sábado, 12 de outubro de 2019

NO PERU, AS MANOBRAS PARA ABAFAR A ROUBALHEIRA DA ODEBRECHT ABRIRAM O CAMINHO PARA O FECHAMENTO DO CONGRESSO E O BLOQUEIO DO SUPREMO. AINDA HÁ TEMPO PARA EVITAR QUE O MESMO OCORRA NO BRASIL

Ainda sobre o cochicho que virou bochicho (falo do "esqueça o PSL, esqueça Bivar"), Bolsonaro pode ou não deixar o partido pelo qual disputou as eleições presidenciais no ano passado, e que, de carona com sua popularidade, passou de uma legenda nanica, com um único representante na Câmara Federal, à segunda maior bancada da Casa, atrás somente do PT.

Se realmente o casamento terminar — o próprio Bolsonaro comparou o entrevero a uma "briga de marido e mulher", mas seu comentário fez com que essa divergência doméstica fosse ouvida por toda a vizinhança —, é possível que parte dos parlamentares pesselistas sigam o capitão e migrem para o Patriota — partido do qual nossa usina de crises já foi “pré-filiada” no passado.

Antes da campanha de 2018, o "mito" chegou a ser apresentado como candidato à Presidência pelo então PEN — Partido Ecológico Nacional —, que mais adiante trocaria o nome para Patriota. Mas a única ligação entre o então deputado e a sigla foi uma ficha “pré-datada”, com a filiação marcada para o dia 10 de março de 2018, assinada por hoje presidente desta banânia, que reconheceu o "noivado" e a "possibilidade de haver casamento". O romance azedou porque o capitão queria que Gustavo Bebianno assumisse o comando da campanha e que o partido desistisse da ação que abrira no STF contra o entendimento da Corte de permitir prisões de pessoas condenadas em segunda instância, chegando mesmo a dizer que não queria ficar conhecido por pertencer a uma partido que “acabou com a Lava-Jato”.

“Fiz das tripas coração para tê-lo com a gente, mudei o nome do partido, mexi no nosso estatuto, dei mais de 20 diretórios para o grupo dele. Mas você não pode ser convidado para entrar em uma casa e depois querer tomar ela inteira para você, expulsando seus moradores originais”, afirmou Adilson Barroso, dirigente do Patriota. Em dezembro de 2017, Bolsonaro passou a negociar com o PSL, e agora, ao que parece, chegou à fase do "foi bom enquanto durou".

Depois de 11 anos no exército — e de ter sido preso por 15 dias em 1986, após ter escrito um artigo publicado na revista Veja sob o título “O salário está baixo” —, o então capitão passou para reserva e ingressou na vida pública como vereador (na hipótese de não se eleger, pensou em trabalhar como limpador de casco de navio, aproveitando o curso de mergulho que fizera anos antes). Ficou dois anos na Câmara Municipal antes de vencer a primeira das 7 eleições para deputado federal que disputou. Em seus quase trinta anos como deputado do baixo clero, passou por 8 partidos (PDC, PPR, PPB, PTB, PFL, PP, PSC e PSL), respondeu a 7 processos por quebra do decoro parlamentar, apresentou 172 projetos e foi relator em 73 deles, mas conseguiu aprovar apenas dois. Foi escolhido presidente por 57.797.847 dos votos dos 147.305.155 brasileiros aptos a votar (47.040.906 escolheram o bonifrate do presidiário de Curitiba, demonstrando que, além de ser majoritariamente analfabeto, o eleitorado tupiniquim decididamente não cultiva o saudável hábito de pensar) graças a sua postura antipetista e à promessa de travar uma cruzada contra a corrupção na política.

O problema é que desde o ano passado a pecha de político corrupto pende como a espada de Dâmocles sobre o cocuruto de Flávio Bolsonaro, que até hoje não explicou diversas movimentações suspeitas em sua conta corrente e em cujo gabinete na Alerj abundam indícios de "rachadinha" (retenção, em benefício do parlamentar, de parte dos salários dos assessores e funcionários do gabinete) e de contratação de funcionários-fantasma, tudo sob a regência do Maestro-Gasparzinho Fabrício Queiroz, cujo paradeiro só a revista Veja descobriu e, segundo o presidente, está com a mãe de alguém, só não se sabe de quem.

A exemplo do encantador de jegues preso em Curitiba, Bolsonaro é um populista e, como tal, fascina uma significativa parcela da população — os Bolsomínions, que podem ser definidos como petistas atávicos com sinal trocado —, que parece não ver (ou não se importar) que seu "Messias" tem pés de barro. Afinal, ninguém sobrevive a 27 anos na Câmara Federal se for o baluarte da retidão, o exterminador da corrupção, o inimigo figadal a velha política. O capitão vendeu essa imagem, mas ela começou a derreter quando o MP-RJ começou a apertar o cerco em torno de zero um, e assim foi-se a carta-branca de Moro, suas medidas anticrime e anticorrupção e coisa e tal. Parafraseando o desembargador Abel Gomes, do TRF-2, em seu voto pela prisão do ex-presidente Michel Temer, "quem tem rabo de jacaré, couro de jacaré e boca de jacaré não pode ser um coelho branco".

Como disse Diogo Mainardi, o presidente está dividido entre o entre o acordão com o STF (e a necessidade de negociar com o sistema podre) e o impeachment dos ministros do STF (conflito aberto). Depois de devastar sua base eleitoral, traindo os antigos aliados, Bolsonaro deve se
acertar com o inimigo, cobrindo-o de regalias. Ao mesmo tempo, ele reconhece que o eleitorado bolsonarista repudia esse acordão, sobretudo quando ele é usado para esmagar a Lava-Jato. Para qual lado o mito vai pender? A resposta deve ser dada em 10 de novembro. A ala do bolsonarismo que defende o conflito aberto contra o sistema podre vai às ruas. Se até lá o STF já tiver inocentado Lula (anulando o processo do triplex) e soltado seus comparsas (abolindo o encarceramento em segundo grau), o capitão poderá tentar recuperar uma parte de seu eleitorado alimentando os protestos.

No Peru, as manobras para abafar a roubalheira da Odebrecht abriram o caminho para o fechamento do Congresso e o bloqueio do Supremo. Ainda há tempo para evitar que o mesmo ocorra no Brasil.

Sobrando tempo e havendo interesse, assista ao clipe a seguir, que explica a novela (mais uma) do não ingresso do Brasil na OCDE: