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sexta-feira, 8 de março de 2024

QUEIJO QUENTE

O SEGREDO PARA ANDAR SOBRE AS ÁGUAS É SABER ONDE ESTÃO AS PEDRAS.

Em quase 8 horas de depoimento, general Freire Gomes cravou mais um prego no caixão da versão vitimista bolsonarista, segundo a qual uma Polícia Federal subserviente a Lula atua em conluio com "Xandão" na construção de um enredo ficcional que busca transformar em golpista um ex-mandatário exemplar. 
A delação de Mauro Cid — a quem Bolsonaro dizia considerar como "um filho" — revelou o que se esconde por trás da fantasia, e o endosso do PGR às operações da PF levantou ainda mais o manto da pseudo perseguição. Que o "mito" será indiciado pela tentativa de golpe até julho e que a PGR encaminhará a denúncia ao STF, isso são favas contadas. Pelo andar da carruagem, restarão à Corte duas opções: condenar Bolsonaro ou condenar Bolsonaro.
Em entrevista à CNN, o ex-presidenciável Ciro Gomes disse acreditar que o ex-presidente será preso, mas salientou a necessidade de se respeitar o devido processo legal. "Mesmo que seja uma pessoa como ele, qualquer bandido tem direito ao processo legal”, disse o cearense de Pindamonhangaba (SP).
Cristaliza-se a sensação de que a prisão do "cabo eleitoral de luxo" do PL não é mais uma questão de "se", mas de "quando". A dúvida é se ele participará das eleições de outubro como indiciado ou como réu. 

Quem costuma jantar assistindo ao telejornal estará menos sujeito a uma congestão se optar por uma refeição frugal — como diz o ditado, devemos fazer o desjejum como rei, almoçar como príncipe e jantar como mendigo. A menos que você seja vegano ou sofra de intolerância a lactose, um queijo quente complementa magistralmente uma salada (no calor) ou uma sopa cremosa (no frio). 

 

Esse lanche consiste basicamente em duas fatias de pão tostadas e recheadas com queijo derretido, mas prepará-lo como como manda o figurino requer atenção para alguns detalhes, começando pela escolha do pão, que deve ser de boa textura, mas não demasiadamente denso. Como no misto-quente e no bauru, a opção natural tende a ser o pão de forma, mas o italiano, a baguete, a ciabatta e o brioche deixam esse sanduba ainda mais gostoso. 

 

Igualmente importante é combinar dois ou três tipos de queijo com aromas, texturas e sabores diferentes. Requeijão de corte, meia-cura ou muçarela de búfala, por exemplo, combinam com queijos mais densos, como o parmesão. Falando nisso, o grana padano e o parmigiano reggiano eram considerados "pinga da mesma pipa" até meados do século passado, quando então foram reconhecidos como produtos diferentes. A exemplo do champanhe, que só pode ser considerados como tal quando é produzido na região homônima da França, o parmigiano "legítimo" é feito em Parma e em Reggio Emilia, e o grana, na Planície Padana (na Itália). 

 

Ambos os produtos são feitos com leite cru de vaca, sal e coalho, têm textura firme e cor de palha (resultante do alto teor de gordura). Mas uma enzima (lisozima) adicionada à massa do parma controla a proliferação de bactérias durante o processo de maturação, tornando-a mais macia, granulosa e adocicada que a massa do parmigiano. Outra diferença é a dieta das vacas que fornecem o leite: no caso do parmigiano, elas se alimentam apenas de pasto fresco ou feno; no do grana, o uso de silagem (alimento produzido através da fermentação de plantas como milho, sorgo, capim ou alfafa) é admitido. Além disso, o processo de maturação — responsável pela textura firme e pelo sabor levemente picante desses queijos — é de 12 a 30 meses para o parmigiano e de 9 a 20 para o grana.  

 

A carga tributária brasileira é uma das mais altas do mundo. Nesta banânia, os "contribuintes" trabalham mais de 5 meses por ano para pagar impostos. Como disse certa vez o economista Delfin Netto, nosso país virou uma INGANA, com impostos da Inglaterra e serviços públicos de Gana. Isso explica por que paga-se caríssimo por praticamente tudo, e mais caro ainda por produtos importados. Em 2012, pelo preço cobrado no Brasil por um Jeep Grand Cherokee era possível comprar três deles em Miami — despautério que foi motivo de chacota na FORBES, em outubro de 2012). Aqui, o preço do iPhone 14 parte de R$ 7,6 mil; nos EUA, o mesmo aparelho custa US$ 799 (menos de R$ 4 mil). 

 

Há bons queijos "tipo parmesão" produzidos no Brasil (e muita porcaria também). O Faixa Azul — fabricado pela empresa Vigor, que faz parte do grupo mexicano Lala — e o La Sereníssima — do grupo argentino Mastellone — são os meus preferidos.  Já os queijos ralados "tipo parmesão" — aqueles vendidos em saquinhos de 40, 50 e 100 gramas — são obtidos através do esfarelamento da massa de até quatro variedades de queijos de baixa umidade, e nem sempre possuem os 75% da variedade parmesão que lhes dá direito a essa denominação. 

 

Observação: De acordo com a mestre queijeira Martina Sgarbi, os queijos só são ralados na indústria quando algum problema a peça de ser aproveitada para venda. E a maioria costuma ser seca demais, salgada demais, ter cheiro de ovo e gosto de farinha ou de ranço. 

 

Concluída esta (não tão breve) introdução, passemos à receita:

 

1 — Corte duas fatias de pão com cerca de 1,5 cm de espessura e passe manteiga (não margarina) dos dois lados para formar uma crosta crocante e dourada.

