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sexta-feira, 4 de outubro de 2019

AINDA SOBRE A SUPREMA VERGONHA




Como eu adiantei no post anterior, o STF tornou-se uma usina de decisões monocráticas cuja essência varia ao sabor das convicções político-partidárias de cada ministro. Quando estender os limites da hermenêutica não lhes parece suficiente, os togados supremos travestem-se de legisladores para parir jabuticabas que amoldem os fatos a suas versões.

Membros do poder legislativo são eleitos pelo povo e pelo menos em tese podem ser punidos nas urnas por mijar fora do penico, mas ministros de cortes superiores são indicados pelo presidente da República e chancelados pelo Senado, de modo que têm emprego garantido até a aposentadoria compulsória (a menos que se desliguem espontaneamente ou que batam as botas antes de completar 75 anos). Claro que sempre existe a possibilidade de impichá-los, mas isso depende de combinar com o presidente do Senado da vez. Nas gavetas de Davi Alcolumbre — que vem se revelando um clone perfeito de Renan Calheiros, só que algumas arrobas a mais  dormitam nada menos que 34 pedidos de impeachment contra ministros do STF. Gilmar Mendes é alvo mais recorrente, com 10, sendo seguido de perto por Dias Toffoli, com 9 (entre os demais, a única que escapa até agora é Cármen Lúcia).

Na última quarta-feira, após anular a condenação de Márcio de Almeida Ferreira por corrupção passiva e lavagem de dinheiro (a segunda no âmbito da Lava-Jato), a pretexto de o réu ter sido prejudicado pelo fato de o juiz não permitir que sua defesa apresentasse as razões finais depois da defesa do réu delator, os ministros decidiram sumular esse entendimento capenga para homenagear os criminosos e escarnecer dos cidadãos de bem. No finalzinho da tarde, o plenário alcançou os 8 votos necessários para o desenvolvimento de uma tese que norteie as instâncias inferiores sobre a ordem de apresentação dos memoriais em processos que envolvem réus delatores e delatados (votam contra os ministros Alexandre de Moraes, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio Mello, mas cada qual com um entendimento diferente).

Apesar de ter ressalvas em relação a Marco Aurélio Mello, destaco (e aplaudo) o lampejo de sensatez desse ministro que tantas barbaridades já cometeu — quem não se lembra da estapafúrdia liminar que ele assinou no dia 19 de dezembro do ano passado, minutos depois do início do recesso do Judiciário, que só não libertou Lula e outros 170 mil condenados em segunda instância que aguardam presos o julgamento de seus recursos às instâncias superiores porque foi prontamente cassada por Toffoli? Voltando ao voto do ministro na última quarta-feira, confira esse trecho:

"O Supremo não legisla, pronuncia-se a partir da ordem jurídica em vigor; entender que o delatado deve falar após o delator é esquecer que ambos têm condição única no processo, qual seja de réus, estabelecendo-se ordem discrepante da versada na legislação de regência (...) a delação sempre existiu e não é mais que depoimento revelador de materialidade criminosa e indícios de autoria (...) e por si só não serve à condenação de quem quer que seja." 

Enfim, Toffoli suspendeu a sessão até a tarde de quinta-feira, mas pensou melhor e resolveu tirar o tema da pauta e adiar o julgamento sine die. Oficialmente, porque diversos ministros tinham outros compromissos e não poderiam participar da sessão de quinta-feira. Na verdade, porque não houve consenso em torno de sua proposta; alguns de seus pares são contrários à fixação da tese e outros rejeitam o modelo que o presidente da corte sugeriu — segundo o qual só teriam a sentença anulada e voltariam à fase de alegações finais os processos de réus que efetivamente reclamaram da ordem de apresentação de memoriais na origem e que comprovassem o dano causado por sua inobservância.  

Lembro que o réu não se defende da delação, mas da acusação feita pelo Ministério Público. Assim, salvo melhor juízo, não faz diferença nenhuma apresentar as razões finais ao mesmo tempo ou depois dos corréus, delatores ou não. Reza o melhor entendimento que: 1) réus colaboradores não estão no polo da acusação — ou seja, também são processados pelo Estado; 2) a lei processual não dispõe sobre prazo diverso para corréus em nenhuma hipótese, sejam eles delatores ou delatados.

Em outras palavras, essa conversa de que não conceder prazo diferenciado para as razões finais de réus delatores e delatados fere o direito de defesa destes últimos é mera cantilena para dormitar bovinos. Isso não está na lei, e só faz sentido na imaginação prodigiosa dos eminentes ministros que ora se valem de criatividade para retaliar a Lava-Jato. Ao parir mais essa jabuticaba, o Supremo se apequenou ainda mais, não só por abrir os portões do inferno, mas por relutar em decidir quais capetas poderão passar ele. 

