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terça-feira, 11 de dezembro de 2018

MAIS ACHINCALHE NO PAÍS DA ESCULHAMBAÇÃO

De acordo com O Antagonista, o ministro Dias Toffoli, atual presidente do STF e do Conselho Nacional de Justiça — um soviete criado durante o governo de Lula para emparedar os magistrados —, deve operar nesta terça-feira, 11, para evitar uma decisão desfavorável ao futuro ministro da Justiça, Sérgio Moro.

O Conselho irá analisar a atuação do ex-juiz da Lava-Jato no dia 10 de julho, quando impediu o cumprimento da ordem de soltura de Lula proferida pelo desembargador-companheiro e então plantonista do TRF-4 Rogério Favreto. Segundo a revista digital Crusoé, o relator do caso, Humberto Martins, é favorável à absolvição, mas não conseguiu convencer todos os 15 conselheiros. Parte deles entendem que não é hora de tirar Moro do alcance do colegiado, arquivando de pronto seus processos, mas não há clima para condená-lo, de modo que o melhor seria deixar os casos em banho-maria. Moro já não é mais juiz, e a punição, a esta altura, teria um efeito mais político do que prático. Mas parece ser justamente isso que parte do CNJ deseja.

Atualização: O corregedor nacional de Justiça, ministro Humberto Martins, decidiu arquivar o procedimento contra Sérgio Moro e os desembargadores do TRF-4 Rogério Favreto, João Pedro Gebran Neto e Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, envolvidos na guerra de liminares travada em julho deste ano, por entender que nenhum deles cometeu infração. Mais detalhes na próxima postagem.

Também segundo O Antagonista, o ministro Gilmar Mendes, que interrompeu o julgamento do HC de Lula com um pedido de vista, só deve devolver o processo no ano que vem. Assim, Moro toma posse no Ministério da Justiça sem o STF julgar se sua decisão de prender Lula foi ou não parcial. 

Joice Hasselmann e Eduardo Bolsonaro protagonizaram um bate-boca acalorado no grupo de WhatsApp que reúne a bancada do PSL. Sobre ela, que disputa a liderança do partido na Câmara e participa das articulações da formação do novo governo, disse ele: "Salta aos olhos a intenção da Joice de ser líder [do partido] e, assim como já demonstrou na época da campanha, ela atropela qualquer um que esteja à frente de seus objetivos (...) Vamos começar o ano já rachados com olhar de desconfiança e cheios de dúvidas", escreveu ele no grupo. E numa segunda mensagem: "Joice, sua fama já não é das melhores. A continuar assim vai chegar com fama ainda maior de louca no Congresso. Favor não confundir humildade com subordinação. Liderança é algo automático, não imposto".

A deputada federal mais votada da história desta República rebateu, afirmando que o fato de o atual líder da bancada ser filho do presidente é uma "vidraça" e pode prejudicar o partido. "Qual é o problema em eu ou qualquer outro deputado querer disputar a liderança??? O fato de termos um deputado que também é filho do nosso presidente (por quem trabalharei todos os dias) não nos exclui. Isso é democracia. Você é dentro do partido um parlamentar que fez votação estrondosa com o sobrenome que tem. Eu também fiz, sem sobrenome. Se quisermos ter 52 candidaturas podemos ter e decidimos no voto e no debate, não por recadinhos infantis via Twitter. Cresça".

Joice chegou mesmo a dizer que Eduardo deveria se colocar em seu lugar e insinuou que, em matéria de fama, a dele pode ser pior: "Não admito nem te dou liberdade para falar assim comigo, ou escrever algo nesse tom. Não te dei liberdade pessoal nenhuma, portanto, ponha-se no seu lugar. Minhas discussões aqui são políticas e não pessoais. Se formos discutir a questão 'fama', a coisa vai longe. Então não envergonhe o que seu pai criou." E mais: que Eduardo falha na liderança do partido na Câmara e que a articulação do PSL — sigla que elegeu 52 dos 513 deputados— no Congresso está "abaixo da linha de miséria". Antes de bater boca com o filho do chefe, Joice já havia protagonizado discussões com o senador eleito Major Olímpio e a deputada eleita Carla Zambelli.

Mudando de pato para ganso, o MPF ingressou com uma ação civil pública por improbidade administrativa contra Dilma RousseffGuido MantegaArno Hugo Augustin FilhoMarcus Pereira AucélioLuciano Galvão Coutinho e Aldemir Bendine, que são acusados de se valerem dos cargos que ocupavam para maquiar as estatísticas fiscais com o objetivo de melhorar a percepção da performance governamental e ocultar uma crise fiscal e econômica iminente, comprometendo ainda mais a saúde financeira do Estado.

Segundo o procurador Ivan Marx, o caso talvez represente o passo final na infeliz transformação do denominado “jeitinho brasileiro” em “criatividade maquiavélica”. Para ele, as pedaladas minaram a credibilidade das estatísticas brasileiras, contribuindo para o rebaixamento da nota de crédito do país, e assim requer a perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, pagamento de multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos, além de indenização por danos morais coletivos pela prática de improbidade administrativa.

