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sexta-feira, 8 de dezembro de 2023

A SAGA DOS VICES

 

Nesta quinta-feira, os EUA anunciaram exercícios militares na Guiana, o que foi interpretado por Maduro como uma provocação. No dia seguinte, o tiranete assinou uma série de decretos para transformar Essequibo num estado venezuelano, aumentado a especulação sobre a possibilidade de um conflito armado na fronteira com o Brasil. O ministro da Defesa, José Múcio, disse que o território brasileiro não será usado por tropas estrangeiras.

Após ser derrotado por Collor em 1989 e por FHC em 1994 e 1998, Lula venceu Serra (2002) e Alckmin (2006), fez sua sucessora em 2010, reelegeu-a em 2014, foi preso em 2018 e, em 2022, amancebou-se com seu mais novo amigo de infância para impedir a reeleição do pior mandatário desde Tomé de Souza

A maioria dos esclarecidíssimos eleitores tupiniquins compreendeu que se livrar do "mito" era fundamental, mas não entendeu que conceder um terceiro mandato ao ex-presidiário era opcional. Para piorar, 9 de cada 10 eleitores mal sabem o nome do segundo na chapa, e esse desdém pode resultar em encrencas de bom tamanho  como em 1985, quando o Brasil foi dormir com Tancredo Neves e acordou com José Sarney (foi o túnel no fim da luz, sintetizou o saudoso Millôr Fernandes).

No Brasil, vice-presidentes, vice-governadores e vice-prefeitos não são votados, vêm no pacote com os respectivos titulares. Sei de gente que ajudou a eleger um candidato apesar do vice de turno, mas não conheço uma viva alma que votou no titular por simpatizar com o reserva. 

Em 2018, mesmo dispondo de vasta vitrine televisiva, Alckmin não decolou. No modo desespero, recorreu a uma mensagem sincericida: "Pra vencer o PT e a sua turma no segundo turno, o candidato é Geraldo Alckmin, mesmo que você não simpatize tanto com ele." Mas não funcionou. Bolsonaro derrotou o bonifrate do então presidiário, pulou de volta no colo do Centrão, amancebou-se com o PL, comprou a eleição de Arthur Lira à presidência da Câmara e nomeou Ciro Nogueira para a Casa civil (ambos expoentes do Centrão e estrelas do Petrolão). 
 
Barão de Itararé ensinou que político brazuca é um sujeito que vive às claras, aproveita as gemas não despreza as cascas. Isso é prova provada de que o impossível é apenas uma palavra que contém o possível dentro de si. Em 2018, Bolsonaro, então candidato pelo PSL, queria compor uma chapa com Magno Malta, do PL, mas Valdemar Costa Neto preferiu entregar seu tempo de TV à coligação de Alckmin. Exagerando na teatralidade, o chefe do clã das rachadinhas agradeceu o adversário por "ter unido a escória da política brasileira."

É fácil entender o que levou Lula a "engolir" Alckmin como parceiro de chapa, difícil é saber por que o ex-tucano se sujeitou a esse patético papel, sobretudo depois de ter comparado uma eventual vitória do petista à "volta do criminoso à cena do crime". Como se explica esse formidável "cavalo de pau"? Por acaso se descobriu que a roubalheira nas gestões petistas não existiu? Que não houve dezenas de confissões de culpa e devolução de milhões em dinheiro roubado? Os processos penais contra Lula só foram anulados porque o STF formou maioria para excluir o crime de corrupção do código penal.
 
Se nada mudou e Lula não mudou nada, ou Alckmin é favor do chefe, ou é contra ele. Não dá para ficar em cima do muro. E da feita que ninguém se candidata a vice para fazer oposição ao titular, então deve ser a favor. 

Diante do fiasco da "terceira via", quem se deixou seduzir pela cantilena da Frente Ampla pela Democracia acreditou que Alckmin aceitou o papel de coadjuvante para "pôr trela" no protagonista . Mas tudo que o ex-tucano fez até agora foi compactuar bovinamente com a volta das invasões do MST, o comando dos empreiteiros de obras, o fortalecimento do Centrão, o roubo permanente na CEF e no BB, e por aí afora.
 