Se o Brasil já era uma aberração em vários sentidos, agora tornou-se também a única democracia do planeta com 13 poderes: o Executivo, o Legislativo e os 11 ministros do Supremo, cada qual agindo como se fosse dono de seu próprio tribunal e de seus próprios fatos. A propósito, semanas atrás o brilhante comentarista político Caio Coppolla tuitou mais ou menos o seguinte: "Era uma vez um supremo tribunal federal que se tornou um pequeno parlamento autoritário com um enorme balcão de atendimento reservado aos poderosos e aos opressores".

O Supremo sempre foi um tribunal político, mas esse aspecto só ficou visível com a Lava-Jato. Até então, mal se ouvia o nome de um ou outro ministro, e, mesmo assim, só na indigesta Voz do Brasil. Hoje, as chances de você encontrar quem saiba de cor os nomes do 11 togados são bem maiores que de encontrar quem se lembre da escalação da seleção canarinho que foi goleada pela Alemanha na copa de 2010. 

Ministros que se autodeclaram "garantistas" são na verdade coniventes com a corrupção. E já não têm o menor constrangimento em confabular diante das câmeras da TV JUSTIÇA. Alguns têm se encontrado sub-repticiamente com o presidente Bolsonaro, cujo projeto de governo ora se resume a blindar seu primogênito contra as investigações do MP-RJ e emplacar o caçula na embaixada do Brasil nos EUA. Toffoli já havia se encarregado de aliviar a barra do primeiro rebento, mas agora a blindagem ganhou o reforço de Gilmar Mendes (veremos isso melhor numa próxima postagem), que não esconde seu ódio pela Lava-Jato.

Haveria muito mais a dizer, mas por hoje é só.

quinta-feira, 26 de setembro de 2019

VAI COMEÇAR A FUNÇÃO



Respeitável público, o espetáculo vai começar! É dia de... sessão no STF!


Atualização: A indicação de Augusto Aras foi aprovada por 68 votos a 10 (como a votação foi secreta, não se sabe quais senadores viram que, por baixo da barba, o procurador baiano esconde um bagre ensaboado). Enfim, a nomeação foi publicada ainda na noite de ontem, numa edição extra do Diário Oficial da União — ué, não bastaria Bolsonaro fazer a comunicação via Twitter? Falando no capitão, nova pesquisa indica que sua popularidade tornou a cair (ou continua caindo, ou não para de cair, conforme o ponto de vista), mas isso eram favas contadas. Mais preocupante que o falastrão incorrigível é o julgamento iniciado na tarde de ontem no STF, que foi suspenso após a leitura do longo — mas lúcido, coerente e cirúrgico — relatório do ministro Fachin. Ainda faltam os votos de 10 ministros, e o prosseguimento está marcado para esta quinta-feira — vale lembrar que a decisão do pleno pode afetar 32 sentenças da Lava-Jato envolvendo 143 dos 162 condenados pela operação. Para encerrar esta introdução, uma boa notícia: O ministro Jorge Mussi, da 5ª Turma do STJ, negou dois pedidos de liminar em habeas corpus nos quais a defesa de Lula, o podre, alega a suspeição dos desembargadores federais Thompson Flores e João Pedro Gebran Neto, do TRF-4, para julgar a apelação contra a sentença que o condenou o criminoso de Garanhuns a 12 anos e 11 meses no caso do sítio de Atibaia. 

Quanto ao discurso de Bolsonaro na ONU e suas repercussões na mídia, não aplaudo enfaticamente tudo que o presidente disse, mas não vejo como discordar de muita coisa que ele disse. Portanto, faço minhas as inspiradas palavras de Guilherme Fiuza, que já reproduzi no post anterior, mas enfim...

O discurso de Bolsonaro na ONU decepcionou a intelectualidade mundial. Não teve a genialidade da Dilma, a honestidade do Lula, o biquinho do Macron, os suspiros da Bachelet, não salvou as girafas da Amazônia, não demitiu Sergio Moro e ainda disse que a verdade liberta. Não dá.

Em decisão tomada na manhã da última terça-feira, o presidente do Congresso, os líderes partidários, a presidente da CCJ do Senado e o relator da PEC Previdenciária no Senado decidiram adiar (pela segunda vez) a votação da reforma da previdência naquela casa. Para quem não sabe ler nas entrelinhas, a atitude dos senhores senadores foi uma clara retaliação à operação de busca e apreensão deflagrada na última quinta-feira no gabinete do senador Fernando Bezerra, líder do governo no Senado.

A presidente da CCJSimone Tebet, afirmou que, mesmo com o adiamento, “o calendário será mantido”, e que os líderes se comprometeram a votar o segundo turno da proposta em plenário até o dia 10 de outubro — quanto patriotismo! Mesmo assim, a senadora considerou o atraso um “erro de estratégia”.

Mas a palhaçada não terminou aí. Alcolumbre e seu cupinchas foram ao STF defender a anulação das buscas — autorizadas pelo ministro Luís Roberto Barroso. O presidente do Congresso avisou o togado supremo que preside os demais supremos togados que a maioria do Senado trabalha para defender o Supremo de ataques que a corte vem sofrendo “há seis meses”. Que simpático!