2 — Misture cerca de 150 g de três queijos, sendo um mais fresco e dois que derretam bem, mas com sabores e textura diferentes. 

3 — Aqueça em fogo médio uma frigideira de ferro pesada e já curada (na falta dela, use uma de inox com fundo triplo, quem também transmite o calor de forma uniforme), doure as fatias de pão por cerca de 30 segundos, vire com uma espátula, espalhe o recheio sobre um dos lados e tempere com sal e pimenta-do-reino.

4 — Cubra com a outra fatia de pão (com o lado dourado em contato com o queijo) e, pressionando de vez em quando com a espátula (de modo a "achatar" o sanduíche), deixe dourar por 2 a 3 minutos ou até que as bordas fiquem crocantes.

5 — Vire o sanduíche e deixe dourar por mais 2 a 3 minutos do outro lado, também pressionando algumas vezes com a espátula. Quando as bordas desse lado estiverem crocantes, transfira o lanche para o prato de servir e, se quiser, corte-o ao meio (para facilitar as mordidas).

 

O sanduíche deve ser comido assim que sair da frigideira. Se você não conseguir parar no primeiro (o que é bem provável), repita o processo para preparar o segunda, de modo a comê-lo bem quentinho.

domingo, 19 de junho de 2022

SAL DE FRUTAS A GENTE VÊ DEPOIS

 


A decadência da ditadura militar propiciou o ressurgimento da democracia no Brasil, culminado com a promulgação da Constituição de 1988. A volta das eleições diretas para o Planalto com atuação expressa da Justiça Eleitoral ocorreu no ano seguinte, e contou com 82.074.718 eleitores aptos a votar. Fernando Collor, o caçador de marajás de araque, recebeu 35.089.998 votos e foi o primeiro chefe do Executivo Federal eleito diretamente desde 1960. Em 1994, o povo voltou às urnas e elegeu Fernando Henrique, que obteve 34.377.829 votos e foi reconduzido ao cargo em 1988, com 35.936.916 votos. 


A primeira eleição presidencial totalmente informatizada desde a criação da urna eletrônica — que foi implantada progressivamente em todo o país a partir de 1996 — ocorreu há exatos 20 anos e culminou na vitória de Lula, com 52.793.364 votos. Quatro anos depois, o demiurgo de Garanhuns foi reeleito com 58.295.042 votos; em 2010, sua pupila, a inolvidável nefelibata da mandioca, recebeu 55.752.529 votos e se tornou a primeira presidenta desta banânia. 


Mediante o maior estelionato eleitoral da história (até então, porque seria superado em 2018), Dilma, a inolvidável, se reelegeu em 2014, mas foi afastada em maio de 2016 e penabundada dali a três meses, quando então Michel Temer, o vampiro do Jaburu, se aboletou no trono. Dois anos mais tarde, Jair Bolsonaro, o Messias que não miracula, foi eleito com 57.797.847 dos votos válidos. 


Assim que subiu a rampa e vestiu a faixa, o "mito" dos descerebrados enrolou as bandeiras de campanhaenfiou-as onde o sol não bate e deu continuidade à demolição da economia que a bruxa má iniciou e o impeachment a impediu de concluir. Agora, faltando 100 dias para as eleições gerais, uma dezena de aberrações ameaça disputar a Presidência (lembrando que a data limite para a oficialização das candidaturas é o dia 5 de agosto, e que até lá muita coisa pode mudar). 


Para além da parelha que encabeça todas as pesquisas de intenção de voto, integram o indigesto cardápio os arrozes de festa Ciro Gomes (que caminha para a quarta derrota) e José Maria Eymael (que comemorará seu sexto fiasco). Apesar da oratória invejável, o cearense de Pindamonhangaba é visto como mero satélite do PT, e quem escuta seu jingle de campanha tem a impressão de que ele é candidato à prefeitura de Itapipoca. 

 

Entre os itens mais vomitativos (mas menos que o ex-presidente ex-presidiário e o lunático que prometeu acabar com a reeleição e jamais desceu do palanque) destaca-se o maquiavélico Luciano Bivar, mentor intelectual da “descandidatura” de Sergio Moro. André Janones e Felipe D’Ávila são ilustres desconhecidos, e de Vera Lucia, Leonardo Péricles, Pablo Marçal e Sofia Manzano, a maioria de nós mal ouviu falar. O folclórico Cabo Daciolo ameaçou repetir o fiasco de 2018, mas resolveu apoiar Ciro Gomes e voltou para o alto de sua montanha encantada. Glória a Deus! 


As pré-candidaturas de Alessandro Vieira e Rodrigo Pacheco não passaram de balões de ensaio. João Doria era uma iguaria que não faríamos mal em experimentar, mas foi retirado do cardápio por não ornar com o paladar sofrível do eleitorado. Moro chegou a figurar como “prato do dia”, mas foi “desapoiado” pelo Podemos e traído pelo União Brasil. Já as idas e vindas de José Luiz Datena são folclóricas.


Em 2018, o apresentador chegou a se licenciar do Brasil Urgente e lançar-se pré-candidato ao Senado, mas desistiu. Em 2020, chegou a ser cotado para vice na chapa de Bruno Covas, mas desistiu. No ano passado, recém-filiado ao PSL, exsudou determinação: “Dessa vez é pra valer!” Semanas atrás, embora tivesse dito que só lhe interessa a Presidência, o monumento à incoerência — que declarou que não votou em ninguém depois de Lula, que não é responsável “por boa parte do Brasil que está aí”, e  “apoiei o Bolsonaro é o cacete” — anunciou que disputará o Senado. E com o apoio de Bolsonaro. No último sábado (4), no intervalo de duas horas, Datena anunciou sua desistência, voltou atrás e disse que desistiu de desistir. 

