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sábado, 20 de setembro de 2025

DE VOLTA ÀS VIAGENS NO TEMPO — 47ª PARTE — QUANDO A VIDA IMITA A ARTE

NUNCA ACENDA UM FOGUEIRA QUE VOCÊ NÃO SEJA CAPAZ DE APAGAR.

Os romances futurísticos de Júlio Verne anteciparam em mais de um século a alunissagem da Apollo 11 e os submarinos movidos a energia nuclear, sugerindo que a ficção de hoje pode ser a ciência de amanhã.

Em meados dos anos 1980, em seu único romance de ficção — Contato —, o cientista planetário e autônomo Carl Sagan narra a saga da personagem interpretada por Jodie Foster, que recebe instruções de uma civilização extraterrestre para a construção de uma nave capaz de viajar pelo hiperespaço através de um buraco de minhoca


Sagan pediu a seu colega Kip Thorne que investigasse se sua ideia do atalho no espaço-tempo estava cientificamente correta, e a conversa deu origem a um artigo que detalha o formalismo matemático da Relatividade Geral tendo como solução a geometria de um túnel no espaço-tempo ligando duas regiões remotas do Universo. 

 

Observação: Thorne concluiu que a "garganta" do buraco de minhoca deveria ser preenchida com matéria exótica — um tipo hipotético de matéria com massa negativa ou densidade de energia negativa — para permanecer aberta, o que, à luz das leis conhecidas, contraria o princípio da conservação de energia. Mas Einstein ensinou que o impossível só é impossível até alguém provar o contrário, e Arthur C. Clarke, que a única maneira de descobrir os limites do possível é ir além deles rumo ao impossível.


CONTINUA DEPOIS DA POLÍTICA


Ao transformarem sua obsessão pela autoproteção num processo de deformação das estruturas arquitetônicas de Niemeyer, nossos caríssimos deputados fizeram do Congresso um bunker que o crime organizado jamais imaginou obter. 

Essa imoralidade havia sido extinta em 2001, sob pressão social, porque resultava em impunidade. Mas, como o escorpião da fábula, suas insolências são incapazes de agir contra a própria natureza, e escolheram um momento estratégico para matar futuras ações penais, beneficiando desde assaltantes das verbas federais das emendas até Eduardo Bolsonaro, indiciado por tramar contra o Judiciário e o interesse nacional nos Estados Unidos.

Noutros tempos, o crime organizado financiava a eleição de seus representes. Confirmando-se a blindagem, os criminosos comprarão seus próprios mandatos. O bunker congressual é tão extraordinário que estimula o PCC a ocupar o Congresso sem intermediários.

Se esse acinte não for barrado no Senado, as cuias dos plenários do Congresso — a da Câmara com as bordas viradas para o céu, e a do Senado, emborcada para baixo— serão abrigos fortificados para proteger criminosos.

  

Desde o artigo proposto por Sagan, cientistas vêm buscando soluções para criar um buraco de minhoca atravessável sem recorrer a algum tipo de matéria exótica — cuja existência ainda não foi comprovada. Especula-se que exista uma ligação com a matéria escura, que representaria cerca de 27% da composição do Universo, mas não se sabe se ela possui as propriedades necessárias para manter um túnel estável. 


Observação: Se a gravidade é uma força exclusivamente atrativa e diretamente proporcional à massa dos corpos, como formulou Isaac Newton em 1687, então a matéria exótica produz o efeito inverso, ou seja, tem caráter "repulsivo". O problema é que criar um buraco de minhoca que não contrarie as leis da natureza exige uma reformulação da Relatividade Geral.


O Universo observável se estende em todas as direções por 42 bilhões de anos-luz (cerca de 397 quatrilhões de quilômetros), e a estrela mais próxima do nosso sistema solar — Proxima Centauri — fica a 4,26 anos-luz de distância (cerca de 40 trilhões de quilômetros). Isso significa que, com a velocidade da luz, uma viagem até lá levaria mais de 4 anos para chegar até lá, e a sonda mais veloz lançada pela NASA até agora atingiu "modestos" 692 mil km/h (0,064% da velocidade da luz).


Resumo da ópera: Quando se trata de viagens interestelares (ou mesmo no tempo), os buracos de minhoca são nossa melhor chance, já que supostamente interligam sistemas e estrelas muito distantes. A questão é que ainda não se descobriu uma maneira de criar buracos de minhoca atravessáveis. E mesmo mantido aberto com matéria exótica, o túnel cósmico poderia sofrer instabilidades que fariam sua garganta se fechar rapidamente — sem falar que a presença de observadores em seu interior poderia amplificar as flutuações quânticas, levando ao colapso da estrutura. 

