sábado, 23 de novembro de 2024

ELE NÃO SABIA DE NADA

QUANDO A GENTE IMAGINA QUE JÁ VIU O PIOR DAS PESSOAS, APARECE ALGUÉM PARA MOSTRAR QUE O MAL É INFINITO.

 

Sob Bolsonaro, o absurdo era tramado com a naturalidade de um batizado. Adorno tétrico da trama, o assassinato de Lula, Alckmin e Moraes forneceria a apoteose necessária para virar a mesa da democracia em grande estilo. Mas o imprevisto costuma ter voto decisivo na assembleia dos acontecimentos, e as consequências sempre chegam depois.
 
"Quem espera sempre alcança", reza a sabedoria popular. Sempre que se via em apuros, Bolsonaro recorria ao versículo multiuso: "conhecereis a verdade e a verdade vos libertará" (João, 8:32). A Operação Contragolpe proporcionou seu encontro com a verdade, mas, ao invés de libertá-lo, a verdade o empurrará à cadeia. 

Até o momento, quatro militares de alta patente e um policial federal foram presos. Bolsonaro, Braga Netto e Mauro Cid estão entre os 37 indiciados pela "suposta" tentativa de golpe — "suposta" porque, como sabemos, sempre há a possibilidade de o que tem rabo de jacaré, couro de jacaré, boca de jacaré e dentes de jacaré ser, na verdade, um coelhinho branco.
 
Em junho de 2022, numa reunião em que o presidente foi filmado rosnando contra a democracia e o bobo da corte dizendo que era preciso virar a mesa antes das eleições, o general Mário Fernandes, número dois da Secretaria-Geral da Presidência, fez coro com os insurretos: 
"...É muito melhor assumir um pequeno risco de conturbar o país [...], para que aconteça antes, do que assumir um risco muito maior de conturbação no 'day after', né? Quando a fotografia lá for de quem a fraude determinar". 

Segundo a PF, o "day after" do general incluía uma carnificina que só não aconteceu por falta de adesão da tropa.
 
Bolsonaro perdeu a reeleição e colecionou derrotas nos pleitos municipais. A inelegibilidade o excluiu da cédula de 2026, mas a vitória de Trump o animou a conceder entrevistas em série, pregando uma "pacificação" escorada numa anistia inusitada. A cada vez mais provável condenação criminal pende como uma espada de Dâmocles sobre seu plano de controlar a sucessão no campo da direita.
 
Em público, Valdemar Costa Neto — ex-presidiário do Mensalão e indiciado na última terça-feira — insiste na tese abilolada de que Bolsonaro "não tem nada a ver com nada". Nos bastidores, porém, a cúpula do PL já admite que subiu no telhado a pretensão mimetizar Lula em 2018, registrando uma candidatura legalmente inviável.
 
A esta altura, falar em solidariedade afronta o razoável, mesmo nos insanos territórios da extrema-direita, e a construção de uma chapa conservadora, sem o veneno golpista do "mito", já começa a ser articulada. Mesmo porque os parlamentares do Centrão são conhecidos por carregar o caixão, não por pular na cova com o defunto. 
 
Cabe aos representantes da direita construir uma alternativa sensata, e a Tarcísio de Freitas, o primeiro da fila, tirar a mão da alça do caixão, trocando uma reeleição praticamente certa para o governo de São Paulo pela aventura de concorrer disputar o Planalto em 2026. Na seara da esquerda, Lula diz que concorrerá ao quarto mandato "se tiver saúde" — se tivesse juízo, o macróbio indicaria um sucessor para recompor o arco conservador que o reabilitou, não por gostar dele, mas para se livrar do refugo da escória da humanidade.
 
Indiciado, Bolsonaro renovou a pose de perseguido. Mas demonizar Moraes perdeu o nexo quando quando o delator Mauro Cid, os ex-comandantes do Exército e da Aeronáutica (que não aderiram ao golpe) os investigadores da PF, as togas que avalizam os despachos de Moraes e o procurador-geral Paulo Gonet se juntaram à hipotética confraria de perseguidores.
 
Em 1986, ainda capitão da ativa, Bolsonaro amargou 15 dias de prisão disciplinar por publicar na revista Veja o artigo "O salário está baixo". No ano seguinte, a mesma revista revelou que ele e outro capitão planejavam explodir bombas nos quartéis se o aumento do soldo ficasse abaixo de 60%. O então ministro do Exército pediu a expulsão dos insurretos, mas o Superior Tribunal Militar acatou a tese da defesa.
 
