Mostrando postagens com marcador PT. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador PT. Mostrar todas as postagens

quinta-feira, 3 de outubro de 2019

UMA HISTÓRIA DO OUTRO MUNDO — PARTE 2



O STF tornou-se uma usina de decisões monocráticas cuja essência varia ao sabor das convicções político-partidárias de cada decisor. Quando estender os limites da hermenêutica não lhes parece suficiente, os ministros se travestem de legisladores e amoldam os fatos a suas versões. Membros do poder legislativo são eleitos pelo povo, e (pelo menos em tese) são punidos nas urnas quando mijam fora do penico. Togados supremos são indicados pelo presidente da vez, e da feita que se aboletam nas cobiçadas poltronas cor de caramelo, lá permanecem até completar 75 anos, pedir o boné por iniciativa própria (é raro, mas acontece), ou passar a comer capim pela raiz na chácara do vigário. 

Na semana passada, a corte transformou um Habeas Corpus em processo objetivo e anulou a segunda sentença, no âmbito da Lava- com base numa jurisprudência improvisada, criada sob medida para homenagear criminosos e escarnecer da população de bem deste país de merda. No início da noite de ontem, o plenário alcançou os 8 votos necessários para o desenvolvimento de uma tese que norteie as instâncias inferiores sobre a ordem de declarações em processos que envolvem réus delatores e delatados. Dado o "avançado da hora", os incansáveis trabalhadores supremos entraram em recesso (afinal, ninguém é de ferro). Se nada mudar e ninguém tiver coisa melhor a fazer, eles voltarão a se reunir novamente hoje à tarde, quando então a tese em questão deverá ser definida. 

Quando transferiu a competência para o julgamento de crimes comuns que tinham alguma conexão com delitos eleitorais para a Justiça Eleitoral, que não está aparelhada para julgá-los, o STF arrancou um braço da Lava-Jato. Agora, com essa decisão que vai atrasar processos sem nenhuma base legal, arranca uma perna da Lava-Jato. A corrupção continua correndo no Brasil com dois braços e duas pernas, mas passará a ser combatida por uma operação maneta e perneta. Os bandidos estão em festa.

Entrementes, o Senado concluiu o primeiro turno da votação da reforma da Previdência. Esperava-se que passassem a limpo a proposta aprovada na Câmara, mas os eminentes senadores decidiram passar a sujo a emenda constitucional previdenciária: além de não melhorarem o texto, conseguiram piorar o que já não era grande coisa.

Dito isso, passemos ao segundo capítulo da nossa historinha.

Quem leu o capítulo inicial desta peça de ficção (volto a frisar que qualquer semelhança com fatos, eventos ou pessoas reais é mera coincidência) pode enxergar similitudes entre Bostil — clone do Brasil no planeta Lodo ou numa dimensão paralela qualquer— e nossa "pátria amada, idolatrada, salve, salve" aqui na Terra, onde tão jogando futebol, tem muito samba, muito choro e rock'n'roll. Mas o que eu quero é lhes dizer que a coisa lá está preta.

Enquanto no país do futuro temos tido uma sequência de presidentes patriotas, probos e competentes, criteriosamente escolhidos por um eleitorado politizado, esclarecido e cioso de seus direitos constitucionais, além de parlamentares de reputação inatacável, que efetivamente zelam pelos interesses da sociedade, o Congresso Nacional de Bostil reúne uma caterva de criminosos da pior espécie.

Os políticos bostileiros, notadamente os deputados e senadores que dão expediente em Bostília — esse é o nome da capital do nosso clone —, são corporativistas, fisiologistas e corruptos. Seu único propósito é locupletar-se da coisa pública, favorecer amigos e familiares e saciar o apetite pantagruélico dos abjetos partidos políticos (mais de 30 estão regularmente inscritos na injustiça eleitoral daquela banânia). E um poder que se serve em vez de servir é um poder que não serve.

Se nos custa acreditar na existência de um país assim, é porque aqui somos todos cultos e politizados. Nosso  povo respeita filas, faixas de pedestre, sinais de trânsito... Ninguém cospe no chão ou joga papel na rua. Quando usa banheiro público, brasileiro urina dentro do vaso, não sobre a tampa. E depois dá a descarga. Nas eleições, nosso eleitorado nota 10 vota consciente de estar escolhendo os candidatos mais preparados entre uma gama de opções de altíssimo nível, que vê na defesa da coisa pública um sacerdócio.

Já em Bostil o povo é porco, mal-educado e bronco. Participar das eleições não é um direito dos cidadãos, mas uma obrigação. Até analfabetos têm título eleitoral. À guisa de protesto, vira e mexe essa caterva em imbecis vota em rinocerontes, chimpanzés. Já foram eleitos cantores sem talento (tanto para a arte quanto para a política), ator de filme pornô, animador de programa de auditório, massagista de time de futebol e até palhaço de circo. Como há dezenas de milhões de desempregados, não falta quem vote em candidatos desonestos em troca de camiseta, dentadura, dinheiro pra cachaça ou dois merréis de mel coado.

Mas o que esperar de uma nação em que a população é incapaz de encontrar a própria bunda usando as duas mãos e um farolete, não tem condições sequer de escolher um síndico de condomínio de periferia e ainda é obrigada a comparecer às urnas a cada dois anos para escolher seu presidente e demais representantes nas esferas federal, estadual e municipal de uma lista de candidatos que não valem a merda que cagam?

E a ignomínia bostiliana não se limita aos poderes Executivo e Legislativo. Como aqui, lá existe um Poder Judiciário e uma imprensa atuante, mas, ao contrário dos nossos togados supremos, que têm reputação ilibada e notável saber jurídico, os juízes bostileiros são indicados à luz de interesses políticos (e quase nunca republicanos) pelo presidente da República da vez, sem a observância dos mais elementares princípios da meritocracia. E a sabatina a que são submetidos no Congresso é um jogo de cartas marcadas, para não dizer uma verdadeira palhaçada, já que lá, o palhaço é o povo.

Como é do couro que sai a correia, diversos ministros das cortes superiores bostileiras são corruptos ou, no mínimo, coniventes com os criminosos (sobretudo de colarinho branco), subservientes aos interesses dos advogados estrelados que os representam e eternos devedores daquele (presidente da República) que os indicou para o mais alto posto no Judiciário bostileiro. Como um país assim pode funcionar?

Enquanto aqui quase não existe crime (roubar para quê, se há emprego, moradia, educação, saúde e segurança pública para todos, e mesmo quem ganha salário mínimo tem mais do que precisa para viver confortavelmente e pôr mesa farta para os seus), em Bostil são os foras-da-lei que ditam as regras. Vez por outra a polícia prende alguns, mas a turma dos "direitos humanos" logo sai em sua defesa. Lá, as leis são criadas para favorecer os infratores em detrimento dos cidadãos de bem, e algumas chegam ao cúmulo de prever punições para policiais, procuradores, promotores, juízes et cætera, que acabam constrangidos e desestimulados de fazer um bom trabalho.

Em Bostil, só bandido pé-de-chinelo fica na cadeia. Quem têm cacife para pagar honorários milionários a criminalistas bambambãs jamais vê o sol nascer quadrado. E na hipótese (remota) de ser flagrado com a boca na botija, não faltará ao bandido azarado um desembargador ou ministro (como são chamados tanto lá quanto cá os eminentes juízes dos tribunais superiores) para soltá-lo antes que o diabo pisque um olho. Segundo nosso correspondente exclusivo naquele fim de mundo, alguns desses magistrados são regiamente recompensados por seus "favores", mas o medo de sofrer represálias o impede de dar nomes aos bois. 

Bostil é assolado pela corrupção desde sua colonização, mas quem a institucionalizou e potencializou foram os comunas do Partido dos Camarões. A pouca vergonha chegou a tal ponto que uma quadrilha comandada por essa agremiação criminosa de esquerda e integrada por políticos suprapartidários mancomunados com empresários do mais do alto escalão quase pôs a pique a petrolífera Petrobosta — entre outras estatais bostileiras que os gatunos sugaram durante anos com uma sofreguidão pantagruélica. Aliás, foi essa ambição desmedida que gerou a pressão popular que resultou no impeachment da presidanta Vilma Meketreff e, mais adiante, na condenação e prisão de seu antecessor, padrinho e mentor Lulaís Pascácio Mula da Selva.

Pode parecer contraditório uma terra sem lei ter um ex-presidente na cadeia, mas o fato é que as coisas começaram a mudar quando a Operação Mata-Rato — uma força-tarefa formada por membros do Ministério Público e policiais federais — passou a investigar, processar, condenar e prender roedores de todas as gamas do espectro político, a começara das ratazanas do Partido dos Camarões.