Lula e o PT nunca aceitaram — e jamais aceitarão  o "equilíbrio" com que sonham os analistas políticos. Podem até dar uns empreguinhos e outras esmolas a Alckmin e a seus acólitos, desde que o número 2 não mije fora do penico. Basta uma vista d'olhos na agenda oficial da vice-presidência para perceber que há pouco (ou quase nada) de empolgante no front. E tem sido assim desde a posse, mesmo durante as muitas viagens internacionais do titular. 
 
Sobre as três semanas de convalescença de Lula em outubro, Alckmin perorou: "Não há necessidade de o presidente se afastar do cargo porque vai ser um período curto, praticamente um final de semana, e depois ele despacha do Palácio do Alvorada. Na minha opinião, ele deve continuar, não há necessidade de nenhum afastamento do cargo".
 
Quando alguém está no buraco e o Universo lhe joga uma corta, esse alguém pode usá-la para sair do buraco ou para se enforcar. Aparentemente, Alckmin concluiu que se aliar ao antigo desafeto era a única maneira de ocupar, ainda que em caráter eventual, a tão cobiçada poltrona presidencial. Claro que sempre existe a possibilidade de Lula ser apeado do cargo ou bater as botas durante o mandato, mas isso é outra conversa. 
 
Num balé em que sujos se misturam a mal-lavados, quem olha de longe fica com dificuldade para distinguir quem é quem. Prevalece a impressão de que em política nada se cria, nada se transforma, tudo se corrompeA história ensina que é preciso prestar muita atenção na figura do vice. A primeira lição remonta ao século 19, quando Floriano Peixoto, vice de Deodoro da Fonseca, assumiu a Presidência depois que o titular foi "convidado a renunciar". Outros sete casos envolveram Nilo PeçanhaDelfim Moreira, Café FilhoJoão GoulartJosé SarneyItamar FrancoMichel Temer. 
 
Escolhido por Lula para disputar a vice-presidência na chapa de Dilma em 2010 e 2014, Michel Temer deu mais "peso" à candidatura do poste, mas se tornou o mentor intelectual e principal articulador do impeachment de madame. José Alencar, "eleito" vice-presidente em 2002 e 2006, foi um dos principais avalistas avalistas do petista junto à classe empresarial, mas não chegou a assumir a Presidência. O general Hamilton Mourão jamais conspirou contra Bolsonaro, embora não lhe faltassem motivos.
 
Não fossem os vices, haveria outros sucessores e outras formas de sucessão. E aqui chegamos a um ponto de relevância para um debate sobre a real necessidade dessa figura arcaica e anacrônica. Para o reserva é ótimo: rende palácio à beira do lago, mordomias e, em caso de infortúnio do titular, até a Presidência. Mas para o país inexiste demonstração de que essa peça não passa de mera decoração até virar um foco de conspiração.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2023

AINDA SOBRE TRAGÉDIAS E FARSAS...

 

Visando manter aquecida a poltrona presidencial até poder voltar a ocupá-la, Lula criou um "poste" e o vendeu como "gerentona eficiente". Mas a cria se revelou um conto do vigário no qual próprio criador caiuEntre 2013 e 2016, a economia brasileira encolheu 6,8% e o desemprego saltou de 6,4% para 11,2%. Foram ao olho da rua algo como 12 milhões de pessoas. Se Lula passou à história como presidente que fez a sucessora, Dilma se imortalizou como a criatura que desfez a obra do criador.

 

Dilma foi um arremedo de guerrilheira que jamais disparou um tiro — a não ser no próprio pé, ao se reeleger, devido ao tamanho da encrenca que herdou de si mesma. Jamais foi política e tampouco demonstrou vocação para gerir o que quer que fosse. Não obstante, com Dirceu e outras estrelas do alto escalão petista no xadrez e sem peito para levar adiante o "golpe via emenda constitucional" que lhe garantiria um terceiro mandato, Lula achou que ela seria mais fácil de manipular do que Marina Silva e, por “não ser política”, não se apegaria ao cargo. Só que a cria tomou gosto pelo poder e "fez o diabo" para se reeleger, azedando suas relações com o criador.