 

Ninguém merece um sujeito desses no Planalto — nem mesmo o sapientíssimo eleitorado tupiniquim. Por outro lado, considerando que por lá passaram Collor, FHC, Lula, Dilma, Temer e Bolsonaro... Isso me lembra a anedota do pinguço que enchia a cara e ficava torrando a paciência do dono bar. Um belo dia, cansado de ouvir o manguaceiro pedir “a saideira”, o portuga lhe serviu um cálice de urina. O pinguço bebeu, mas nem assim foi embora. “Mais alguma coisa?”, rosnou o botequineiro. E o bêbado respondeu: “Já que você me serviu um copo de mijo, que tal um sanduíche de merda para acompanhar?” 

 

Torçamos pela senadora Simone Tebet. Talvez ela não seja a candidata de nossos sonhos, mas é tudo que nos resta. O sal de frutas, a gente vê depois.

 

Triste Brasil.

quinta-feira, 2 de junho de 2022

O BRASIL JOGA CONTRA O BRASIL

 


Bastou Bolsonaro aventar que só participará de debates no segundo round para Lula dizer que também não irá. Segundo o petista, não faz sentido ele “servir de escada” para candidatos que ostentam percentuais abaixo dos dois dígitos nas pesquisas. 

 

Parece aquele meloso “só vou se você for” de começo de namoro, mas é a prova provada da interdependência de nhô-ruim e nhô-pior, como evidenciam as projeções de vitória no segundo turno quando um dos componentes da fórmula Lula x Bolsonaro é substituído por outro candidato.

 

Em 2018, Bolsonaro participou de dois debates antes de ser esfaqueado por um napoleão de hospício (daqueles que não comem merda nem rasgam dinheiro). Na Band, ficou nervoso quando Guilherme Boulos quis saber por que ele embolsava o dinheiro do auxílio moradia em Brasília. Na Rede TV!, foi espinafrado por Marina Silva por ter ensinado uma criança de colo a fazer o sinal de arminha. Convalescente, usou a facada como salvo-conduto para fugir dos debates, embora não se furtasse a dar entrevistas à imprensa, gravar programas eleitorais e participar de eventos com apoiadores. E reconheceu que agiu de caso pensado: “Tudo na política é estratégia”. 

 

Se eu for [aos debates], os dez candidatos vão querer dar pancada em mim. E não vou ter tempo de responder”, ponderou o ex-capitão durante a entrevista que foi ao ar no último dia 31. “Acho que debate teria que ser com perguntas pré-acertadas antes com os encarregados de fazer o debate, até pra não baixar o nível.” 

 

Numa campanha séria, os candidatos são confrontados com assuntos incômodos e precisam se virar sem a cola do teleprompter. O que Bolsonaro propõe é outra coisa: transformar um gênero jornalístico em peça de propaganda. É como se desejasse substituir o debate pelo deboche de um jogo de cartas marcadas.

 

A tática de fugir da raia não é nova. Collor (1989), Fernando Henrique (1998) e Lula (2006) também se recusaram a encarar os adversários no primeiro turno, mas todos lideravam as pesquisas, e Bolsonaro aparece atrás do petista em todas elas. A razão de sua recusa é simples: num debate de verdade, ele precisaria dar explicações sobre a inflação galopante, os rolos dos filhos e a demora a comprar vacinas. Mas ele prefere frequentar ambientes onde não corre o risco de ser questionado. No bate-papo com Ratinho, que já atuou como garoto-propaganda de seu governo, mentiu à vontade sobre a urna eletrônica, as queimadas na Amazônia e as críticas da classe artística.

 

Ciro Gomes não deixou por menos. Em vídeo publicado em seu canal no YouTube, o terceiro colocado nas pesquisas afirmou que a ausência de Lula e Bolsonaro nos debates é uma “covardia inominável”. “Será, Lula, que você vai mostrar ao Brasil que é igualzinho ao Bolsonaro? Por favor, não traia a democracia, não traia os valores que você tanto defendeu quando queria”, afirmou o cearense de Pindamonhangaba. E complementou: “Quando você estava na cadeia em 2018, você entrou na Justiça para a Justiça lhe permitir da cadeia participar do debate, e agora que você está livre […] você não vai?”.

 

As eleições gerais deste ano consumirão R$ 5 bilhões em verbas públicas. Entre todas as disputas, a que mais costuma interessar ao eleitorado é a presidencial. Confirmando-se o esvaziamento dos debates, o pleito ganhará instantaneamente uma aparência de estelionato.

 

Este país só se tornará minimamente sério quando o povo se conscientizar que políticos devem ser cobrados, não endeusados. Quem viver, verá.

terça-feira, 31 de maio de 2022

A VOLTA DA FÊNIX MITOLÓGICA — MAS PODEM CHAMAR DE TERCEIRA VIA


Contam-se nos dedos os países desenvolvidos em que pessoas perdem suas vidas em decorrência de chuvas. Por aqui, só neste ano houve tragédias dessa natureza na Bahia, no Rio e em Pernambuco. Coisa de terceiro mundo? Não. De quinto. Dito isso, passo ao assunto do dia.

O saudoso maestro Antonio Carlos Brasileiro de Almeida Jobim, brasileiro até no nome, sabia das coisas. Atribui-se a ele a máxima segundo a qual o Brasil não é para principiantes. Prova disso é que, a menos de cinco meses do pleito presidencial, temos de um lado o ex-presidiário fantasiado de “ex-corrupto”, que quer voltar à cena do crime, e do outro um presidente investigado em seis inquéritos e alvo de quase 150 pedidos de impeachment, que move mundos e fundos (sobretudo fundos) para continuar na cena... digo, no cargo.