Bolsonaro trocou a caserna por um mandato de vereador e outros 7 de deputado federal. Em 1991, defendeu o retorno do regime de exceção e o fechamento temporário do Congresso. Em 1994, disse que preferia "sobreviver no regime militar a morrer nesta democracia". Em 1999, afirmou que "a situação do país seria melhor se a ditadura tivesse matado mais gente" (incluindo o então presidente FHC). Em 2016, 
ao votar favor do impeachment de Dilma, homenageou o torturador da ditadura Carlos Alberto Brilhante Ustra. 

Sem outra fonte de renda além do salário de parlamentar, a "Famiglia Bolsonaro" comprou mais de 100 imóveis, 51 dos quais foram pagos total ou parcialmente em espécie. Em "O Negócio do Jair", a jornalista Juliana Dal Piva revela o método usado pelo clã para acumular milhões de reais e construir um projeto político iniciado com o emprego de parentes e coordenado pela segunda esposa. O livro detalha ainda as relações da família com o ex-capitão do Bope Adriano da Nóbrega, que virou chefe da milícia de Rio das Pedras e do Escritório do Crime, e acabou executado em 2020 por policiais militares baianos e fluminenses.  
 
Em meio à pandemia, Bolsonaro desdenhou do vírus, disse que a reação da população e da imprensa era "histeria", chamou a Covid de "gripezinha de nada" e demitiu Mandetta da Saúde porque o médico "estava se achando estrela", nomeou um sucessor que não durou um mês no cargo, e colocou em seu lugar o general Eduardo 
"um manda e o outro obedece" Pazuello. 
 
relatório da CPI da Covid apontou uma dúzia de crimes, mas o genocida saiu ileso graças à subserviência do antiprocurador Augusto Aras, e escapou de 140 pedidos de impeachment porque Rodrigo Maia "viu erros, mas não crimes de responsabilidade", e Arthur Lira avaliou que "todos os pedidos que analisou eram inúteis". 

Ao longo de toda a gestão, o pior mandatário desde Tomé de Souza não só incentivou como participou de atos antidemocráticos, chamou Moraes de canalha e Barroso de filho da puta, transformou o 7 de Setembro em apologia ao golpe de Estado, e por aí afora. Mas o dito ficou pelo não dito. 
 
Derrotado nas urnas, o capetão-golpista se encastelou no Alvorada até a antevéspera da posse de Lula. Mestre em tirar a castanha com a mão do gato, escafedeu-se para a Flórida (EUA) e se homiziou na cueca do Pateta por 89 dias, retornando somente quando poeira dos atos terroristas do 8 de janeiro já havia baixado. 

Observação: Se Bolsonaro não conspirasse 24/7 contra a democracia, não se associasse à a Covid, não rosnasse para o Legislativo e o Judiciário, não se amancebasse com QueirozZambelli, Collor, milicianos e que tais, talvez o ex-tudo (ex-retirante, ex-metalúrgico, ex-sindicalista, ex-presidiário, ex-condenado etc.) ainda estivesse gozando férias compulsórias na carceragem da PF em Curitiba. Mas de nada adianta chorar sobre o leite derramado.
 
Desde a última terça-feira que só se fala na Operação Contragolpe e seus impactos na situação do ex-presidente — uma novela que começou há anos e deve entrar pelo ano que vem, já que novidades surgem dia sim, outro também, e a última peça nunca fica pronta. 

Moraes deve enviar a PGR, nesta segunda-feira, o relatório de 884 páginas que recebeu da PF, mas Gonet dificilmente denunciará os indiciados até o final do ano, e o tempo necessário para alinhar todas as investigações conduzidas pode empurrar a denúncia para depois do recesso judiciário. O recebimento da denúncia pelo STF abrirá prazo para a instrução da ação penal. 

Espera-se que a sentença saia ainda em 2025, para não contaminar as eleições de 2026. Com as penas impostas aos envolvidos no 8 de janeiro variando entre 16 e 18 anos, é provável que, em caso de condenação, o Messias que não miracula permaneça inelegível por mais tempo que os anos que lhe restam de vida. 