 

Dilma foi um Pacheco de terninho que, sem ter sido vereadora, virou secretária municipal; sem passar pela Assembleia Legislativa, virou secretária de Estado, sem estagiar no Congresso, virou ministra; sem ter inaugurado nada de relevante, posou de gerente de país; sem saber juntar sujeito e predicado, virou estrela de palanque; sem ter tido um único voto na vida até 2010, virou presidente do Brasil em outubro daquele ano e renovou o mandato quatro anos depois. Lula chegou a dizer — em off, naturalmente — que ele próprio foi a maior vítima de Dilma. Sua escolha feriu de morte a relação com Marina, que abandonou o governo em 2008 e o PT em 2009, e disputou a presidência pelo PV em 2010 — quando ficou em 3° lugar, com 19% dos votos válidos.

 

Dilma tinha o apoio de Lula e de marqueteiros de primeiríssimo time, como João Santana e sua mulher, Mônica Moura — ambos foram presos na 23ª fase da Lava-Jato e soltos mediante o pagamento de fiança no valor de R$ 31,4 milhões. Com as velas enfunadas por recursos milionários (oriundos, em grande parte, do propinoduto da Petrobras), o "poste" derrotou Marina no primeiro turno e venceu José Serra no segundo (por 46,91% a 32,61% dos votos válidos). Marina votou a disputar o Planalto em 2014 — primeiro como vice na chapa de Eduardo Campos, e depois como titular, já que o cabeça da chapa morreu num acidente aéreo a dois meses do primeiro turno. 

 

Mesmo tendo obtido 2 milhões de votos a mais que em 2010, Marina não conseguiu superar Aécio, que perdeu para Dilma no segundo turno por uma diferença de 3.459.963 votos válidos. Assim, superando a si mesma em incompetência, a cria de Lula pariu a maior crise econômica da história deste país e acabou penabundada do Planalto presidência em 31 de agosto de 2016. Graças a uma vergonhosa maracutaia urdida pelos então presidentes do Congresso e do STF, a gerentona de festim não teve os direitos políticos cassados por 8 anos, ao arrepio da Constituição e da Lei do Impeachment. 

 

Menos de 24 horas após ser notificada de sua deposição, a eterna estocadora de vento conseguiu se aposentar com o estipêndio mensal de R$ 5.189,82 ("teto" pago pelo INSS naquela época), embora o tempo de espera para conseguir atendimento na agência do INSS onde ela fez o pedido fosse de 115 dias. Uma sindicância aberta pelo Ministério do Desenvolvimento Social concluiu que a ex-chefa não só se valeu da influência de servidores de carreira do INSS para agilizar sua aposentaria como conseguiu o benefício sem apresentar toda a documentação necessária. 

 

Segundo a revista VEJA, no dia seguinte ao julgamento do impeachment o então ministro da Previdência Carlos Gagas e uma secretária pessoal de Dilma entraram pela porta dos fundos do posto do INSS, foram atendidos pelo chefe do local e em menos de 10 minutos o processo foi aberto no sistema e concluído de forma sigilosa. De acordo com a sindicância, Gabas usou sua influência no INSS para agilizar a concessão do benefício, e a servidora Fernanda Doerl calculou o tempo de serviço com base em informações fornecidas verbalmente, sem comprovação documental.

 

Resumo da ópera: Num país onde o desemprego é preocupante (para dizer o mínimo) e o salário-mínimo é de R$ 1.212,00 — quando deveria ser de R$ 6.641,58 segundo o DIEESE — o salário que a pior presidente da história desta bodega (noves fora o assassino de emas) dever receber é mais uma cusparada na cara do contribuinte brasileiro.