Tem mais:  O Congresso derrubou 18 dos 33 pontos vetados por Bolsonaro na Lei de Abuso de Autoridade. A sessão foi antecipada em uma semana por decisão de Alcolumbre, pelo mesmo motivo que levou ao adiamento da votação da PEC Previdenciária: a operação da PF no gabinete de Bezerra, o impoluto.

Como eu disse em outra postagem, Davi Alcolumbre não tarda a atingir o grau de cinismo que Renan Calheiros, sua musa inspiradora, levou anos para alcançar. Um senador da república que não resolveu até hoje o mistério dos 82 votos (1 a mais que o número de senadores) na sessão que o elegeu presidente da Casa, e que age como o menino birrento que empresta a bola mas a toma de volta quando escalado para o banco dos reservas não merece nosso respeito. E como ele, muitos outros servidores públicos — em última análise, eles não passam disso, não importa quão "categorizado" seja o cargo que ocupam — foram eleitos para representar os cidadãos, mas se servem do poder para servir a si próprios e a seus apaniguados. Não honram, portanto, o mandato e, portanto, devem barrados nas urnas, já que desencalacrá-los de seus confortáveis gabinetes é tarefa quase impossível.

Observação: Chegamos a tal ponto de absurdismo que tanto o Palácio do Planalto quanto a Esplanada dos Ministérios, o Congresso Nacional e o Supremo viram hospício se cercados e circo se cobertos.

O Senado pediu oficialmente a Toffoli, o grande, que a autorização de Barroso seja discutida em plenário e que seja determinada a devolução de qualquer material apreendido, para que “se restabeleça a harmonia e separação dos Poderes e a imagem do Congresso Nacional”. Parece piada, mas é isso mesmo. Depois do encontro, Toffoli afirmou que o pleno deverá discutir a concessão de medidas cautelares contra parlamentares sem o aval da Procuradoria-Geral da República, mas não disse quando isso acontecerá, alegando que a questão “tem que ser amadurecida, tem que ser bem pensada”, porque qualquer decisão, se tomada, “vai ser tomada colegiadamente, justamente para estabelecer um marco”.

Preparem a pipoca e o amendoim, pois vai começar a função. E os palhaços, como sempre... bom, deixa pra lá.

segunda-feira, 16 de setembro de 2019

CRISE? QUE CRISE?



Enquanto falta dinheiro para comprar giz para as escolas e gaze para os hospitais — e Bolsonaro sugere espaçar as idas ao banheiro para economizar papel higiênico —, nossos colossos togados confundem recursos protelatórios e chicanas com o pleno direito de defesa que assiste aos réus. Como se não bastasse, os doutos decisores decidem em flagrante desacordo com os interessas da sociedade e, entre uma sessão e outra, banqueteiam-se, a expensas do Erário, com lagosta na manteiga queimada, bacalhau à Gomes de Sá, frigideira de siri, moqueca, arroz de pato, carré de cordeiro, medalhões e “tournedos de filé”. Tudo regado a uísques e vinhos importados e premiados, naturalmente.

Escusado repetir (mais uma vez) por que considero a atual composição do STF a pior de toda a história. A quem interessar possa, esta postagem e a subsequente dão uma boa ideia da suprema agonia, e mais dois textos — igualmente ilustrativos — as complementam (tome uma dose cavalar de Plasil e clique aqui e aqui degustá-los). Mas não posso me furtar a relembrar que, graças ao folclórico "nós contra eles" de Lula e seu bando, a cizânia dividiu a sociedade e se espalhou como metástase pela alta cúpula do Judiciário, transformando o Brasil na única democracia do mundo formada por 13 poderes: o Executivo, o Legislativo e os 11 ministros supremos, que agem como se cada qual fosse dono da verdade e de seu próprio tribunal.

A divisão em alas "garantista" e "punitivista" azedou o relacionamento entre os togados supremos. Como se não bastassem os embates verbais (para não dizer bate-bocas) entre Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso, dignos de cortiço de quinta categoria — num deles, Barroso acusou Mendes (e não se razão, mas isso já é outra conversa) de ser “uma pessoa horrível, uma mistura do mal com atraso e pitadas de psicopatia” —, agora o presidente e o vice-presidente da corte quase não se falam.

Toffoli integra a ala "garantista", que defende a impunidade a pretexto de resguardar o direito dos réus; Fux, a dos "punitivistas", favorável ao cumprimento antecipado da pena em nome do combate à impunidade. Segundo matéria publicada na revista Época, os membros desse grupo são chamados pejorativamente pelos do outro time de "iluministas". O relacionamento entre os dois está a tal ponto estremecido que não houve, durante o último recesso, a tradicional divisão do plantão: o presidente dos togados preferiu ficar ele próprio responsável por todas as decisões urgentes do período, inclusive aquela em que, a pretexto de proteger Flávio Bolsonaro, sobrestou todos os demais processos baseados em dados compartilhados pelos órgãos de fiscalização e controle sem autorização judicial.

