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terça-feira, 27 de maio de 2025

O PAÍS DA CORRUPÇÃO — 8ª PARTE

LASCIATE OGNI SPERANZA VOI CH'ENTRATE!

Para assegurar a independência do Ministério Público Federal em relação ao Executivo, a Constituição de 1988 condicionou a destituição do PGR à aprovação do Senado. Assim, prestar vassalagem a presidente que o indicou não fazia parte das atribuições de Augusto Aras. No entanto, seduzido pela promessa (jamais cumprida) de uma vaga no STF, o antiprocurador lambeu as botas de Bolsonaro até dezembro de 2022 — e estaria lambendo as de Lula se não tivesse sido preterido por Paulo Gonet.

 

Ao longo de 79 fases, a Lava-Jato contabilizou 1.450 mandados de busca e apreensão, 211 conduções coercitivas, 132 mandados de prisão preventiva e 163 de temporária. Foram colhidos materiais e provas que embasaram 130 denúncias contra 533 acusados e geraram 278 condenações (sendo 174 nomes únicos), num total de 2.611 anos de pena. Foram propostas 38 ações civis públicas e 735 pedidos de cooperação internacional, e mais de R$ 4,3 bilhões foram recuperados por meio de 209 acordos de colaboração e 17 de leniência.

 

Tudo ia bem até que os procuradores cometeram o "pecado mortal" de mirar dois ministros do STF e um parlamentar rachadista que, coincidentemente, era filho do presidente da República. A partir de então, o ministro Gilmar Mendes passou de defensor a crítico ferrenho da força-tarefa e articulador do fim da prisão em 2ª instância. Paralelamente, o procurador que nada encontrava porque não procurava disparou o tiro de misericórdia na operação que expôs as entranhas pútridas dos governos petistas e trancafiou no xilindró bandidos travestidos de executivos das maiores empreiteiras do país e políticos ímprobos do mais alto escalão do governo federal.

 

A pá de cal foi gentilmente fornecida pelo site esquerdista Intercept Brasil, com o vazamento seletivo de mensagens roubadas dos celulares de Sergio Moro, Deltan Dallagnol e outros procuradores por uma quadrilha de hackers capiaus. No entanto, ainda que sugerisse uma colaboração explícita entre quem acusava e quem deveria julgar com imparcialidade, o material espúrio não foi periciado pela PF, já que "provas" obtidas criminosamente carecem de valor legal. Mesmo assim, Moro passou de herói nacional a "juiz parcial", e Lula, de presidiário a inquilino do Planalto (pela terceira vez), onde agora busca concluir a demolição da economia — iniciada no 1º mandato de sua pupila e interrompida pelo processo de impeachment.

 

Ao embarcar numa canoa que deveria saber furada, Moro iniciou um périplo pelos nove círculos do inferno. A exemplo de Aras, deixou-se seduzir pela promessa (jamais cumprida) de uma vaga no STF, e assim trocou 22 anos de magistratura por um efêmero ministério no governo daquele que viria a ser o pior mandatário desde Tomé de Souza. Pode-se acusá-lo de ter sido ingênuo (para dizer o mínimo), mas não de condenar Lula motivado por "ambições políticas". Primeiro, porque a sentença foi proferida em julho de 2017, quando ninguém levava a sério a possibilidade de Bolsonaro ser eleito presidente; segundo, porque o petista foi preso por determinação do TRF-4, que não só ratificou a condenação como aumentou a pena em um terço.

 

Observação: Durante os 580 dias de férias compulsórias na carceragem da PF em Curitiba, sempre que alguém lhe perguntava se estava bem, o pontifex maximus da seita do inferno respondia: "Só vou ficar bem quando foder o Moro".

 

As coisas poderiam ter tomado outro rumo se Moro continuasse engolindo sapos depois da folclórica reunião interministerial em que Bolsonaro ameaçou trocar o superintendente da PF antes que "alguma sacanagem fodesse sua família ou um amigo". Na coletiva de imprensa que convocou para anunciar seu desembarque do governo, ele acusou o presidente de interferir politicamente na PF — a revelação desse segredo de Polichinelo resultou na abertura de um inquérito para apurar os fatos, mas tudo acabou em pizza quando o ministro Celso de Mello se aposentou.

 

Como juiz federal, Moro enquadrou poderosos em processos de grande repercussão, como o escândalo do Banestado, a Operação Farol da Colina e a Operação Fênix, e condenou figuras do alto escalão da política e do empresariado, como Lula, José Dirceu, Sergio Cabral e Emílio e Marcelo Odebrecht. Em 2018, sua imagem de herói nacional ajudou o mau militar e parlamentar medíocre a se passar por inimigo da corrupção e conquistar o apoio da classe média. Como ministro, foi traído por Bolsonaro; ao deixar o governo atirando, passou de ídolo a traidor na visão dos bolsonaristas — para os lulopetistas, ele sempre foi tido como algoz de seu amado líder.

 

Como aspirante à inquilino do Planalto, Moro se filiou ao Podemos, migrou para o União Brasil e foi sabotado por Luciano Bivar — que fingiu interesse em disputar a Presidência para tirá-lo do jogo, como já o havia tirado do Podemos. Candidato a deputado federal por São Paulo, elegeu-se senador pelo Paraná. A despeito de ter escapado da cassação, sua apagada atuação parlamentar ombreia com a de Bolsonaro (que aprovou míseros dois projetos em quase 3 décadas como deputado do baixo-clero). Refém do personagem que criou na Lava-Jato e do político pouco habilidoso que demonstrou ser, vem colhendo os frutos do que plantou ao trocar o certo pelo duvidoso. 