 

Enfim, quem viver verá. 

sexta-feira, 19 de setembro de 2025

MAIS SOBRE SMARTPHONES — DE VOLTA AO MALWARE

ERRAR É HUMANO; CULPAR OUTRA PESSOA É POLÍTICA.

Depois que foram promovidos a smartphones, os celulares se tornaram verdadeiros computadores de bolso. No entanto, a exemplo dos desktops e notebooks, eles são suscetíveis a malwares e à ação de cibercriminosos.


Ainda não surgiu uma ferramenta de segurança idiot proof o bastante para proteger o usuário de si mesmo, e ele é o elo mais fraco da corrente nos golpes baseados em engenharia social.

 

Por ser um sistema de código aberto, o Android conta com um enorme ecossistema de apps. Baixá-los da Google Play Store ou da loja oficial do fabricante do celular reduz os riscos, mas não garante 100% de segurança. E o mesmo se aplica às guias anônimas e às VPN.  


Os cibercriminosos travestem seus apps nefastos de jogos, lanternas, filtros de câmera e outros programas aparentemente inocentes para coletar dados bancários e informações pessoais de forma praticamente imperceptível. Para não levar gato por lebre, só instale aplicativos depois de checar a idoneidade do desenvolvedor, conferir as avaliações de outros usuários e as permissões solicitadas (uma lanterna, por exemplo, não precisa ter acesso a sua lista de contatos para funcionar). 


CONTINUA DEPOIS DA POLÍTICA


Ao transformarem a obsessão pela autoproteção num processo de deformação das estruturas arquitetônicas de Niemeyer, nossos caríssimos deputados fizeram do Congresso um bunker que o crime organizado jamais imaginou obter. Essa imoralidade havia sido extinta em 2001, sob pressão social, porque resultava em impunidade. Mas, como o escorpião da fábula, suas insolências são incapazes de agir contra a própria natureza, e escolheram um momento estratégico para matar futuras ações penais, beneficiando desde assaltantes das verbas federais das emendas até Eduardo Bolsonaro, indiciado por tramar contra o Judiciário e o interesse nacional nos Estados Unidos.

Noutros tempos, o crime organizado financiava a eleição de seus representes. Confirmando-se a blindagem, os criminosos comprarão seus próprios mandatos. O bunker congressual é tão extraordinário que estimula o PCC a ocupar o Congresso sem intermediários. Se esse acinte não for barrado no Senado, as cuias dos plenários do Congresso — a da Câmara com as bordas viradas para o céu, e a do Senado, emborcada para baixo— serão abrigos fortificados para proteger criminosos.

Mas não é só: um dia depois de aprovar a PEC da Blindagem, a camarilha dos deputados aprovou de maneira folgada o requerimento de urgência para o PL que prevê anistia a todos os envolvidos nos atos golpistas após a eleição de 2022, acelerando a tramitação do projeto, que não precisará mais passar pelas comissões da Câmara antes de ir ao plenário. 

O pedido de urgência recebeu 311 votos a favor e 163 contra. Ao anunciar a decisão, Hugo Marmota disse que nomeará um relator que conte com o apoio da maioria da Casa. A expectativa é de que o texto original, de autoria do deputado-bispo Marcelo Crivella — que prevê anistia a todos os que participaram de manifestações de caráter político ou eleitoral entre 30 de outubro de 2022 e a entrada em vigor da lei, incluindo pessoas que apoiaram os atos por meio de contribuições financeiras, doações, apoio logístico, prestação de serviços ou publicações em redes sociais — seja modificado pelo relator e apresente uma proposta mais próxima de uma redução das penas do que de uma anistia propriamente dita.

Veja como cada deputado votou na sessão e faça um favor ao Brasil não reelegendo esses fidumas em 2026. Aliás, está na hora de votarmos nas putas, pois votar nos filhos delas não deu certo.

 

Manter o software atualizado é fundamental, não só do ponto de vista da segurança, mas também para evitar que determinados aplicativos deixem de funcionar — como o WhatsApp, que deixou de suportar versões do Android anteriores à Lollipop (5.0) e do iOS anteriores à 12.0 em maio deste ano. 