Bolsonaro disse a Veja que "jamais compactuaria com qualquer plano para dar um golpe". Lavou as mãos sobre o plano que previa o assassinato de Lula, Alckmin e Moraes. Se alguém cometeu algum crime, ele não sabia. Collor também não sabia do esquema PC, e Lula, do Mensalão. O "eu não sabia" é um velho conhecido dos brasileiros, que reaparece sempre que algum personagem capaz de tudo pede à nação que o veja como como um incapaz de todo.
 
O Brasil terá que aprender a conviver com um Bolsonaro inelegível, indiciado e indefensável. Não será fácil, e ficará mais difícil à medida que o indiciamento evoluir para denúncia, ação penal e provável condenação. Essa convivência pode ser longa, já que a Justiça, conhecida por tardar mas não falhar, move-se em solo brasileiro a velocidade de um cágado perneta. 

O fato de a deusa Themis ter sido retratada sentada diante do STF indica que quem recorre àquela corte precisa ter paciência de : dependendo de quem julga e de quem é julgado, a sentença pode demorar 20 horas ou 20 anos (haja vista as condenações de Maluf, de Collor e do próprio Lula).

Triste Brasil.

sexta-feira, 22 de novembro de 2024

ESQUERDA X DIREITA

É A INGUINORANSSA QUE ASTRVANCA O POGRESSO.

Em sua fase larval, o PT se jactava de não roubar nem deixar roubar, mas bastou seu Pontifex Maximus ascender ao poder para a petralhada institucionalizar a corrupção e transformar o Brasil numa organização criminosa pluripartidária. 
 
Rivalidade na política sempre existiu. Lula começou a semear a cisão 
entre a classe operária e as "elites"quando ainda era líder sindical, e essa polarização se consolidou na disputa acirrada entre ele e Collor, na eleição solteira de 1989.

CONTINUA DEPOIS DA POLÍTICA

Existem duas maneiras de ser enganado. Uma é acreditar no que não é verdade, a outra é não acreditar no que é verdade. Os bolsonaristas acham que a vitória de Trump abre as portas para a volta do mito em 2026, ao passo que os lulopetistas acreditam que Lula disputará e obterá um quarto mandato. Já quem não se rendeu ao fanatismo militante tem o dever de duvidar desse efeito Orloff. Se as eleições municipais não servem para projetar com precisão as eleições presidenciais de dois anos depois, menos confiável é o reflexo presumido nos resultados eleitorais em dois países muito diferentes. 
Bolsonaro não ganhou em 2018 devido à ascensão de Trump ao poder em 2016, mas graças uma conjunção de fatores internos. O que nos aproxima dos EUA é o mau humor do eleitorado que a direita sabe bem capturar e a esquerda ainda não faz ideia de como reconquistar. Tudo o mais nos distancia: sistema eleitoral, organização pluripartidária, trauma do passado de golpes e governos autoritários, existência de Justiça Eleitoral, barreiras legais a candidaturas fichas-sujas, Suprema Corte em alerta e a inelegibilidade do capetão-golpista.

Antes do golpe de 1964, a hipótese de um semianalfabeto chegar à Presidência era tão improvável quanto minha ascensão ao Trono de Pedro, mas Einstein ensinou que o impossível só é impossível até que alguém duvide e prove o contrário, e Lula provou — não uma, mas três vezes!
 
Ainda que o PSDB tenha sido o adversário natural do PT durante décadas,
 os tucanos sempre foram de "centro" (se de centro-esquerda ou centro-direita, nem eles próprios sabem; quando há dois banheiros na casa, tucano que é tucano mija no corredor). Com a derrota de Aécio Neves em 2014, o partido perdeu o protagonismo e iniciou um processo de autocombustão. 

Observação: De 2018 para cá, as disputas presidenciais lembram a anedota do barítono, que, vaiado, provocou a plateia: "Não gostaram da minha performance? Esperem para ouvir o tenor!
 
O esquema de corrupção administrado pelo Planalto não "existe desde sempre". Ele começou com o Mensalão, evoluiu para Petrolão e desaguou no Tratoraço de Bolsonaro. Com a volta do desempregado que deu certo — que sempre negou o Mensalão e o Petrolão e atribuiu o desastre econômico à breve passagem de Michel Temer pelo Planalto —, a retomada da putaria franciscana eram favas contadas.

Pandora abriu sua caixa de desgraças uma única vez, mas os brasileiros borrifam merda na conjuntura a cada eleição. Nosso país vem sendo administrado como uma usina de processamento de esgoto, onde a merda entra pela porta das urnas, muda de aparência, troca de nome, recebe nova embalagem e sai pela outra porta, na posse do novo mandatário.
 