Não se espera que um juiz — qualquer juiz — decida visando agradar a gregos e troianos, mas que julgue em conformidade com a legislação vigente. Por outro lado, a intenção do legislador nem sempre está expressa de forma clara e na letra fria da lei, daí os magistrados se valerem da "hermenêutica" termo que o jargão jurídico emprestou do religioso para definir a interpretação dos textos legais à luz do "espírito" da lei, ou seja, visando inferir o alcance das intenções do legislador.

Interpretar a lei não significa legislar, como deveriam saber os togados supremos — e muitos de seus pupilos nas instâncias inferiores — que parecem achar que, se limites existem, é para que sejam ultrapassados. Agem como se dirigissem em alta velocidade, imbuídos da certeza de que nenhum policial rodoviário se atreveria a multá-los; afinal, eles são supremos, inatingíveis, incontestáveis, irretorquíveis e incriticáveis.

Quiseram os constituintes de 1988 que coubesse ao supremo o direito de errar por último, e à plebe ignara, que paga os altos salários e banca suas escandalosas mordomias dos decisores, o papel de ovelha de presépio.

Como quase tudo mais neste mundo, a política funciona como uma via de mão dupla. Em junho, um pacto institucional celebrado entre os chefes dos Poderes impediu a queda do castelo de cartas tupiniquim. Bolsonaro correu risco real de ser apeado da Presidência, do que se pode inferir que nem todas as conspirações palacianas são fruto da paranoia e da imaginação fértil do capitão e seus pimpolhos.

Observação: Em entrevista a VEJA, o ministro Dias Toffoli confirmou que o Brasil esteve à beira de uma crise institucional entre os meses de abril e maio, e disse que sua atuação foi fundamental para pôr panos quentes numa insatisfação que se avolumava. A combinação explosiva envolvia setores político e empresarial e militares próximos a Bolsonaro. No Congresso, a reforma da Previdência não avançava, e o Executivo acusava os deputados de querer trocar votos por cargos e verbas públicas. O impasse aumentou quando um grupo de parlamentares resolveu desengavetar um projeto que previa a implantação do parlamentarismo — se aprovado, Bolsonaro se tornaria uma figura decorativa, um presidente sem poder (ou um "banana", nas palavras do próprio presidente).

Mas não existe almoço grátis: o pacto conteve a insurreição, mas tornou nosso indômito presidente refém da nova agenda política, cujo objetivo é travar a Lava-Jato e seus desdobramentos. Mutatis mutandis, o mesmo se deu quando Temer comprou o apoio das marafonas do Câmara para se escudar das "flechadas" do ex-PGR Rodrigo Janot. Por uma via, o vampiro do Jaburu se segurou no palácio; por outra, tornou-se um presidente "pato-manco" — ou "lame duck", que é como os americanos se referem a políticos terminam o mandato tão desgastados que os garçons palacianos demonstram seu desprezo servindo-lhes o café frio. E foi parar na cadeia poucos meses depois de descer a rampa do Planalto.

É, a vida tem dessas coisas.

quarta-feira, 11 de setembro de 2019

EU ARO, TU ARAS, ELE ARA — RESTA SABER QUEM SE FERRA



Falo mais adiante sobre a foto que ilustra esta postagem. Antes, volto a abordar a indicação de Augusto Aras para substituir Raquel Dodge no comando da PGR, que desagradou membros do MPF, sobretudo os que participam da ANPR

Cabe ao "ungido do Senhor" tentar reduzir as críticas buscando apoio entre procuradores que não integram forças-tarefas e não têm cargos de comando. Esse será seu maior desafio, já que a aprovação pelo Senado são favas contadas. Como cautela e canja de galinha não fazem mal a ninguém, o indicado já iniciou o périplo de beija-mão pelos gabinetes do presidente da Casa, Davi Alcolumbre, e da presidente da CCJ, Simone Tebet. Nas próximas semanas, o candidato deve se reunir a portas fechadas com outros 79 senadores. 

Oficialmente, o presidente indicou Aras por ele ser "católico e ter perfil conservador"; nas entrelinhas, porém, salta aos olhos o verdadeiro motivo, que é a disposição demonstrada pelo subprocurador (que se reuniu com Bolsonaro pelo menos quatro vezes antes de ser formalmente indicado) de rezar pelo seu catecismo. O capitão diz que quer alguém favorável às medidas do governo para destravar grandes obras de infraestrutura no país, mas está mais preocupado em salvar seu primogênito. Daí porque o fato de Aras ter criticado a Lava-Jato, repudiado a chamada ideologia de gênero e se mostrado favorável ao excludente de ilicitude para proprietários rurais também pesou na decisão.

Como se sabe, Flávio Bolsonaro é investigado por movimentações financeiras mal explicadas — dele próprio e de seu ex-motorista e ex-chefe de gabinete, Fabrício Queiroz. Sem o menor constrangimento, seu papai mandou às favas a agenda anticorrupção — uma das principais promessa de campanha do então candidato — para aliviar a barra do pimpolho, sobretudo depois que Queiroz demitiu a ex-mulher de Adriano da Nóbrega (acusado de chefiar uma milícia no Rio). Mesmo assim, Queiroz lamenta não ver ninguém mover nada para tentar ajudá-lo. Talvez devesse aproveitar sua próxima visita ao Einstein para consultar um oftalmologista.