Observação: O Google atualiza o Android a cada 12 meses, em média, mas os fabricantes de celulares decidem quando e como liberar os updates. Alguns modelos premium prometem até 7 anos de atualizações do sistema, enquanto outros — sobretudo os de entrada — contam com apenas uma ou duas. Portanto, só saque seu poderoso cartão de crédito depois de consultar a página de suporte do dispositivo que você tem em vista.

 

Malwares costumam agir discretamente, mas aquecimento anormal do aparelho, reinicializações aleatórias, travamentos e redução da autonomia bateria são sinais de infecção. A Google Play Store conta com centenas (senão milhares) de apps que se propõem a oferecer algum tipo de segurança. Isso inclui desde soluções robustas de empresas conhecidas (como Avast, AVG, Bitdefender, Kaspersky, McAfee, Norton) até opções menos conhecidas, que podem ser menos eficazes, ou mesmo maliciosas. 


Prefira instalar aplicativos conceituados, que ofereçam proteção em tempo real, varredura automática e por demanda, atualizações regulares e funções adicionais importantes — como VPN e bloqueio de spyware — e faça varreduras com o Play Protect  acessando a Play Store, tocando em sua foto de perfil, selecionando Play Protect e pressionando o botão Verificar.

 

"Rootear" o aparelho (mais detalhes nesta sequência) para ter poderes de "superusuário" é uma faca de dois gumes, pois aumenta o risco de infecção por malwares. No âmbito do software, quase tudo é reversível, de modo que restaurar o dispositivo às definições de fábrica é uma maneira eficiente de eliminar malwares, pois apaga a partição de dados do usuário e reverte a partição do sistema operacional para o estado original. No entanto, alguns malwares — notadamente os rootkits — se valem do acesso privilegiado (root) para modificar áreas do firmware ou da partição de sistema que não são apagadas por um reset comum. 


Se um backup contiver arquivos infectados, eles serão reinstalados após o reset. Nesse caso, faça um novo reset, ignore o backup e configure o telefone como fez quando o adquiriu. Baixe os aplicativos essenciais diretamente da Google Play Store e verifique se o problema foi resolvido. Se não foi, o jeito será reinstalar o firmware ou recorrer às ferramentas de segurança disponibilizadas pelo fabricante do celular.


Observação: Reinstalar o firmware completo (ROM de fábrica) apaga tudo, incluindo as partições do sistema onde rootkits e outras pragas persistentes podem se alojar. O processo varia conforme o fabricante e o modelo do aparelho, mas geralmente consiste em baixar o firmware oficial do site do fabricante (ou de fontes confiáveis), utilizar uma ferramenta de flash específica para o seu dispositivo e seguir as instruções cuidadosamente, pois um flash incorreto pode danificar o celular. Caso não se sinta confortável, procure assistência profissional.

 

Segurança é um hábito, e batalha contra malwares requer um conjunto de ações que vão desde evitar instalar aplicativos fora das lojas oficiais a manter o sistema atualizado com os patches de segurança mais recentes, utilizar um bom antivírus e uma VPN confiável, revisar cuidadosamente as permissões concedidas aos aplicativos e ficar atento a sinais de atividades suspeitas no dispositivo.

 

Boa sorte — você vai precisar

segunda-feira, 15 de setembro de 2025

AINDA SOBRE A CONDENAÇÃO DOS ASPIRANTES A GOLPISTAS

NÃO HÁ MAL QUE SEMPRE DURE NEM BEM QUE NUNCA TERMINE.

Em 2015, Jair Bolsonaro começou a pavimentar o caminho que o levaria ao Palácio do Planalto. A dois meses do pleito de 2018, todas as pesquisas de intenção de voto apontavam a vitória da coligação da esquerda — embora o cabeça da chapa fosse ficha-suja e estivesse cumprindo pena de prisão. Mas quis o destino (ou alguém cujo nome permanece nas sombras) que um atentado a faca livrasse o então candidato do nanico PSL dos debates, evitando que ele fosse trucidado em rede nacional pela invejável oratória de Ciro Gomes.

 

A pouco mais de um mês do primeiro turno, o TSE rejeitou a quimérica candidatura do então presidiário mais famoso da história deste país. Como Jaques Wagner declinou do papel de bonifrate, o Partido dos Trabalhadores que nao trabalham anunciou oficialmente a substituição de Lula por Fernando Haddad. Mesmo assim, as empresas de pesquisa continuaram dando como certa a vitória de “Luladdad” e a eleição de Dilma para o Senado. 