Por mal de nossos pecados, um desses pesadelos poderá se tornar realidade. Até porque, como bem disse Pelé, e Figueiredo depois dele, o brasileiro não está preparado para votar. Aliás, esta banânia só teria alguma chance de dar certo quando e se o povinho de merda que Deus colocou aqui compreendesse que políticos não devem ser endeusados, mas cobrados e trocados regularmente. 

Apesar de divergirem no percentual de preferência do eleitorado, todas as pesquisas apontam Lula e Bolsonaro como prováveis adversários no segundo turno. Algumas não descartam sequer a possibilidade de o petralha liquidar a fatura no dia 3 de outubro. 

Não sei até que ponto pesquisas feitas com tanta antecedência são confiáveis, mas acho que elas prestam um desserviço ao país ao estimularem ainda mais a polarização. Por outro lado, é nítido que o "esclarecidíssimo" eleitorado canarinho apagou da memória a roubalheira havida nos 13 anos e fumaça de gestões lulopetistas e a tragédia que se tornou o país sob o "mito" dos bolsomínions. Para piorar, nhô ruim e nhô pior vomitam falácias eleitoreiras em palanques antecipados sem que a pusilânime Justiça Eleitoral dê um pio. Mas nenhum dos dois apresenta um projeto de governo como manda o figurino. 

Observação: Desde o início do ano, o TSE recebeu 17 ações que apontam propaganda eleitoral antecipada na disputa presidencial, na disputa presidência, sendo 12 contra a campanha de Bolsonaro e 5 contra a de Lula, mas até o momento não houve qualquer punição efetiva.

Bolsonaro continua fazendo o que sempre fez desde o instante em que subiu a rampa do Palácio do Planalto: tudo, menos governar o país. Lula, recém conduzido ao tabuleiro da sucessão por uma suprema conspirata, quer reescrever a história distorcendo os fatos, a começar pela “inocência”que o STF não reconheceu. 

A decisão tomada por 8 a 3 pelas togas anulou os processos do tríplex, do sítio e outros dois envolvendo o Instituto Lula, mas não absolveu o camelô de empreiteiro, que percorre a conjuntura na esdrúxula condição de “ex-corrupto”, apesar de sua culpabilidade ter sido reconhecida em três instâncias no caso do tríplex do Guarujá (cuja sentença transitou em julgado) e duas no caso sítio de Atibaia.

A mítica terceira via — que já começava a duvidar da própria existência — ressurgiu timidamente depois que Sergio Moro e João Doria foram elididos da disputa. A bola da vez é a senadora Simone Tebet, já que Ciro Gomes encanta com sua grandiloquência, mas afugenta o eleitorado com a postura beligerante que já lhe garantiu três derrotas em três disputas presidenciais. A menos que o imprevisto tenha voto decisivo na assembleia dos acontecimentos, o cearense de Pindamonhangaba (SP) morrerá na praia pela quarta vez.

Embora ainda precise confirmar a consolidação da terceira via, crescer nas pesquisas e driblar eventuais traições dentro do próprio partido, Simone teve a pré-candidatura referendada por emedebistas dos principais estados do país. Mas nem Doria nem o senador Tasso Jereissati se empolgaram com a ideia de disputar a vice-presidência na chapa encabeçada por ela. Já Eduardo Leite — que foi derrotado nas conturbadas prévias tucanas — aceita ser coadjuvante. O problema é que a ala tucana liderada pelo deputado Aécio Neves entende que o PSDB deve encabeçar a chapa. Afinal, por que simplificar quando se pode complicar?

O senso comum recomenda não contar com o ovo na cloaca da galinha, mas a pesquisa Ipespe divulgada na última sexta-feira mostrou que o potencial de voto em Simone Tebet aumentou 11% em uma semana. Ele agora é de 28%. Além dos 5% que disseram ao instituto que votariam nela com certeza, há outros 23% que poderiam votar. Há sete dias, os números eram 3% e 14%. 

terça-feira, 24 de maio de 2022

É ASSIM QUE A POLÍTICA É FEITA NO BRASIL


Com a escalada do discurso de Bolsonaro contra as instituições e a volta dos ataques às urnas eletrônicas, o presidente da Câmara, Arthur Lira, ouviu de quatro ministros do STF apelos para que suba o tom contra e marque posição clara contra qualquer discurso golpista ou teoria conspiratória envolvendo as eleições. A mensagem foi clara: por ter como atribuição dar andamento a eventuais processos de impeachment contra o mandatário, Lira teria autoridade política para frear sua verborragia e baixar a temperatura da retórica que emula as Forças Armadas como garantidoras do pleito.

Os magistrados disseram ao deputado que a Corte teve papel crucial na articulação política para que o Congresso rejeitasse o voto impresso, negociando diretamente com partidos para que colocassem parlamentares mais ponderados na discussão do tema, e afirmaram que, diante da insistência de Bolsonaro de tentar colocar em xeque o TSE, o presidente da Câmara precisa se posicionar com mais veemência contra cada insinuação contra o sistema eleitoral e a democracia.

Na terça-feira 10, em um evento com investidores nos Estados Unidos, Lira defendeu as urnas eletrônicas e o sistema eleitoral brasileiro. “Eu fui eleito nesse sistema durante seis eleições e não posso dizer que esse sistema não funciona. O sistema é confiável (...) É importante que tenhamos tranquilidade política no pleito, e nós haveremos de ter. O povo vai escolher, sem o eufemismo de dizer que aquela urna presta, que aquela urna não presta”, declarou. A fala foi interpretada no STF como uma resposta aos apelos dos ministros feitos dias antes.