Os detalhes ficam para o próximo capítulo.

sábado, 28 de setembro de 2019

AINDA SOBRE O "CASO JANOT" E O DISCURSO DE BOLSONARO



Ainda sobre o supremo buchicho da última quinta-feira, o prosseguimento ficou marcado para a próxima quarta, quando então a composição plenária contará com a presença do anjinho barroco primo de Collor, e todos ouvirão atentamente a solução que o mestre de cerimônias do circo supremo promete tirar magicamente da cartola. Até lá, resta-nos a certeza de que as forças do bem nem sempre vencem o mal: a despeito do didatismo do relatório do ministro Fachin, das ponderações lúcidas dos ministros BarrosoFux, o entendimento que prosperou foi o de que, quando se trata de favorecer criminosos, normas estranhas aos nossos diplomas legais (e não estou falando aqui de leis consuetudinárias) podem e devem ser aplicadas, sobretudo se ajudarem a pavimentar a estrada dos tijolos vermelhos que leva à soltura do sórdido criminoso de Garanhuns. Também na quinta-feira, causou frisson a notícia de que Rodrigo Janot chegou ao cúmulo de entrar armado no STF para exterminar Gilmar Mendes e dar cabo da própria vida. Vamos aos detalhes.

Janot e a maritaca de Diamantino (se me permitem parafrasear o brilhante jornalista Augusto Nunes) foram empossados no Ministério Púbico em 1984, mas a relação degringolou por motivos que o ex-procurador geral detalha em seu livro Nada Menos que Tudo (Editora Planeta), a ser lançado na próxima semana. Em 2017, ao rebater críticas do então PGR ao andamento dos processos no STF, o semideus togado afirmou que a atuação de Moro é que era muito rápida (!?). Em março do ano seguinte, acusou Janot de divulgar de forma indevida informações de processos sigilosos. Este, sem citar nominalmente o desafeto, rebateu: "Não vi uma só palavra de quem teve uma disenteria verbal a se pronunciar sobre esta imputação ao Congresso, ao Palácio e até o Supremo".

O clima azedou ainda mais depois que Rodrigo Janot passou a mirar suas flechadas no então presidente Michel Temer, com quem o togado supremo era carne e unha. Depois que deixou a PGR, o procurador e o ministro se estranharam num voo para a Europa. Mais adiante, durante palestra em Washington, disse Janot (referindo-se a Gilmar): "Ninguém tem essa capacidade de odiar gratuitamente a várias pessoas a não ser que tenha algum problema, né, de saúde". Pouco antes, durante uma sessão no STF, o togado afirmou que o PGR deveria ter pedido a própria prisão diante do malogro das investigações do caso JBS: "Eu sou da turma de 84. Certamente já ouvimos falar de procuradores preguiçosos, de procuradores violentos, alcoólatras, mas não de procuradores ladrões. É disso que se cuida aqui, corruptos num processo de investigação. Essa pecha a Procuradoria não merecia ao fazer investigação criminal".

"Ele [Janot] não tem preparo jurídico nem emocional para dirigir um órgão dessa importância", disse o ministro em outra oportunidade, depois de afirmar que o Ministério Público ficou "a reboque das loucuras" do inimigo. A animosidade entre ambos cresceu a ponto de levar Janot pensar em matar Mendes. Em entrevista ao Estado, disse o ex-procurador: “Não ia ser ameaça não. Ia ser assassinato mesmo. Ia matar ele (Mendes) e depois me suicidar”. O motivo teria sido uma notícia sobre a participação da filha de Janot na defesa da OAS: “Foi logo depois que eu apresentei a sessão (...) de suspeição dele no caso do Eike. Aí ele inventou uma história que a minha filha advogava na parte penal para uma empresa da Lava Jato. Minha filha nunca advogou na área penal... e aí eu saí do sério”.

Em 15 de setembro, Mendes voltou a criticar Janot e o comparou ao médico Simão Bacamarte, de "O Alienista", clássico do escritor Machado de Assis. Na história, o médico resolve internar a si próprio em um hospício. "Acredito que a gestão do procurador Rodrigo Janot na Procuradoria-Geral da República foi sem dúvida alguma a mais infeliz, a mais desastrosa. Faltou institucionalidade, houve abuso de poder, houve tentativa de transformar a Procuradoria em palanque político. O procurador-geral quase que chegou à situação tal qual o personagem principal do livro 'O Alienista'. Ao final de seu mandato, quase que o procurador-geral pediu sua própria prisão preventiva".

Momentos antes da última participação de Janot em sessão plenária no STF, Gilmar citou um verso de Bocage para se referir à despedida: "Eu diria em relação ao procurador-geral Janot uma frase de Bocage: 'Que saiba morrer quem viver não soube'"Janot respondeu: "Mas tudo isso já encontra-se no passado. Os mortos, então, deixai-os a seus próprios cuidados". E acrescentou: "As páginas da história certamente hão de contar com isenção e verdade o lado que cada um escolheu para travar sua batalha pessoal nesse processo".

Dada a extensão deste texto, volto ao assunto no post de amanhã, quando então comentarei também a decisão estapafúrdia tomada pela nossa mais alta corte de injustiça na sessão plenária da última quinta-feira. Fiquem com o texto que eu havia preparado para hoje:

O discurso que nosso indômito presidente proferiu no último dia 24 já é notícia velha, mas a mídia continua repercutindo mesmo assim. Na manhã desta quinta-feira, incomodado com a reação negativa da imprensa, o capitão afirmou ter assistido a própria fala novamente e que considerou suas posições agressivas. "Queriam alguém lá que fosse para falar abobrinha, enxugar gelo e passar o pano?", questionou. "Não fui ofensivo com ninguém. Assisti ao que eu falei, seria muito mais cômodo eu fazer um discurso para ser aplaudido, mas não teria coragem de olhar para a cara de vocês aqui". Disse ainda reconhecer que o governo tem enfrentado algumas derrotas no Congresso, mas que isso é normal na democracia, pois não pode impor sua vontade em tudo. "O parlamento tem um freio necessário, às vezes a gente não concorda, mas tem que respeitar", sentenciou o "mito". É verdade. Pena que boa parte dos congressistas não valha dois tostões de mel coado.

Repito aqui o tuíte de Guilherme Fiuza: " O discurso de Bolsonaro na ONU decepcionou a intelectualidade mundial. Não teve a genialidade da Dilma, a honestidade do Lula, o biquinho do Macron, os suspiros da Bachelet, não salvou as girafas da Amazônia, não demitiu Sergio Moro e ainda disse que a verdade liberta. Não dá."

Enquanto nosso presidente desfilava seu júbilo em Nova York, seu "novo Brasil" apodrecia em Brasília. Horas depois de sua estreia na ONU, seu líder no Senado, Fernando Bezerra Coelho, escalou a tribuna para discursar sobre a acusação de que recebeu R$ 5,5 milhões em propinas na época em que foi ministro da Integração Nacional do velho Brasil presidido por Dilma, a insuportável. Disse pouco em sua defesa. Preferiu queixar-se da batida policial realizada em seus endereços pela PF, subordinada ao "símbolo" Sergio Moro, e posar de perseguido: "Fui vítima de uma operação política, articulada para atingir o Congresso Nacional e o governo do presidente Jair Bolsonaro, do qual tenho a honra de ser líder no Senado Federal", declarou o coelho maroto.

Embora não se considere alvo da investigação criminal, Bezerra evocou sua condição de cliente de caderneta da Lava-Jato para expressar sua fé no futuro: "Pela ausência de elementos comprobatórios, [o caso] terá o mesmo destino de outras acusações que enfrentei: o arquivamento. Inclusive com força de decisão do STF. Que fique claro, senhores parlamentares, não temo as investigações. Digo com veemência que jamais excedi os limites impostos pela lei e pela ética".

A despeito do destemor, o obelisco da probidade pediu ao Supremo que ordene a devolução de todo o material recolhido pela PF, por tratar-se de prova ilícita. Foi socorrido também pela advocacia do próprio Senado, que preparou petição sobre a suposta ilegalidade dos mandados de busca e apreensão expedidos pelo ministro Luís Roberto Barroso. Formou-se ao redor do senador desconsolado um denso e comovente cinturão de solidariedade. Inclui do PT, sócio majoritário do MDB de Bezerra nos governos que levaram o Brasil "à beira do socialismo", até o DEM de Davi Alcolumbre, guindado à presidência do Senado com o apoio do chefe da Casa Civil Onyx Lorenzoni, um ministro do "novo Brasil".

Sob a liderança de Alcolumbre, uma caravana pluripartidária de 15 senadores cruzou a Praça dos Três Poderes para entregar a Toffoli, o luminar, o recurso preparado pela advocacia do Senado. Os defensores de Bezerra revelam-se capazes de quase tudo, exceto de tomar as dores de quem lhes paga o salário: o brasileiro em dia com suas obrigações tributárias.

Indefeso, o contribuinte assiste ao início da exposição dos achados da PF. Relatório enviado pelo delegado Edson Lopes ao ministro Barroso empilhou itens encontrados nos endereços de Bezerra e do seu primogênito, o deputado Fernando Coelho Filho, também sob investigação. Há coisas constrangedoras na lista — de dinheiro vivo a arquivo digital chamado "doadores ocultos"; de indícios de transferências imobiliárias a um automóvel registrado no nome de empresa cujo sócio é investigado como operador do esquema sob investigação.