A merda reprocessada no governo Lula desaguou no governo Dilma e se reprocessou no governo Temer — parte integrante da herança que os desgovernos petistas deixaram para os próximos mandatários. Por um breve período, a Lava-Jato nos deu a impressão de que lei valia para todos. Mas o STF voltou atrás na jurisprudência sobre prisão em segunda instânciaanulou as condenações do xamã da petralhada e pregou no ex-juiz Sergio Moro a pecha da parcialidade. Essa sucessão de descalabros levou a usina de compostagem a produzir o bolsonarismo

Enquanto Lula oscilava entre a prisão e o Planalto, uma combinação mal-ajambrada de mau militar e parlamentar medíocre comia pelas beiradas. À luz da Teoria das Probabilidades, um anormal ser guindado à Presidência era improvável; dois, inacreditável; três, e em seguida, virtualmente impossível. Mas não no Brasil. Lula ocupou o Planalto de 2003 a 2010; Dilma, de 2011 a 12 de maio de 2016; e Bolsonaro, de 2019 a 2022. 
 
Graças à sucessão de decisões teratológicas emanadas do STFLula voltou a desgovernar esta banânia em janeiro de 2023. Bolsonaro está inelegível até 2030, mas alardeia que voltará em 2026, talvez porque a PGR e o ministro Alexandre de Moraes venham protelando sua conversão a réu pela fieira de crimes que lhe são atribuídos. 

Observação: Talvez isso mude agora, à luz dos detalhes estarrecedores revelados pela Operação ContragolpeA PF mirou em especial quatro militares, presos no contexto da suspeita de integrarem um plano que tinha como ponto de partida a decretação de um estado de exceção e, a partir daí, prisão, sequestro ou assassinato do então presidente do TSE, ministro Alexandre de Moraes, e da chapa presidencial eleita (Lula-Alckmin).
 
Minha pergunta, caro leitor, é a seguinte: você se enxerga como "de esquerda", "de direita" ou "isentão"? 

Continua...

quinta-feira, 21 de novembro de 2024

BANDIDO BOM É BANDIDO SOLTO

QUANDO VOCÊ ESTÁ NUM POÇO E O DESTINO LHE DÁ UMA CORDA, CABE A VOCÊ USÁ-LA PARA SUBIR OU PARA SE ENFORCAR.

Há tempos que o Brasil é governado como uma usina de processamento de esgoto, onde a merda entra pela porta das urnas, ganha nova embalagem e sai pelo outro lado, na posse do novo governante. O resultado é um círculo vicioso: políticos endeusados por uma choldra tacanha se elegem para roubar, roubam para se reeleger e criam leis em benefício próprio, em detrimento dos interesses da choldra tacanha, que, mesmo assim, insiste em reelegê-los. 
 
Assistir aos telejornais tornou-se uma provação. Quando não é o PCC executando delatores sob o nariz da polícia, é Haddad exaltando o óbvio na tentativa de convencer o PT e o próprio Lula de que é preciso cortar despesas para manter o déficit fiscal sob controle. E antes mesmo de decidir onde cortar — Saúde, Educação, Segurança Pública ou Previdência Social —, Lula nos enfia goela abaixo um novo Aerolula orçado em R$ 1,5 bi.

ObservaçãoO inquérito sobre a trama golpista mudou de patamar na última terça-feira, quando veio à público que um grupo de oficiais da tropa de elite do Exército urdiu um plano que envolvia o assassinato de Lula, Alckmin e Moraes. A questão agora não é mais se Bolsonaro e seus cúmplices serão condenados à prisão, mas quando as sentenças serão proferidas. Em que pesem as bobagens verbalizadas pelo filho do pai, o artigo 359-M do Código Penal anota que é crime "tentar depor, por meio de violência ou grave ameaça, o governo legitimamente constituído". Relator do inquérito, Xandão avalia que a materialidade da tentativa de golpe está comprovada. A PF deve encaminhar ao Supremo ainda nesta semana o relatório que antecede os indiciamentos. Juridicamente, o destino dos golpistas logo estará nas mãos do procurador-geral Paulo Gonet. Politicamente, os aliados de Bolsonaro foram presenteados com um pretexto para organizar uma chapa à sucessão de 2026 sem o capetão. Até aqui, a pose de vítima do ex-presidente golpista era uma caricatura; a partir de agora, a ideia de articular algo que se pareça com a reabilitação política de um "mito" de pés de barro torna-se um escárnio.  
 