 

Triste Brasil. 

sexta-feira, 30 de setembro de 2022

ELEIÇÕES NO PAÍS DA CLEPTOCRACIA DE FATO E DE DIREITO

AtualizaçãoO debate de ontem — quiçá o mais medíocre da série pós-redemocratização — terminou com a vitória do eleitor que desligou a TV logo no primeiro bloco. Não valia a pena perder preciosas horas de sono, em plena quinta-feira, para assistir a uma briga de botequim patrocinada pelo suado dinheiro dos contribuintesTrocar insultos com o padre de Festa Junina dificilmente dará a Lula os votos que faltam para encerrar o jogo neste domingo. No mais, Simone saiu-se melhor do que Ciro na disputa pela terceira colocação. Bolsonaro ressuscitou o petrolão e exumou Celso Daniel  mas evitou se dirigir ao petista quando teve a chance de escolher a quem perguntar, preferindo o confronto através de enfadonhos direitos de resposta. Como bem disse Josias de Souza, quem ficou acordado depois de Pantanal para dar uma nova chance ao poder de sedução de Bolsonaro pode ter dificuldades em distinguir quem é quem nos trechos em que o capitão da direita e o coronel da esquerda acusaram-se mutuamente de ladrões. Triste Brasil.

***

Às vésperas do primeiro turno, Lula continua encabeçando as pesquisas. Os demais postulantes ao Planalto, a começar por Bolsonaro, buscam fazer da corrupção a marca registrada do petralha, evidenciar os defeitos dos adversários e enaltecer as virtudes que alegam possuir.  

Criado em 1980 com a promessa de "não roubar nem deixar roubar", o PT aparelhou o Estado para a prática da corrupção como nenhum outro partido na história recente do Brasil. Toda a administração direta e indireta foi encarregada de obter propinas fabulosas para eternizar Lula no poder e enriquecer seus acólitos, os aliados do Centrão e o falsos oposicionistas. O país foi transformado numa quadrilha a serviço dos corruptos — ou, como bem disse o jurista Modesto Carvalhosa (*), instalou-se no Brasil uma cleptocracia de fato, um governo voltado ao assalto aos cofres púbicos.
 
Sempre que é questionado sobre os crimes contra a administração pública cometidos por ele e seus apaniguados, Lula sai pela tangente. P
romovido de presidiário a ex-corrupto por uma sucessão de maracutaias jurídicas, alega que "a corrupção está presente qualquer governo", que a Lava-Jato a transformou "numa questão política para retirá-lo da vida pública", e que foi absolvido em 26 processos "pelo STF e pela ONU, na primeira e segunda instâncias". Balela.

Lula voltou ao cenário político depois que uma "epifania" revelou ao ministro Fachin que a 13ª Vara Federal do Paraná era territorialmente incompetente para processar e julgar o ex-presidente. Mas isso não muda o fato de que, desde a redemocratização, nenhum outro governo teve suas atividades político-administrativas tão voltadas à execução de um plano de corrupção como os de Lula e de sua sucessora.

Lula ajusta o discurso à conjuntura, indo da negativa absoluta ao reconhecimento (parcial) dos fatos, mas sempre com a ressalva de que "não sabia de nada". No auge do mensalão, ele insinuou que o caixa dois eleitoral era disseminado entre partidos, e que "o PT fez o que era feito sistematicamente no Brasil". Mais adiante, chegou a ensaiar um pedido público de desculpas. E, quando Duda Mendonça reconheceu que havia recebido pagamento da ORCRIM via caixa dois no exterior, queixou-se de ter sido "traído" e disse estar "indignado". 
 
Em 2010, Lula classificou a crise política de "tentativa de golpe". Depois que deixou o cargo, usou a vitória de Dilma para apregoar que o PT no poder era o remédio para todos os males. Em 2014, apoiou (a contragosto) a reeleição da pupila. 
Em 2018, em entrevista publicada no livro "A Verdade Vencerá", foi mais além: "Na verdade, nunca acreditei na história do mensalão. Essa foi a grande descoberta do século 21: de como a mídia poderia ser utilizada para criminalizar as pessoas antes da Justiça. A mídia tomou a decisão de, ao invés de esperar a Justiça criminalizar, transformar alguns líderes do PT em bandidos". 

