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terça-feira, 26 de novembro de 2024

ENTRE NINHOS DE PERIQUITOS E OVOS DE SERPENTE

UMA MENTIRA É SÓ UMA MENTIRA, DUAS SÃO DUAS MENTIRAS, MAIS DE TRÊS É CAMPANHA POLÍTICA.

O conto "Ninho de Periquitos" ilustra a coragem e as escolhas inevitáveis que a vida exige: ao apanhar dois periquitinhos para ao filho que completava 10 anos naquele dia, um sertanejo foi picado por uma urutu, matou a cobra com seu facão e amputou a própria mão para preservar a vida.

Naquele fim de mundo, socorro médico era uma miragem, e adiar a decisão, numa época em que se usavam sanguessugas para tratar enfermidades, era assinar o próprio atestado de óbito. 

 

Até pouco tempo atrás, o câncer era uma sentença de morte inapelável. Hoje, o diagnostico precoce aumenta exponencialmente as chances de cura. Costuma-se dizer que reconhecer a existência do problema é meio caminho andado, mas a solução só virá a reboque das medidas cabíveis. E essa lógica se aplica também ao contexto político. 

 

Em 2018, ao preferir a certeza do erro à possibilidade do acerto, a maioria irracional do eleitorado obrigou a minoria pensante a apoiar o "menos pior". Como a alternativa ao bonifrate do então presidiário mais famoso do Brasil era Jair Bolsonaro, o jeito foi tapar o nariz e votar no nhô-ruim para evitar a volta do nhô-pior. Claro que se podia esperar grandes coisas de um mau militar que trocou a caserna pela política para continuar pendurado no erário como parlamentar medíocre, mas tampouco se podia prever que o mandrião flibusteiro se tornaria o pior mandatário desde Tome de Souza. 

 

Não faltaram pedidos de impeachment (foram mais de 140) nem evidencias de crimes comuns que justificassem a abertura de inquéritos do STF. Mas Rodrigo Maia viu erros, mas não crimes nas 60 petições que arquivou, Arthur Lira reputou inúteis as demais e o antiprocurador-geral jogou na privada o relatório CPI da Covid e o que mais ameaçou a permanência do napoleão de hospício na Presidência. Em suma, o carcinoma foi diagnosticado, mas nem o Legislativo nem o Judiciário se dignaram de extirpá-lo antes que ele evoluísse para metástase. 

 

Bolsonaro sempre foi inimigo visceral das liberdades democráticas — tanto nos 15 anos de caserna quanto nos 28 de deputância —, mas seus arroubos antidemocráticos não eram levados a sério, nem mesmo quando ele defendia abertamente a censura e o fechamento do STF e do Congresso. A exemplo do escorpião da fábula, esse filhote da ditadura jamais foi capaz de agir contra a própria natureza. As "mudanças de comportamento" que ele encenou quando as circunstâncias o exigiram eram tão fictícias quanto a criação do mundo descrita no Gênesis. 

 

Segundo Charles Baudelaire, "o maior trunfo do diabo é nos convencer de que ele não existe". Tudo que Bolsonaro queria era se perpetuar no poder a qualquer custo. Se tivesse contido seu furor uterino e governado o país dentro das "quatro linhas" que ele tanto evocava, talvez Lula estivesse gozando férias compulsórias em Curitiba e ele, Bolsonaro, conquistado um segundo mandato de maneira legítima.

 

Seu inconformismo com o resultado das urnas ficou claro no silêncio conivente diante das manifestações de correligionários que pregavam a retomada do poder. Em vez de ordenar o desmonte dos acampamentos de radicalizados ansiosos por uma inexequível virada da maré, o aspirante a tiranete acalentou a ilusão dos que agora clamam por uma inconcebível anistia por se verem na contingência de ver o sol nascer quadrado. Mestre em tirar castanha com a mão do gato, emendou à autoclausura a fuga para Miami. Homiziado na cueca do Pateta, assistiu de camarote aos desdobramentos dos ataques terrorista de 8 de janeiro — ápice da trama golpista que vinha sendo costurada nos bastidores havia meses. 