Na Divina Comédia, Dante percorre o inferno e o purgatório guiado pelo poeta Virgílio, e o paraíso, pela mão de sua amada Beatriz. Na política, cada um precisa fazer seu caminho, e o ex-juiz entrou nessa sem guia. Mas a questão que se coloca é: como estaria o Brasil se o establishment não tivesse conspirado para o aborto de seu voo de galinha?  The answer, my friend, is blowing in the wind — ou num universo paralelo: segundo a Interpretação de Muitos Mundostoda decisão ou evento quântico que ocorre no nosso se desdobra em múltiplas realidades, cada uma com um desfecho diferente.

Moro ingressou na política embrulhado na bandeira do combate à corrupção. Mesmo com voz de pato e trocando “cônjuge” por “conje”, “comigo” por “com mim” e “depredaram” por “depredraram”, talvez ele se saísse melhor como presidente do que como ministro — até porque a prometida carta branca era “para inglês ver”; o que Bolsonaro queria era um vassalo que dançasse conforme a música que ele tocasse, e via o ex-juiz como um potencial adversário, alguém que no futuro poderia ameaçar seu projeto de poder.  

Quando foi abatido no voo de galinha rumo ao Planalto, Moro mirou a Câmara Federal e acertou o Senado. Sua migração entre partidos escancara a falta de apoio político — um problema grave no presidencialismo de coalizão. A judicialização da política durante a Lava-Jato deixou sequelas: parte da população ainda o vê como herói; outra, como justiceiro seletivo. Seu apoio à reeleição do presidente que o obrigou a engolir sapos e beber a água da lagoa foi um escárnio, e sua atuação como parlamentar revelou-se irrelevante.

É provável que Moro fosse menos desastroso que Bolsonaro ou Lula. Seu governo provavelmente teria uma abordagem mais pragmática, com foco em reformas estruturais em vez de populismo. Mesmo sem o carisma do xamã petista ou a conexão emocional do refugo da escória da humanidade com seu "gado", o ex-juiz poderia conquistar o apoio dos antipetistas não-bolsonaristas — mas correria o risco de se tornar refém do Centrão e repetir os vícios que sempre criticou.

Enquanto Lula acumulou feitos sociais (ainda que nitidamente populistas e eleitoreiros) e Bolsonaro reavivou uma extrema-direita que estava no armário desde o fim da ditadura, a força de Moro estaria na promessa de normalidade institucional — algo frágil em um país com demandas urgentes por emprego e serviços básicos como educação, saúde e segurança. 

Moro teria vantagens técnicas sobre Bolsonaro e simbólicas sobre Lula, mas sua inabilidade política e o peso de suas contradições limitariam seu alcance. Seria um presidente imperfeito, mas menos nocivo à democracia que o capetão e menos vulnerável a escândalos que o macróbio petista. Sua gestão dificilmente resolveria os problemas estruturais do país, mas talvez evitasse os extremos dos últimos anos. Numa era de opções ruins, “menos pior” pode ser o máximo que a política oferece — e, nesse critério rasteiro, Moro se beneficiaria do fracasso alheio.

Observação: diante das opções impostas por cegos mentais em 2018 e 2022, até Ciro Gomes teria sido uma escolha mais lúcida para quebrar a polarização. Mas o cearense de Pindamonhangaba concorreu à Presidência quatro vezes (1998, 2002, 2018 e 2024) e não chegou ao segundo turno em nenhuma delas.

Continua...

sexta-feira, 8 de março de 2024

QUEIJO QUENTE

O SEGREDO PARA ANDAR SOBRE AS ÁGUAS É SABER ONDE ESTÃO AS PEDRAS.

Em quase 8 horas de depoimento, general Freire Gomes cravou mais um prego no caixão da versão vitimista bolsonarista, segundo a qual uma Polícia Federal subserviente a Lula atua em conluio com "Xandão" na construção de um enredo ficcional que busca transformar em golpista um ex-mandatário exemplar. 
A delação de Mauro Cid — a quem Bolsonaro dizia considerar como "um filho" — revelou o que se esconde por trás da fantasia, e o endosso do PGR às operações da PF levantou ainda mais o manto da pseudo perseguição. Que o "mito" será indiciado pela tentativa de golpe até julho e que a PGR encaminhará a denúncia ao STF, isso são favas contadas. Pelo andar da carruagem, restarão à Corte duas opções: condenar Bolsonaro ou condenar Bolsonaro.
Em entrevista à CNN, o ex-presidenciável Ciro Gomes disse acreditar que o ex-presidente será preso, mas salientou a necessidade de se respeitar o devido processo legal. "Mesmo que seja uma pessoa como ele, qualquer bandido tem direito ao processo legal”, disse o cearense de Pindamonhangaba (SP).
Cristaliza-se a sensação de que a prisão do "cabo eleitoral de luxo" do PL não é mais uma questão de "se", mas de "quando". A dúvida é se ele participará das eleições de outubro como indiciado ou como réu. 