Na bancada amiga do Jornal Nacional, Lula reconheceu que, se os envolvidos no esquema de corrupção confessaram, é porque houve corrupção, mas emendou uma comparação com os valores envolvidos nas emendas de relator do atual governo. Agora, na reta final da campanha, além de relativizar a corrupção nas gestões petistas, ele promete "a volta da felicidade para todos os brasileiros". 

Essa pretensa volta ao "passado feliz" traria (ou trará) a reboque o velho hábito petista de assaltar os cofres públicos, já que os quadros do partido continuam os mesmos, com seus líderes, tesoureiros e comparsas no setor privado (muitos dos quais foram condenados pela Lava-Jato, mas, como o próprio Lula, acabaram sendo soltos e recuperaram seus direitos políticos).  Não sobrou nenhum corrupto na cadeia — noves fora Sergio Cabral, que lá permanece por ter ameaçado denunciar altas figuras da magistratura em sua requerida e sempre negada delação premiada.

Para qualquer eleitor que tenha mais de 2 neurônios (um contra e outro a favor seja lá do que for), reeleger Bolsonaro está fora de questão. Mas a pergunta é: qual ambiente legal e institucional será encontrado pelos petistas numa eventual volta ao poder? 

Na Itália dos anos 1990, quando a Operação Mãos Limpas foi desmantelada, os eternos donos do poder levaram adiante o desmonte das instituições de combate à corrupção e criaram um arcabouço legislativo para punir que ouse combater corruptos antigos, atuais e futurosQualquer semelhança com esta banânia não é mera coincidência. 

Observação: Passados cinco meses do desembarque de Sergio Moro, Bolsonaro teve o desplante de dizer que acabou com a Lava-Jato porque não havia mais corrupção no governo. De lá para cá, ninguém mais foi condenado por corrupção. Os processos criminais foram anulados, os corruptos foram absolvidos e várias leis e outros tantos procedimentos orçamentários foram criados para proporcionar aos donos do poder, já na boca do caixa, a apropriação dos recursos públicosA estapafúrdia lei 13.877/2019ironicamente chamada de "minirreforma política", permite aos partidos usar o dinheiro do Fundo Partidário para construir sedes próprias, custear viagens de seus dirigentes e pagar honorários advocatícios a causídicos estrelados que os defendam em processos eleitorais e por corrupção.

Para desfazer o "mal estar" resultante da descoberta do esquema de propinas pagas por empreiteiras para financiar a reeleição dos parlamentares, criou-se um segundo fundo eleitoral, mediante o qual bilhões de reais abastecem as contas dos partidos para enriquecer seus dirigentes e filiados e garantir que as raposas continuem com a chave do galinheiro. Não bastassem as emendas parlamentares, R$ 16 bi foram servidos as parlamentares, só neste ano, via "orçamento secreto". Isso sem qualquer controle efetivo dos órgãos encarregados, enquanto o TCU se dedica a perseguir os antigos integrantes da extinta Lava-Jato. 

Para que não se volte a questionar os direitos patrimonialistas dos donos do poder de se apropriarem de recursos públicos, a Lei do Abuso da Autoridade estabeleceu a punição de até quatro anos de prisão para delegados, promotores e juízes que praticarem atos em desfavor de políticos "à falta de indício da prática do crime". Sem mencionar a Lei de Improbidade Administrativa, que isenta  os administradores públicos de qualquer punição, a não ser na (improvável) hipótese de restar provado que eles agiram com dolo.

Tudo indica que o Congresso continuará trabalhando em prol de um Estado Cleptocrático de Direito. Estará de parabéns o lulopetismo se vencer as próximas eleições, pois encontrará, na missão de restaurar seus velhos hábitos, um céu de brigadeiro.
 