Por enquanto, coelhão e coelhinho silenciam sobre os indícios. Seu silêncio não resolve o problema, mas é extremamente útil para ouvir os ruídos da reação corporativa do Legislativo. Em meio ao sacolejo, culpados e cúmplices se uniram no plenário do Congresso para derrubar 18 dos 33 vetos que Bolsonaro havia aplicado à lei sobre abuso de autoridade. Foram restaurados artigos que o "símbolo" Sergio Moro considera inibidores do trabalho de juízes, procuradores e investigadores. Mantido o padrão da contraofensiva, o país "socialista" resgatado pelo capitão à "beira do abismo" logo acusará o "novo Brasil" de plágio.

Como toda unanimidade é burra, vale citar a opinião do PT sobre a fala presidencial, que ecoou o sempre lúcido, isento e ponderado pensamento da líder nacional da quadrilha, deputada Gleisi “Lula” Hoffmann. A petralhada sórdida afirmou que o discurso foi permeado de ataques infundados, Fake News e muita, muita teoria conspiratória dos anos 70: Bolsonaro atacou governos petistas, países vizinhos, a mídia internacional e a sanidade mental dos ouvintes, bem como envergonhou o povo brasileiro ao tentar justificar a destruição que provoca no país, desmontando estatais, prejudicando os mais pobres e instaurando a censura e o preconceito. É curioso que, para o PT, quem envergonha o país é Bolsonaro, e não o presidiário condenado.

Aliás, Lula vai apresentar (mais) uma queixa na ONU, desta vez contra Jair Bolsonaro. O criminoso de Garanhuns alega que o presidente violou seus direitos ao dizer, na Assembleia Geral, que seus antecessores roubaram centenas de bilhões de dólares. Isso, sim, é uma vergonha internacional.

Com Josias de Souza e O Antagonista.

domingo, 22 de setembro de 2019

PENSE UM POUCO



Tenho cá minhas ressalvas em relação ao governo Bolsonaro, mas, no geral, concordo com o autor do texto que transcrevo abaixo:

Previsões sobre o que vai acontecer amanhã sempre ficam melhores quando são feitas depois de amanhã. O que temos na vida real é o hoje, só isso — e o grande problema é chegar a alguma conclusão coerente sobre o que está realmente acontecendo hoje. Há uma sugestão honesta para resolver isso; infelizmente, ela dá trabalho, exige esforço mental e não pode ser encontrada no Google. Como não há o mais remoto acordo sobre o dia de hoje — as coisas estão melhores que ontem, ou nunca estiveram tão horríveis? —, a única ferramenta disponível para ter alguma ideia decente das coisas é pensar. E pensar, como se sabe, é uma das atividades humanas mais odiadas neste país, sobretudo por aqueles que imaginam saber o que estão falando.

No caso, pensar significa olhar com um pouco mais de atenção para onde o Brasil está indo. No fundo, é isso o que importa. O país vai estar melhor daqui a três anos? Depende das decisões que estão sendo tomadas agora. Se você está construindo a cada dia 1 quilômetro de estrada, por exemplo, daqui a 100 dias terá 100 quilômetros de estrada construídos. Não pode ser de outro jeito. Há uma única coisa que importa nisso: se aquele 1 quilômetro por dia está sendo construído mesmo. Se estiver, a realidade do país estará sendo mudada para melhor. Se não estiver, a realidade continuará a mesma. O resto é conversa inútil de sociólogo-politólogo-­intelectuólogo. E então: para onde estamos indo, com base nos fatos que se podem verificar hoje?

É certo, para começar, que há oito meses não se rouba por atacado no governo federal, coisa que jamais ocorreu, na memória de qualquer brasileiro vivo. Não há a mais remota denúncia de nada de errado por aí, apesar da vontade imensa dos adversários do governo de denunciar tudo. Pode haver daqui a meia hora — mas por enquanto não houve. É bobagem ignorar isso, ou achar que não faz diferença — é claro que faz uma tremenda diferença. Também não há dúvida sobre uma realidade raramente mencionada: o ministro da Economia é Paulo Guedes, e Paulo Guedes é o primeiro capitalista de verdade a chefiar a economia brasileira desde Roberto Campos, há mais de cinquenta anos. Guedes é artigo genuíno: não tem compromisso nenhum com a “economia de Estado” e a sua burocracia estúpida, sabe que não pode haver progresso duradouro no Brasil sem o máximo de liberdade econômica e está convencido de que a única função útil de um governo neste mundo é tornar mais cômoda a vida das pessoas. É igualmente óbvio que isso vai mudar o país nos próximos três anos.

É um fato que haverá uma reforma tributária — e, qualquer que ela seja, as coisas não vão ficar como estão, nem a situação atual dos impostos no Brasil vai piorar, pois isso é praticamente uma impossibilidade científica. Não há nenhum motivo concreto para alguém acreditar que o Brasil passará os próximos anos sem fazer privatizações, como passou os treze anos da era Lula-Dilma. Também é uma realidade concreta que não falta capital para ser investido no processo brasileiro de privatização já em andamento: estima-se que existam no exterior, neste momento, entre 15 trilhões e 17 trilhões de dólares aplicados a juros negativos. É possível que nenhum centavo venha para cá? Possível é — mas aí seria preciso demonstrar qual a lógica de uma coisa dessas. Também não há falta do que privatizar. O governo brasileiro é o maior proprietário de imóveis do mundo; boa parte do que tem pode ir para o mercado. O Brasil tem 72000 torres de telefonia; a China tem 1 milhão. A razão sugere que há alguma coisa a fazer nessa área ou em saneamento, já que 100 milhões de brasileiros não dispõem hoje de esgotos, por falta de investimento.

A Petrobras tem 12000 funcionários a menos do que no fim do governo Dilma; mais 10000 serão dispensados no futuro próximo, e a empresa estará enfim preparada para a privatização depois de já ter vendido, sem barulho algum, sua distribuidora BR e suas operações de gás, e posto à venda oito de suas refinarias. Um dos resultados disso, pela lógica, será a redução geral dos custos da energia no país. Por causa do monopólio estatal, o preço do metro cúbico de gás no Brasil é de 12 dólares, em comparação com 7,70 na Europa e 2,80 nos Estados Unidos. Sem Petrobras, sem monopólio e com concorrência, por que essa aberração iria continuar? Houve uma queda superior a 20% no número de homicídios neste primeiro semestre, segundo o site G1. A inflação está perto de zero. Os juros são os mais baixos dos últimos trinta anos. A construção cresce.

São fatos. Pense neles, para pensar no amanhã.

Texto de J.R. Guzzo.

sábado, 21 de setembro de 2019

E VIVA O POVO BRASILEIRO — PARTE III


O principal problema ético-político do PT é que o pedaço da sociedade que se desiludiu com o partido é incapaz de reconhecer nele disposição para evoluir. E a legenda é incapaz de demonstrá-la. Surgiram no último final de semana duas novas evidências de que a rotina da sigla virou um pesadelo do qual seus dirigentes já não fazem muita questão de acordar.

O PT emitiu nota oficial para rebater entrevista na qual o governador petista da Bahia, Rui Costa, ousou expor à revista Veja uma raridade no petismo: bom senso. De resto, o partido celebrou a entrevista de Lula — ao jornal argentino Página 12 — em que o mártir petralha recobriu-se de autoelogios, enaltecendo seus feitos no poder como se não houvesse roubalheira nem Dilma Rousseff.

Rui Costa disse, entre outras coisas: 1) que o PT deveria apresentar "propostas concretas" em vez de "ficar só na negativa"; 2) que a adesão ao "Lula Livre" não deveria ser condição para a formação de uma frente oposicionista; 3) que o apoio incondicional ao regime bolivariano da Venezuela é "um problema". Mas o partido não deu o braço a torcer.

Lula declarou: "Gerei 22 milhões de empregos, aumentei o salário mínimo em 75%. Disponibilizei 52 milhões de hectares de terra para fazer a reforma agrária. Fiz o maior programa social em toda história do Brasil. […] Esse foi o crime que eu cometi."

O PT bateu bumbo como se confundisse memória fraca com consciência limpa. Apagou da lembrança horrores como o mensalão, o Petrolão, a gestão empregocida de Dilma. Tudo isso está vinculado a Lula. Os escândalos têm raízes fincadas nos dois mandatos da divindade petista. É de autoria de Lula a lenda segundo a qual Dilma seria uma supergerente.

Embora o petismo ainda não tenha notado, o PT perde espaço na preferência do eleitorado há uma década. Lula prevaleceu em 2002 e 2006 com 61% dos votos válidos. Em 2010, Dilma foi enviada ao Planalto com 56%; em 2014, amealhou 52%. Na disputa de 2018, o bonifrate Fernando Haddad obteve 44,87% dos votos válidos.

A derrota para Bolsonaro atrasou o relógio do PT para 1989, quando Lula amealhara 47% dos votos, perdendo para Collor, o caçador de marajás de araque, com 53%. O eleitorado cobra do partido, em prestações, a fatura dos seus descalabros. Ainda que Haddad tivesse vencido, a legenda precisaria parar de arrastar as correntes de Lula. Com a derrota, o partido deveria se dedicar a uma fisioterapia política que lhe permitisse andar sem a sua muleta. Mas o petismo parece não ter aprendido nada com os seus fracassos.