Quem costuma jantar assistindo ao telejornal estará menos sujeito a uma congestão se optar por uma refeição frugal — como diz o ditado, devemos fazer o desjejum como rei, almoçar como príncipe e jantar como mendigo. A menos que você seja vegano ou sofra de intolerância a lactose, um queijo quente complementa magistralmente uma salada (no calor) ou uma sopa cremosa (no frio). 

 

Esse lanche consiste basicamente em duas fatias de pão tostadas e recheadas com queijo derretido, mas prepará-lo como como manda o figurino requer atenção para alguns detalhes, começando pela escolha do pão, que deve ser de boa textura, mas não demasiadamente denso. Como no misto-quente e no bauru, a opção natural tende a ser o pão de forma, mas o italiano, a baguete, a ciabatta e o brioche deixam esse sanduba ainda mais gostoso. 

 

Igualmente importante é combinar dois ou três tipos de queijo com aromas, texturas e sabores diferentes. Requeijão de corte, meia-cura ou muçarela de búfala, por exemplo, combinam com queijos mais densos, como o parmesão. Falando nisso, o grana padano e o parmigiano reggiano eram considerados "pinga da mesma pipa" até meados do século passado, quando então foram reconhecidos como produtos diferentes. A exemplo do champanhe, que só pode ser considerados como tal quando é produzido na região homônima da França, o parmigiano "legítimo" é feito em Parma e em Reggio Emilia, e o grana, na Planície Padana (na Itália). 

 

Ambos os produtos são feitos com leite cru de vaca, sal e coalho, têm textura firme e cor de palha (resultante do alto teor de gordura). Mas uma enzima (lisozima) adicionada à massa do parma controla a proliferação de bactérias durante o processo de maturação, tornando-a mais macia, granulosa e adocicada que a massa do parmigiano. Outra diferença é a dieta das vacas que fornecem o leite: no caso do parmigiano, elas se alimentam apenas de pasto fresco ou feno; no do grana, o uso de silagem (alimento produzido através da fermentação de plantas como milho, sorgo, capim ou alfafa) é admitido. Além disso, o processo de maturação — responsável pela textura firme e pelo sabor levemente picante desses queijos — é de 12 a 30 meses para o parmigiano e de 9 a 20 para o grana.  

 

A carga tributária brasileira é uma das mais altas do mundo. Nesta banânia, os "contribuintes" trabalham mais de 5 meses por ano para pagar impostos. Como disse certa vez o economista Delfin Netto, nosso país virou uma INGANA, com impostos da Inglaterra e serviços públicos de Gana. Isso explica por que paga-se caríssimo por praticamente tudo, e mais caro ainda por produtos importados. Em 2012, pelo preço cobrado no Brasil por um Jeep Grand Cherokee era possível comprar três deles em Miami — despautério que foi motivo de chacota na FORBES, em outubro de 2012). Aqui, o preço do iPhone 14 parte de R$ 7,6 mil; nos EUA, o mesmo aparelho custa US$ 799 (menos de R$ 4 mil). 

 

Há bons queijos "tipo parmesão" produzidos no Brasil (e muita porcaria também). O Faixa Azul — fabricado pela empresa Vigor, que faz parte do grupo mexicano Lala — e o La Sereníssima — do grupo argentino Mastellone — são os meus preferidos.  Já os queijos ralados "tipo parmesão" — aqueles vendidos em saquinhos de 40, 50 e 100 gramas — são obtidos através do esfarelamento da massa de até quatro variedades de queijos de baixa umidade, e nem sempre possuem os 75% da variedade parmesão que lhes dá direito a essa denominação. 

 

Observação: De acordo com a mestre queijeira Martina Sgarbi, os queijos só são ralados na indústria quando algum problema a peça de ser aproveitada para venda. E a maioria costuma ser seca demais, salgada demais, ter cheiro de ovo e gosto de farinha ou de ranço. 

 

Concluída esta (não tão breve) introdução, passemos à receita:

 

1 — Corte duas fatias de pão com cerca de 1,5 cm de espessura e passe manteiga (não margarina) dos dois lados para formar uma crosta crocante e dourada.

2 — Misture cerca de 150 g de três queijos, sendo um mais fresco e dois que derretam bem, mas com sabores e textura diferentes. 

3 — Aqueça em fogo médio uma frigideira de ferro pesada e já curada (na falta dela, use uma de inox com fundo triplo, quem também transmite o calor de forma uniforme), doure as fatias de pão por cerca de 30 segundos, vire com uma espátula, espalhe o recheio sobre um dos lados e tempere com sal e pimenta-do-reino.

4 — Cubra com a outra fatia de pão (com o lado dourado em contato com o queijo) e, pressionando de vez em quando com a espátula (de modo a "achatar" o sanduíche), deixe dourar por 2 a 3 minutos ou até que as bordas fiquem crocantes.

5 — Vire o sanduíche e deixe dourar por mais 2 a 3 minutos do outro lado, também pressionando algumas vezes com a espátula. Quando as bordas desse lado estiverem crocantes, transfira o lanche para o prato de servir e, se quiser, corte-o ao meio (para facilitar as mordidas).

 

O sanduíche deve ser comido assim que sair da frigideira. Se você não conseguir parar no primeiro (o que é bem provável), repita o processo para preparar o segunda, de modo a comê-lo bem quentinho.

domingo, 19 de junho de 2022

SAL DE FRUTAS A GENTE VÊ DEPOIS

 


A decadência da ditadura militar propiciou o ressurgimento da democracia no Brasil, culminado com a promulgação da Constituição de 1988. A volta das eleições diretas para o Planalto com atuação expressa da Justiça Eleitoral ocorreu no ano seguinte, e contou com 82.074.718 eleitores aptos a votar. Fernando Collor, o caçador de marajás de araque, recebeu 35.089.998 votos e foi o primeiro chefe do Executivo Federal eleito diretamente desde 1960. Em 1994, o povo voltou às urnas e elegeu Fernando Henrique, que obteve 34.377.829 votos e foi reconduzido ao cargo em 1988, com 35.936.916 votos. 


A primeira eleição presidencial totalmente informatizada desde a criação da urna eletrônica — que foi implantada progressivamente em todo o país a partir de 1996 — ocorreu há exatos 20 anos e culminou na vitória de Lula, com 52.793.364 votos. Quatro anos depois, o demiurgo de Garanhuns foi reeleito com 58.295.042 votos; em 2010, sua pupila, a inolvidável nefelibata da mandioca, recebeu 55.752.529 votos e se tornou a primeira presidenta desta banânia. 


Mediante o maior estelionato eleitoral da história (até então, porque seria superado em 2018), Dilma, a inolvidável, se reelegeu em 2014, mas foi afastada em maio de 2016 e penabundada dali a três meses, quando então Michel Temer, o vampiro do Jaburu, se aboletou no trono. Dois anos mais tarde, Jair Bolsonaro, o Messias que não miracula, foi eleito com 57.797.847 dos votos válidos. 


Assim que subiu a rampa e vestiu a faixa, o "mito" dos descerebrados enrolou as bandeiras de campanhaenfiou-as onde o sol não bate e deu continuidade à demolição da economia que a bruxa má iniciou e o impeachment a impediu de concluir. Agora, faltando 100 dias para as eleições gerais, uma dezena de aberrações ameaça disputar a Presidência (lembrando que a data limite para a oficialização das candidaturas é o dia 5 de agosto, e que até lá muita coisa pode mudar). 


Para além da parelha que encabeça todas as pesquisas de intenção de voto, integram o indigesto cardápio os arrozes de festa Ciro Gomes (que caminha para a quarta derrota) e José Maria Eymael (que comemorará seu sexto fiasco). Apesar da oratória invejável, o cearense de Pindamonhangaba é visto como mero satélite do PT, e quem escuta seu jingle de campanha tem a impressão de que ele é candidato à prefeitura de Itapipoca. 

 

Entre os itens mais vomitativos (mas menos que o ex-presidente ex-presidiário e o lunático que prometeu acabar com a reeleição e jamais desceu do palanque) destaca-se o maquiavélico Luciano Bivar, mentor intelectual da “descandidatura” de Sergio Moro. André Janones e Felipe D’Ávila são ilustres desconhecidos, e de Vera Lucia, Leonardo Péricles, Pablo Marçal e Sofia Manzano, a maioria de nós mal ouviu falar. O folclórico Cabo Daciolo ameaçou repetir o fiasco de 2018, mas resolveu apoiar Ciro Gomes e voltou para o alto de sua montanha encantada. Glória a Deus! 


As pré-candidaturas de Alessandro Vieira e Rodrigo Pacheco não passaram de balões de ensaio. João Doria era uma iguaria que não faríamos mal em experimentar, mas foi retirado do cardápio por não ornar com o paladar sofrível do eleitorado. Moro chegou a figurar como “prato do dia”, mas foi “desapoiado” pelo Podemos e traído pelo União Brasil. Já as idas e vindas de José Luiz Datena são folclóricas.


Em 2018, o apresentador chegou a se licenciar do Brasil Urgente e lançar-se pré-candidato ao Senado, mas desistiu. Em 2020, chegou a ser cotado para vice na chapa de Bruno Covas, mas desistiu. No ano passado, recém-filiado ao PSL, exsudou determinação: “Dessa vez é pra valer!” Semanas atrás, embora tivesse dito que só lhe interessa a Presidência, o monumento à incoerência — que declarou que não votou em ninguém depois de Lula, que não é responsável “por boa parte do Brasil que está aí”, e  “apoiei o Bolsonaro é o cacete” — anunciou que disputará o Senado. E com o apoio de Bolsonaro. No último sábado (4), no intervalo de duas horas, Datena anunciou sua desistência, voltou atrás e disse que desistiu de desistir. 

 

Ninguém merece um sujeito desses no Planalto — nem mesmo o sapientíssimo eleitorado tupiniquim. Por outro lado, considerando que por lá passaram Collor, FHC, Lula, Dilma, Temer e Bolsonaro... Isso me lembra a anedota do pinguço que enchia a cara e ficava torrando a paciência do dono bar. Um belo dia, cansado de ouvir o manguaceiro pedir “a saideira”, o portuga lhe serviu um cálice de urina. O pinguço bebeu, mas nem assim foi embora. “Mais alguma coisa?”, rosnou o botequineiro. E o bêbado respondeu: “Já que você me serviu um copo de mijo, que tal um sanduíche de merda para acompanhar?” 