Ninguém diz a um mandatário o que ele não quer ouvir. Foi sempre assim, desde que o homem é homem, e no passado pior, porque resultava em morte. No caso de Bolsonaro, os que o cercam mais de perto sabem que morte significa exclusão imediata do seu convívio e, no limite que ele, se necessário, ultrapassa sem pestanejar, demissão. Dizem que ele chorou ao demitir o ministro das Minas e Energia.

Bolsonaro é bom de choro quando quer. É um ator com razoável talento. Ensinaram-lhe um dia que lágrimas comovem e que o sorriso torna qualquer pessoa mais simpática. Para não banalizar o gesto, ele não chora sempre, mas sorri com ou sem motivo. O general Luiz Eduardo Ramos, ministro da Secretaria do Governo, prefere humilhar-se a ser humilhado pelo ex-capitão afastado do Exército por má conduta. Por duas vezes, pelo menos, para fazer graça ou agradar ao chefe, já se ajoelhou diante dele.

Os mais diretamente envolvidos com a campanha para reeleger Bolsonaro dão de barato que ele conhece as dificuldades que enfrenta e sentem-se dispensados de alertá-los para erros que tem cometido. Quando o fazem são excessivamente cuidadosos. Sem um candidato da terceira via, eles trabalham com a hipótese de que a eleição será decidida no primeiro turno. Porém, se pensam que Lula é o favorito, dizem a Bolsonaro que o favorito é ele e vão para o abraço.

A julgar pelas pesquisas, o molusco deverá chegar às vésperas das eleições na condição de favorito. Há quem diga que vencerá com 171% dos votos válidos; outros, que já está se preparando para reeditar o Mensalão, o Petrolão, e assim voltar a ser o parteiro do Brasil Maravilha, o Pai dos Pobres e Mãe dos Ricos, o enviado pela Divina Providência para acabar com a fome, presentear a imensidão de desvalidos com três refeições por dia e multiplicar a fortuna dos milionários, o Redentor dos Miseráveis, o gênio da raça que proclamou a Segunda Independência ao reinventar a Petrobras e descobrir o pré-sal, o maior dos governantes desde Tomé de Souza, o campeão de popularidade e senhor das urnas capaz de eleger qualquer poste para qualquer cargo. E tem quem acredita.

Ciro Gomes não admite sair do páreo mesmo que se convença de que irá perder, mas seus eleitores poderão abandoná-lo antes do fim, para não desperdiçar o voto. E a maioria de seus eleitores votaria em Lula sem pestanejar, mesmo que Ciro já tenha dito horrores do petralha. No último dia 14, o cearense de Pindamonhangaba disse à Jovem Pan que “Lula pediu o impeachment do Fernando Henrique, do Itamar Franco… O único político para quem ele não pediu impeachment foi o Bolsonaro. Estávamos todos na rua pedindo o impeachment do Bolsonaro. O Lula não pisou lá e mandou os jagunços dele me agredirem fisicamente”.

Para o pedetista, Lula não abre mão de ter Bolsonaro no pleito porque só assim teria chance de voltar ao Palácio do Planalto, e que o contrário também acontece, ou seja, a reeleição só se torna viável porque boa parte dos eleitores temem a volta dos petralhas ao poder. “Só vamos derrotar o Bolsonaro se entendermos por que ele foi eleito. Alguma dúvida que a razão foi o lulopetismo?”, questionou.Bolsonaro foi eleito por conta da mágoa extensa da maior crise econômica da história brasileira — que foi produzida pelo Lula e pelo PT. Os números mostram isso. O que explica a resiliência e a competitividade perigosa que o Bolsonaro ainda se apresenta é o lulopetismo. É o Lula destruindo o debate, repetindo os mesmos conchavos.”

Um dos conchavos seria a articulação do molusco para minar a pré-candidatura de Simone Tebet e conseguir o apoio do MDB. Caciques do partido no Nordeste, entre os quais Renan Calheiros, defendem que a sigla apoie o PT já no primeiro turno. Ciro lembra que os políticos agora cortejados por Lula encabeçaram a articulação pelo impeachment de Dilma em 2016. “Quando enfrentamos o golpe (sic) praticado pelo Senado Federal, quem presidiu o Senado e votou pelo impeachment da Dilma? Renan Calheiros. Quem presidia o Senado em seguida, por acordo e apoio do PT? Eunício Oliveira. Com quem o Lula estava agarrado no primeiro dia? Com eles”, destacou. Em live com o Instituto Conhecimento Liberta na última quinta-feira, 12, o ex-governador do Ceará disse que o ex-presidente é um “politiqueiro esclerosado” e que “vendeu sua alma para o sistema”. E o pior é que ele tem razão.

A (patética) união com Alckmin também vem recebendo seguidos golpes do populista cearense, a despeito de ele já ter feito diversos elogios públicos ao conterrâneo — ambos nasceram em Pindamonhangaba, no interior de São Paulo. Na sexta-feira, 13, Ciro deixou fixado no topo de sua conta no Twitter um vídeo em que o ativista político Thiago Torres explica por que rejeita a aliança entre o petista e o ex-tucano. “Para mim, ele [Alckmin] é igual Bolsonaro. A periferia conheceu o fascismo na figura desses caras [do PSDB]. Durante toda minha [de Torres] adolescência o Alckmin era governador. Faltou comida na minha escola. Cuidado Lula, cuidado PT. Tem um grito engasgado na garganta dos mais pobres de São Paulo”.