Com Josias de Souza.

quarta-feira, 11 de setembro de 2019

EU ARO, TU ARAS, ELE ARA — RESTA SABER QUEM SE FERRA



Falo mais adiante sobre a foto que ilustra esta postagem. Antes, volto a abordar a indicação de Augusto Aras para substituir Raquel Dodge no comando da PGR, que desagradou membros do MPF, sobretudo os que participam da ANPR

Cabe ao "ungido do Senhor" tentar reduzir as críticas buscando apoio entre procuradores que não integram forças-tarefas e não têm cargos de comando. Esse será seu maior desafio, já que a aprovação pelo Senado são favas contadas. Como cautela e canja de galinha não fazem mal a ninguém, o indicado já iniciou o périplo de beija-mão pelos gabinetes do presidente da Casa, Davi Alcolumbre, e da presidente da CCJ, Simone Tebet. Nas próximas semanas, o candidato deve se reunir a portas fechadas com outros 79 senadores. 

Oficialmente, o presidente indicou Aras por ele ser "católico e ter perfil conservador"; nas entrelinhas, porém, salta aos olhos o verdadeiro motivo, que é a disposição demonstrada pelo subprocurador (que se reuniu com Bolsonaro pelo menos quatro vezes antes de ser formalmente indicado) de rezar pelo seu catecismo. O capitão diz que quer alguém favorável às medidas do governo para destravar grandes obras de infraestrutura no país, mas está mais preocupado em salvar seu primogênito. Daí porque o fato de Aras ter criticado a Lava-Jato, repudiado a chamada ideologia de gênero e se mostrado favorável ao excludente de ilicitude para proprietários rurais também pesou na decisão.

Como se sabe, Flávio Bolsonaro é investigado por movimentações financeiras mal explicadas — dele próprio e de seu ex-motorista e ex-chefe de gabinete, Fabrício Queiroz. Sem o menor constrangimento, seu papai mandou às favas a agenda anticorrupção — uma das principais promessa de campanha do então candidato — para aliviar a barra do pimpolho, sobretudo depois que Queiroz demitiu a ex-mulher de Adriano da Nóbrega (acusado de chefiar uma milícia no Rio). Mesmo assim, Queiroz lamenta não ver ninguém mover nada para tentar ajudá-lo. Talvez devesse aproveitar sua próxima visita ao Einstein para consultar um oftalmologista.

Observação: Depois de ser operado de um câncer no intestino, na virada do ano, o ex-assessor parlamentar de Flávio Bolsonaro na Alerj desapareceu como uma cusparada num temporal — pelo menos para a polícia, já que a reportagem investigativa da revista Veja, quando não perde tempo beijando os pés de Verdevaldo das Couves, sabe fazer seu trabalho: semanas atrás, os repórteres flagraram o fantasminha camarada tomando um cafezinho na lanchonete do Hospital Albert Einstein.

Ao rebater críticas de nepotismo na indicação de Zero Três para a embaixada do Brasil nos EUA, Bolsonaro disse achar "natural que um pai, podendo, dê filé-mignon a seus filhos". Esse amor incondicional pela prole levou o capitão se aproximar do presidente do STF, que fez sua parte: suspendeu as investigações envolvendo Queiroz e Zero Um — e aproveitou o embalo para suspender também todos os demais processos baseados em dados compartilhados pelos órgãos de fiscalização e controle sem autorização judicial, livrando, por tabela, a pele da própria esposa e da mulher do ministro Gilmar. Paralelamente, Bolsonaro interferiu no MP-RJ, na Receita Federal, no Coaf e na PGR, além de (quiçá movidos por ciúmes) dar início ao processo de "fritura" do ministro Sérgio Moro, cuja popularidade supera a do chefe em respeitáveis 25 pontos percentuais.

O entorno palaciano já se deu conta de que parte do eleitorado bolsonarista está descontente com as interferências nos órgãos de combate à corrupção. O capitão tenta reagir, seja posando para fotos sorridente ao lado do ministro da Justiça e vetando parcialmente o abjeto projeto de lei aprovado pela Câmara sobre Abuso de Autoridade. A medida foi bem recebida por parte de sua base, mas considerada insuficiente por outra parte, que esperava o veto total. 

Na última quinta-feira, Bolsonaro reconheceu ter desagradado o eleitorado. Falando a populares disse o presidente: “Estou recebendo muita crítica de gente que votou em mim. Se não acredita em mim, e continua fazendo esse trabalho de não acreditar, eu caio mais cedo, e mais cedo o PT volta.” Se isso evitará que as pessoas que o apoiaram por rejeição ao PT pulem do barco, sob o risco de ficarem estigmatizadas, só o tempo poderá dizer.

Passando agora à foto que ilustra esta postagem, Eduardo Bolsonaro se deixou fotografar, ao lado do leito em que o pai convalesce da cirurgia a que foi submetido no último domingo, exibindo uma pistola Glock 9 mm na cintura. Foi a quarta vez que o capitão teve de ser operado em razão da facada desfechada pelo inimputável Adélio Bispo, um ano atrás, durante ato de campanha em Juiz de Fora. 

Durante uma das inúmeras entrevistas que vem concedendo a partir de sua cela VIP em Curitiba, o presidiário diz que o atentado contra a vida de Bolsonaro não passou de uma farsa. É nisso que dá medir os outros pela própria régua. Duvidosa, mesmo, é a autoria dos tiros desfechados contra a caravana de Lula no Paraná, em março de 2018, ou dos ataques à sede nacional do PT, em junho de 2016.

Voltando à foto, que foi publicada originalmente pelo próprio Zero Três: Vale lembrar que o pimpolho é entusiasta e colecionador de armas, além de adepto da prática de tiro esportivo. A Glock 9 mm é a arma padrão usada pelos policiais federais em todo país. Eduardo é escrivão da PF, e o fato de estar licenciado não anula a prerrogativa de andar armado. Particularmente, acho que estão fazendo carnaval em copo d'água, sobretudo quando há coisas muito mais importantes acontecendo no pais. Mesmo assim, é impossível negar a "falta de absolutamente" que baliza o comportamento do clã presidencial — a começar pelo próprio presidente, que há meses estilhaça a imagem do Brasil, ofendendo governantes estrangeiros e tomando atitudes indignas para um chefe do Executivo, mesmo numa banânia como a nossa.

Dias atrás, uma emissora francesa flagrou o momento em que o presidente da França critica o colega brasileiro durante a última cúpula do G7.  Em conversa com o presidente do Chile, Emmanuel Macron não só reprovou a maneira desrespeitosa como o colega brasileiro tratou a primeira-dama francesa nas redes sociais, como relembrou que, em julho passado, Bolsonaro cancelou no último minuto uma reunião com o ministro de relações exteriores da França para... cortar o cabelo. E filmou a si mesmo na cadeira do barbeiro, desancando Felipe Santa Cruz com a aleivosa teoria de que o pai do presidente nacional da OAB não foi morto pela ditadura militar, e sim por correligionários que visavam evitar o vazamento de informações confidenciais. Nas palavras do próprio Bolsonaro: “Eles resolveram sumir com o pai do Santa Cruz; não foram os militares que mataram ele não, tá? É muito fácil culpar os militares por tudo que acontece.”

Durma-se com um barulho desses!

quinta-feira, 15 de agosto de 2019

WALTER DELGATTI E A LAND ROVER DE MANUELA D'ÁVILA — NÃO SÃO NOSSAS VONTADES OU PREFERÊNCIAS QUE DETERMINAM O QUE É OU NÃO VERDADE



Perto de completar um mês, a prisão dos responsáveis pela invasão de celulares de autoridades já não desperta tanto interesse, a exemplo das mensagens supostamente trocadas entre o Sérgio Moro, Deltan Dallagnol e procuradores da Lava-Jato, vazadas a partir de arquivos digitais obtidos criminosamente pelos hackers e cedidos graciosamente a Verdevaldo das Couves, o paladino da Justiça, pelo benemérito chefe do bando, Walter Delgatti Neto, conhecido como Vermelho, cuja capivara sugere que, de graça, ele não dá nem bom-dia. Mas o assunto continua servindo de pano de fundo para toda sorte de Fake News, como a que atribui à ex-deputada do PCdoB e ex-candidata a vice-presidente da República na chapa do PT, Manuela D'Ávila, a propriedade do Land Rover apreendida em poder de Vermelho.

Logo depois que Vermelho disse à PF que Manuela foi a intermediária que o colocou em contato com o comandante do panfleto digital esquerdista The Interpret, a ex-parlamentar divulgou nota afirmando que repassou o contato do jornalista, e autorizou seus advogados a “entregarem cópias das mensagens” a investigadores da PF. Mais adiante, um requerimento de autoria do deputado federal Capitão Augusto, do PL, aprovado na última terça-feira, convida Manuela a comparecer a uma audiência na Comissão de Segurança Pública da Câmara Federal, para dar explicações.