 

Torçamos pela senadora Simone Tebet. Talvez ela não seja a candidata de nossos sonhos, mas é tudo que nos resta. O sal de frutas, a gente vê depois.

 

Triste Brasil.

quinta-feira, 2 de junho de 2022

O BRASIL JOGA CONTRA O BRASIL

 


Bastou Bolsonaro aventar que só participará de debates no segundo round para Lula dizer que também não irá. Segundo o petista, não faz sentido ele “servir de escada” para candidatos que ostentam percentuais abaixo dos dois dígitos nas pesquisas. 

 

Parece aquele meloso “só vou se você for” de começo de namoro, mas é a prova provada da interdependência de nhô-ruim e nhô-pior, como evidenciam as projeções de vitória no segundo turno quando um dos componentes da fórmula Lula x Bolsonaro é substituído por outro candidato.

 

Em 2018, Bolsonaro participou de dois debates antes de ser esfaqueado por um napoleão de hospício (daqueles que não comem merda nem rasgam dinheiro). Na Band, ficou nervoso quando Guilherme Boulos quis saber por que ele embolsava o dinheiro do auxílio moradia em Brasília. Na Rede TV!, foi espinafrado por Marina Silva por ter ensinado uma criança de colo a fazer o sinal de arminha. Convalescente, usou a facada como salvo-conduto para fugir dos debates, embora não se furtasse a dar entrevistas à imprensa, gravar programas eleitorais e participar de eventos com apoiadores. E reconheceu que agiu de caso pensado: “Tudo na política é estratégia”. 

 

Se eu for [aos debates], os dez candidatos vão querer dar pancada em mim. E não vou ter tempo de responder”, ponderou o ex-capitão durante a entrevista que foi ao ar no último dia 31. “Acho que debate teria que ser com perguntas pré-acertadas antes com os encarregados de fazer o debate, até pra não baixar o nível.” 

 

Numa campanha séria, os candidatos são confrontados com assuntos incômodos e precisam se virar sem a cola do teleprompter. O que Bolsonaro propõe é outra coisa: transformar um gênero jornalístico em peça de propaganda. É como se desejasse substituir o debate pelo deboche de um jogo de cartas marcadas.

 

A tática de fugir da raia não é nova. Collor (1989), Fernando Henrique (1998) e Lula (2006) também se recusaram a encarar os adversários no primeiro turno, mas todos lideravam as pesquisas, e Bolsonaro aparece atrás do petista em todas elas. A razão de sua recusa é simples: num debate de verdade, ele precisaria dar explicações sobre a inflação galopante, os rolos dos filhos e a demora a comprar vacinas. Mas ele prefere frequentar ambientes onde não corre o risco de ser questionado. No bate-papo com Ratinho, que já atuou como garoto-propaganda de seu governo, mentiu à vontade sobre a urna eletrônica, as queimadas na Amazônia e as críticas da classe artística.

 

Ciro Gomes não deixou por menos. Em vídeo publicado em seu canal no YouTube, o terceiro colocado nas pesquisas afirmou que a ausência de Lula e Bolsonaro nos debates é uma “covardia inominável”. “Será, Lula, que você vai mostrar ao Brasil que é igualzinho ao Bolsonaro? Por favor, não traia a democracia, não traia os valores que você tanto defendeu quando queria”, afirmou o cearense de Pindamonhangaba. E complementou: “Quando você estava na cadeia em 2018, você entrou na Justiça para a Justiça lhe permitir da cadeia participar do debate, e agora que você está livre […] você não vai?”.

 

As eleições gerais deste ano consumirão R$ 5 bilhões em verbas públicas. Entre todas as disputas, a que mais costuma interessar ao eleitorado é a presidencial. Confirmando-se o esvaziamento dos debates, o pleito ganhará instantaneamente uma aparência de estelionato.

 

Este país só se tornará minimamente sério quando o povo se conscientizar que políticos devem ser cobrados, não endeusados. Quem viver, verá.

terça-feira, 31 de maio de 2022

A VOLTA DA FÊNIX MITOLÓGICA — MAS PODEM CHAMAR DE TERCEIRA VIA


Contam-se nos dedos os países desenvolvidos em que pessoas perdem suas vidas em decorrência de chuvas. Por aqui, só neste ano houve tragédias dessa natureza na Bahia, no Rio e em Pernambuco. Coisa de terceiro mundo? Não. De quinto. Dito isso, passo ao assunto do dia.

O saudoso maestro Antonio Carlos Brasileiro de Almeida Jobim, brasileiro até no nome, sabia das coisas. Atribui-se a ele a máxima segundo a qual o Brasil não é para principiantes. Prova disso é que, a menos de cinco meses do pleito presidencial, temos de um lado o ex-presidiário fantasiado de “ex-corrupto”, que quer voltar à cena do crime, e do outro um presidente investigado em seis inquéritos e alvo de quase 150 pedidos de impeachment, que move mundos e fundos (sobretudo fundos) para continuar na cena... digo, no cargo.

Por mal de nossos pecados, um desses pesadelos poderá se tornar realidade. Até porque, como bem disse Pelé, e Figueiredo depois dele, o brasileiro não está preparado para votar. Aliás, esta banânia só teria alguma chance de dar certo quando e se o povinho de merda que Deus colocou aqui compreendesse que políticos não devem ser endeusados, mas cobrados e trocados regularmente. 