Observação: Depois de ser operado de um câncer no intestino, na virada do ano, o ex-assessor parlamentar de Flávio Bolsonaro na Alerj desapareceu como uma cusparada num temporal — pelo menos para a polícia, já que a reportagem investigativa da revista Veja, quando não perde tempo beijando os pés de Verdevaldo das Couves, sabe fazer seu trabalho: semanas atrás, os repórteres flagraram o fantasminha camarada tomando um cafezinho na lanchonete do Hospital Albert Einstein.

Ao rebater críticas de nepotismo na indicação de Zero Três para a embaixada do Brasil nos EUA, Bolsonaro disse achar "natural que um pai, podendo, dê filé-mignon a seus filhos". Esse amor incondicional pela prole levou o capitão se aproximar do presidente do STF, que fez sua parte: suspendeu as investigações envolvendo Queiroz e Zero Um — e aproveitou o embalo para suspender também todos os demais processos baseados em dados compartilhados pelos órgãos de fiscalização e controle sem autorização judicial, livrando, por tabela, a pele da própria esposa e da mulher do ministro Gilmar. Paralelamente, Bolsonaro interferiu no MP-RJ, na Receita Federal, no Coaf e na PGR, além de (quiçá movidos por ciúmes) dar início ao processo de "fritura" do ministro Sérgio Moro, cuja popularidade supera a do chefe em respeitáveis 25 pontos percentuais.

O entorno palaciano já se deu conta de que parte do eleitorado bolsonarista está descontente com as interferências nos órgãos de combate à corrupção. O capitão tenta reagir, seja posando para fotos sorridente ao lado do ministro da Justiça e vetando parcialmente o abjeto projeto de lei aprovado pela Câmara sobre Abuso de Autoridade. A medida foi bem recebida por parte de sua base, mas considerada insuficiente por outra parte, que esperava o veto total. 

Na última quinta-feira, Bolsonaro reconheceu ter desagradado o eleitorado. Falando a populares disse o presidente: “Estou recebendo muita crítica de gente que votou em mim. Se não acredita em mim, e continua fazendo esse trabalho de não acreditar, eu caio mais cedo, e mais cedo o PT volta.” Se isso evitará que as pessoas que o apoiaram por rejeição ao PT pulem do barco, sob o risco de ficarem estigmatizadas, só o tempo poderá dizer.

Passando agora à foto que ilustra esta postagem, Eduardo Bolsonaro se deixou fotografar, ao lado do leito em que o pai convalesce da cirurgia a que foi submetido no último domingo, exibindo uma pistola Glock 9 mm na cintura. Foi a quarta vez que o capitão teve de ser operado em razão da facada desfechada pelo inimputável Adélio Bispo, um ano atrás, durante ato de campanha em Juiz de Fora. 

Durante uma das inúmeras entrevistas que vem concedendo a partir de sua cela VIP em Curitiba, o presidiário diz que o atentado contra a vida de Bolsonaro não passou de uma farsa. É nisso que dá medir os outros pela própria régua. Duvidosa, mesmo, é a autoria dos tiros desfechados contra a caravana de Lula no Paraná, em março de 2018, ou dos ataques à sede nacional do PT, em junho de 2016.

Voltando à foto, que foi publicada originalmente pelo próprio Zero Três: Vale lembrar que o pimpolho é entusiasta e colecionador de armas, além de adepto da prática de tiro esportivo. A Glock 9 mm é a arma padrão usada pelos policiais federais em todo país. Eduardo é escrivão da PF, e o fato de estar licenciado não anula a prerrogativa de andar armado. Particularmente, acho que estão fazendo carnaval em copo d'água, sobretudo quando há coisas muito mais importantes acontecendo no pais. Mesmo assim, é impossível negar a "falta de absolutamente" que baliza o comportamento do clã presidencial — a começar pelo próprio presidente, que há meses estilhaça a imagem do Brasil, ofendendo governantes estrangeiros e tomando atitudes indignas para um chefe do Executivo, mesmo numa banânia como a nossa.

Dias atrás, uma emissora francesa flagrou o momento em que o presidente da França critica o colega brasileiro durante a última cúpula do G7.  Em conversa com o presidente do Chile, Emmanuel Macron não só reprovou a maneira desrespeitosa como o colega brasileiro tratou a primeira-dama francesa nas redes sociais, como relembrou que, em julho passado, Bolsonaro cancelou no último minuto uma reunião com o ministro de relações exteriores da França para... cortar o cabelo. E filmou a si mesmo na cadeira do barbeiro, desancando Felipe Santa Cruz com a aleivosa teoria de que o pai do presidente nacional da OAB não foi morto pela ditadura militar, e sim por correligionários que visavam evitar o vazamento de informações confidenciais. Nas palavras do próprio Bolsonaro: “Eles resolveram sumir com o pai do Santa Cruz; não foram os militares que mataram ele não, tá? É muito fácil culpar os militares por tudo que acontece.”