Embora a notícia sobre o Land Rover tenha viralizado nas redes sociais, não há provas — pelo menos até onde se sabe — de que Manoela pagou Vermelho pelo material hackeado, nem, muito menos, de que o tal veículo teria sido usado como moeda de troca. Aliás, nenhuma Land Rover foi apreendida com o hacker. Embora haja relatos de que, de fato, ele andasse com uma, não há nada que ligue a ex-vice na chapa encabeçada pelo bonifrate de Lula, o podre, com o carro em questão. 

Sabe-se, isso sim, que Delgatti ostenta uma respeitável capivara, com seis processos na Justiça paulista por crimes de estelionato, furto qualificado, apropriação indébita e tráfico de drogas, e que acumula duas condenações. Sabe-se também que ele é um estelionatário fanfarrão, que já foi flagrado com uma carteira de estudante de medicina da USP e uma de delegado da Polícia Civil de São Paulo, e que publicou no Facebook fotos com um “leque” de ao menos vinte notas de 100 dólares e com um fuzil em um clube de tiro nos Estados Unidos. Que, poucos dias antes de ser preso pela PF, ele dirigia uma Land Rover branca pelas ruas de Ribeirão Preto, onde passara a viver. A bordo do carrão, deixou pendurada em um posto de gasolina da cidade uma fatura de R$ 200, alegando ao frentista que o cartão de crédito não estava funcionando. E nunca mais voltou lá. Todavia, as fotos usadas como “ilustração” nas tais mensagens nada têm a ver com ele. Uma delas foi retirada de um anúncio na OLX , e a outra, de uma operação da Polícia Federal que apreendeu carros em Goiás em janeiro de 2019.

Claro que isso não significa que o PT não esteja por trás dessa merdeira, nem que Vermelho esteja dizendo a verdade quando afirma que nada recebeu em troca do material entregue ao site comunista. Até porque o propósito dos vazamentos feitos pelo Interpret e seus satélites (FOLHA/UOL, BandNews e VEJA, entre outros) é denegrir a imagem do ex-juiz Sérgio Moro, do coordenador da Lava-Jato em Curitiba e da própria força-tarefa. Por outro lado, as "notícias" veiculadas nas redes sociais visando ligar Manuela ao carro são vagas, alarmistas e repletas de erros ortográfico-gramaticais, além de seguirem o tradicional formato usado em Fake News políticas. Como no caso do HB20 de Adélio Bispo — o estripador de Bolsonaro — que seria do ex-deputado Jean Wyllys —, ex-deputado federal do PSOL que desistiu de assumir o terceiro mandato e se autoexilou na Espanha por medo de acabar como a vereadora e colega de partido Danielle Franco, o deixando sua cadeira livre para o suplente, David Miranda, que acontece de ser marido de ninguém menos que... Verdevaldo das Couves.

Resumo da ópera: Nenhuma Land Rover foi apreendida com Vermelho e tampouco há provas de que o veículo que ele utilizava era de Manuela D’Ávila. Ou seja, as mensagens que circulam na Web não passam de Fake News. A verdade pode contrariar preceitos profundamente enraizados e não coadunar com o que queremos desesperadamente que seja verdade. Em outras palavras, não são nossas vontades ou preferências que determinam o que é ou não verdade.

quarta-feira, 14 de agosto de 2019

ACREDITE EM NADA DO QUE OUVE E EM METADE DO QUE LÊ. MESMO ASSIM...



Como costuma dizer o ministro Marco Aurélio, vivemos tempos estranhos (na verdade, essa frase é de Platão, mas isso não vem ao caso). Temos um presidente da república eleito porque era a única alternativa à volta do PT ao poder, mas que vem se mostrando tão despreparado para exercer o cargo quanto seu pimpolho para assumir a Embaixada do Brasil nos EUA. Havia alternativas menos extremistas no primeiro turno, mas agora não adianta chorar; o esclarecidíssimo eleitorado tupiniquim achou por bem defenestrá-las e despachar justamente as duas piores para o embate final.

É certo que situações desesperadoras exigem medidas desesperadas, mas é igualmente certo que as consequências vêm depois. Colhemos o que plantamos, e quem semeia ventos colhe tempestades. E elas vêm em forma de disputa ideológica na política, produzindo paradoxos a torto e a direito.

Jair Bolsonaro era defensor incondicional da Lava-Jato, mas isso mudou quando as investigações chegaram ao gabinete de seu primogênito na Alerj, e entrou em choque branco com o ministro Sérgio Moro — um dos sustentáculos do seu governo — devido a críticas do presidente do Coaf à proibição de investigação sem autorização judicial (pedido da defesa de Flavio que foi acolhido pelo presidente do STF). Demais disso, quando Deltan Dallagnol tuitou um elogio às investigações sobre o ex-factótum do clã presidencial, Fabrício Queiroz, acusado de ser o operador do esquema, o capitão compartilhou em seu perfil oficial no Facebook um post chamando o procurador de "esquerdista estilo PSOL", como se fosse possível Deltan ser esquerdista e, ao mesmo tempo, o algoz de Lula.

Bolsonaro é apoiador incondicional de Mauricio Macri e contrário a Cristina Kirchner, a quem considera a versão portenha da ex-presidanta Dilma. À luz das primárias no país vizinho, porém, o capitão trombeteou que "não quer 'irmãos argentinos' fugindo para o Brasil se o resultado se confirmar em outubro", sem ter a sensibilidade de perceber que isso não ajuda Macri, que, diga-se de passagem, não é um radical de direita como nosso capitão-presidente.

Além de ser fã de metáforas envolvendo namoro, noivado e casamente, o presidente mostra que também tem um viés, digamos, escatológico: dias atrás, diante de uma pergunta que o incomodou, sobre como conciliar meio ambiente com desenvolvimento, respondeu: "É só você deixar de comer menos um pouquinho […] Você fala para mim em poluição ambiental. É só você fazer cocô dia sim, dia não, que melhora bastante a nossa vida também". Na última segunda-feira, voltou ao tema: "Há anos um terminal de contêiner no Paraná, se não me engano, não sai do papel porque precisa agora também de um laudo ambiental da Funai. O cara vai lá, e se encontrar — já que está na moda — um cocozinho petrificado de um índio, já era. Não pode fazer mais nada ali. Tem que acabar com isso no Brasil." Mas adiante, comentando sua primeira colocação, disse que apenas respondeu uma “pergunta idiota de um jornalista”. Litteris: "Respondi que é só você cagar menos que com certeza a questão ambiental vai ser resolvida."

Perguntado sobre o próximo procurador-geral da República, a ser indicado por ele a próxima sexta-feira, disse o capitão que o futuro PGR "não pode atrapalhar a agenda de desenvolvimento do país" e deve saber "tratar as minorias como minorias". Ao ser questionado sobre o nome de Deltan Dallagnol para o cargo, respondeu que ainda não foi procurado. “Mande-o me procurar, por que não me procurou até hoje? É muito simples. Todos querem ser procurados. Eu não procurei ninguém. A caneta BIC é minha".

Falando na PGR, a procuradora Raquel Dodge anunciou nesta segunda-feira que prorrogou por mais um ano os trabalhos da força-tarefa de procuradores que atuam na Operação Lava-Jato no Paraná. Será mantido o orçamento de aproximadamente R$ 800 mil para gastos com pagamentos de diárias e passagens para procuradores e servidores que estiverem no trabalho de investigação, bem como a estrutura do grupo, composto por 15 procuradores, entre eles os quais Deltan Dallagnol. Esta é a quinta prorrogação dos trabalhos desde 2014, quando as investigações começaram. Passados cinco anos e desencadeadas 61 fases, as investigações da força-tarefa no Paraná resultaram em 244 condenações de 159 pessoas em 50 processos, por acusações de lavagem de dinheiro, corrupção ativa e passiva, fraude à licitação e organização criminosa, entre outros crimes.

Dallagnol é alvo de nove ações no CNMP. Na reunião marcada para a manhã desta terça-feira, estavam pautadas a análise de uma reclamação disciplinar apresentada pelo senador Renan Calheiros e de um processo administrativo disciplinar (PAD) instaurado a pedido do togado supremo Dias Toffoli, bem como a possibilidade de apreciação de um terceiro expediente, aberto pela corregedoria do órgão para investigar se ele lucrou de forma irregular com palestras ministradas sobre a Lava-Jato. Nos bastidores, havia uma movimento orquestrado para não puni-lo pela forma como atuou nos processos contra boa parte da elite política e empresarial do país, revelada por Verdevaldo das Couves e seus compinchas — FOLHA/UOL, BandNews e Veja — com base no vazamento de mensagens supostamente trocadas pelos integrantes da força-tarefa, material esse que, nunca é demais lembrar, foi obtido criminosamente por hackers a partir de invasões das contas que os envolvidos mantinham no aplicativo Telegram.

Observação: Por unanimidade, o Conselho negou o recurso negou o recurso mediante o qual Dallagnol buscava reverter a abertura do PAD (as sanções que podem resultar de um processo administrativo disciplinar vão desde uma pena de censura até a aposentadoria compulsória). Numa outra votação foi decidido, também por unanimidade, aprovar um pedido de dois conselheiros para que seja revisto o arquivamento de uma reclamação disciplinar contra o coordenador da Lava-Jato.