 

Escorado no princípio da causalidade, o Conselheiro Acácio (personagem do romance O Primo Basílio, de Eça de Queiroz) ensinou que as consequências sempre vêm depois. Por tudo que fez, o falso messias que prometeu salvar o Brasil do lulopetismo corrupto se tornou um caso clássico de emenda pior que o soneto. Em abril, seus pernoites na embaixada da Hungria levaram apoiadores a temer sua prisão preventiva; quando Moraes não a decretou, o temor deu lugar à galhofa: "Xandão amarelou, virou xandinho [...] encarcerar Mauro Cid é uma coisa, e outra bem diferente é prender Bolsonaro sem uma sentença [...] o barulho seria grande no Congresso e nas ruas diante dessa covardia injustificável", mugiram os devotos do rebotalho da ditadura. 

 

Inelegível até 2030, proibido de deixar o país e alvo de três inquéritos que tramitam no STF — todos sob a relatoria de Moraes —, Bolsonaro segue livre, leve e solto. Mas não há nada como o tempo para passar: no último dia 19, a Operação Contragolpe prendeu quatro militares de alta patente e indiciou Braga Netto, Mauro Cid, o próprio Bolsonaro e outros 34 envolvidos na "suposta" tentativa de golpe. "Suposta" porque o que tem rabo de jacaré, couro de jacaré, boca de jacaré e dentes de jacaré sempre pode ser um coelhinho inofensivo. 

 

À luz da lógica e das trajetórias de alguns personagens, é difícil desconectar a trama posta em marcha logo após o resultado das eleições das atitudes e ligações do candidato derrotado, cujo vice na chapa anfitriou pelos menos uma reunião com os pretensos executores da eliminação LulaAlckmin e Moraes — segundo informações do ex-ajudante de ordens ora delator e de um caminhão de provas reunidas pela PF num relatório de 884 páginas. 

 

O direito ao delírio é livre, mas os deveres da realidade recomendam observar o andar da carruagem e incluir no radar uma mudança de planos. Na política, a fidelidade vai ao velório, mas assiste ao enterro no limite da beira da cova. Quem vive de votos sabe que eleições livres dependem de democracia plena, e que, em nome da própria sobrevivência, não convém associar-se a empreitadas liberticidas. Não tão depressa que pareça traição, mas nem tão devagar que denote conivência, a tendência é que o ferido seja deixado pelo caminho no ritmo do agravamento de sua situação.

 

O indiciamento de Bolsonaro por golpismo recebeu defesa morna de aliados — "para fingir que se importam", nas palavras de um de seus asseclas. No Xwitter, 23 dos 93 deputados federais do PL criticaram a PF nas 24 horas seguintes ao caso — alguns de forma genérica, sem sequer uma menção ao ex-presidente. No Instagram, outros 43 parlamentares da sigla também o apoiaram, mas sem grande ênfase. Um congressista do PL avalia que metade do grupo bolsonarista da sigla — estimado em dois terços dos parlamentares — está disposta a romper com o ex-presidente se surgir uma liderança forte para enfrentar o PT em 2026.

 

Segundo a Folha, a revelação do plano de assassinatos impactou mais o Congresso do que a divulgação dos 37 indiciados por golpismo. Boa parte dos nomes da lista já era esperada, mas não as evidências da trama para executar um presidente eleito, seu vice e um ministro da Suprema Corte. Avalia-se que a mera cogitação de usar aparato estatal para cometer assassinatos políticos é algo inimaginável, só encontrando paralelo nos anos de chumbo. 

 

Os 55 áudios aos quais o Fantástico teve acesso deram fornecem detalhes das ações golpistas e confirmam o protagonismo do general Mario Fernandes. que tinha um roteiro para deputados bolsonaristas usarem durante a CPMI do 8 de Janeiro. O documento de três páginas descreve estratégias para criar uma narrativa em relação aos movimentos do envolvidos. 


Em uma live no perfil do ex-ministro do Turismo, Bolsonaro ironizou as investigações. O general Braga Netto, igualmente denunciado por envolvimento no plano de execuções, afirmou que nunca se tratou de golpe, muito menos de assassinar alguém.

 

A esta altura, impõe-se uma reflexão: foi para isso que lutamos tanto pelas "Diretas Já"? É fato que, pior que nossos políticos, só mesmo um eleitorado que repete os erros a cada eleição, esperando um resultado diferente. 


