais que os outros candidatos, sempre terá chances excelentes de ganhar.

O curioso, na atual eleição presidencial, é que grande parte da elite empresarial brasileira — aquela que se imagina mais avançada, vê a si própria como merecedora de uma cota de sócia no mundo civilizado, lê os jornais e revistas de Nova York ou Londres, etc., etc., etc. — esteja achando que o candidato que promete voltar ao governo passado é o mais adequado para ocupar o governo futuro.

Não que Fernando Haddad seja o homem ideal, claro. Nossos mais distintos magnatas e seus guias espirituais prefeririam um Emmanuel Macron, digamos, ou coisa que o valha; mas Monsieur Macron não está disponível. A saída, então, é se arrumar com esse Haddad mesmo. É verdade que ele tem, entre todos os candidatos, o mais bem armado projeto de destruição do Brasil. O que se vai fazer, porém? A alternativa é eleger um homem de extrema direita — e isso deixa passando mal os nossos capitães de indústria, comércio e finanças — ou, pelo menos, é o que dizem. Haddad, imaginam, é uma pessoa com quem daria “para conversar”.

De mais a mais, é essa a instrução que recebem no momento do The Economist — e nos últimos anos, por razões de ordem psicológica que talvez sejam melhor esclarecidas no futuro, o The Economist virou uma espécie de Almanaque Capivari para os empresários brasileiros da modalidade “civilizada-liberal-contemporânea”. Acreditam no que é publicado ali como se acredita na tábua de marés da Marinha Nacional — e ali estão dizendo que Haddad, além de ter sido um prefeito “de êxito” em São Paulo, poderia inclinar-se para uma abordagem mais liberal da economia.

Quem pode levar a sério um disparate desses? Mais gente do que você pensa. Empreiteiros de obras públicas, banqueiros preocupados em manter o monopólio que tanto dinheiro lhe deu nos governos Lula-Dilma, fornecedores de sondas nacionais para a Petrobras, Joesleys, Eikes e todo o resto da turma estão prontos para assinar embaixo.

Por J.R. Guzzo — Publicado na edição impressa da EXAME

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quinta-feira, 27 de setembro de 2018

O PT NÃO PRECISA DA NOSSA AJUDA PARA SER DEMONIZADO



Neste primeiro turno de 2018, a emergência no campo político-prático de pautas de teor liberal e conservador, oriundas daquilo que chamei, ao lado de muitos outros, de “nova direita” brasileira, tem suscitado, pela forma com que se dá, estresses e preocupações. Essas pautas estão diluídas entre mais de uma candidatura, de partidos diferentes, para os vários cargos da República, e isso tem estimulado alguns segmentos mais dogmáticos, intransigentes ou mesmo movidos por interesses mesquinhos não confessados, a promover verdadeiras sanhas persecutórias e difundir mentiras e ataques rasos e gratuitos dentro da própria direita.

Isso não começou agora; desde a consumação do impeachment, têm sido observados esses “efeitos de manada” para ataques conjuntos e essas retóricas seletivamente ferinas. Há grupos que efetivamente procuram infiltrar no debate do momento teorias perigosamente antiliberais, no sentido mesmo institucional do liberalismo, demonstrando desprezo pelo sistema representativo e liberdades individuais, tais como a religiosa. A título de exemplo, poderiam ser citados os desafetos que atacaram, até com expressões de baixíssimo calão, meu artigo contra a tese do “Estado católico”, em seus vídeos populares do YouTube.

Tudo isso, ressalvada a inevitabilidade das divergências internas e até a necessidade de aprendermos com elas, tem de ser veementemente condenado quando ultrapassa certos limites mínimos de civilidade. Apoio qualquer iniciativa nesse sentido. Contudo, o receio desses grupos e do impacto que possam vir a ter, que esperamos seja sempre reduzido, não nos deveria levar a, histericamente, acreditar que tudo que fizemos e pregamos nos últimos quatro ou cinco anos está perdido e que fomos tomados por fanáticos totalitários.

Essa conclusão, que alguns amigos estão adotando, me parece um grave equívoco e um erro de leitura. É incorrer por demais na narrativa social democrata de que não podemos deixar as eleições “se transformarem em um plebiscito movido pelo ódio e pelos extremos”. Estou convencido de que há quem esteja confundindo o acirramento de ânimos no período eleitoral, bem como algumas consequências esperadas de uma massificação das ideias e da demanda por uma reação às esquerdas, com uma decantação disruptiva e apocalíptica da sociedade, pela qual nós, que usamos a necessária retórica de dureza no quadro contemporâneo, seríamos tão responsáveis quanto os próceres do lulopetismo.
Não poderia discordar mais dessa linha de raciocínio. A direita não é responsável em absolutamente grau nenhum por qualquer clima de divisão exacerbada ou decantação social que se acredite estar pairando no ar. Ela é apenas uma reação tardia a uma hegemonia perturbadora que inevitavelmente não poderia subsistir para sempre

Nos anos 50, a UDN detonava o varguismo da tribuna, Carlos Lacerda sofreu atentado, manifestações de rua estavam à beira da revolução e um presidente se suicidou. Nos anos 60, vivíamos a Guerra Fria, o presidente pregava abertamente contra a Constituição no Comício da Central e terminou deposto e substituído por um regime militar. É fato que costumamos resolver nossos conflitos históricos com menos derramamento de sangue, mas não posso deixar de pensar que há certo superdimensionamento do suposto caráter inédito da “polarização” nacional que alguns vêm apontando.

A memória recente do marasmo e da briga de comadres do pós-regime militar está contaminando o juízo desses analistas que dizem que precisamos refrear o tom de beligerância, “falar mais fino” e pregar o absoluto “consenso”, a “estabilidade” e a “tranquilidade” perante o PT. É como se pecássemos em dizer o óbvio: que o PT é, sim, sem meias palavras, uma força maligna. A presença de divergências fundamentais (em português claro, a presença de uma direita) é o que parece estar realmente incomodando por demais alguns intelectuais mais santarrões.

Houvessem Churchill e Reagan, por exemplo, tratado o nazismo e o socialismo soviético como meros divergentes, contra quem não existisse um embate civilizacional e moral, e talvez os resultados que obteriam fossem bem diferentes do que aqueles que a História registra. Nossos liberais e conservadores podem e devem divergir, podem e devem denunciar radicalismos presentes em seu próprio seio, mas não deveriam agir como sociais democratas – caso contrário, para que existirmos, se não faremos diferença alguma, visto que a social democracia já predomina como fundamento mínimo das estruturas sociais, políticas e culturais brasileiras há décadas?

É preciso não perdermos o receio de proclamar: ainda estamos, e nunca deixamos de estar, em guerra contra o PT. A ascensão de Fernando Haddad nas intenções de voto, por mais que ponderemos nosso ceticismo perante as pesquisas oficiais, apenas ilustra a força do inimigo. O discurso do “ah, atenue essa retórica, somos apenas adversários!” só seria tolerável vindo de quem tivesse passado todos os últimos tempos em profunda hibernação.

Reproduzo o que disse Lacerda acerca de sua oposição a Vargas, ao afirmar, na Tribuna da Imprensa, que “a divisão não seria de opiniões e sim de concepções de vida, do Estado, da sociedade, da nação”. Permanece existindo no Brasil um conflito entre quem acredita que o país pode ser governado da cadeia, por uma organização totalitária e criminosa que o afundou para perseguir a perpetuação no poder, e quem se opõe a isso. Tal distinção vai muito além de uma mera diferença de opiniões e, portanto, por puro realismo e coerência com a situação concreta, precisa ser encarada com a firmeza e a energia devidas.

Tive que ler nos últimos dias que estamos sendo imprudentes ao “demonizar” o PT. O PT não precisa de ajuda para ser demonizado. Quem ainda acredita nisso, considerando até que votar em candidatos do PT no segundo turno é cogitável, realmente, se não estiver mergulhado em ignorância ou em lamentáveis idiossincrasias, só pode estar pensando em qualquer outra coisa que não o bem do Brasil.

Por Lucas Berlanza, publicado pelo Instituto Liberal

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