A mulher sapiens ficou a ver navios, mas, com a volta de seu criador, foi recompensada pelo "golpe" (como a petralhada se refere ao impeachment da anta) com a presidência do Banco do Brics e um salário anual de meio milhão de dólares. Já o combo de mau militar e parlamentar medíocre, incompetente até para gerir um prosaico carrinho de pipoca, surfou na onda do antipetismo e derrotou a marionete de Lula no segundo turno por uma diferença de 10,8 milhões de votos válidos (houve 2,5 milhões de votos em branco e 8,6 milhões de votos nulos).

 

Depois de construir uma carreira parlamentar tão longa quanto inexpressiva, Bolsonaro forneceu a prova cabal de que o Brasil não é um país sério. Para mostrar que era amigo do mercado e obter o apoio dos empresários, o estatista que acreditava em Estado grande e intervencionista, que sempre lutou por privilégios para corporações que se locupletavam do Erário havia décadas, foi buscar Paulo Guedes, que embarcou em uma canoa que deveria saber furada. 

 

Para demonstrar que era inimigo da corrupção e obter o apoio da classe média, o deputado que, em sete mandatos, percorreu 8 partidos de aluguel e sempre foi adepto das práticas da baixa política e amigo de milicianos, foi buscar Sergio Moro, que embarcou em uma canoa que deveria saber furada. E para obter o apoio das Forças Armadas, o oficial de baixa patente, despreparado, agressivo e falastrão, condenado por insubordinação e indisciplina e enxotado da corporação, foi buscar legitimidade em uma fieira de generais, que embarcaram em uma canoa que deveriam saber furada. 

 

Não podia dar certo — como de fato não deu. O ora ex-presidente e futuro presidiário se revelou o pior mandatário desde Tomé de Souza. Sua admiração pela ditadura militar e vocação para tiranete se acentuaram ao longo de sua nefasta gestão. As “acusações” que o ministro demissionário Sergio Moro fez sobre ingerência política no comando da PF foram comprovadas na gravação da reunião ministerial de abril de 2020. O ministro Celso de Mello autorizou a abertura de um inquérito para apurar os fatos, mas a apuração virou pizza com sua aposentadoria do STF


A despeito de a CPI do Genocídio lhe imputar a essa criatura desprezível uma dezena de crimes associados às políticas públicas de combate à pandemia, e dos mais de 140 pedidos de impeachment protocolados, a inação de Rodrigo Maia, a cumplicidade de Arthur Lira e a subserviência abjeta de Augusto Aras asseguraram a permanência do estrupício no cargo até dezembro de 2022. 

 

Mandrião de quatro costados, o ex-presidente trabalhava, em média, 18 horas por semana a menos que um trabalhador celetista e 14 a menos que um servidor público federal da administração direta (conforme o estudo "Deixa o homem trabalhar?", de Dalson Figueiredo, Lucas Silva e Juliano Domingues). Em 2019, houve dias em que ele trabalhou 12 horas, mas cargas horárias superiores a cinco horas diárias só foram registradas em trânsito (como em 18 de novembro de 2021, na volta de Doha, no Catar, para Brasília). Se aplicado o mesmo critério, o tempo gasto com motociatas pelo país, comendo farofa nas ruas de Brasília ou passeando de jet-ski no Guarujá seria considerado jornada de trabalho. 
 
Observação: Bolsonaro gastou mais tempo em almoços (média de 1,3 hora) do que em reuniões com ministros de estado (menos de 1 hora). Durante a pandemia, participou apenas de cinco eventos envolvendo explicitamente o tema “vacina”, investindo, em média, 0,9 hora por compromisso — totalizando três almoços. Na manhã do dia 8 de julho de 2021, mês em que o Brasil ultrapassou as 500 mil mortes pela Covid, conversou durante 50 minutos com devotos no cercadinho defronte ao Alvorada (a maior parte do tempo foi gasta com piadas), e chegou a dizer que sua agenda andava “meio folgada”. 

 

Ao longo dos quatro anos em que conspurcou a Presidência, o "mito" dos anencéfalos reafirmou ad nauseam sua autoridade com frases como “quem manda sou eu”, “minha caneta funciona” e “não sou um presidente banana”. Na célebre reunião ministerial de abril de 2020, esbravejou: Não vou esperar foder [sic] a minha família toda, de sacanagem, ou amigos meus, porque eu não posso trocar alguém da segurança na ponta da linha que pertence à estrutura nossa. Vai trocar! Se não puder trocar, troca o chefe dele! Não pode trocar o chefe dele? Troca o ministro! E ponto final! Não estamos aqui pra brincadeira.” 