De um lado da Praça dos Três Poderes, nossos congressistas mantêm um olho no peixe (as presidências da Câmara e do Senado), outro no gato (as "emendas Pix") e os ambos na proposta que simplifica o impeachment de ministros do STF. Do outro lado da praça, semideuses togados empurram para as calendas a prisão de Collor e adiam as férias compulsórias de
 Bolsonaro e seus asseclas na Papuda ou no raio que os parta.

Collor, para quem não lembra, derrotou Lula em 1989 e se tornou primeiro presidente eleito pelo voto popular na “Nova República” e o primeiro a sofrer impeachment. Depois de recuperar seus direitos políticos, o sacripanta disputou (e perdeu) o governo de Alagoas, foi eleito senador, tentou o governo do estado e perdeu outra vez, renovou o mandato de senador em 2014 e foi denunciado pela saudosa Lava-Jato, no ano seguinte, de desviar R$ 20 milhões da BR Distribuidora.
 
Passados nove anos, o "Rei-Sol" continua livre, leve e solto, embora tenha sido condenado pelo STF a 8 anos de 10 meses de prisão. Os embargos de declaração (recurso que se destina apenas a esclarecer pontos contraditórios, omissos ou obscuros da sentença) começaram ser apreciados no escurinho do plenário virtual em fevereiro. Depois que Moraes votou pela rejeição, Toffoli vestiu a fantasia de paladino e emperrou o julgamento com um pedido de vista tão escancaradamente protelatório quanto os próprios embargos, já que a defesa pedia simplesmente a redução da pena.
 
Devolvidos os autos e reiniciado o julgamento, um pedido de destaque apresentado pelo ministro bolsonarista André Mendonça (que seguiu o voto de Dias Toffoli pela redução da pena) levou o caso ao plenário físico, onde o recurso foi rejeitado por 6 votos a 4 (o ministro lulista Cristiano Zanin se escusou de votar). Significa dizer que 40% das togas (Toffoli, Mendonça, Mendes e Marques) votaram a favor de cortar a pena pela metade, e como o réu não amargou condenações anteriores e tem mais de 70 anos, o castigo poderia ser convertido de cana dura em prestação de serviços à comunidade. Um acinte!
 
A defesa de Collor ainda pode apresentar novos embargos de declaração. Tecnicamente, isso faz parte do devido processo legal; na prática, olhando esse imbróglio a partir de uma mesa de bar, o cidadão comum pode chegar à conclusão de que, no Brasil, acima de um certo nível de poder e renda, bandido bom é bandido solto.

quarta-feira, 20 de novembro de 2024

CIÊNCIA X RELIGIÃO... (FINAL)

SEM O MEDO DO DIABO NÃO EXISTE NECESSIDADE DE DEUS.
 
A morte é a única certeza que temos na vida, mas o que acontece depois — isso se houver um "depois" — intriga a humanidade desde os tempos mais antigos. 

Os católicos não creem em reencarnação; os "bons" vão para o céu e os "pecadores", para o inferno (não deixe de ler esta anedota). Já os espíritas acreditam que os "maus" reencarnam para evoluir espiritualmente, e os judeus... enfim, cada grupo tem sua própria interpretação do que seria a vida após a morte, e o desfile de crenças é tão variado quanto o das escolas de samba na Sapucaí.

A perspectiva da vida eterna sempre foi e continuará sendo explorada por proselitistas que alegam falar em nome de um Deus cuja existência jamais se provou. E, claro, soam convincentes: afinal, o sucesso do engodo depende da habilidade do enganador em manipular a fé alheia. 