Em 1989, ao quebrar um jejum de urna de 29 anos, a récua de muares guindou ao Planalto um falso caçador de marajás, que entrou para a história como o primeiro presidente eleito pelo povo na Nova República e o primeiro a sofrer um impeachment. 

Nas pegadas do pleito de 2002, o lulopetismo corrupto se instalou no Poder e reinou por 13 anos 4 meses e 11 dias. Em 2018, Lula, que então colecionava duas dúzias de ações criminais, foi recolhido à carceragem da PF, onde gozou férias compulsórias por míseros 580 dias. Em 2024, já "descondenado" e reabilitado politicamente, conquistou um inusitado terceiro mandato, pois era preciso defenestrar do Planalto o refugo da escória da humanidade. 

Passados dois anos da posse do macróbio petista, livramo-nos das turbulências militares — o que não é pouca coisa —, mas falta saber o que o STF fará com a quadrilha de golpistas que incluía um presidente e quatro ex-ministros, três dos quais com altas patentes militares. Considerando que nossa mais alta corte baixou o pano da Operação Lava-Jato, convém economizar expectativas.

 

Ao contrário do sertanejo que optou por amputar a própria mão para não perder a vida, Bolsonaro escolheu cavar mais fundo em busca do caminho que o eternizaria no poder, mas que, pavimentado por uma fieira de crimes que não para de crescer, deverá levá-lo a ver o sol nascer quadrado. E quanto antes isso acontecer, tanto melhor. 

sábado, 5 de outubro de 2024

A CAIXA DE PANDORA — O MITO E A REALIDADE (CONCLUSÃO)

LASCIATE OGNI SPERANZA VOI CHE ENTRATE

 

No Brasil, os chefes do Executivo federal, estadual e municipal são eleitos em dois turnos. Caso nenhum candidato obtenha mais de 50% dos votos válidos no primeiro turno, os eleitores voltam às urnas para escolher entre os dois mais votados. 

No primeiro turno, um eleitor que não vota no candidato com quem tem mais afinidade porque o dito-cujo está mal colocado pesquisas eleitorais é um idiota. Mas o que esperar de um eleitorado com Q.I. de ameba e lobotomizado pela polarização?

Pesquisas de intenções de voto devem ser vistas com reservasEm 2018, todas apontavam a vitória de Haddad e a eleição de Dilma para o Senado, mas Bolsonaro foi eleito e a mulher sapiens ficou em quarto lugar. Dias após o primeiro turno, eu cantei essa bola. Não por ser clarividente, mas porque o capetão obteve quase o dobro dos votos do bonifrate de Lula, e todos os candidatos à Presidência que chegaram ao segundo turno na dianteira até então acabaram sendo eleitos. 
 
Pandora abriu sua caixa uma vez, mas os brasileiros borrifam desgraças em si mesmos a cada dois anos. Em 2018, preferindo errar com convicção a tentar acertar, despacharam Bolsonaro e Haddad para o segundo turno, embora pudessem testar Geraldo Alckmin (ainda tucano), Henrique Meirelles, João Amoedo, ou mesmo Ciro Gomes (afinal, situações desesperadoras justificam medidas desesperadas). E deu no que deu. 

Em 2022, podendo dar uma chance a Simone Tebet, Felipe D'Ávila ou Ciro, a récua de muares votou a escolher a execrável "dupla de dois". Lula, já "descondenado", não precisou de preposto e se beneficiou da gestão desastrosa de seu antecessor. E deu no que está dando: enviado pela terceira vez ao Planalto, o petista levou na bagagem a corja mensaleira e petroleira que havia submergido no auge da Lava-Jato. A (indi)gestão em curso só não é pior que a anterior porque nada pode ser pior que o refugo da escória da humanidade. Mas o páreo é duro. 

Diz a sabedoria popular que cada povo tem o governo que merece. Sob Bolsonaro, o "centrão" transformou a ocupação do Orçamento num processo de bolsonarização das instituições. Lula escapou do mensalão, tropeçou no Petrolão e foi libertado da prisão, mas segue refém do Imperador da Câmara. Tanto nhô-ruim como nhô-pior são meros agentes transmissores de um mal maior. 
 
Comparado aos vexames que Bolsonaro fez o Brasil passar no exterior, um espirro que Lula desse no microfone da ONU soaria como um esguicho de bom senso. Foi assim na cerimônia de abertura no ano passado, mas as diferenças ficaram menos evidentes neste ano. 