A virulência do terceiro colocado nas pesquisas chamou a atenção de bolsonaristas, que passaram a compartilhar seus vídeos e posts. Petistas o acusam de ser “linha auxiliar” de Bolsonaro, enquanto os pedetistas comemoram a penetração do político de centro-esquerda fora de seu tradicional núcleo de apoio. Já Lula não rebateu nenhum dos ataques. O PT avalia que ele só tem a perder se contra-atacar o antigo aliado.

Ciro acha que, se renunciasse a ser candidato desde já, o maior beneficiado seria Bolsonaro. Segundo ele, Lula bateu no teto, e Bolsonaro sobe lenta, mas consistentemente. Ele acredita nas próprias chances de crescer até agosto, e diz que vai em frente. Se o quadro atual permanecer mais ou menos igual, e se Ciro não decolar nas pesquisas, dependerá dele e dos seus eleitores uma solução mais rápida para despachar Bolsonaro.

E o povo? E o Brasil? Fodam-se. É assim que se faz política nesta banânia.

domingo, 22 de maio de 2022

O PENÚLTIMO GOLPE FINAL



Nova pesquisa Ipespe/XP sinaliza que a corrida presidencial está refém da disputa ideológica ‘direita versus esquerda’ — um ranço da Revolução Francesa que já deveria ter sido varrido do cenário político, mas enfim...

Sobre Lula, 65% o veem como alguém de esquerda, 6% como de centro-esquerda, 1% como de centro, 1% como de centro-direita e 7% como de direita; 20% não souberam ou não responderam. Em relação a Bolsonaro, 63% o consideram de direita, 4% de centro-direita, 3% de centro, 1% de centro-esquerda e 8% de esquerda; 21% não souberam ou não responderam.

Não sei se você acredita nessas pesquisas. Eu tenho cá minas reservas. Mas isso não muda o fato de que o Brasil caminha para as eleições mais figadais desde 1989, nem de que o clima eleitoral, que sempre foi marcado pela esperança da mudança ou da continuidade democrática, tornou-se um ambiente contaminado pelo temor de que o livre debate das ideias seja sufocado pela força.

Em 2018, a necessidade de impedir a volta do criminoso à cena do crime (parafraseando o atual candidato a vice na chapa do dito-cujo) levou-nos a eleger um sociopata que jamais disfarçou seu pendor golpista. Um mau militar que ingressou na política com votos de militares e passou 28 anos na Câmara como símbolo do extremismo de direita. Um parlamentar medíocre que, no terceiro mandato, pregou o fechamento do Congresso e o fuzilamento do então presidente Fernando Henrique. Um subversivo que, questionado sobre o que faria se chegasse ao Planalto, respondeu de bate-pronto: “Daria golpe no mesmo dia”. Um despirocado que, na mesma entrevista, disse que o Brasil precisava de uma guerra civil, mesmo que isso provocasse a morte de inocentes, e, ato contínuo, escancarou seu desprezo pelas eleições: “Através do voto, você não vai mudar absolutamente nada neste país”.

A renovação promovida em 2018 foi, na maioria dos casos, desastrosa. Ao longo da campanha, Bolsonaro falou em fuzilar adversários políticos, disse que as minorias teriam que se curvar às maiorias, renovou ameaças ao Judiciário e à imprensa, prometeu “uma limpeza nunca vista”. Mas a rejeição ao lulopetismo corrupto falou mais alto, dando aso à vitória de um inimigo da democracia que se valeu dela para chegar ao poder. Numa trapaça história, o ex-capitão — que foi eleito com 57 milhões de votos e amplo apoio da elite econômica — pôs em marcha o plano anunciado em 1999 tão logo subiu a rampa. Não deu o golpe “no mesmo dia”, mas vem trabalhando diuturnamente para viabilizá-lo.

O ataque ao que foi chamado de velha política produziu uma onda extremista que adentrou às instituições moldadas pela Constituição de 1988 e envenenou o Estado Democrático de Direito, contra o qual os ataques passaram de exageros retóricos para a práticas antirrepublicanas, enquanto as sucessivas ameaças ao processo eleitoral põem em risco as eleições de outubro (algo que seria inimaginável cinco anos atrás). 

Depois de encenar mais um falso recuo, Bolsonaro fez um chamado à sublevação armada. Diante de uma possível derrota nas urnas, ele vê na ruptura institucional sua única alternativa para se manter no poder — e não hesitará em romper com a institucionalidade, como deixou claro nos discursos de Sete de Setembro e com o indulto a Daniel Silveira. Prova disso é ele elevar a cada dia o tom das ameaças. Nas últimas semanas, sua ofensiva ganhou apoio explícito de porta-vozes da caserna — o ministro da Defesa fez novas provocações ao TSE, e o comandante da Marinha endossou o discurso de questionamento das urnas. 

Ciro Gomes avisou está em curso um golpe contra a democracia. Se não forem tomadas providências já, chegaremos a um ponto sem retorno, advertiu o cearense de Pindamonhangaba. Nada muito diferente do que eu venho dizendo desde os primeiros arroubos autoritários do mandatário de fancaria. 

O golpe de Bolsonaro já começou. Se a democracia brasileira sucumbir, não será por falta de aviso.

quinta-feira, 5 de maio de 2022

SOBRE CAUSAS E CONSEQUÊNCIAS


Reza o bom senso que primeiro é preciso resolver o problema e depois apurar as responsabilidades. No entanto, quando a péssima qualidade dos postulantes à Presidência se soma à péssima qualidade do eleitorado, como acontece no Brasil, só resta rezar, já que o responsável por esse descalabro foi o próprio Criador.

Nossa primeira eleição presidencial aconteceu em 1891, mas de forma indireta. Três anos depois, o povo foi às urnas pela primeira vez e elegeu Prudente de Morais, pondo fim à República da Espada (um resumo do que aconteceu a partir de então pode ser lido nesta postagem e nas seguintes). O próximo pleito presidencial deve acontecer daqui a 5 meses. “Deve”, porque com Bolsonaro nada é impossível (noves fora um bom governo). 


Não fossem as peculiaridades mencionadas no primeiro parágrafo, o eleitorado teria chances reais de pôr fim esse infortúnio. E se Deus fosse ainda fosse o mesmo Deus do Velho Testamento, Ele certamente daria uma mãozinha, fulminando as candidaturas dos postulantes mais bem colocados nas pesquisas (ou os próprios candidatos, melhor ainda).

 

Observação: Segundo o Estadão, pesquisas internas da campanha de Lula mostram que Bolsonaro ganhou mais pontos entre os evangélicos, conquistando eleitores até então indecisos nesse segmento. Deve ter sido por isso que o petralha vem mencionando Deus em seus discursos. Um lulista disse para o jornal: “Lula acordou católico. Ou crente”.

 

No mundo real, o imprevisto sempre pode ter voto decisivo na assembleia dos acontecimentos (aliás, há que diga que “as coincidências nada mais são do que Deus agindo nos bastidores). 


Em 1961, a renúncia de Jânio Quadros deu azo ao golpe de 1964, que resultou em 21 anos de ditadura militar. Em 1985, a morte de Tancredo Neves mudou os rumos da Nova República. Em 2014, a morte de Eduardo Campos mudou os rumos da eleição presidencial. Em 2017, a morte de Teori Zavascki pavimentou o caminho o sepultamento em vida da Lava-Jato. 


Em 2018, a aversão ao lulopetismo corrupto resultou na vitória do pior mandatário desta banânia desde Thomé de Souza, e agora (valei-nos Deus!), ao que tudo indica, teremos um repeteco, mas com Lula disputando pessoalmente o butim e a rejeição ao bolsonarismo boçal ombreando com o repúdio ao lulopetismo corrupto.

 

Da quimérica terceira via, restaram João Dória e Simone Tebet — ela descarta a possibilidade de ser vice na chapa dele; ele não descarta nada, nem ser vice numa eventual chapa encabeçada por ela. No UB, o caviloso lançamento do nome de Luciano Bivar foi uma conspirata para sepultar a candidatura de Sergio Moro do páreo (e já tem gente falando em ressurreição). Segundo dados do Paraná Pesquisas, Dória superou Ciro Gomes (o cearense de Pindamonhangaba seria uma alternativa à polarização se ele não fosse quem é). 


Enfim, enquanto esperamos Deus fulminar os sacripantas de turno (dada a quantidade desses imprestáveis, seria melhor Ele cercar Brasília reeditar o Dilúvio), vejamos o que disse Josias de Souza em seu comentário da última terça-feira.

 

O poder não aceita desaforos. Quem tem poder precisa exercê-lo na medida exata. Quem exorbita erra o alvo. Quem claudica vira o alvo. Desacatado por Daniel Silveira, o ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes apresentou ao deputado bolsonarista, com pelo menos 16 dias de atraso, a conta do escracho: R$ 405 mil.


Moraes mirou o bolso de Silveira num instante em que a protelação já havia se transformado num fator de desmoralização de sua toga. O deputado desligara o equipamento que deveria monitorá-lo desde 17 de abril. Era como se o réu tivesse instalado sua tornozeleira no magistrado. O escárnio começara antes, como anotou Moraes em seu despacho: ‘Desde a decisão que fixou a multa diária, proferida em 30 de março de 2022, o réu desrespeitou flagrantemente várias das medidas’.


Na véspera, Silveira dizia que o perdão que obtive de Bolsonaro o livrou de responder por todas as culpas. Embora o decreto da graça continue sub judice, o deputado continuou fazendo graça: ‘Presidente perdoou, acabou!’ O restabelecimento da ordem está condicionado ao pagamento da conta.


Moraes determinou ao Bacen o bloqueio de R$ 405 mil nas contas de Silveira. Mandou notificar o réu que preside a Câmara para que providencie o desconto da dívida no contracheque, na proporção de 25% do salário até a quitação. Resta agora ressuscitar o axioma segundo o qual ordem judicial se cumpre.” 

terça-feira, 3 de maio de 2022

AS VIÚVAS DA TERCEIRA VIA


No último Sete de Setembro não houve manifestações, mas arruaças capitaneadas por um presidente golpista. Grupelhos de esquerda protestaram aqui e ali, e meia dúzia de cidadãos que execram tanto Lula quanto Bolsonaro se reuniram cá e acolá. 

A pandemia contribuiu para a falta de adesão popular, mas o fiasco se deveu mesmo à conjuntura. A população, em sua maioria desalentada, não saiu às ruas porque está mais preocupada com o próprio sustento.

Manifestações populares no Brasil, depois dos atos pró-diretas, eclodiram em 2013 e se estenderam até 2016, resultando no impeachment de Dilma — que, graças maior estelionato eleitoral da história até então, derrotou Aécio Neves em 2014 e foi penabundada em 2016, sob panelaços e manifestações populares como manda o figurino. 


Faltando cinco meses para as eleições, as campanhas presidenciais (que começaram lá atrás, quando Bolsonaro subiu a rampa e Lula deixou a cadeia) ainda não se tornaram assunto de conversas de botequim. Se uma ou outra discussão acontece, isso se deve à nefasta polarização e aos esforços da mídia — que amplia e reverbera cada arroto do ex-ladrão e cada peido do sociopata de plantão.