Em 2018, a parcela minoritária do eleitorado que apoiou o fantasioso "outsider anti establishment" o fez por absoluta falta de opção, e, portanto, não comemorou sua vitória, mas sim a derrota da marionete do então presidiário. Em 2022, esses "isentões" ajudaram a eleger Lula porque era imperativo evitar mais quatro anos (ou sabe Deus quantos) sob a batuta de um genocida golpista, e a quimérica terceira via — tida como a solução para furar a polarização, acabou virando parte do problema devido a egos avantajados, falta de projetos e carência de apoio popular.


O que Bolsonaro mais fez durante seu mandato — além de gozar férias paradisíacas no litoral paulista e em cidades turísticas da costa catarinense, promover motociatas e fazer campanha pela reeleição — foi atacar o TSE e o STF. Se o Brasil fosse uma democracia como manda o figurino, essa aberração teria sido deposta muito antes dos discursos golpistas do 7 de Setembro; numa republiqueta de bananas presidida por um ex-presidiário convertido em ex-corrupto por conveniência da alta cúpula do Judiciário, não chega a espantar que um pedido de desculpas mal ajambrado, rascunhado às pressas por um ex-presidente de nada saudosa memória, levasse muita gente a acreditar (ou a fazer de conta que acreditava) que o
 escorpião da fábula estava sinceramente arrependido.

 

Disse o poeta que  não há nada como o tempo para passar, e o Conselheiro Acácio, que as consequências sempre vêm depois. Inobstante a pressão dos aliados do capetão, do lobby abjeto do filho do pai, da ingerência igualmente abjeta de Donald Trump na soberania nacional e da ignóbil proposta de anistia que tramita no Congresso, Bolsonaro e sete cúmplices na tentativa de golpe de Estado foram condenados a pesadas penas privativas de liberdade. 

 

A inédita condenação dos militares graduados do “núcleo crucial da trama golpista” mostrou que o Brasil foi capaz de dar um passo à frente, mas os veredictos são meras reticências. Por mais que o voto teratológico de Fux (embora não inexplicável tenha reavivado as brasas da esperança do gado bolsonarista, quem enxerga as coisas como elas realmente são — e não como gostaria que fossem — sabe que as chances de reforma da decisão da Primeira Turma são quase inexistentes. Os bolsomínions mais radicais prometiam forrar as ruas caso o “mito” fosse condenado, mas o que se viu foram uns poucos gatos pingados em prantos, abraçados ridiculamente a bandeiras dos EUA e do Brasil. 

 

Uma vez publicado o acórdão, as defesas terão cinco dias para apresentar embargos declaratórios, que servem para esclarecer aspectos obscuros da decisão, mas costumam ser usados para protelar o trânsito em julgado. Já os embargos infringentes só são admissíveis, à luz da jurisprudência do STF, quando há quatro ou mais votos divergentes em decisões plenárias ou dois ou mais votos em decisões das turmas. No caso em tela, somente o ministro Fux divergiu do relator. 


Se algumas das defesas seguir por esse caminho, Moraes negará seguimento ao recurso; se os advogados ingressarem com embargos infringentes, caberá à própria Turma decidir manter ou não a decisão monocrática do do relator, e Dino, Cármen e Zanin certamente acompanhariam Moraes. Assim, as chances de o caso ser reexaminado pelo plenário da Corte são próximas de zero, e ainda que assim não fosse, nada garante que as demais togas divergiriam de Moraes, Dino, Cármen e Zanin.


Dito isso, resta aos sectários do Messias que não miracula apostar na anistia, que é outra miragem: se essa aberração for aprovada pela Câmara e pelo Senado, será vetada por Lula; se o Congresso derrubar o veto, o STF a julgará inconstitucional. Em última análise, a irresignação dos bolsonaristas serve apenas para acirrar a tensão entre os Poderes e carimbar na testa dos parlamentares a pecha de "Cupinchas do Trump".

 

A defesa de Bolsonaro já se equipa para pedir sua prisão domiciliar — que ele já vem cumprindo desde 4 de agosto por ter desobedecido medidas cautelares. Talvez o trânsito em julgado da condenação arraste gente para as ruas — como a prisão de Lula arrastou em abril de 2018. Mas o Brasil não parou em 2018 e não vai parar agora. Malafaia et caterva reuniram mais de 80 mil manifestantes no Rio e São Paulo no feriado da Independência, mas esse número está longe de representar a maioria dos brasileiros — que, aliás, é contra a anistia.