De volta ao mesmo púlpito, com o dedo em riste e a voz roufenha, o Sun Tzu de fancaria discursou como discursa para os ignorantes que o endeusam. Falou sobre meio ambiente enquanto as queimadas estragavam o ambiente inteiro de seu discurso. Não repetiu o ridículo de seu antecessor, que culpava os indígenas, a imprensa e as ONGs pelo fogo, mas foi compelido a reconhecer que os incêndios na Amazônia dizimaram cinco milhões de hectares só no mês de agosto. 
 
Lula lamentou a falta de perspectiva de paz na Ucrânia e a crise humanitária em Gaza e na Cisjordânia, lastimou a expansão do conflito para o Líbano, avaliou que resposta de Israel ao Hamas tornou-se "punição coletiva para o povo palestino" e voltou a criticar o embargo econômico dos EUA a Cuba. Mas não deu um único pio sobre as violações aos direitos humanos na Venezuela do tirante-companheiro Nicolás Maduro.
 
Lamúrias não ornam com a pretensão de liderar o debate sobre a emergência climática, e um chefe de Estado que silencia sobre as atrocidades cometidas em um país vizinho não pode ser levado a sério quando palpita sobre perversões que enxerga na Europa, no Oriente Médio e na América do Norte. Antes de atuar como professor do mundo, Lula deveria extrair lições de suas próprias contradições.
 
A raiz da degeneração da nossa democracia é profunda. Apesar dos avanços obtidos com a redemocratização, o Brasil não progrediu graças aos governantes, mas apesar delesA conivência, mesmo dos menos desonestos, permitiu que a corrupção se disseminasse por todas as esferas do poder

A vida ensina que a primeira regra dos buracos é "quem cair dentro de um deve parar de cavar", mas o povo brasileiro, habituado ao precipício, prefere jogar mais terra por cima. Brecht ensinou que o pior analfabeto é o analfabeto político, que se orgulha de ignorar a política sem se dar conta de que da sua ignorância nasce o político vigarista, pilantra, corrupto e lacaio dos exploradores do povo, e Churchill, que a democracia é "a pior forma de governo afora todas as outras".

A lição do dramaturgo alemão fazia sentido na época em que ele caminhava entre os vivos; hoje, qualquer pessoa que tenha dois neurônios funcionais percebe que não precisa dos políticos para viver e que viveria melhor sem eles. Quanto ao ensinamento do estadista britânico, quem apoiou as Diretas Já, festejou a vitória Tancredo, lamentou sua morte e se decepcionou com a redemocratização  como é o caso deste que vos fala  endossa o que disseram Pelé e Figueiredo sobre misturar brasileiros com urnas em eleições presidenciais.

Numa democracia de respeito, eleger o chefe do Executivo pelo voto direto é a expressão suprema da soberania popular; num país como o nosso, onde o voto é obrigatório dos 18 aos 70 anos, falar em "festa da democracia" é gozação. Nossas eleições deveriam ser uma ação de cidadãos racionais e interessados, mas nosso eleitorado jamais se notabilizou pela capacidade cognitiva e incorporou a desinformação e a ignorância que norteiam desde sempre seu comportamento nas urnas. E vale tudo para se aproveitar dos mais despreparados e menos qualificados, até mesmo levar urnas aos confins da selva amazônica para que silvícolas que sequer falam português exerçam o "sagrado direito do voto". 
 
Às vésperas de completar 18 anos, minha prioridade era a carteira de habilitação; alistamento militar e título de eleitor, meros inconvenientes que vinham no pacote da maioridade. Votei pela primeira em 1978, quando os generais ainda ditavam as regras e os governadores e parte dos parlamentares eram "biônicos" (indicados pela alta cúpula militar). 
Em 1989, votei em Mario Covas no primeiro turno e em Collor no segundo, mas só porque a alternativa era Lula, e Lula não era uma alternativa. 

Muita coisa mudou desde então, incluindo a mentalidade dos adolescentes. Mas esse empenho dos políticos pela participação dos "eleitores facultativos" é eminentemente oportunista, sobretudo em tempos de polarização, quando se mais com o fígado do que com a razão.
 