 

No Dia do Trabalhador, a falta de público levou Lula a atrasar sua aparição. Bolsonaro, chamado à ordem pelo Centrão, participou virtualmente das “manifestações” na Avenida Paulista, onde um magote de bolsomínions exibia cartazes e faixas contra o Poder Judiciário e pedia o impeachment dos ministros Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso, entre gritos antidemocráticos em defesa da volta do AI-5 e do fechamento do Congresso e do STF. 


No vídeo — recheado de ataques velados ao Supremo —, o mandatário sociopata enalteceu seus apoiadores, falou em “liberdade”, afirmou ser o chefe de um governo que “acredita em Deus” e que “respeita os militares, defende a família e deve lealdade a seu povo” e voltou a dizer que “o bem sempre vence o mal”. 


Observação: Barroso disse que existe um limite para liberdade de expressão. Para demonstrar apoio ao Judiciário, o presidente do Senado e um grupo de parlamentares pretendem se encontrar nesta terça-feira com o presidente do STF. E lá vamos nós pagar pelo chá com bolachinhas. Enquanto suas excelências não unirem ação às palavras, o sociopata continuará assombrando o Brasil. O Ibovespa, que tinha subido 17% em 2022 até abril, já devolveu quase todo o ganho. A alta acumulada caiu para 2,6%. É verdade que teve a pandemia e a invasão da Ucrânia, mas há duas desgraças ainda maiores: uma se chama Jair Messias Bolsonaro e a outro, Luiz Inácio da Silva. Elidir essa parelha de abantesmas não resolveria todos os problemas do Brasil, mas ajudaria um bocado.
 

Diogo Mainardi escreveu em O Antagonista que o fiasco do ato lulista reflete o vazio de sua candidatura; que o Brasil se prepara para eleger um presidente que ninguém quer; que o petralha está saindo das planilhas da Odebrecht diretamente para o Palácio do Planalto (após breve escala numa cela VIP em Curitiba) apenas porque seu principal adversário é Bolsonaro — daí o PT fazer de tudo para manter o “mito” no poder até outubro, pois a vitória do partido depende mais da rejeição ao oponente do que do proselitismo de seu eterno presidente de honra. 


Recentemente, quando Lula voltou a ser Lula e a vomitar as velhas asnices de sempre, o resultado foi uma queda imediata nas pesquisas. José Dirceu chegou mesmo a dizer que atua nos bastidores porque, se aparecer, atrapalha — de certa maneira, isso vale também para Lula, que, quando aparece, atrapalha.

 

Bolsonaro afronta o STF para disfarçar as agruras que seu funesto governo impôs aos brasileiros — mais de 600 milhões de vítimas fatais da Covid, volta da inflação, dólar nas alturas, gasolina a preço de ouro e outras mazelas que o incompetente não foi capaz de evitar (ou pelo menos mitigar). 


O ato mais emblemático do bolsonarismo, no último domingo, não teve o "mito" como protagonista, mas sim o dublê de ex-cobrador de ônibus mandrião e ex-policial truculento (que sofreu dezenas de sanções disciplinares), ora travestido de deputado federal, que estava num palanque em Niterói, segurando uma placa de rua com seu nome, ao lado de um sujeito fantasiado como o Viking do Capitólio. 


Essa imagem representa o escárnio com o STF, o plano de macaquear o golpismo dos partidários de Donald Trump, a pobreza mental dessa gente e a alusão orgulhosa ao assassinato de Marielle Franco, que deve render uns votos nas zonas ocupadas por milicianos (para quem não se lembra, o deputado neandertal se tornou conhecido depois de quebrar uma placa em homenagem à vereadora assassinada). 

 

É esse tipo de imagem grotesca alimenta o bolsonarismo e, ao mesmo tempo, empurra o eleitorado desesperado em direção à armadilha lulista. Até porque terceira via é uma incógnita — não por não se saber quem será o “candidato único”, mas por não se saber se ela será produzirá um aborto ou um natimorto. 


Depois que o União Brasil conseguiu matar a candidatura Sergio Moro e desinventar a de Luciano Bivar (aquele que deu palanque a Bolsonaro em 2018 no PSL dos laranjais), a tão sonhada candidatura alternativa desliza melancolicamente do improvável para o patético. Já nem se sabe se haverá realmente o anúncio de qualquer coisa no próximo dia 18.

 

Se liberar geral, o UB favorecerá Bolsonaro e propiciará a repetição desse movimento com o Podemos — de onde Bivar arrancou Moro para jogar no vazio — e com o PSD de Gilberto Kassab — que apoia Lula, mas pode mudar de lado conforme a direção do vento. 


Com o que (ainda) resta da terceira via se resumindo a João Doria e Simone Tebet (ou Tebet e Doria, a depender de quem narra o jogo), a rede da polarização tende a apanhar peixes graúdos em meio ao eleitorado órfão. Ciro Gomes, sempre pronto a disputar a próxima derrota, aparece em terceiro lugar nas pesquisas (ah, as pesquisas!). Entre xingamentos e agressões a puxa-sacos de Bolsonaro, o cearense de Pindamonhangaba sonha em reduzir a distância intergalática que o separa do segundo colocado. Triste Brasil.   

 

Entrementes, no outro canto do tabuleiro político-ideológico, o ex-presidiário que encabeça as pesquisas comete atos falhos (defendendo o aborto, insinuando que policiais não são gente, e por afora) no afã de conquistar o apoio do PSB e da Rede, ampliar o de setores do MDB, do PSD e do União Brasil e transformar uma decisão — estapafúrdia e sem efeito prático — do Comitê de Direitos Humanos da ONU contra Moro e a Lava-Jato em troféu a ser exibido em seus palanques.

 

O que advirá desse furdunço — para além de uma possível guerra civil ou de um provável golpe de Estado — as viúvas da finada terceira via dirão. Chamem as carpideiras!