Na tarde de ontem, Haddad foi finalmente ungido candidato à presidência.
Resta saber quantos dos otários que supostamente votariam em Lula votarão nele, que, segundo levantamento feito pela consultoria Eurasia, tem 60% de
chances de passar para o segundo turno e 25% de ganhar a eleição.
Estrategistas do ora candidato admitem que um dos principais problemas de sua campanha será defender a gestão de Dilma e ao mesmo tempo tentar convencer o mercado de que o PT não adotará a mesma política econômica da gerentona de araque. Mas não é só.
O PT (leia-se Lula) optou (sem trocadilho) por adiar
ao máximo a substituição de seu cabeça de chapa e com isso dificultou a vida de Haddad. Em 2010, Lula foi bem-sucedido em transferir votos para Dilma,
mas a candidatura foi preparada com dois anos de antecedência e numa época em que o petralha estava solto e
gozava de altíssima popularidade. Embora a transferência de votos de uma liderança
para seu apadrinhado seja um fenômeno comum na política, resta saber se haverá tempo para isso, pois estamos a menos de 1 mês do primeiro turno e Lula não poderá gravar vídeos abraçando seu poste nem rodar o país
com ele a tiracolo.
Outro complicador é a possível migração de
eleitores de Lula para outros
candidatos, como Marina e Ciro. Se o cenário apontado pelas
sondagens continuar apontando Ciro como mais competitivo no segundo turno contra Bolsonaro, Haddad corre o risco de perder eleitores
de esquerda para um possível “voto útil”. Mas tem mais: enquanto o sevandija de Garanhuns explora sua imagem de migrante nordestino e fala a “língua do
povão”, seu poste tem trajetória
acadêmica e cultiva o hábito de abrir os comícios dizendo para a militância ignara que
sua campanha “representa a antítese do
status quo”. Desde que entrou para a política, ele disputou duas eleições, ambas para prefeito de São Paulo. E se venceu a primeira, em 2012, graças ao apoio de Lula, não conseguiu se reeleger em 2016, quando o PT
vivia o auge de seu desgaste com as denúncias de corrupção na Petrobras e o
impeachment de Dilma.
Nenhum candidato entre os mais bem colocados nas pesquisas tem cara de povo (com a possível exceção de Marina, que não tem cara de nada). E enquanto tenta convencer os
menos esclarecidos de que sua eleição é o passaporte para “o povo ser feliz de
novo”, Haddad terá de driblar os
ataques de adversários — vale lembrar que ele é investigado por corrupção passiva,
lavagem de dinheiro e associação criminosa e réu num processo que apura fraude
na construção de um dos trechos da ciclovia de São Paulo, uma das marcas de sua
gestão. Talvez isso não faça grande diferença para o eleitorado
de Lula, já que o molusco foi condenado e está
preso, mas Lula é Lula e Haddad é Haddad.
Voltando ao demiurgo de Garanhuns: Fachin enviou ao plenário virtual o recurso de sua defesa contra a
decisão de negar a suspensão de a condenação no caso do triplex no Guarujá. Isso
significa que o agravo será julgado remotamente pelos ministros, que terão sete dias para
proferir seus votos. Tramitam ainda no STF,
sob a relatoria do decano da Corte, uma petição que busca suspender a decisão
do TSE que barrou a candidatura do
ex-presidente — o que daria ao PT mais
uma semana de prazo para substituir a cabeça de chapa, coisa que, a esta
altura, não faz mais sentido — e uma apelação que ataca diretamente o
mérito da decisão do TSE. Um quarto recurso da defesa, que se insurge contra a não
concessão de um habeas corpus a Lula, já encontra no plenário virtual e
deve ter o julgamento concluído até amanhã.
Atualização: Celso de Mello negou o pedido da defesa para suspender a decisão do TSE que rejeitou o registro e barrou a candidatura de Lula à Presidência.
Atualização: Celso de Mello negou o pedido da defesa para suspender a decisão do TSE que rejeitou o registro e barrou a candidatura de Lula à Presidência.