Os advogados Modesto de Souza Barros Carvalhosa, Adriana Nunes Martorelli, Marco Aurélio Chagas Martorelli, Maura Fernandes Garcia da Costa, Leonardo Tavares Siqueira e Leopoldo Penteado Butkiewicz protocolaram, na última sexta-feira 7, um pedido de impeachment contra o ministro Ricardo Lewandowski. A Mesa Diretora do Senado confirmou que recebeu o documento, mas informou que ele ainda não foi numerado.

O pedido tem como base o episódio ocorrido durante o voo de São Paulo para Brasília — que eu venho abordando nas últimas postagens e, portanto, dispensa maiores detalhes. Para os autores, “ao reagir como reagiu contra o direito constitucional de um cidadão que nada mais fez do que o livre e civilizadamente se manifestar o sentimento de vergonha, aliás não exclusivo dele mas de grande parte do povo, que reiteradas vezes tem tomado as ruas do país inteiro para protestar contra um garantismo penal que só a delinquentes poderosos teima em servir, o ministro, abusando de seu poder e autoridade, quebrou o decoro do cargo que ocupa e deve responder às penas por crime de responsabilidade”.

Os advogados sustentam que o ministro Lewandowski cometeu crimes de responsabilidade consistentes em quebra de decoro e abuso de poder, e pedem que ele seja “condenado à definitiva perda do cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal e inabilitado para o exercício de toda e qualquer função pública durante o período de oito anos”. O Senado informou que, após numerado, o documento será autuado e publicado no Diário Oficial do órgão. Feito isso, o presidente despacha para a Advocacia Geral do Senado, que emite um parecer com base no qual o presidente do Senado pode rejeitar de ofício a petição ou encaminhá-la à Mesa Diretora para distribuição e prosseguimento da denúncia.

Observação: Somente no ano passado, Gilmar Mendes foi alvo de seis pedidos de impeachment ― dois foram arquivados pelo presidente do Senado, Eunício Oliveira, antes mesmo que tivessem qualquer tramitação. O último, apresentado no dia 22 de dezembro, foi embasado num abaixo-assinado virtual com 1,7 milhão de apoios e fundamentado na conduta incompatível do jurista com a honra, a dignidade e o decoro de suas funções; o exercício de atividade político-partidária; a prática de atitude patentemente desidiosa no cumprimento dos deveres do cargo; o proferimento de julgamento quando deveria se declarar legalmente suspeito na causa, e o estabelecimento de relações com investigados. Em abril deste ano, mais um pedido foi protocolado, desta vez pelo renomado jurista Modesto Carvalhosa. Além Mendes, os ministros Toffoli e Lewandowski também já foram alvo de pedidos de impeachment.

segunda-feira, 10 de dezembro de 2018

AINDA SOBRE O PAÍS DO ACHINCALHE



Sobre o caso da vestal ofendida que mandou deter o advogado Cristiano Acioli por expressar sua opinião sobre o Supremo, o jornalista Mario Sabino escreveu revista digital Crusoé: “Rebuscar a linguagem jurídica, não só em contratos e testamentos, mas em sentenças e julgamentos, remonta aos tempos da Roma Antiga, e que, nos desvãos do jargão e nos labirintos das frases, moram o sofisma e o seu coroamento: o casuísmo.”

A linguagem jurídica rebuscada adultera a clareza da língua e, portanto, é uma forma de corrupção. Embrulhado no universo corrompido pela linguagem rebuscada, em que as prosopopeias se fazem acompanhar por rapapés mais ou menos republicanos, Ricardo Lewandowski, ao ouvir de um cidadão comum, embarcado no mesmo voo de São Paulo a Brasília, que o STF é “uma vergonha”, mandou prender o insurgente (Acioli foi levado para a PF, onde prestou depoimento e foi liberado em seguida)

A pergunta que não quer calar é: por que diacho o cidadão acha o STF “uma vergonha”? Só porque Lewandowski manteve os direitos políticos de Dilma Rousseff, depois de ela sofrer impeachment, em desacordo com a Constituição? Só porque esse mesmo magistrado queria que o condenado Lula desse entrevista antes da eleição, para atacar a Justiça que o prendeu e o proibiu de se candidatar? Só porque Gilmar Mendes é sócio de uma faculdade que recebe patrocínios oficiais e nem tanto? Só porque Dias Toffoli recebe — ou recebia — uma mesada de 100 mil reais da mulher advogada e o COAF não foi informado pelo banco? Só porque ministros vão a convescotes patrocinados por bacharéis com causas em tribunais superiores? Só porque Luís Roberto Barroso desabafou que havia gabinetes no Supremo “distribuindo senha para soltar corruptos”?

Se Acioli tivesse dito que o STF é “deontologicamente questionável”, talvez a vestal ofendida não se sentisse ultrajada. Talvez pudesse ter entabulado uma discussão cordial com o indignado da fileira ao lado, entre snacks veganos e Coca Zero oferecidos pela Gol (pagos com verba de viagem, evidentemente). Mas não. O ministro disse que ia mandar prender o cidadão e, quando desembarcaram em Brasília, lá estava a PF esperando o ofensor, como se os agentes não tivessem mais nada que fazer.

Sem abandonar o jargão que lhes é ferramenta, os juízes da Suprema Corte Americana não corrompem a língua com o juridiquês e literatices encobridoras. Obrigam-se a que as suas sentenças sejam cristalinas e, portanto, inteligíveis a qualquer cidadão americano com instrução média. E, em 2014, passaram a exigir que as petições dos advogados também fossem em “plain terms” — objetivas, diretas, sem trololós. Quando é clara, a linguagem traduz posições límpidas; como forma é conteúdo, ela também produz comportamentos transparentes.

Um cidadão americano pode até não concordar com as decisões da Suprema Corte, mas jamais poderá dizer que ela é “uma vergonha”. Os juízes seguem um código de conduta rigoroso, estejam eles à direita ou à esquerda no espectro político. O conservador Antonin Scalia, que morreu em 2016, protagonizou um episódio exemplar no Brasil. Convidado para um jantar no Copacabana Palace, organizado por ex-alunos de Harvard, Scalia, ao saber que um advogado brasileiro com uma causa na Suprema Corte americana estaria presente, pediu que ele fosse tirado da lista. O pedido não foi atendido, e Scalia não foi ao jantar.

Ricardo Lewandowski, togado ministro do STF pelo deus pai da Petelândia, preside a segunda turma do STF, conhecida como Jardim do Éden pelos criminalistas estrelados, pagos a peso de ouro para livrar o rabo de corruptos milionários.  Que respeito merece uma corte em que ‘juízes’ são gestados e paridos em gabinetes de presidentes amigos — alguns suspeitos por denúncias sólidas de corrupção, e um até condenado e preso por corrupção e lavagem de dinheiro?

O magistrado injuriado é um petista de coração e colaboração incondicional. Já na Ação Penal 470, que ficou conhecida como “processo do Mensalão”, ele se destacou como fiel escudeiro da bandidagem vermelha. Perguntado pela imprensa sobre quando liberaria o relatório do ministro Joaquim Barbosa, o ministro Lewandowski, revisor do processo, respondeu que era preciso primeiro receber o relatório em questão — que já estava disponível na rede local do STF, de acesso restrito aos ministros, havia seis meses. Segundo se noticiou na época, a estratégia de Lewandowski era dar tempo ao tempo para que alguns crimes prescrevessem. 

Observação: Lewandowski só liberou o processo para julgamento depois de receber uma “prensa” do ministro Ayres Britto, mas mais constrangedor foi o fato de ele ter tramado com o advogado Márcio Thomas Bastos o fatiamento do processo, remetendo às instância estaduais a parte referente aos réus que não tinham direito ao foro privilegiado, como era o caso de José Dirceu. Se a maracutaia tivesse prosperado, muitos bandidos teriam saído impunes por obra e graça da prescrição.

Ao longo do julgamento, Lewandowski atuou mais como defensor do réus do que como juiz, e teve atritos memoráveis com o ministro Joaquim Barbosa. Mas o ministro-cumpanhêro é mais conhecido como “flagelo da Constituição” devido à sua atuação no processo de impeachment de Dilma. Eu relembrei esse fato no post anterior, mas vale a pena dedicar-lhe mais algumas linhas.

Reza o artigo 52 da Constituição, em seu parágrafo único: (...) Funcionará como Presidente (do processo de impeachment) o do Supremo Tribunal Federal, limitando-se a condenação, que somente será proferida por dois terços dos votos do Senado Federal, à perda do cargo, com inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública, sem prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis.” Não é difícil inferir que “com”, no caso, exerce a função de conjunção subordinativa aditiva, relacionando o que vem depois dela (inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública) com o que vem antes (perda do cargo). Basta fazer esta singela análise gramatical para concluir que a deposição de Dilma sem a suspensão de seus direitos políticos ofendeu a Constituição, e que, ao permitir que isso ocorresse, o ministro supremo cometeu crime de prevaricação.

Dizer que “O Supremo é uma vergonha e eu tenho vergonha de ser brasileiro quando eu vejo vocês”, como fez Acioli, é exercer o direito à da liberdade de expressão, conquista maior das democracias, e, portanto, não configura crime algum. O Estado de São Paulo noticiou que o gabinete de Lewandowski, em nota, informou que o magistrado “ao presenciar um ato de injúria à Corte, sentiu-se no dever funcional de proteger a instituição a que pertence, acionando a autoridade policial para que apurasse eventual prática de ato ilícito, nos termos da lei”. 

Além de desconhecedor da gramática portuguesa, sua excelência fala em “ato de injúria à Corte”. Seria providencial que alguém explicasse ao ministro-fatiador que crime de injúria é PESSOAL — portanto, inexiste crime de injúria contra instituições.

Talvez um dia venhamos a ter juízes no STF como os da Suprema Corte americana. Até lá, se você encontrar um desses ministros que despertam seus instintos mais primitivos, contenha-se. Se for impossível evitar a reprimenda, diga apenas que o tribunal é deontologicamente questionável.