Apesar de divergirem no percentual de preferência do eleitorado, todas as pesquisas apontam Lula e Bolsonaro como prováveis adversários no segundo turno. Algumas não descartam sequer a possibilidade de o petralha liquidar a fatura no dia 3 de outubro. 

Não sei até que ponto pesquisas feitas com tanta antecedência são confiáveis, mas acho que elas prestam um desserviço ao país ao estimularem ainda mais a polarização. Por outro lado, é nítido que o "esclarecidíssimo" eleitorado canarinho apagou da memória a roubalheira havida nos 13 anos e fumaça de gestões lulopetistas e a tragédia que se tornou o país sob o "mito" dos bolsomínions. Para piorar, nhô ruim e nhô pior vomitam falácias eleitoreiras em palanques antecipados sem que a pusilânime Justiça Eleitoral dê um pio. Mas nenhum dos dois apresenta um projeto de governo como manda o figurino. 

Observação: Desde o início do ano, o TSE recebeu 17 ações que apontam propaganda eleitoral antecipada na disputa presidencial, na disputa presidência, sendo 12 contra a campanha de Bolsonaro e 5 contra a de Lula, mas até o momento não houve qualquer punição efetiva.

Bolsonaro continua fazendo o que sempre fez desde o instante em que subiu a rampa do Palácio do Planalto: tudo, menos governar o país. Lula, recém conduzido ao tabuleiro da sucessão por uma suprema conspirata, quer reescrever a história distorcendo os fatos, a começar pela “inocência”que o STF não reconheceu. 

A decisão tomada por 8 a 3 pelas togas anulou os processos do tríplex, do sítio e outros dois envolvendo o Instituto Lula, mas não absolveu o camelô de empreiteiro, que percorre a conjuntura na esdrúxula condição de “ex-corrupto”, apesar de sua culpabilidade ter sido reconhecida em três instâncias no caso do tríplex do Guarujá (cuja sentença transitou em julgado) e duas no caso sítio de Atibaia.

A mítica terceira via — que já começava a duvidar da própria existência — ressurgiu timidamente depois que Sergio Moro e João Doria foram elididos da disputa. A bola da vez é a senadora Simone Tebet, já que Ciro Gomes encanta com sua grandiloquência, mas afugenta o eleitorado com a postura beligerante que já lhe garantiu três derrotas em três disputas presidenciais. A menos que o imprevisto tenha voto decisivo na assembleia dos acontecimentos, o cearense de Pindamonhangaba (SP) morrerá na praia pela quarta vez.

Embora ainda precise confirmar a consolidação da terceira via, crescer nas pesquisas e driblar eventuais traições dentro do próprio partido, Simone teve a pré-candidatura referendada por emedebistas dos principais estados do país. Mas nem Doria nem o senador Tasso Jereissati se empolgaram com a ideia de disputar a vice-presidência na chapa encabeçada por ela. Já Eduardo Leite — que foi derrotado nas conturbadas prévias tucanas — aceita ser coadjuvante. O problema é que a ala tucana liderada pelo deputado Aécio Neves entende que o PSDB deve encabeçar a chapa. Afinal, por que simplificar quando se pode complicar?

O senso comum recomenda não contar com o ovo na cloaca da galinha, mas a pesquisa Ipespe divulgada na última sexta-feira mostrou que o potencial de voto em Simone Tebet aumentou 11% em uma semana. Ele agora é de 28%. Além dos 5% que disseram ao instituto que votariam nela com certeza, há outros 23% que poderiam votar. Há sete dias, os números eram 3% e 14%. 

terça-feira, 24 de maio de 2022

É ASSIM QUE A POLÍTICA É FEITA NO BRASIL


Com a escalada do discurso de Bolsonaro contra as instituições e a volta dos ataques às urnas eletrônicas, o presidente da Câmara, Arthur Lira, ouviu de quatro ministros do STF apelos para que suba o tom contra e marque posição clara contra qualquer discurso golpista ou teoria conspiratória envolvendo as eleições. A mensagem foi clara: por ter como atribuição dar andamento a eventuais processos de impeachment contra o mandatário, Lira teria autoridade política para frear sua verborragia e baixar a temperatura da retórica que emula as Forças Armadas como garantidoras do pleito.

Os magistrados disseram ao deputado que a Corte teve papel crucial na articulação política para que o Congresso rejeitasse o voto impresso, negociando diretamente com partidos para que colocassem parlamentares mais ponderados na discussão do tema, e afirmaram que, diante da insistência de Bolsonaro de tentar colocar em xeque o TSE, o presidente da Câmara precisa se posicionar com mais veemência contra cada insinuação contra o sistema eleitoral e a democracia.

Na terça-feira 10, em um evento com investidores nos Estados Unidos, Lira defendeu as urnas eletrônicas e o sistema eleitoral brasileiro. “Eu fui eleito nesse sistema durante seis eleições e não posso dizer que esse sistema não funciona. O sistema é confiável (...) É importante que tenhamos tranquilidade política no pleito, e nós haveremos de ter. O povo vai escolher, sem o eufemismo de dizer que aquela urna presta, que aquela urna não presta”, declarou. A fala foi interpretada no STF como uma resposta aos apelos dos ministros feitos dias antes.