Segundo dados colecionados pelo Datafolha, 50% dos entrevistados defendem a prisão de Bolsonaro, 43% são contra e 7% responderam que "não sabem". É preocupante o fato de metade do eleitorado ter dificuldade para se situar no mundo e, pior se dar conta de estar sendo tratado como morador do fundo do quintal imaginário da calopsita laranja que pousou na Casa Branca. Também preocupante é o fato de o Congresso discutir a anistia de quem ainda nem foi preso. Governadores conservadores, supostamente democráticos, prometem indulto a Bolsonaro caso cheguem ao Planalto. Empresários fazem cara de nojo para o STF.


Ao evitar o golpe, o Brasil deu ao mundo a impressão de que superou a barbárie. Em editorial publicado neste sábado, o jornal francês Le Monde anotou que a condenação do núcleo crucial da tentativa de golpe é "uma prova de maturidade para um país que esteve submetido ao arbítrio e à brutalidade de uma ditadura militar". Tudo verdade. Mas quem presta atenção aos fatos percebe que, se os otimistas se descuidarem, o Brasil corre o risco retornar à selvageria antidemocrática sem atingir o estágio intermediário de algo que, no futuro, possa pelo menos ser chamado de bons tempos.


Incitado pelo traidor Eduardo Bolsonaro, o terror da Casa Branca pode aplicar mais sanções — que também não mudarão o curso das coisas. Ainda pode haver tumulto, já que os líderes do bolsonarismo não estão preocupados com o país, e sim com os próprios umbigos. Os aspirantes a herdeiros políticos do prisoner-to-be circulam como urubus em torno do moribundo, reivindicando um pedaço de seu legado eleitoral. Ainda haverá muito dedo no olho e gritaria, uma vez que os eleitores insistem em fazer a cada eleição, por ignorância, o que Pandora fez uma única vez por curiosidade.

 

Para concluir este romance, relembro a saga de um ex-estudante de São Petersburgo que escritor russo Fiódor Dostoiévski descreveu em Crime e Castigo, e que os criminosos sempre se baseiam na relação de custo-benefício. Bolsonaro e seus cúmplices assumiram o risco da prisão acreditando no antídoto da anistia que seus comparsas no Parlamento se esforçam para aprovar. No entanto, da mesma forma que cometeram erros elementares no planejamento do golpe, erraram ao não levar em conta outros efeitos da condenação. 

 

Depois do trânsito em julgado, o STM deve cassar as patentes dos militares condenados — incluindo Bolsonaro, que deixou a caserna pela porta dos fundos, mas, por força de lei, recebeu a patente de capitão. Infelizmente, ele não perderá suas remunerações de parlamentar aposentado e de ex-presidente. Dos demais militares condenados, somente Mauro Cid se manterá tenente-coronel, já que foi apenado com anos de prisão em regime aberto (mas já adiantou que pretende deixar o Exército e se mudar para os EUA).

 

Os danos qualificados e a destruição de bens tombados acarretaram penas privativas de liberdade e responsabilidade patrimonial solidária no valor de R$ 30 milhões. Todos os integrantes do núcleo crucial da tentativa de golpe — Bolsonaro e Ramagem em especial — devem permanecer inelegíveis por oito anos contados a partir do término do cumprimento das penas. Na testa de Bolsonaro — um péssimo militar, deputado antidemocrático e misógino e presidente inepto e de mentalidade golpista-fascista — o STF carimbou o fim de seu prazo de validade política.

terça-feira, 26 de novembro de 2024

ENTRE NINHOS DE PERIQUITOS E OVOS DE SERPENTE

UMA MENTIRA É SÓ UMA MENTIRA, DUAS SÃO DUAS MENTIRAS, MAIS DE TRÊS É CAMPANHA POLÍTICA.

O conto "Ninho de Periquitos" ilustra a coragem e as escolhas inevitáveis que a vida exige: ao apanhar dois periquitinhos para ao filho que completava 10 anos naquele dia, um sertanejo foi picado por uma urutu, matou a cobra com seu facão e amputou a própria mão para preservar a vida.

Naquele fim de mundo, socorro médico era uma miragem, e adiar a decisão, numa época em que se usavam sanguessugas para tratar enfermidades, era assinar o próprio atestado de óbito. 

 

Até pouco tempo atrás, o câncer era uma sentença de morte inapelável. Hoje, o diagnostico precoce aumenta exponencialmente as chances de cura. Costuma-se dizer que reconhecer a existência do problema é meio caminho andado, mas a solução só virá a reboque das medidas cabíveis. E essa lógica se aplica também ao contexto político. 