Na última segunda-feira, em novo depoimento ao Ministério
Público, o ex-ministro Antonio Palocci reafirmou que “Lula
cuidou ‘diretamente’ de pedidos de propina”, que “a descoberta do pré-sal
causou um clima de ‘delírio político” no governo”, e que “Lula pediu vantagens indevidas diretamente”. Perguntado se foi a
partir da descoberta do pré-sal que o ex-presidente passou a atuar, a testemunha esclareceu que “Lula sempre soube
que tinha ilícito e sempre apoiou as iniciativas de financiamento ilícito de
campanha, etc. Mas no caso, no pré-sal, ele começou a ter uma atuação pessoal”.
Ainda segundo Palocci, Lula também atuou na obra de Belo Monte e na negociação de compra de caças para as Forças Armadas, chegando a assinar um protocolo com o então presidente francês Nicolas Sarkozi, atropelando uma negociação que vinha sendo conduzida pela área da Defesa e gerando todo tipo de propina. O ex-ministro disse ainda que Dilma, quando chefiou a Casa Civil, agia como Lula: “Ela insistia, inclusive usava muito que era uma ordem do presidente Lula, e fazia reuniões com os fundos na Casa Civil, forçando a barra para que os fundos investissem”.
Ainda segundo Palocci, Lula também atuou na obra de Belo Monte e na negociação de compra de caças para as Forças Armadas, chegando a assinar um protocolo com o então presidente francês Nicolas Sarkozi, atropelando uma negociação que vinha sendo conduzida pela área da Defesa e gerando todo tipo de propina. O ex-ministro disse ainda que Dilma, quando chefiou a Casa Civil, agia como Lula: “Ela insistia, inclusive usava muito que era uma ordem do presidente Lula, e fazia reuniões com os fundos na Casa Civil, forçando a barra para que os fundos investissem”.
Virando a página: na última segunda-feira o Comitê de Direitos Humanos da ONU reafirmou
que o Brasil deve garantir a Lula o
direito de disputar as eleições,
em consonância com sua decisão liminar de 17 de agosto. Assinaram a manifestação Sarah Cleveland e Olivier de Frouville, que foram consultados pela defesa do petista
para esclarecer a natureza das medidas provisórias emitidas pelo órgão. No
documento, ambos afirmam que a decisão liminar está em vigor até que o
mérito do pedido de Lula seja
analisado ou o Comitê decida de outra maneira.
Volto a lembrar que tal comitê é formado por
especialistas independentes, que monitoram a implementação, pelos Estados
partes, dos principais tratados internacionais de direitos humanos adotados
pela Assembleia Geral da ONU, mas atuando de forma independente da Organização. Sua decisões são consideradas meras recomendações, e outros governos estrangeiros já as ignoraram em diversas ocasiões
— no início do ano, por exemplo, a Espanha não cumpriu decisões desse comitê em
relação a políticos catalães que atuaram pela independência da região.
Observação: Mesmo não sendo fã de Jair
Bolsonaro, é-me impossível não reconhecer que assiste razão ao candidato
quando ele diz que, se for eleito, tirará o
Brasil da ONU. Textualmente: “Se
eu for presidente, eu saio da ONU.
Não serve pra nada essa instituição (...) É um local de reunião de comunistas e
gente que não tem qualquer compromisso com a América do Sul”.
É por essas e outras que nossa democracia está descendo pelo ralo. Como
bem pontou J.R. Guzzo em mais um
artigo lapidar, a democracia no Brasil,
se quisermos dizer a verdade em voz alto e sem perder tempo com muito
palavrório, está valendo cada vez menos hoje em dia. Sem dúvida, é um arranjo
provisório que só fica de pé porque ninguém ainda se organizou para jogar tudo
por terra.
Nossa democracia pode estar adulta, como dizem alguns, mas
sua idade mental no momento é de 3 anos. Quanto tempo ela ainda resiste até ir
para o espaço é difícil dizer. Pode demorar um tanto mais, um tanto menos. Para
a maioria dos brasileiros, porém, tanto faz — estão pouco ligando
para o assunto, e quando ligam é para torcer contra. Mas os que se dizem
democratas ou ganham a vida nos cargos, funções e atividades que a democracia
fornece, esses estão contribuindo ao máximo para que tudo vá o mais breve
possível para o buraco.
O que põe a existência da nossa democracia cada vez
mais em risco é a falta de lógica comum. Como é possível o país ter democracia se,
ao mesmo tempo, tem o ministro Edson
Fachin, um dos 11 monarcas que do STF? Ou se tem uma coisa ou a outra. Fachin é o que se poderia chamar de insegurança jurídica
ambulante — ou seja, o oposto do que um regime democrático precisa. Onde
está a lógica?