Ninguém diz a um mandatário o que ele não quer ouvir. Foi sempre assim, desde que o homem é homem, e no passado pior, porque resultava em morte. No caso de Bolsonaro, os que o cercam mais de perto sabem que morte significa exclusão imediata do seu convívio e, no limite que ele, se necessário, ultrapassa sem pestanejar, demissão. Dizem que ele chorou ao demitir o ministro das Minas e Energia.

Bolsonaro é bom de choro quando quer. É um ator com razoável talento. Ensinaram-lhe um dia que lágrimas comovem e que o sorriso torna qualquer pessoa mais simpática. Para não banalizar o gesto, ele não chora sempre, mas sorri com ou sem motivo. O general Luiz Eduardo Ramos, ministro da Secretaria do Governo, prefere humilhar-se a ser humilhado pelo ex-capitão afastado do Exército por má conduta. Por duas vezes, pelo menos, para fazer graça ou agradar ao chefe, já se ajoelhou diante dele.

Os mais diretamente envolvidos com a campanha para reeleger Bolsonaro dão de barato que ele conhece as dificuldades que enfrenta e sentem-se dispensados de alertá-los para erros que tem cometido. Quando o fazem são excessivamente cuidadosos. Sem um candidato da terceira via, eles trabalham com a hipótese de que a eleição será decidida no primeiro turno. Porém, se pensam que Lula é o favorito, dizem a Bolsonaro que o favorito é ele e vão para o abraço.

A julgar pelas pesquisas, o molusco deverá chegar às vésperas das eleições na condição de favorito. Há quem diga que vencerá com 171% dos votos válidos; outros, que já está se preparando para reeditar o Mensalão, o Petrolão, e assim voltar a ser o parteiro do Brasil Maravilha, o Pai dos Pobres e Mãe dos Ricos, o enviado pela Divina Providência para acabar com a fome, presentear a imensidão de desvalidos com três refeições por dia e multiplicar a fortuna dos milionários, o Redentor dos Miseráveis, o gênio da raça que proclamou a Segunda Independência ao reinventar a Petrobras e descobrir o pré-sal, o maior dos governantes desde Tomé de Souza, o campeão de popularidade e senhor das urnas capaz de eleger qualquer poste para qualquer cargo. E tem quem acredita.

Ciro Gomes não admite sair do páreo mesmo que se convença de que irá perder, mas seus eleitores poderão abandoná-lo antes do fim, para não desperdiçar o voto. E a maioria de seus eleitores votaria em Lula sem pestanejar, mesmo que Ciro já tenha dito horrores do petralha. No último dia 14, o cearense de Pindamonhangaba disse à Jovem Pan que “Lula pediu o impeachment do Fernando Henrique, do Itamar Franco… O único político para quem ele não pediu impeachment foi o Bolsonaro. Estávamos todos na rua pedindo o impeachment do Bolsonaro. O Lula não pisou lá e mandou os jagunços dele me agredirem fisicamente”.

Para o pedetista, Lula não abre mão de ter Bolsonaro no pleito porque só assim teria chance de voltar ao Palácio do Planalto, e que o contrário também acontece, ou seja, a reeleição só se torna viável porque boa parte dos eleitores temem a volta dos petralhas ao poder. “Só vamos derrotar o Bolsonaro se entendermos por que ele foi eleito. Alguma dúvida que a razão foi o lulopetismo?”, questionou.Bolsonaro foi eleito por conta da mágoa extensa da maior crise econômica da história brasileira — que foi produzida pelo Lula e pelo PT. Os números mostram isso. O que explica a resiliência e a competitividade perigosa que o Bolsonaro ainda se apresenta é o lulopetismo. É o Lula destruindo o debate, repetindo os mesmos conchavos.”

Um dos conchavos seria a articulação do molusco para minar a pré-candidatura de Simone Tebet e conseguir o apoio do MDB. Caciques do partido no Nordeste, entre os quais Renan Calheiros, defendem que a sigla apoie o PT já no primeiro turno. Ciro lembra que os políticos agora cortejados por Lula encabeçaram a articulação pelo impeachment de Dilma em 2016. “Quando enfrentamos o golpe (sic) praticado pelo Senado Federal, quem presidiu o Senado e votou pelo impeachment da Dilma? Renan Calheiros. Quem presidia o Senado em seguida, por acordo e apoio do PT? Eunício Oliveira. Com quem o Lula estava agarrado no primeiro dia? Com eles”, destacou. Em live com o Instituto Conhecimento Liberta na última quinta-feira, 12, o ex-governador do Ceará disse que o ex-presidente é um “politiqueiro esclerosado” e que “vendeu sua alma para o sistema”. E o pior é que ele tem razão.

A (patética) união com Alckmin também vem recebendo seguidos golpes do populista cearense, a despeito de ele já ter feito diversos elogios públicos ao conterrâneo — ambos nasceram em Pindamonhangaba, no interior de São Paulo. Na sexta-feira, 13, Ciro deixou fixado no topo de sua conta no Twitter um vídeo em que o ativista político Thiago Torres explica por que rejeita a aliança entre o petista e o ex-tucano. “Para mim, ele [Alckmin] é igual Bolsonaro. A periferia conheceu o fascismo na figura desses caras [do PSDB]. Durante toda minha [de Torres] adolescência o Alckmin era governador. Faltou comida na minha escola. Cuidado Lula, cuidado PT. Tem um grito engasgado na garganta dos mais pobres de São Paulo”.