Falando em Dias ToffoliVeja publicou uma entrevista com o dito-cujo. À guisa de introdução, a reportagem traz um texto pra lá de preocupante. É certo que a prudência recomenda acreditar em nada do que se ouve e em metade do que se lê, mas mesmo assim eu achei por bem compartilhar com meus leitores um excerto dessa matéria:

Em entrevista a VEJA, o ministro confirmou que o Brasil esteve à beira de uma crise institucional entre os meses de abril e maio — e disse que sua atuação foi fundamental para pôr panos quentes numa insatisfação que se avolumava. Toffoli não deu muitos detalhes, mas a combinação explosiva envolvia uma rejeição dos setores político e empresarial e até de militares ao presidente Jair Bolsonaro. O cenário, de fato, era preocupante naquele momento. No Congresso, a reforma da Previdência, a principal e mais importante bandeira econômica da atual administração, não avançava. O governo, por sua vez, acusava os deputados de querer trocar votos por cargos e verbas públicas. O impasse aumentou quando um grupo de parlamentares resolveu tirar da gaveta um projeto que previa a implantação do parlamentarismo. Se aprovado, Bolsonaro seria transformado numa figura meramente decorativa, um presidente sem poder.

Em paralelo, vazamentos atribuídos ao MPF mostravam que a investigação sobre o senador Flávio Bolsonaro, o Zero Um, tinha potencial para gerar mais constrangimentos e desgastes do que se supunha no início. A família presidencial teria se beneficiado da chamada “rachadinha”, um artifício ilegal empregado por políticos para embolsar parte dos salários de seus funcionários. Simultaneamente, uma ala do Exército começou a discutir a incapacidade do presidente de governar, enquanto outra, mais radical e formada por militares de baixa patente, falava em uma sublevação contra as “instituições corruptas”. Um dos generais próximos ao presidente chegou a consultar um ministro do Supremo para saber se estaria correta a sua interpretação da Constituição segundo a qual o Exército, em caso de necessidade, poderia lançar mão das tropas para garantir “a lei e a ordem”. Em outras palavras, o general queria saber se, na hipótese de uma convulsão, teria autonomia para usar os soldados independentemente de autorização presidencial.

Longe de Brasília, a insatisfação também era grande. Empresários do setor industrial incomodados com a paralisia da pauta econômica discutiam a possibilidade de um impeachment de Bolsonaro. O ideal, diziam, era que houvesse uma brecha jurídica que permitisse a convocação de novas eleições. Foram informados de que não havia brecha. Em caso de impedimento, assumiria o vice-presidente, o general Hamilton Mourão. “Se é para trocar, melhor que seja logo”, pregavam. Na época, Carlos Bolsonaro, o filho Zero Dois, afirmou que estaria em andamento uma conspiração golpista, apontando o dedo em direção aos militares que despacham no Palácio do Planalto, mas sem citar nomes.

Nas redes sociais, a pregação radical contra o STF também se intensificou. Grupos defendiam desde ações violentas até o afastamento de magistrados que supostamente estariam impedindo o governo de implementar projetos. Os ministros tinham a convicção de que os ataques eram insuflados pelo governo. No Senado, com o aval de lideranças partidárias, foram colhidas assinaturas para a criação da chamada “CPI da Lava-Toga”, cujo objetivo seria averiguar suspeitas de corrupção no Judiciário. O clima entre os poderes era de conflagração. O ponto de ebulição da crise tinha até data para acontecer: 10 de abril, dia em que o STF julgaria a legalidade das prisões em segunda instância, o que poderia resultar na libertação do ex-presidente Lula.

Quando o caldo ameaçou transbordar, o presidente Bolsonaro, o ministro Dias Toffoli, o deputado Rodrigo Maia, presidente da Câmara, e o senador Davi Alcolumbre, presidente do Senado, além de autoridades militares, se reuniram separadamente mais de três dezenas de vezes para resolver o problema. Convencidos de que a situação caminhava em uma direção muito perigosa, costuraram um pacto que foi negociado em vários encontros. Resultado: no Congresso, o projeto do parlamentarismo voltou à gaveta, a CPI da Lava-­Toga foi arquivada e a reforma da Previdência se destravou. No Planalto, o vice-­presidente Hamilton Mourão reduziu suas barulhentas aparições públicas, e o general Carlos Alberto dos Santos Cruz, ministro-chefe da Secretaria de Governo, um dos alvos das suspeitas de Carlos Bolsonaro, foi demitido. No Supremo, Dias Toffoli pôs a polícia nos calcanhares de grupos que pregavam ações violentas contra os ministros, adiou o julgamento que poderia soltar Lula e concedeu uma liminar que paralisava as investigações sobre o senador Flávio Bolsonaro. A Praça dos Três Poderes ficou, ao menos momentaneamente, pacificada.

Por tudo o que se viu nos primeiros seis meses de governo Bolsonaro, não é exagero dizer que os cerca de 300 metros que separam o Planalto, o Congresso e o Supremo ainda são um campo minado. Neste segundo semestre, o STF será protagonista de uma agenda capaz de elevar a temperatura política a níveis de alta octanagem. De acordo com o que decidirem os ministros, o ex-presidente Lula poderá ser solto, o ex-juiz Sergio Moro ser considerado suspeito e processos que envolvem corruptos de vários matizes acabar anulados. Isso para falar apenas de três casos relacionados à Operação Lava-­Jato. O STF também vai definir, entre outros assuntos delicados, o destino da investigação sobre o senador Flávio Bolsonaro e concluir o julgamento que pode resultar na descriminalização de drogas como a maconha.

Toffoli terá a responsabilidade de conduzir essa agenda inflamável. Como guardião da lei, cabe ao Supremo o juízo final sobre qualquer assunto — goste-se ou não do veredicto. Em tempos de radicalismo extremo, manter o equilíbrio é uma tarefa complicada.

Como disse José Nêumanne, assumindo definitivamente o papel de Conselheiro Acácio de Marília sem um voto sequer, o novo condestável da República, presidente de plantão do STF, fez questão de entrar no coro dos descontentes com a Lava-Jato, dizendo que a popularíssima operação de combate à corrupção não é uma instituição, mas um fruto da “institucionalidade”. Aproveitando-se da ignorância generalizada, comparável com a sua própria, o apadrinhado de Lula acha que a instituição que preside, por obra e graça de sua vassalagem ao picareta dos picaretas, exerce o poder moderador que o imperador se autoconcedeu para se impor a liberais e conservadores que se revezavam no comando do parlamento monárquico. É uma mistura de mentira com desconhecimento e uma formidável cara de pau. Sobrando um tempinho, não deixe de assistir ao vídeo a seguir, no qual Caio Coppola analisa esses devaneios megalômanos do magistrado:


Alea jacta est.   

terça-feira, 13 de agosto de 2019

TOFFOLI, LULA, O VÍNCULO ENTRE O PT E O PCC E OUTRAS CONSIDERAÇÕES




Cientistas políticos, analistas e outros palpiteiros afirmam que a democracia pressupõe a alternância do poder como elemento intrínseco a sua própria concepção. No Brasil, porém, ao menos um dos Poderes não segue essa norma: no STF, os togados não são eleitos, mas indicados pelo chefe do executivo da vez e chancelados pelo Senado. Até hoje, apenas 5 nomes foram rejeitados — Barata Ribeiro, Inocêncio Galvão de Queiroz, Ewerton Quadros, Antônio Sève Navarro e Demóstenes da Silveira Lobo —, nenhum deles na "nova república".

Uma vez aboletados na Corte, os felizardos lá permanecem intocáveis e irremovíveis até colherem a 75.ª flor no jardim de suas nem sempre ilibadas existências (a menos que morram ou peçam o boné antes da aposentadoria compulsória, naturalmente). Para piorar, dos 11 semideuses desse Olimpo, 7 foram indicados por Lula ou Dilma. As exceções são o decano Celso de Mello — classificado de "juiz de merda" pelo ex-ministro Saulo Ramos —, alçado ao posto por José Sarney; Marco Aurélio — que chegou lá por influência do pai, embora tenha recebido a toga pelas mãos do primo Fernando Collor; Gilmar Mendes, nomeado por FHC, e Alexandre de Moraes, escolhido por Michel Temer. Como se vê — e eu venho dizendo desde outros carnavais —, a composição atual é a pior de toda a história do tribunal.