Dias atrás, num voto no tribunal eleitoral, o ministro passou duas horas inteiras torturando o português, a razão e a lei brasileira com
um alarmante teorema em favor da insanidade. Sim, dizia ele, não há nenhuma
dúvida legal que o ex-presidente Lula
é inelegível. Mas uma força superior, ainda segundo o conspícuo magistrado nos
disse, anula a lei nacional. Que força seria essa? Deus? Não: dois sujeitos que
fazem parte de um comitê de dezoito consultores da ONU em direitos humanos. Eles não têm nenhum poder
funcional — não são a Corte Internacional de Haia, a Agência de
Energia Atômica de Viena ou a Assembleia Geral. Não têm existência jurídica.
Não julgam nada, nem decidem nada; só dão pareceres, e acharam que Lula tem o direito de se candidatar à
Presidência. Mas só dois, entre dezoito, resolveram isso? Só dois. Ouviram os
dois lados — os advogados de Lula
e o Ministério Público Brasileiro?
Não. Só ouviram o lado de Lula. O
que decidiram representa uma posição oficial? Não; isso eles só vão dar no ano
que vem. Em suma: é uma insânia, e por isso mesmo o tribunal eleitoral negou
por 6 a 1 o pedido de Lula.
O espantoso é que tenha havido esse 1 a favor — justamente
o voto de Fachin. Nada do que ele
disse fez o mais remoto sentido. E se os dois consultores tivessem decidido que
o Brasil deveria invadir o Peru, por exemplo, ou restaurar a monarquia? Fachin acha que a gente seria obrigado
a obedecer, sob pena de ficar na ilegalidade internacional. Se um ministro da
nossa suprema corte defende um troço desses, não é possível ter a menor
confiança em nada do que o homem venha a decidir.
Argumentou-se, é claro, que o ministro não é sempre assim;
ao contrário, tem votado de maneira sensata. Mas aí é que está o problema: ele
pode surtar a qualquer momento, sem avisar ninguém, e dar outro voto igual a
esse — e não há absolutamente nada que se possa fazer a respeito.
Insegurança jurídica é justamente isso. Fachin
tem todo o direito a sua opinião pessoal, mas não desse
jeito, da mesma maneira que você não pode dizer: “Na minha opinião a Terra é
quadrada”. Isso não é opinião. Nem democracia.
Causa espécie, nessa e noutras histórias similares, a
ligeireza com que se aceita o espetáculo do circo pegando fogo. Os ministros se
acharam na obrigação de cumprimentar Fachin
por seu “brilhante voto”; ele, por sua vez, achou “brilhantes” os votos dos
seis colegas que massacraram cada palavra que disse. Todos acharam igualmente
“brilhante” a chicana de terceira categoria, amarrada com barbante, que a
defesa armou com essa comissão da ONU.
Brilhante por que, se é um completo disparate? Tudo isso causa a pior
impressão.
Nossos mais altos tribunais de Justiça parecem hoje
montepios de ajuda mútua, onde a solidariedade entre os sócios se pratica
através da puxação de saco automática e perene. Asinus asinum fricat (Google, pessoal!), poderiam dizer uns
aos outros — não são eles que gostam tanto de socar latinório em tudo
o que falam, para o público não entender nada? Pois então; eis aí um pouco de
latim para verem se está a seu gosto.
O STF é o retrato
vivo de uma democracia na UTI. Cada ministro, entre outros espantos, conta com
a assistência individual de um “capinha” (salário de até R$ 12 mil por mês,
mais horas extras) que lhe puxa a poltrona na hora de sentar à mesa. Pode uma
coisa dessas? Nem a Rainha Elizabeth II
tem um serviço assim — possivelmente, não existe nada parecido em
nenhum outro lugar do mundo. Mas os ministros acham isso normal, como acham
normal se autoconcederem um aumento de 16% nos salários diante de uma inflação
anual de 4%, bem como seus privilégios materiais, seus dois meses de férias por
ano, sua aposentadoria com vencimentos integrais e por aí afora. Isso é
simplesmente desigualdade. E como acreditar numa democracia onde a maior corte
de justiça vive abertamente com direitos individuais superiores aos dos
cidadãos que julgam? Pior: se o Judiciário está assim, imagine-se o resto.
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