(*) Modesto Carvalhosa é advogado e autor de Uma nova constituição para o Brasil: de um país de privilégios para uma nação de oportunidades (LMV)
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domingo, 14 de agosto de 2022

ERA UMA VEZ, NO PAÍS DAS MARAVILHAS...

 

Por ter exercido apenas cargos de gestão até 2010, Dilma adquiriu o hábito de mandar. No Planalto, incorporou novas "virtudes", como a soberba, a arrogância e a agressividade. Impaciente, queria tudo “para ontem”. Ignorante, posava de onisciente. Contrariada, atirava objetos nas pessoas — grampeadores eram repostos regularmente em seu gabinete. 


As folclóricas "pedaladas fiscais" foram apenas a justificativa mais à mão para o pé na bunda. A estrupícia foi defenestrada por não ter jogo de cintura no trato com o Congresso. Mas seu vice, que foi o grande mentor e o maior beneficiário do impeachment, tinha traquejo político de sobra. 

 

Caçula temporão de oito irmãos, Michel Miguel Elias Temer Lulia graduou-se em Direito pela USP em 1963 e ingressou na política no ano seguinte, mas só se filiou ao PMDB (hoje MDB), em 1981. Depois de ocupar os cargos de procurador-geral do Estado e secretário de Segurança Pública de São Paulo, o futuro vampiro do Jaburu foi deputado federal por seis mandatos e presidente do PMDB por mais de 15 anos. Em 2009, Temer foi o primeiro colocado entre os parlamentares mais influentes do Congresso. No ano seguinte, aceitou o convite de Lula para disputar a vice-presidência na chapa encabeçada por Dilma


No final de 2015, o nosferatu enviou à "chefa" uma carta (que ele próprio se encarregou de vazar para a imprensa) reclamando de ser um "vice decorativo" e dizendo que sempre teve ciência da desconfiança de Dilma e do PT em relação a ele e ao PMDB. Em resposta, a mandatária afirmou que “não via motivos para desconfiar um milímetro de seu vice, que sempre teve um comportamento bastante correto”, mas logo percebeu que estava enganada. 

 

Assim que a Câmara votou a admissibilidade do impeachment, Temer vazou um arquivo de áudio em que ele falava como se estivesse prestes a assumir o governo. No dia seguinte, Dilma esbravejou que "havia um golpe em curso, e que tinha chefe e vice-chefe" (referindo-se a Temer e a Eduardo Cunha, então presidente da Câmara). 


Madame foi afastada no dia 11 de maio e penabundada em 31 de agosto, quando então o "golpista" passou de presidente interino a titular. Os puxa-sacos de plantão convenceram-no a trocar o Jaburu pelo Alvorada, argumentando que "a mudança atribuiria legitimidade a seu mandato". E assim foi feito. Mas Temer voltou ao Jaburu depois de pouco mais de duas semanas; segundo ele próprio afirmou a VEJA, o Alvorada é assombrado


Como se vê, o Brasil é um país tão surreal que até vampiro tem medo de fantasma.

 

Inicialmente, a troca de comando foi como uma lufada de ar fresco numa catacumba. Depois de mais de 13 anos ouvindo garranchos verbais de um semianalfabeto e frases desconexas de uma destrambelhada, ter um presidente que não só sabia falar como até usava mesóclises foi um refrigério. Para além disso, Temer conseguiu reduzir a inflação, baixar a Selic e aprovar a PEC do Teto dos Gastos e a Reforma Trabalhista. Mas seu ministério de notáveis se revelou uma notável agremiação de corruptos. 

 

Em pouco mais de um mês de governo, caíram os ministros do Planejamento, da Transparência e do Turismo. O primeiro, Romero Jucá — que defendeu um pacto para “estancar a sangria” produzida pela Lava-Jato —, ganhou do presidente uma secretaria criada especialmente para evitar que ele perdesse o foro privilegiado.  Na sequência, caíram o Advogado-Geral da União e os ministros da Cultura e da Casa Civil (foi num apartamento deste último que a PF apreendeu R$ 51 milhões em dinheiro vivo, armazenados em malas e caixas de papelão). Temer se empenhou em preservar Eliseu Padilha e Moreira Franco, que, nas palavras de Joesley Batista, ajudavam o presidente a comandar “a quadrilha mais perigosa do Brasil”.