Nosso sistema político está falido. São trinta e tantas agremiações fisiologistas que não representam a população, embora subsistam e sejam financiadas por dinheiro público (dos fundos eleitoral e partidário). Algumas são verdadeiras organizações criminosos: De acordo com O Globo, ligações interceptadas pela Polícia Federal mostram que integrantes do PCC que controlam a venda de drogas e armas dos presídios reclamam da transferência de presos para o sistema federal, xingam o ministro da Justiça e afirmam que, durante gestões anteriores, o bando e o Partido dos Trabalhadores tinham um diálogo "cabuloso". Veja a seguir a transcrição de um trecho do áudio:

Os caras tão no começo do mandato dos cara, você acha que os cara já começou o mandato mexendo com nois irmão. Já mexendo diretamente com a cúpula, irmão. (…) Então, se os cara começou mexendo com quem estava na linha de frente, os caras já entrou falando o quê? ‘Com nois já não tem diálogo, não, mano. Se vocês estava tendo diálogo com outros, que tava na frente, com nois já não vai ter diálogo, não’. Esse Moro aí, esse cara é um filha da puta, mano. Ele veio pra atrasar. Ele começou a atrasar quando foi pra cima do PT. Pra você ver, o PT com nois tinha diálogo. O PT tinha diálogo com nois cabuloso, mano, porque… situação que nem dá pra nois ficar conversado a caminhada aqui pelo telefone, mano”.

A ORCRIM (falo do PT, não do PCC) anunciou no último domingo que vai protocolar uma notícia crime no STF contra Sérgio Moro e os agentes da PF responsáveis pela investigação. Desde que o conteúdo do documento veio a público, o partido afirma se tratar de uma armação “forjada” e que “vem no momento em que a Polícia Federal está subordinada a um ministro acuado pela revelação de suas condutas criminosas”.

Voltando ao Legislativo e ao Executivo, quando os parlamentares perderam a credibilidade e o mais alto cargo do funcionalismo público federal passou a ser ocupado por uma sequência de presidentes que, com exceção de FHC, hoje ou estão cumprindo, ou já foram presos, ou respondem a processos criminais, o Judiciário se tornou o último bastião da nossa esperança. Mas quem vive de esperança morre de fome. O julgamento do mensalão jogou luz sobre os togados supremos, de quem até então só se ouvia falar pela "Voz do Brasil". Hoje, as opiniões e vieses político-partidários dessa suprema confraria são públicos e notórios: em qualquer discussão de botequim, gente que não consegue lembrar os nomes dos 11 titulares da Seleção Canarinho cita nominalmente, de cor e salteado, os 11 togados supremos deste projeto de Banânia.

Como nada é tão ruim que não possa piorar, desde setembro do ano passado que o Supremo é presidido por ninguém menos que José Antonio Dias Toffoli, o "conciliador", cujo currículo se resume a serviços prestados ao Sindicato dos Metalúrgicos de SBC, à CUT, ao PT e ao guerrilheiro de araque José Dirceu. Na lapidar avaliação do jornalista J.R. Guzzo, um sujeito que foi reprovado duas vezes em concursos para a Magistratura e, portanto, é considerado incompetente para ser juiz da comarca mais ordinária do interior, não só é um dos 11 juízes supremos, mas também o presidente de todos eles.

Esse fenômeno de suspeição e parcialidade provavelmente sem similar no mundo civilizado foi nomeado por Lula — o presidiário mais famoso deste lado da galáxia —, e pelos conhecimentos que demonstrou, não tem capacidade sequer para apitar uma pelada de várzea. Mesmo assim, preside a mais alta corte de Justiça do país. Ele e quem o leva a sério — a começar pelos colegas que o chamam de excelência — insistem todos os dias em tratar o Brasil como um país de idiotas. Não há como entender por que raios uma aberração com este grau de grosseria deve ser imposta a 200 milhões de brasileiros. Para além disso, todo o resto é conversa fiada. 

Para concluir, um texto de Augusto Nunes:

Meia dúzia de bacharéis em Direito que viraram ministros do Supremo depois de escolhidos pelo presidente da República (e aprovados pelo Senado ao fim de uma sabatina com cara de chá de senhoras) imaginam que, embora os três Poderes sejam independentes, o Judiciário é mais independente que os outros. Na cabeça desses doutores em tudo especializados em nada, o Executivo e o Legislativo dependem do que dá na telha do único poder que não depende de nenhum e não obedece a ninguém.

Intercalando interpretações amalucadas de normas constitucionais, frases em Latim e citações impenetráveis de autores que leram na diagonal, os pedantes de toga fazem o diabo. A semana de trabalho tem três dias, o ano é obscenamente encurtado por recessos e feriadões, são cada vez mais frequentes as viagens internacionais (na primeira classe, ao lado da patroa e por conta dos pagadores de impostos), mas a turma encontra tempo para decidir o que é certo e o que é errado qualquer que seja o tema, principalmente se o desconhecem.

Os superjuízes liderados por Gilmar Mendes nunca negam fogo. Como lidar com homofobia, demarcação de terras indígenas, feminicídio? Eles sabem o que pode e o que não pode. Operações da Polícia Federal, atribuições do Ministério Público, desempenho de magistrados e policiais federais, pronunciamentos do chefe do Executivo, prisão em segunda instância  — perguntas sobre esses ou quaisquer outros assuntos encontrarão a resposta na ponta da língua do time que finge tudo saber o tempo todo.

Não faz tanto tempo assim que os ministros do Supremo eram escolhidos entre os melhores e mais brilhantes do mundo jurídico brasileiro. Também assolado pela Era da Mediocridade, anunciada pelo resultado das eleições de 2002, o STF foi ficando parecido com os vizinhos de praça. O estrago foi agravado pela consolidação do único critério que orientou o preenchimento de vagas na corte durante os governos de Lula e Dilma: o escolhido deveria mostrar em seus votos que seria eternamente grato a quem o havia escolhido.

A virtual revogação das duas exigências impostas pela Constituição — um juiz do Supremo deve ter notável saber jurídico e reputação ilibada — escancarou a porta de entrada a figuras que falam demais, em linguagem muito estranha, e falam tanto que não lhes sobra tempo para pensar. No momento, os semideuses de botequim se concentram numa irracional ofensiva destinada a emparedar os procuradores da força-tarefa da Lava-Jato, começando por Deltan Dallagnol, acuar o ministro Sérgio Moro, livrar da insônia os bandidos de estimação e, supremo sonho do bando, tirar Lula da cadeia.

Por ignorar que a paciência da plateia acabou no momento em que aprendeu com a Lava-Jato que todos são iguais perante a lei, a tropa de choque parece seguir acreditando que ninguém pode com o Supremo — que pode tudo, até  inocentar culpados e culpar inocentes sem que nada aconteça. Dias Toffoli, por exemplo, abriu um inquérito que tudo permite e transformou Alexandre de Morais no primeiro relator-detetive da história. Gilmar Mendes qualificou de “organização criminosa” o comando da Lava-Jato e concedeu um habeas corpus perpétuo ao receptador de mensagens roubadas Glenn Greenwald. Para essa gente, não há limites para o absurdo.

“Japona não é toga”, lembrou em outubro de 1964 o então presidente do Senado, Auro Moura Andrade, a chefes militares decididos a atropelar a Constituição. Com quatro palavras, Auro ensinou que não cabia às Forças Armadas usurpar funções privativas do STF. Um general no papel de juiz é tão absurdo quanto um magistrado no comando de uma divisão de infantaria. Pois chegou a hora de  inverter a ordem dos substantivos para adaptar a frase aos tempos modernos e obstruir o avanço dos oniscientes de araque.

Antes que ousem proclamar a Ditadura do Latinório, os doutores em nada precisam aprender que toga não é japona. A lição será assimilada em poucos segundos se for berrada em manifestações que a imensidão de descontentes está devendo a si mesma. Além de uma japona, os gilmares, toffolis, lewandowskis e similares andam enxergando na toga  a capa do Superman. Como para tantos outros, a cura para esses supremos delírios também está na voz das ruas.

Se lhe sobrar tempo — e estômago —, não deixe de ler a entrevista de Toffoli que a revista Veja publicou na edição desta semana. Em resumo, o ministro conta que entre abril e maio últimos houve uma tentativa de golpe para depor o presidente Jair Bolsonaro, e que ele, Toffoli, interveio e, junto com outros nomes de peso da República, conseguiu abortar. Sem dar nomes aos bois, o presidente do STF dá a entender que foi sob a ameaça do golpe que adiou o julgamento da ação que poderia acabar com a prisão em segunda instância, beneficiando Lula. A preocupação com o golpe, segundo ele, destravou na Câmara a aprovação da reforma da Previdência, e os que viam no parlamentarismo a melhor forma de governo a ser implantada com a deposição de Bolsonaro acabaram abandonando a ideia. Dito em outras palavras: por vias tortas, adotou-se a proposta de um pacto entre os três poderes sugerida por Toffoli à época. Mas é tudo conversa fiada. Veja uma versão resumida e mais realista no vídeo a seguir:

segunda-feira, 12 de agosto de 2019

CONSPIRAÇÃO TABAJARA


Serve para animar a polêmica e acirrar antagonismos, mas não faz o menor sentido a teoria conspiratória de que o ministro Sérgio Moro teria arquitetado, por influência na Polícia Federal e ascendência sobre um juiz corregedor, a transferência do ex-presidente Lula para o presídio de Tremembé (SP).

Se fosse por revanchismo, qual o interesse de Moro em provocar uma situação em que haveria previsível reação de solidariedade, abrindo até espaço para eventual decisão do Supremo pela liberdade do ex-presidente, até por parte dos opositores de Lula? Pois é, nenhum.