Durma-se com um barulho desses!

sexta-feira, 6 de setembro de 2019

PEC DA PREVIDÊNCIA, JUDICIÁRIO, PGR, RAQUEL DODGE, LEI DE ABUSO DE AUTORIDADE, RENÚNCIA DE PROCURADORES EM BLOCO E O ORGULHO DE SER BRASILEIRO



Chamar este pobre país de "banânia" é elogiar, mas, convenhamos, seria deselegante (embora não totalmente impróprio) tratá-lo de "país de merda". Questões semânticas à parte, fato é que nossa "Pátria Amada, Brasil" perdeu em abril deste ano a 7ª posição no ranking das principais economias mundiais (que vinha mantendo desde 2005) e já nem figura mais entre as 29 nações mais ricas da lista do Business Insider. O "País do Futuro (que nunca chega)" tem os impostos, os juros, os automóveis, os pedágios, o combustível e a energia elétrica mais caros do mundo.

Como se não bastasse, o "Gigante Adormecido" (deitado eternamente em berço esplêndido) tem os políticos mais corruptos do mundo e é presidido atualmente pelo chefe de governo mais irracional do mundo, que acontece de ser também o mais impopular entre todos os que ocuparam esse cargo desde a redemocratização do "País do Futebol". E com a recente alta do dólar, nosso povo sofrido já nem pode mais ir à Disney conhecer o Pateta. Felizmente, basta ir a Brasília ou entrar nas redes sociais para ver vários.

A coisa fica ainda pior quando se foca a Justiça nesta terra de ninguém. Além de cega, essa senhora é surda e, não raro, corrupta: sobram "causos" de venda de sentenças envolvendo não só juízes de primeira instância, mas desembargadores e ministros das Cortes superiores. Claro que daí até suas meritíssimas excelências serem processadas, jugadas, condenadas e encarceradas vai uma longa distância.

Observação: Entre uma miríade de exemplos notórios, relembro o caso do desembargador Ivan Athié, presidente da 1ª Turma do TRF-2, que em março passado mandou soltar o Vampiro do Jaburu e seu comparsa, coronel Lima (para detalhes da vida pregressa do "Limão", como o policial militar reformado gosta de ser tratado, clique aqui). Athié  ficou afastado do cargo durante sete anos, devido a uma ação no STJ por estelionato e formação de quadrilha (em 2004). Um inquérito contra ele, com as mesmas acusações, foi arquivado em 2008 pelo STJ a pedido do MPF, que alegou não ter encontrado provas de que o desembargador tivesse proferido sentenças em conluio com advogados. O magistrado retornou às atividades em 2011, depois que o STF trancou a ação contra ele.

Falando em patacoadas, a usina de crises de plantão no Planalto criou mais um "mal estar internacional" ao criticar a ex-presidente do Chile e atual comissária da ONU para direitos humanos, Michelle Bachelet. Em pronunciamento sobre o governo brasileiro, Bachelet afirmou que observou "uma redução do espaço cívico e democrático, caracterizado por ataques contra defensores dos direitos humanos, restrições ao trabalho da sociedade civil e ataques a instituições de ensino”, e que, "desde 2002, o Brasil é um dos cinco países do mundo com o maior número de assassinatos de ativistas de direitos humanos".

Fiel ao seu estilo "bateu, levou", Bolsonaro devolveu: “Ela está acusando que não estou punindo policiais que estão matando muita gente no Brasil. Essa é a acusação dela. Ela está defendendo direitos humanos de vagabundos. Ela critica dizendo que o Brasil está perdendo seu espaço democrático. Senhora Michelle Bachelet, se não fosse o pessoal do Pinochet derrotar a esquerda em 73, entre eles seu pai, hoje o Chile seria uma Cuba. Eu acho que não preciso falar mais nada para ela”.

Cá entre nós, eu acho que a repercussão midiática — como de praxe — foi muito além do comentário do capitão, talvez pelo fato de ele ter citado nominalmente o pai de Michelle, general Alberto Bachelet, que foi torturado e morto durante a ditadura de Augusto Pinochet. Mas remexer nos escaninhos da história chilena não é bem a minha praia, e não convém ao sapateiro ir além das chinelas.

Voltando ao cenário jurídico-político tupiniquim, os ex-governadores do Rio, Anthony Garotinho e Rosinha Mateus, presos dias atrás com outros três suspeitos de participar de um esquema de superfaturamentos em contratos celebrados entre a Prefeitura de Campos dos Goytacazes (município fluminense do qual ambos foram prefeitos) e a construtora Odebrecht, foram soltos depois de passarem uma única noite na cadeia, graças à pronta intervenção do desembargador Siro Darlan, que lhes concedeu o habeas corpus durante o plantão judiciário na 7ª Câmara Criminal do TJ-RJ.