 

Em 2018, ao preferir a certeza do erro à possibilidade do acerto, a maioria irracional do eleitorado obrigou a minoria pensante a apoiar o "menos pior". Como a alternativa ao bonifrate do então presidiário mais famoso do Brasil era Jair Bolsonaro, o jeito foi tapar o nariz e votar no nhô-ruim para evitar a volta do nhô-pior. Claro que se podia esperar grandes coisas de um mau militar que trocou a caserna pela política para continuar pendurado no erário como parlamentar medíocre, mas tampouco se podia prever que o mandrião flibusteiro se tornaria o pior mandatário desde Tome de Souza. 

 

Não faltaram pedidos de impeachment (foram mais de 140) nem evidencias de crimes comuns que justificassem a abertura de inquéritos do STF. Mas Rodrigo Maia viu erros, mas não crimes nas 60 petições que arquivou, Arthur Lira reputou inúteis as demais e o antiprocurador-geral jogou na privada o relatório CPI da Covid e o que mais ameaçou a permanência do napoleão de hospício na Presidência. Em suma, o carcinoma foi diagnosticado, mas nem o Legislativo nem o Judiciário se dignaram de extirpá-lo antes que ele evoluísse para metástase. 

 

Bolsonaro sempre foi inimigo visceral das liberdades democráticas — tanto nos 15 anos de caserna quanto nos 28 de deputância —, mas seus arroubos antidemocráticos não eram levados a sério, nem mesmo quando ele defendia abertamente a censura e o fechamento do STF e do Congresso. A exemplo do escorpião da fábula, esse filhote da ditadura jamais foi capaz de agir contra a própria natureza. As "mudanças de comportamento" que ele encenou quando as circunstâncias o exigiram eram tão fictícias quanto a criação do mundo descrita no Gênesis. 

 

Segundo Charles Baudelaire, "o maior trunfo do diabo é nos convencer de que ele não existe". Tudo que Bolsonaro queria era se perpetuar no poder a qualquer custo. Se tivesse contido seu furor uterino e governado o país dentro das "quatro linhas" que ele tanto evocava, talvez Lula estivesse gozando férias compulsórias em Curitiba e ele, Bolsonaro, conquistado um segundo mandato de maneira legítima.

 

Seu inconformismo com o resultado das urnas ficou claro no silêncio conivente diante das manifestações de correligionários que pregavam a retomada do poder. Em vez de ordenar o desmonte dos acampamentos de radicalizados ansiosos por uma inexequível virada da maré, o aspirante a tiranete acalentou a ilusão dos que agora clamam por uma inconcebível anistia por se verem na contingência de ver o sol nascer quadrado. Mestre em tirar castanha com a mão do gato, emendou à autoclausura a fuga para Miami. Homiziado na cueca do Pateta, assistiu de camarote aos desdobramentos dos ataques terrorista de 8 de janeiro — ápice da trama golpista que vinha sendo costurada nos bastidores havia meses. 

 

Escorado no princípio da causalidade, o Conselheiro Acácio (personagem do romance O Primo Basílio, de Eça de Queiroz) ensinou que as consequências sempre vêm depois. Por tudo que fez, o falso messias que prometeu salvar o Brasil do lulopetismo corrupto se tornou um caso clássico de emenda pior que o soneto. Em abril, seus pernoites na embaixada da Hungria levaram apoiadores a temer sua prisão preventiva; quando Moraes não a decretou, o temor deu lugar à galhofa: "Xandão amarelou, virou xandinho [...] encarcerar Mauro Cid é uma coisa, e outra bem diferente é prender Bolsonaro sem uma sentença [...] o barulho seria grande no Congresso e nas ruas diante dessa covardia injustificável", mugiram os devotos do rebotalho da ditadura. 

 

Inelegível até 2030, proibido de deixar o país e alvo de três inquéritos que tramitam no STF — todos sob a relatoria de Moraes —, Bolsonaro segue livre, leve e solto. Mas não há nada como o tempo para passar: no último dia 19, a Operação Contragolpe prendeu quatro militares de alta patente e indiciou Braga Netto, Mauro Cid, o próprio Bolsonaro e outros 34 envolvidos na "suposta" tentativa de golpe. "Suposta" porque o que tem rabo de jacaré, couro de jacaré, boca de jacaré e dentes de jacaré sempre pode ser um coelhinho inofensivo. 