Às vésperas das eleições municipais, os paulistanos estão novamente numa sinuca de bico. Votar em Tábata Amaral é escolher o mal menor – a despeito do que eu disse sobre "voto útil", Datena tem menos chances de se eleger do que eu de ser ungido papa. A deputada
 está longe de ser a candidata dos sonhos dos paulistanos minimamente esclarecidos, mas votar nos afilhados de Bolsonaro e de Lulaou no franco-provocador despirocado Pablo Marçal, é insanidade em estado bruto. 

Sempre se pode votar em branco ou anular o voto, mas eu acho melhor aproveitar o fim de semana para tomar um chopp à beira-mar e acompanhar a apuração pela TV. 

Observação: O voto em branco indica que o eleitor não se identifica com nenhum candidatos, mas não é considerado na contagem. Já o voto nulo é um protesto mais explícito  mas é mito que 50% + 1 votos nulos anulam a eleição. Não comparecer às urnas, por sua vez, é uma forma de protestar contra o sistema como um todo, embora muitos a vejam como desinteresse ou alienação política.
 
Pandora abriu sua caixa movida pela curiosidade, mas os brasileiros o fazem por cegueira mental. Não há outra explicação para um ex-presidente semianalfabeto, que foi réu em duas dúzias processos criminais, condenado a mais de 20 anos de reclusão, solto e reabilitado politicamente graças a uma tecnicidade claramente fabricada por togas camaradas, voltar a presidir o país que ele e seus comparsas foram acusados de assaltar.
 
Nossa caixa de Pandora será reaberta amanhã (alea jacta est!). As pesquisas indicam que Nunes, Boulos e Marçal estão tecnicamente empatados. O
 tanto de votos que o franco-provocador obtiver espelhará o número de eleitores que, como ele, têm a cabeça cheia de merda. 

A exemplo do escorpião da fábula, Marçal é incapaz de agir contra sua própria natureza. A despeito da cadeirada, voltou a trocar insultos com Nunes, responder com embromação a indagações objetivas de especialistas e eleitores, cutucar Boulos e Datena com provocações subliminares e, numa tabelinha com Marina Helena, defender a atuação anticientífica de Bolsonaro na pandemia de Covid. Enquanto os prefeitáveis brigam entre si, dois milhões de cidadãos brasileiros residentes de São Paulo não têm o que comer. 

Nosso maior problema é o eleitorado (vide postagem anterior). Uma ampla reforma política ajudaria um bocado, mas como esperar que os fisiologistas corruptos que dominaram a "res publica" contrariem os próprios interesses? Qual força popular poderia, em nome da decência, reverter o fiasco da nossa democracia? Como diria Bob Dylan, the answer, my friend, is blowing in the wind.
 
Considerando que a esperança ficou presa no fundo da caixa, talvez seja a hora de votar nas putas. Está visto que continuar elegendo os filhos delas jamais fará com que o Brasil reencontre seu norte.

quinta-feira, 20 de junho de 2024

E LA NAVE VA GIU


A DIFERENÇA ENTRE ESTADISTA E POLÍTICO É QUE O ESTADISTA 
PERTENCE À NAÇÃO E O POLÍTICO PENSA QUE A NAÇÃO LHE PERTENCE.

Em março de 2020, três meses depois de alcançar os 120 mil pontos, o Ibovespa pegou Covid e caiu para 63.569. Restabelecido, voltou ao patamar anterior em 2021 e 2022 e beirou os 135 mil pontos em dezembro de 2023. Mas o ano virou e o vento mudou. 

Depois que os gringos sacaram R$ 4,63 bilhões em apenas dois dias, os 125 mil pontos foram para o beleléu. Agora, o iBov sua a camisa para retornar à casa dos 120 mil — e, pelo andar da carruagem, deve encerrar o ano bem abaixo dos 200 mil preconizados anteriormente pelos analistas mais otimistas.

A meta de déficit zero de Haddad ficou para 2025. O ex-poste e ex-bonifrate do ex-corrupto amarga seu pior momento no Ministério da Fazenda. Além de convencer Lula da necessidade de equilibrar as contas públicas, ele precisa resgatar a própria credibilidade como fiador do arcabouço fiscal. E servir a dois senhores é uma missão quase impossível — perguntado sobre a fórmula do sucesso, JFK disse que ela não existia, mas que a do fracasso era tentar agradar a todos. 