Nada a ver com sadismo ou revanche. A PF há muito defende a transferência dele de Curitiba alegando falta de estrutura, aumento de despesas e deslocamento de agentes, bem como a vizinhança protesta contra os transtornos e a falta de segurança na região. Daí o pedido ter sido feito também pela prefeitura de Curitiba.

São inadequadas também as críticas à juíza Carolina Lebbos, da Justiça Federal do Paraná. Ela tomou uma decisão considerada juridicamente correta até por advogados que discordam do envio a Tremembé, onde não haveria como garantir a segurança de Lula.

A escolha do local foi o juiz do departamento de execuções penais do Tribunal de Justiça de São Paulo. Indicado para o posto por Moro. Ok, mas, de novo: qual seria o interesse do ministro em pedir a ele que tomasse uma decisão feita e acabada ao molde de tiro pela culatra, digna das organizações Tabajara? Pois é, nenhum.

Texto de Dora Krmer

sexta-feira, 9 de agosto de 2019

A APROVAÇÃO DA PEC PREVIDENCIÁRIA, MAIS SOBRE LULA EM CURITIBA, A VISÃO BITOLADA DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA


A votação em segundo turno da reforma da Previdência foi eclipsada pelo decisão da juíza federal Carolina Lebbos, que, na última quarta-feira, a pedido da PF, determinou a transferência de Lula para "um presídio em São Paulo" (detalhes na postagem anterior). Mas o fato é que no final da noite da mesma quarta-feira, após quase mais de nove horas de debates, a Câmara rejeitou os oito destaques apresentados pela oposição, que buscavam retirar alguns pontos do texto aprovado na madrugada anterior. O presidente da Casa, Rodrigo Bolinha Maia (ou Botafogo, como o deputado figurava nas planilhas do departamento de propinas da Odebrecht), agradeceu aos partidos aliados e disse que aprovação do texto foi consequência de um "trabalho coletivo" — e com toda razão: se dependesse de Bolsonaro... Enfim, o texto seguirá para o Senado, onde deve começar a tramitar na próxima semana e, se tudo correr bem, ser aprovado em dois turnos antes do final de outubro.

O mercado financeiro reagiu de forma positiva à aprovação do texto e à rejeição dos destaques. O índice Bovespa se recuperou da queda da última terça-feira e iniciou a quinta em alta (no momento em que estou concluindo este posts, o B3 está em alta de 1,25%, a mais de 104 mil pontos). Vale lembrar que a instabilidade do mercado se deveu em grande medida à guerra fiscal entre EUA e China, mas, durante a madrugada de ontem, o governo chinês anunciou dados surpreendentemente bons para sua balança comercial, com crescimento das exportações na casa dos 3% em julho em relação ao mesmo mês de 2018, ante previsões de uma queda de 2%. Os EUA também ofereceram algum alívio aos investidores, já que o presidente do Federal Reserve de Chicago sinalizou a possibilidade de um novo corte na taxa de juros norte-americana, após a redução anunciada na semana passada.

Na Europa, o Banco da França anunciou em sua pesquisa de julho que a segunda maior economia do continente pode ter acelerado seu crescimento. Segundo análise da revista Exame, são fagulhas de boas notícias, mas às quais os investidores devem se agarrar após a leva de decepções dos últimos dias. No Brasil, a aprovação sem alterações do texto base da reforma da Previdência na Câmara desanuvia em parte as incertezas para a Economia, mas atenções agora se voltam para o Senado, onde um grupo de parlamentares fala em trazer de volta a capitalização, em retirar as isenções e em incluir estados e municípios no projeto. A ver.

Ainda sobre a decisão do STF sobre a transferência de Lula, cabe um contraponto ao que eu disse no post anterior: na avaliação de Merval Pereira, fizeram bem os ministros em manter o condenado preso em Curitiba. Não tinha cabimento o pedido da defesa e do PT, para que Lula fosse libertado devido à decisão da juíza federal Carolina Lebbos, responsável pela execução penal do ex-presidente petralha pelo caso do tríplex.

É bom lembrar que Zanin e companhia já haviam pedido anteriormente a transferência do petista para São Bernardo do Campo, onde ele ficaria perto da quadrilha, digo, da família, e aproveitaram a autorização de sua transferência para tentar, mais uma vez, libertar o criminoso — e, mais uma vez, não obtiveram sucesso, como comprova o placar de 10 a 1, ainda que  o único voto discordante — do ministro Marco Aurélio, para quem o recurso deveria ter sido encaminhado ao TRF-4, que decretou a prisão em segunda instância — me pareça o mais adequado à situação.

Vale lembrar, também, que a legislação brasileira não contempla réus condenados, que estão cumprindo pena, com o direito à prisão especial: ex-governadores, ex-ministros, deputados, senadores e distintíssima companhia estão todos em prisão comum, inclusive os que ainda não foram condenados. Mas o caso de Lula é uma situação sem precedentes. Collor e Dilma foram penabundados do Planalto, mas mantiveram as regalias inerentes à condição de ex-presidentes, como assessores e carros à disposição — que Lula só perdeu quando foi condenado em segunda instância. 

Dada a possibilidade de esses dois ex-presidentes (além de Michel Temer) serem condenados e passarem a cumprir pena, talvez esteja na hora de discutir esse tipo de privilégio à luz do preceito constitucional de que todos são iguais perante a lei. É certo que nosso sistema prisional é ultrapassado, que os presídios estão superlotados e que a ressocialização dos presos é uma balela. Mas a prova provada de que a iniquidade campeia solta em nossa sociedade é fato de o maior líder populista surgido nos últimos tempos — e seus abilolados apoiadores — considerar que ir para uma prisão comum é uma tentativa de aniquilá-lo. Por outro lado, num país em quase 7% da população (cerca de 15 milhões e brasileiros) acreditam que a terra é plana, não se pode esperar que o exercício intelectual seja o esporte nacional.

Se o chanceler Ernesto Araújo — que, a exemplo de Bolsonaro e respectiva prole, bebe da sabedoria do escritor, ideólogo e ex-astrólogo Olavo de Carvalho — tivesse escutado uma explanação do então presidente Lula, não teria dúvidas de que a Terra é redonda. Enquanto o guru de festim afirma que ainda não encontrou explicações cientificas convincentes de que a terra seja redonda, embora advirta que não se debruçou detalhadamente sobre o tema, Lula explicou: “Freud dizia que havia várias coisas que a humanidade não controlaria. Uma delas eram as intempéries. Essa questão do clima é delicada por quê? Porque o mundo é redondo. Se o mundo fosse quadrado, ou retangular, e a gente soubesse que nosso território está a 14 mil quilômetros de distância dos centros mais poluidores, ótimo, vai ficar por lá. Mas como o mundo gira, e a gente também passa lá embaixo nos lugares mais poluídos, a responsabilidade é de todos”. Nem Dilma teria feito melhor.

Para concluir: Dias atrás, o porta-voz da presidência afirmou que os filmes financiados pela Ancine devem ter o espírito cristão, que é o da sociedade brasileira. Mas é impensável achar que o Estado só pode financiar filmes que correspondam ao pensamento do presidente. O país não pode ser liderado por uma visão personalista e voluntarista como a de Bolsonaro, que não tem parâmetros, e sim interesses pessoais. Ele vive em torno da família e dos amigos, e quem não está nesse grupo é visto como fora do padrão, não confiável. Sobre o comportamento do presidente, um texto de Rodrigo Constantino fecha esta postagem com chave de ouro:

As redes sociais deram voz aos idiotas de todos os tipos, perfis e ideologias. Andando em bando ou no anonimato, eles se sentem confortáveis para disseminar seu ódio, extravasar seu recalque, transformar sua mediocridade pessoal em arma contra todos aqueles que se mostram superiores, independentes, com autoconfiança.

Anos de petismo produziram um sentimento, compreensível, de revolta profunda, alimentando um desejo de vingança. No encontro entre as redes sociais e esse sentimento difuso, criou-se o fenômeno do bolsolavismo, uma “direita” que se define basicamente por aquilo que odeia, a esquerda. Não há desejo de construção, mas sim de destruição. E como se parecem, nos métodos, com aquilo que pretendem destruir!

Ao perceber isso, muitos liberais e conservadores foram se afastando do governo Bolsonaro. Afinal, trata-se de um pacote: para levar Guedes é preciso levar também essa gente que baba de ódio e quer guerra permanente contra os inimigos — todos aqueles que não aderem totalmente ao bando. O governo Bolsonaro, porém, não é sua militância olavete nas redes sociais. Mas quem conhece essa turma tem calafrios só de imaginar sua crescente influência no governo.

O receio com o autoritarismo, portanto, é legítimo. Não é “fascismo imaginário”, como alguns alegam. É projeção desse grupo se alastrando e tomando conta do todo, inclusive jogando para escanteio aqueles mais moderados e pragmáticos que insistem em lutar pelo país em meio aos boçais. Eles se acham “machões”, mas não passam de brutamontes truculentos sem qualquer noção do que seja conservadorismo.