A virulência do terceiro colocado nas pesquisas chamou a atenção de bolsonaristas, que passaram a compartilhar seus vídeos e posts. Petistas o acusam de ser “linha auxiliar” de Bolsonaro, enquanto os pedetistas comemoram a penetração do político de centro-esquerda fora de seu tradicional núcleo de apoio. Já Lula não rebateu nenhum dos ataques. O PT avalia que ele só tem a perder se contra-atacar o antigo aliado.

Ciro acha que, se renunciasse a ser candidato desde já, o maior beneficiado seria Bolsonaro. Segundo ele, Lula bateu no teto, e Bolsonaro sobe lenta, mas consistentemente. Ele acredita nas próprias chances de crescer até agosto, e diz que vai em frente. Se o quadro atual permanecer mais ou menos igual, e se Ciro não decolar nas pesquisas, dependerá dele e dos seus eleitores uma solução mais rápida para despachar Bolsonaro.

E o povo? E o Brasil? Fodam-se. É assim que se faz política nesta banânia.

domingo, 22 de maio de 2022

O PENÚLTIMO GOLPE FINAL



Nova pesquisa Ipespe/XP sinaliza que a corrida presidencial está refém da disputa ideológica ‘direita versus esquerda’ — um ranço da Revolução Francesa que já deveria ter sido varrido do cenário político, mas enfim...

Sobre Lula, 65% o veem como alguém de esquerda, 6% como de centro-esquerda, 1% como de centro, 1% como de centro-direita e 7% como de direita; 20% não souberam ou não responderam. Em relação a Bolsonaro, 63% o consideram de direita, 4% de centro-direita, 3% de centro, 1% de centro-esquerda e 8% de esquerda; 21% não souberam ou não responderam.

Não sei se você acredita nessas pesquisas. Eu tenho cá minas reservas. Mas isso não muda o fato de que o Brasil caminha para as eleições mais figadais desde 1989, nem de que o clima eleitoral, que sempre foi marcado pela esperança da mudança ou da continuidade democrática, tornou-se um ambiente contaminado pelo temor de que o livre debate das ideias seja sufocado pela força.

Em 2018, a necessidade de impedir a volta do criminoso à cena do crime (parafraseando o atual candidato a vice na chapa do dito-cujo) levou-nos a eleger um sociopata que jamais disfarçou seu pendor golpista. Um mau militar que ingressou na política com votos de militares e passou 28 anos na Câmara como símbolo do extremismo de direita. Um parlamentar medíocre que, no terceiro mandato, pregou o fechamento do Congresso e o fuzilamento do então presidente Fernando Henrique. Um subversivo que, questionado sobre o que faria se chegasse ao Planalto, respondeu de bate-pronto: “Daria golpe no mesmo dia”. Um despirocado que, na mesma entrevista, disse que o Brasil precisava de uma guerra civil, mesmo que isso provocasse a morte de inocentes, e, ato contínuo, escancarou seu desprezo pelas eleições: “Através do voto, você não vai mudar absolutamente nada neste país”.

A renovação promovida em 2018 foi, na maioria dos casos, desastrosa. Ao longo da campanha, Bolsonaro falou em fuzilar adversários políticos, disse que as minorias teriam que se curvar às maiorias, renovou ameaças ao Judiciário e à imprensa, prometeu “uma limpeza nunca vista”. Mas a rejeição ao lulopetismo corrupto falou mais alto, dando aso à vitória de um inimigo da democracia que se valeu dela para chegar ao poder. Numa trapaça história, o ex-capitão — que foi eleito com 57 milhões de votos e amplo apoio da elite econômica — pôs em marcha o plano anunciado em 1999 tão logo subiu a rampa. Não deu o golpe “no mesmo dia”, mas vem trabalhando diuturnamente para viabilizá-lo.

O ataque ao que foi chamado de velha política produziu uma onda extremista que adentrou às instituições moldadas pela Constituição de 1988 e envenenou o Estado Democrático de Direito, contra o qual os ataques passaram de exageros retóricos para a práticas antirrepublicanas, enquanto as sucessivas ameaças ao processo eleitoral põem em risco as eleições de outubro (algo que seria inimaginável cinco anos atrás). 

Depois de encenar mais um falso recuo, Bolsonaro fez um chamado à sublevação armada. Diante de uma possível derrota nas urnas, ele vê na ruptura institucional sua única alternativa para se manter no poder — e não hesitará em romper com a institucionalidade, como deixou claro nos discursos de Sete de Setembro e com o indulto a Daniel Silveira. Prova disso é ele elevar a cada dia o tom das ameaças. Nas últimas semanas, sua ofensiva ganhou apoio explícito de porta-vozes da caserna — o ministro da Defesa fez novas provocações ao TSE, e o comandante da Marinha endossou o discurso de questionamento das urnas. 

Ciro Gomes avisou está em curso um golpe contra a democracia. Se não forem tomadas providências já, chegaremos a um ponto sem retorno, advertiu o cearense de Pindamonhangaba. Nada muito diferente do que eu venho dizendo desde os primeiros arroubos autoritários do mandatário de fancaria. 

O golpe de Bolsonaro já começou. Se a democracia brasileira sucumbir, não será por falta de aviso.