O ministro esperava arrecadar mais de R$ 29 bilhões com a "MP do Fim do Mundo", mas ela foi devolvida pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco. No passado, os parlamentares aprovaram medidas que aumentaram a arrecadação; agora, recusam-se a compactuar com o aumento da carga tributária — não por estarem preocupados com a situação periclitante dos "contribuintes", mas porque haverá eleições em outubro. 

Haddad diz que não há plano B, mas vai ter de negociar com o Congresso para "encontrar" os R$ 26 bilhões de que precisa para compensar a desoneração da folha de salários de 17 setores da economia e dos municípios de até 156,2 mil habitantes. O problema e que ele e Simone Tebet estão isolados. A ministra sugeriu a revisão da vinculação do salário-mínimo aos benefícios previdenciários, mas foi desancada nas redes por Gleisi Hoffman, presidente do PT, e criticada por Rui Costa e outros ministros palacianos contrários ao corte de despesas em ano eleitoral. Ninguém se dignou de defendê-la.

O desgaste do ministro não interessa ao governo nem (muito menos) ao mercado. "Se quem entrar se meter a besta, a inflação começar a subir e o mercado perder a confiança, vai ser um grande e rápido fiasco político", ponderou Armínio Fraga, ex-presidente do BC. O custo político da demissão seria elevado, sem falar que de nada adianta trocar as rodas da carroça quando o problema é o burro. 

Rumores sobre a troca de comando na Fazenda levaram líderes governistas a defender a permanência de Haddad no cargo. O senador  Jacques Wagner — que elogiou a devolução da MP por Pacheco — foi um deles, e o próprio Lula disse que Haddad é um ministro extraordinário e que desconhece pressões sobre ele. Mas o presidente se irrita com as discussões sobre o déficit fiscal. Dias atrás, disse que o aumento da arrecadação e a queda da taxa de juros reduzirão o déficit sem comprometer o investimento público. Ato contínuo, a Bolsa caiu e o dólar fechou o dia em R$ 5,42

Segundo um velho ditado, os sábios aprendem com os erros alheios e os tolos aprendem com os próprios erros. Lula não aprendeu nada nos dois reinados anteriores nem nos 580 dias de férias compulsórias que gozou em Curitiba. Dirige o país com os olhos no retrovisor, mas não é capaz de enxergar a própria imagem refletida no espelho. Talvez "caia na real" quando se der conta de que o trono está em risco. 

Sempre existe a possibilidade de um presidente não concluir o mandato ou de não mais caminhar entre os vivos para disputar a reeleição, mas análise é análise, torcida é torcida e fato e fato, e o fato é que imbróglio da MP 1.227 ainda não produziu um choque de realidade. Em abril, o déficit nominal atingiu o recorde de R$ 1,043 trilhão no acumulado de 12 meses, e a mudança da meta do arcabouço fiscal para 2025 tornou pior o que já era ruim. 

As falas de Lula e de Haddad contribuem para a desconfiança sobre a leniência em relação ao avanço de preços às vésperas da troca de comando do BC. Lula repete ad nauseam que Campos Neto "tem lado político" e o culpa por tudo que deu errado no mundo desde as 10 pragas do Egito. Em seu penúltimo ataque, tentou terceirizar os desafios impostos à política econômica — "não tem explicação a taxa de juros do jeito que está" — e pisou no economista ao revelar sua inconformidade com o jantar de 70 convidados oferecido ale por Tarcísio Gomes de Freitas no Palácio dos Bandeirantes (detalhes na entrevista à CBN).

Lula não está fazendo nada diferente do que fez desde o início de seu terceiro (e queira Deus derradeiro) mandato, e o próprio Campos Neto forneceu a munição para as críticas, sobretudo ao participar do tal jantar — procedimento que não orna com o caráter independente do Banco Central. O xamã petista sabe muito bem como explorar esses episódios, mas o tiro pode sair pela culatra se ele acreditar realmente que o BC é a única coisa desajustada no país.

 
A irresignação presidencial não influenciou a decisão sobre a Selic, que ficou mantida em 10,5% ao ano encerrando um ciclo de sete cortes seguidos. A unanimidade na decisão, ao contrário do que ocorreu na última reunião. A decisão mostra um Copom alinhado com investidores, já que não cedeu à pressão política de Planalto. 
 