Além de ter carreira marcada por decisões controversas e de grande repercussão, Darlan é alvo de inquérito no STJ, que apura a venda de sentenças no fórum da capital. Antes de ser nomeado desembargador, em 2004, ele comandou, por mais de uma década, a 1ª Vara da Infância e da Juventude do Rio. Muitas de suas decisões geraram polêmicas. Como desembargador, em 2013, concedeu habeas corpus a sete dos nove envolvidos na invasão ao Hotel Intercontinental, em São Conrado, em 2010, quando o bando, armado com fuzis, pistolas e granadas, manteve 35 reféns, entre funcionários e hóspedes, por três horas. Na ocasião, uma pessoa morreu e seis ficaram feridas. Entre os beneficiados estava Rogério 157, que assumiu o comando do tráfico na Rocinha após a prisão do traficante Nem.

Em dezembro do ano passado, O GLOBO publicou que Darlan é suspeito de soltar presos durante plantões judiciais em troca de propina. Em dois casos investigados, detentos teriam sido beneficiados por decisões do desembargador. Num deles, foi anexada a colaboração premiada de um dos envolvidos, que afirmou ter ouvido de um dos presos sobre o pagamento a um intermediário do magistrado: R$ 50 mil para ser solto. Inicialmente, segundo o delator, o lance foi de R$ 120 mil, mas caiu para menos da metade dividido em duas parcelas.

Passando às boas notícias — se é que ainda as temos neste país: A CCJ do Senado não só aprovou, por 18 votos contra 7, relatório do senador Tasso Jereissati sobre a PEC da Previdência, como rejeitou os oito destaques apresentados para alterar o parecer do relator. A PEC paralela também foi aprovada em votação simbólica e por unanimidade. O texto principal segue para o plenário do Senado e, se aprovado, será promulgado. O ganho fiscal chegará na R$ 962 bilhões, mais R$ 350 bilhões se a PEC paralela for aprovada na Câmara e os estados e municípios aderirem à proposta que altera as regras da aposentadoria.

Bolsonaro anunciou ontem que deve acolher integralmente as sugestões de vetos do ministro da Justiça ao texto da Lei de Abuso de Autoridade, aprovada a toque de caixa, dias atrás, pelo Congresso. Segundo o portal G1, o capitão efetivamente votou 36 trechos de 19 artigos. Apesar dos esforços de Verdevaldo da Couves, da imprensa marrom (ou seria vermelha?), dos corruptos que pululam no Congresso e da banda podre da alta cúpula do Judiciário, Sérgio Moro continua muito popular, com 25 pontos de aprovação acima do presidente.

Por outro lado, segue envolta em brumas a nomeação do próximo Procurador-Geral da República (o mandato da atual termina no próximo dia 17). Há uma pressão política dos presidentes da Câmara e do Senado para que Raquel Dodge seja reconduzida ao cargo, o que desagradou membros da força-tarefa da Lava-Jato que atuam no DF, onde as coisas andam muuuuuuito mais devagar do que em Curitiba — até hoje, nenhum político com foro privilegiado foi mandado para a cadeia pelos 11 togados supremos, sem mencionar que a delação de Leo Pinheiro, da OAS, está parada há mais de um ano e outros processos e delações estão embolorando nos escaninhos da PGR.

Atualização: no finalzinho da tarde de ontem, o Augusto Aras foi escolhido pelo presidente para suceder a Raquel Dodge no comando da PGR. O subprocurador baiano tem 60 anos de idade e foi apadrinhado pelo ex-deputado federal Alberto Fraga, que é um dos políticos mais próximos de Bolsonaro. Aras era bem contado, mas caiu na bolsa de apostas depois que a imprensa divulgou que ele já defendeu o MST (em discurso na Câmara, em 2008) e promoveu jantares para petistas. Pelo mesmo motivo, enfrentou resistências no PSL, mas procurou parlamentares da legenda que têm proximidade com o capitão para tentar reverter o quadro. Funcionou. Sua indicação ainda precisa ser chancelada pelo Senado, mas o que importa mesmo é saber se foi uma boa escolha, considerando que a Lava-Jato e o combate à corrupção dependem diretamente da PGR  que o o próprio Bolsonaro comparou recentemente à Rainha no jogo de Xadrez

Na última quarta-feira, os procuradores Raquel Branquinho, Maria Clara Noleto, Luana Vargas, Hebert Mesquita, Victor Riccely e Alessandro Oliveira, integrantes da força-tarefa da Lava-Jato em Brasília, pediram demissão em bloco, alegando divergências de posicionamento com Raquel Dodge. Em nota, o grupo afirmou que o desligamento se deve a uma “grave incompatibilidade de entendimento dos membros da equipe” com a manifestação enviada pela PGR ao STF no dia anterior, quando Dodge pediu arquivamento preliminar de trechos do acordo de colaboração de Léo Pinheiro em que foram citados Rodrigo Maia e Ticiano Dias Toffoli, irmão ministro supremo Dias Toffoli.