 

À luz da lógica e das trajetórias de alguns personagens, é difícil desconectar a trama posta em marcha logo após o resultado das eleições das atitudes e ligações do candidato derrotado, cujo vice na chapa anfitriou pelos menos uma reunião com os pretensos executores da eliminação LulaAlckmin e Moraes — segundo informações do ex-ajudante de ordens ora delator e de um caminhão de provas reunidas pela PF num relatório de 884 páginas. 

 

O direito ao delírio é livre, mas os deveres da realidade recomendam observar o andar da carruagem e incluir no radar uma mudança de planos. Na política, a fidelidade vai ao velório, mas assiste ao enterro no limite da beira da cova. Quem vive de votos sabe que eleições livres dependem de democracia plena, e que, em nome da própria sobrevivência, não convém associar-se a empreitadas liberticidas. Não tão depressa que pareça traição, mas nem tão devagar que denote conivência, a tendência é que o ferido seja deixado pelo caminho no ritmo do agravamento de sua situação.

 

O indiciamento de Bolsonaro por golpismo recebeu defesa morna de aliados — "para fingir que se importam", nas palavras de um de seus asseclas. No Xwitter, 23 dos 93 deputados federais do PL criticaram a PF nas 24 horas seguintes ao caso — alguns de forma genérica, sem sequer uma menção ao ex-presidente. No Instagram, outros 43 parlamentares da sigla também o apoiaram, mas sem grande ênfase. Um congressista do PL avalia que metade do grupo bolsonarista da sigla — estimado em dois terços dos parlamentares — está disposta a romper com o ex-presidente se surgir uma liderança forte para enfrentar o PT em 2026.

 

Segundo a Folha, a revelação do plano de assassinatos impactou mais o Congresso do que a divulgação dos 37 indiciados por golpismo. Boa parte dos nomes da lista já era esperada, mas não as evidências da trama para executar um presidente eleito, seu vice e um ministro da Suprema Corte. Avalia-se que a mera cogitação de usar aparato estatal para cometer assassinatos políticos é algo inimaginável, só encontrando paralelo nos anos de chumbo. 

 

Os 55 áudios aos quais o Fantástico teve acesso deram fornecem detalhes das ações golpistas e confirmam o protagonismo do general Mario Fernandes. que tinha um roteiro para deputados bolsonaristas usarem durante a CPMI do 8 de Janeiro. O documento de três páginas descreve estratégias para criar uma narrativa em relação aos movimentos do envolvidos. 


Em uma live no perfil do ex-ministro do Turismo, Bolsonaro ironizou as investigações. O general Braga Netto, igualmente denunciado por envolvimento no plano de execuções, afirmou que nunca se tratou de golpe, muito menos de assassinar alguém.

 

A esta altura, impõe-se uma reflexão: foi para isso que lutamos tanto pelas "Diretas Já"? É fato que, pior que nossos políticos, só mesmo um eleitorado que repete os erros a cada eleição, esperando um resultado diferente. 


Em 1989, ao quebrar um jejum de urna de 29 anos, a récua de muares guindou ao Planalto um falso caçador de marajás, que entrou para a história como o primeiro presidente eleito pelo povo na Nova República e o primeiro a sofrer um impeachment. 

Nas pegadas do pleito de 2002, o lulopetismo corrupto se instalou no Poder e reinou por 13 anos 4 meses e 11 dias. Em 2018, Lula, que então colecionava duas dúzias de ações criminais, foi recolhido à carceragem da PF, onde gozou férias compulsórias por míseros 580 dias. Em 2024, já "descondenado" e reabilitado politicamente, conquistou um inusitado terceiro mandato, pois era preciso defenestrar do Planalto o refugo da escória da humanidade. 

Passados dois anos da posse do macróbio petista, livramo-nos das turbulências militares — o que não é pouca coisa —, mas falta saber o que o STF fará com a quadrilha de golpistas que incluía um presidente e quatro ex-ministros, três dos quais com altas patentes militares. Considerando que nossa mais alta corte baixou o pano da Operação Lava-Jato, convém economizar expectativas.

 

Ao contrário do sertanejo que optou por amputar a própria mão para não perder a vida, Bolsonaro escolheu cavar mais fundo em busca do caminho que o eternizaria no poder, mas que, pavimentado por uma fieira de crimes que não para de crescer, deverá levá-lo a ver o sol nascer quadrado. E quanto antes isso acontecer, tanto melhor.