CONTINUA DEPOIS DA POLÍTICA

Em determinas situações, um palavrão bem dito torna-se bendito, pois produz um alívio que nem a melhor prece é capaz de prover. Mas um palavrão teatral, solto no meio do nada — como o "foda-se" que a primeira-dama dirigiu a Elon Musk —, serve apenas para realçar a teatralidade de alguém que ambiciona ser o centro das atenções. 
Rosângela da Silva demonstra não ter desencarnado do papel de militante de esquerda do qual precisaria se desvincular antes de criar um problema mais sério para o governo e ao país. O episódio da dancinha ao desembarcar na Índia enquanto as enchentes assolavam o Rio Grande do Sul já havia sido constrangedor e aproveitado pela oposição o suficiente para que ela se desse conta da necessidade de se adaptar à posição assumida lá se vão quase dois anos.
O multibilionário, aninhado ao pé do ouvido de Donald Trump, gargalhou para a boquirrota num par de emojis e rogou uma praga: "Vão perder a próxima eleição." Lula preferiu ficar mal no Alvorada a ficar pior na Casa Branca, e tentou atenuar o prejuízo do Itamaraty, que molha os punhos de renda para exorcizar o personalismo que vem afastando a diplomacia dos trilhos do interesse nacional. 
Algumas primeiras-damas preferiam a discrição. Outras amavam os holofotes. Todas devem obedecer a algumas normas e ter alguma noção sobre a liturgia do poder, e nenhuma havia dito um palavrão em cerimônia oficial. Até agora. Alguém deveria lembrar Janja da liturgia que rege o papel de rainha-consorte desta banânia.

 

A origem do termo "conto do vigário" ilustra essa prática. Uma das versões mais conhecidas remonta a Ouro Preto, onde um pároco propôs amarrar uma imagem de Nossa Senhora a um burro, sugerindo que o animal decidisse para qual paróquia a santa deveria ir. O burro foi direto para a igreja de Pilar, que ficou com a imagem até que se descobriu que o dono do burro era o próprio pároco que havia dado a sugestão.


Embora política e religião não sejam mutuamente excludentes, a influência da religião na política cria uma via de mão dupla que fomenta a instrumentalização recíproca. Reivindicando uma suposta interlocução divina, padres, pastores e assemelhados (dentro ou foram dos parlamentos) exercem forte influência sobre a população, que, fragilizado pelo temor do fogo do inferno, se deixa manipular pela verborragia desses mestres do proselitismo. O truque é velho como o diabo, mas funciona, pois oferece conforto diante das incertezas do porvir.

 

Em contraste, a fé individual não depende de rituais, hierarquias ou dogmas. Ela surge espontaneamente, movida por experiências profundas e pessoais — como um momento inesperado de conexão com a existência — e se desenvolve sem a necessidade de intermediários ou tradições rígidas. Em tempos de desconfiança nas instituições, muitos encontram na espiritualidade independente uma forma de se conectar com uma força maior. Para alguns, a fé é uma confiança silenciosa em algo transcendente; para outros, uma aceitação do mistério sem precisar de "explicações definitivas".

 

Nesse sentido, ciência e filosofia têm colaborado para uma nova visão: a complexidade do universo pode ser contemplada e apreciada mesmo sem uma explicação finalista. Ao afirmar que somos "poeira das estrelas", o físico Carl Sagan não só descreveu uma conexão física entre nós e o cosmos como abriu uma janela para que muitos vejam no vasto universo um sentido de "sagrado", ainda que sem figura divina.

 

Curiosamente, a ciência não invalida a fé; ao contrário, ela a expande. A fé moderna é, muitas vezes, uma admiração pelo universo, uma disposição para o questionamento e uma abertura ao desconhecido. Essa perspectiva vê na dúvida e na busca por novas respostas uma maneira de honrar o mistério da existência. Grandes pensadores, como Einstein e Spinoza, viam no universo uma ordem tão majestosa que, mesmo sem acreditar em um "Deus pessoal", sentiam-se conectados a uma força criadora, e consideravam a busca pelo conhecimento como um ato quase espiritual. Einstein chegou a dizer que o mistério é a fonte de toda verdadeira arte e ciência.

 

A busca pelo autoconhecimento — que algumas correntes psicológicas e filosóficas incentivam — mostra que a espiritualidade livre pode ser um caminho para nos conectarmos com nós mesmos e com o mundo, sem a necessidade de um conjunto de crenças formais. A fé, nesse contexto, se torna uma prática interior, uma jornada de descoberta pessoal que aceita as incertezas da existência.

 

Diferente de muitas religiões tradicionais, que impõem normas e rituais rígidos, a espiritualidade pessoal se ajusta aos valores e necessidades de cada um. Meditação, contemplação da natureza ou mesmo o simples exercício de gratidão são maneiras de alinhar a vida com uma ordem maior. Essa é uma fé que é, ao mesmo tempo, íntima e universal, uma prática de fé que respeita o mistério.