Com o cenho carregado, a voz roufenha e o dedo indicador em riste como a cauda de um escorpião antes do bote, Lula acusou Campos Neto de usar a autonomia do BC como trampolim para acrobacias políticas e mimetizar o comportamento de Sergio Moro, que trocou a 13ª Vara de Curitiba pelo Ministério da Justiça sob Bolsonaro. Trovejou que, "se for necessário", ele disputará um quarto mandato "para evitar que trogloditas voltem a governar o país".

Observação: Em atenção aos desmeriados e descerebrados de sempre, cumpre esclarecer que o morubixaba petista se referiu ao mico do bolsomínions, que bateu no iceberg das urnas em 2022 quando o conservadorismo civilizado trocou o Titanic do capetão pelo "arco democrático" que reconduziu o molusco de Garanhuns, e afundou na inelegibilidade da Justiça Eleitoral depois que a direita neandertal que o elegera em 2018 foi para a rua no 8 de janeiro de 2023

Num ambiente polarizado como o atual, cara feia, dedo e riste e chuva de perdigotos não bastam para evitar que a "direita não-troglodita" migre para Tarcísio em 2026Lula terá que exibir resultados efetivos. E aí que a porca torce o rabo.

segunda-feira, 2 de janeiro de 2023

SEM RETROSPECTIVAS NEM PERSPECTIVAS


Passagem de ano é terreno fértil para retrospectivas, mas revisitar a gestão que terminou ontem é puro masoquismoBolsonaro deveria ter sido defenestrado no primeiro ano de sua malfadada gestão, mas agarrou-se ao cargo com unhas e dentes e fez da presidência parque de diversões particular e palanque para a reeleição. Derrotado, fechou-se em copas. Desapareceu do cercadinho, parou de gravar as tradicionais lives de quinta-feira e deixou o país antes da virada do ano, para não transferir a faixa presidencial a Lula.

Observação: Não que o capitão fosse "chegado no batente": em 2019, sua média de trabalho diária era de 5,6 horas; em 2020, 4,7 horas; em 2021, 4,3 horas; neste ano, até outubro, 3,6 horas; depois da derrota, 36 minutos por dia. 

Desde janeiro de 2019, Bolsonaro fez 16 pronunciamentos em rede nacional. Nos primeiros três anos de "governo", divulgou vídeos de Boas Festas. Mas 2022 passou em branco. No dia de Natal, foi publicada em suas redes sociais uma postagem em que ele aparece distribuindo presentes para crianças. "Um feliz Natal, com muita paz ao lado daqueles que vocês mais amam".
 
Livrarmo-nos do pior mandatário desde Tomé de Souza é uma benção. No entanto, graças ao esclarecidíssimo eleitorado tupiniquim, isso custou a volta de Lula et caterva. E as perspectivas não são alvissareiras. Para satisfazer o apetite voraz do PT e da tal "Frente Democrática" que o apoiou, Lula aumentou de 23 para 37 os Ministérios e nomeou "gente da melhor qualidadepara comandá-los. Como dizia o velho Bezerra da Silva...
 
O Brasil não merecia — e talvez nem suportasse — mais quatro anos sob Bolsonaro. Mas caiu do cavalo quem "fez o L" esperando que Lula governasse com responsabilidade fiscal, que o PT não tentasse avançar sobre as estatais e que entregasse cargos importantes a partidos ou políticos como os quais sua afinidade foi meramente de ocasião. A serventia desses "aliados" — políticos com mandato, líderes partidários, economistas influentes ou formadores de opinião — terminou às 18 horas de 30 de outubro de 2022. Daquele momento em diante, eles se tornaram fardos a tolerar em nome da tal “governabilidade”. 

Considerando que o partido está na vida pública do Brasil há quatro décadas e governou o Brasil por quase catorze dos últimos vinte anos, isso não é exatamente uma surpresa. Mas boa parte dos que "fizeram o L" não entendeu — talvez porque não não quis entender — que, como escorpião da fábula, o PT esta sendo o PT e fazendo o que ele sempre fez. É uma lição dura para aqueles que, por conveniência ou aversão (justificada ou não) a Bolsonaro, abraçaram o lulopetismo apesar de seu histórico.

Eles poderão continuar a fazer o "L", mas desta vez de "ludibriados".

Feliz 2023 a todos.