Ao que parece, depois que a 2ª Turma do Supremo, decisão de anular a sentença do então juiz Sérgio Moro no caso do ex-presidente petista do BC e da Petrobrás, Aldemir Bendine, e devolver os autos à primeira instância, a Lava-Jato resolveu partir para a guerra. Para entender melhor esse imbróglio, convém ouvir que entende do assunto:

terça-feira, 3 de setembro de 2019

TRATADO DE PAZ (OU: CALA A BOCA, MAGDA)



Se o presidente Jair Bolsonaro tivesse quem bem lhe quisesse, esse alguém lhe diria: “Desiste, essa busca é inútil” — e aí, se ele desistiria ou não, é assunto que ninguém pode resolver em seu lugar.

Seria uma coisa muito boa se ele desistisse da ronda que faz dia e noite à procura de problemas inúteis, atritos com quem lhe desagrada, justa ou injustamente, e discussões que lhe rendem pouco lucro, mesmo quando tem a razão a seu lado. Para que isso?

Bolsonaro, quando se verificam as realizações que obteve nos últimos sete meses, está fazendo um bom governo e entregando resultados concretos na maioria das áreas que interessam ao país. Mas os seus atos são muito melhores do que as suas palavras — e do que os seus frequentes arranques de cachorro atropelado, como diria Nelson Rodrigues. É um contrassenso. Conforme acaba de mostrar uma pesquisa de VEJA, publicada na edição anterior, grande parte da população apoia o presidente, mas não gosta do seu jeito de governar. Não está falando mal do que ele faz. Está falando mal do que ele diz.

Bolsonaro tem de assinar o mais rápido possível um tratado de paz consigo mesmo, com o seu próprio governo, com o Brasil e com o resto do mundo. A partir daí, faria um grande favor a todos se largasse essa vida de criador de caso, ou de atirador de gasolina na fogueira dos outros, e passasse a cumprir a sua jornada diária de trabalho como a maioria dos brasileiros cumpre — trabalhando. Seria a maneira mais prática de resolver o paradoxo de um governo cujo principal opositor é o próprio presidente, e não os partidos da oposição, que conseguem valer menos hoje do que valiam em seu desastre eleitoral do ano passado. Se tivesse ficado quieto desde janeiro, só isso, estaria agora numa situação muito mais confortável — e seus inimigos estariam com muito mais dificuldades para falar mal dele. Mas Bolsonaro acha que para governar bem é essencial ficar brigando com repórter da Folha, e outras mixarias desse tipo. E daí, se ele mostrar que o repórter é um idiota? O que o Brasil ganha com isso? O povo, aliás, está pouco ligando para sua guerrinha — mesmo porque presta cada vez menos atenção no que a mídia diz.

Poucas palhaçadas revelam esse seu “estilo” tão bem quanto a comédia que está escrevendo a quatro mãos com o presidente da França, Emmanuel Macron, em torno da “Amazônia”. Macron, achando que faria cartaz, começou a brigar com Bolsonaro e com o Brasil, já que não pode brigar com Donald Trump ou com a China. Bolsonaro, para se vingar, recusou-se a receber um ministro francês porque estava cortando o cabelo. Macron surtou. Disse que a Amazônia estava “em chamas”, resolveu ilustrar sua denúncia com uma foto tirada por um fotógrafo americano que morreu em 2003 e acabou propondo a “internacionalização” da área. Nenhum líder mundial, naturalmente, lhe deu a menor atenção — mesmo porque Macron não saberia como “internacionalizar” uma área que pertence a oito países livres e que só no Brasil tem mais de 5 milhões de quilômetros quadrados, onde vivem 20 milhões de pessoas. Bolsonaro, a essa altura, estava ganhando de 3 a 0. Fez, inclusive, um discurso sereno e equilibrado em resposta a essa alucinação. Aí, resolveu aproveitar uma piadinha de internet para rir da idade da senhora Macron. Em um segundo, mandou tudo para o espaço. Mexer com a mulher dos outros é coisa de cafajeste — e não adianta enrolar agora, porque foi isso mesmo que ele fez.

Bolsonaro deveria se lembrar, urgentemente, que não foi eleito por causa de suas virtudes de brigador de rua, mas porque a maioria do eleitorado viu nele o único homem capaz de derrotar Lula e treze anos de desgraça petista. Não deveria esquecer que esses 57 milhões de brasileiros, e muitos outros, querem que faça o que prometeu — não o elegeram para sair no braço com jornalista, com o presidente da França ou com artista de novela. De tudo o que prometeu, enfim, o que os seus eleitores mais cobram é o combate à corrupção, como acabaram de provar mais uma vez com manifestações em massa nas ruas, no último domingo, em defesa da Lava-­Jato e do ministro Sergio Moro. E aí: de que lado Bolsonaro realmente está? Não dá para ser contra a corrupção e, ao mesmo tempo, ficar de briguinha com Moro e de amiguinho com Antonio Dias Toffoli. Não dá para dizer que “não leu” a lei de promoção à impunidade recém-aprovada na Câmara, ou abandonar o projeto anticrime de Moro, ou aceitar a suspensão de investigações contra a corrupção por órgãos de seu governo.

Nada disso é “questão de estilo”. É questão de dizer qual é, de fato, o seu time.

Texto de J.R. Guzzo.