 

Vale destacar que essa fé, que não se prende a religiões formais, não rejeita as tradições; em vez disso, reflete uma busca por autenticidade espiritual. É uma fé que aceita respostas parciais, valoriza o caminho e celebra o mistério. Para muitos, é um retorno ao sentido mais original da espiritualidade: uma ligação com o que nos transcende sem precisar de explicações definitivas, e uma confiança de que, mesmo sem respostas absolutas, nossa existência carrega propósito — ainda que esse propósito seja simplesmente a busca por entender o insondável.


Quod erat demonstrandum.

terça-feira, 19 de novembro de 2024

META AI — A POLÊMICA

QUEM TEM MEDO DE CAGAR NÃO COME, TOMA SOPA.

A inclusão da Meta AI no WhatsApp, Facebook e Instagram vem preocupando os usuários. 
A empresa reconhece que utiliza os dados para aprimorar sua inteligência artificial, mas garante a conformidade com a LGPD e reforça que o WhatsApp conta com criptografia de ponta a ponta em todas as formas de comunicação.

Em tese, o treinamento se restringe ao uso das informações fornecidas durante as interações com a ferramenta, que, segundo a big tech, não vincula os dados pessoais da conta do WhatsApp aos dados do usuário no Facebook e no Instagram. 

A impossibilidade de remover a IA do WhatsApp não fere a LGPD se a coleta de dados é feita com o consentimento dos usuários, mas quem quiser pode se opor expressamente ao uso dos seus dados preenchendo formulários específicos para o Face e para o Insta (no mensageiro, a solicitação é validada mediante a confirmação de um número de telefone vinculado à conta).

CONTINUA DEPOIS DA POLÍTICA

O terrorista de festim que detonou o próprio carro num estacionamento da Câmara e se explodiu na frente do STF provocou um inusitado debate entre Bolsonaro e Alexandre de Moraes. Numa postagem de ex-Bolsonaro, o ex-presidente anotou: "Apelo a todas as correntes políticas e aos líderes das instituições nacionais para que, neste momento de tragédia, deem os passos necessários para avançar na pacificação nacional." Escorando-se no inquérito que apura os crimes do alto-comando da trama golpista, Xandão rebateu: "Não há possibilidade de pacificação com anistia dos criminosos." 
Na visão de Bolsonaro, o que houve foi "um fato isolado provocado por perturbações na saúde mental da pessoa que, infelizmente, acabou falecendo". Na avaliação do ministro, "a coisa está conectada com o quebra-quebra do 8 de janeiro num contexto que se iniciou lá atrás, no famoso gabinete do ódio". 
Para o capetão, "já passou da hora de o Brasil voltar a cultivar um ambiente adequado para que as diferentes ideias possam se confrontar pacificamente, e que a força dos argumentos valha mais do que o argumento da força." Para o togado da calva luzidia, a força do direito deve prevalecer sobre o direito da força, e "está chegando a hora da responsabilização total de todos aqueles que atentaram contra a democracia". 
O duelo antecipa as duas consequências práticas das explosões que estremeceram a conjuntura política na noite de quarta-feira: 1) A proposta de anistia dos condenados do 8 de janeiro descerá à sepultura junto com o homem-bomba; 2) Bolsonaro e seus cúmplices ficaram mais próximos de um encontro com incontornáveis sentenças condenatórias.
 
Não há como desativar a ferramenta no WhatsApp nem fazer o downgrade de versão sem baixar um APK de terceiros (o que não é recomendável, pois os APKs copiam o código-fonte do WhatsApp e exigem que o usuário forneça seus dados de login para entrar na plataforma). Enquanto o recurso que permite ocultar botão — que já está disponível nos EUA — não chega ao Brasil, quem quiser evitar que bot fique visível na página inicial do aplicativo deve manter a conversa pressionada e tocar no ícone da lixeira, ou então segurar aba até que a seta para baixo surja, permitindo enviar a conversa para a pasta Arquivadas.
 
Não existe almoço grátis — quando você não paga por um produto, é porque o produto é o você — mas ninguém é obrigado a usar o Facebook, o Instagram, o WhatsApp ou o Xwitter do Mr. Musk (detalhes nesta postagem). 

Por falar no X, uma gambiarra para "desligar" a Meta AI no Zap viralizou na plataforma. O truque consiste basicamente em pedir ao bot que ignore as mensagens do usuário e finja que ele não existe.