 

Temer almejava entrar para a história como “o cara que recolocou o Brasil nos eixos”. O sonho durou pouco. Depois que sua conversa de alcova com Joesley Batista foi revelada por Lauro Jardim, o presidente passou a ser lembrado pela célebre frase “tem de manter isso, viu”. O então procurador-geral Rodrigo Janot (outra aberração da natureza) ofereceu duas denúncias contra ele, que não se deu por achado: com a ajuda de sua tropa de choque (capitaneada Carlos Marun, o ridículo), montou sua tenda de mascate libanês na porta da Câmara e passou a oferecer cargos e verbas em troca dos votos das marafonas parlamentares. 


Observação: Nada muito diferente do que Lula tentou fazer durante o impeachment de sua deplorável sucessora. Mas o petralha malhou em ferro frio, e Temer conseguiu que a maioria do lupanar entoasse a marcha fúnebre enquanto as denúncias de Janot eram sepultadas.

 

Corta para julho de 2022:  Um petista habituado às negociações e articulações políticas afirmou em off que o ex-presidente estava propenso a trabalhar por uma aliança em torno de Lula ainda no primeiro turno, em detrimento da candidatura da senadora emedebista Simone Tebet. Como contrapartida, o vampiro pediu que o PT deixasse de se referir a ele como “golpista”. 


Apesar de ser um exímio estrategista, Temer não só deu com os burros n'água como provocou a ira de Dilma, a irascível, ao destacar durante uma entrevista que madame era “honestíssima”. Não use minha honestidade para aliviar sua traição”, reagiu a estocadora de vento, exsudando ressentimento. 


Embora pudesse render bons frutos eleitorais, a aliança era considerada improvável. Querer que o PT deixe de tratar o impeachment como um golpe seria exigir demais da patuleia.

 

Continua...

segunda-feira, 22 de novembro de 2021

DIVIDIR PARA NÃO CONQUISTAR

 

"Dividir para conquistar" é uma estratégia (utilizada por Júlio César, Felipe da Macedônia e Napoleão Bonaparte, entre outros) que consiste em fragmentar as forças inimigas para então derrotá-las. No Brasil contemporâneo, esse precioso ensinamento vem sendo desprezado pela assim chamada "terceira via", que parece incapaz (pelo menos até o presente momento) de se unir em torno de um nome que possa despachar para o quinto dos infernos as ambições da desprezível parelha Lula/Bolsonaro.

O PSDB ficou de ir "às urnas" neste domingo (o fato de eu ter escrito esta postagem na manhã ontem explica o tempo verbal) para decidir se será João Doria, Eduardo Leite ou Arthur Virgílio o tucano que pegará em lanças para derrotar a execrável dupla retromencionada. Para piorar, nada garante que os derrotados apoiarão o vencedor, e um racha no partido dificultará ainda mais a missão do emplumado que vencer disputa interna.

Os govenadores de SP e do RS se digladiaram numa campanha acirrada e com alguns ensaios de golpes abaixo da cintura, ao passo que o ex-senador, ex-prefeito de Manaus figurou como azarão — só o ego inflado e o fato de ser um dos caciques da sigla explicam sua participação na disputa. Com orçamento estimado em quase R$ 5 milhões — financiado pelo partido com recursos do Fundo Partidário (dinheiro público, em última análise) — essas avis rara percorreram todos os Estados em busca de apoio dos eleitores (pessoas que se filiaram ao PSDB até maio deste ano e se cadastraram para a votação até o último dia 15). Doria e Leite recorreram também a disparos em massa de mensagens.

ATUALIZAÇÃO: Problemas de instabilidade no aplicativo levaram o PSDB a suspender a votação eletrônica. Ainda não foi definida uma nova data para reabertura do processo para que todos os filiados que não puderam votar no pleito de ontem possam fazê-lo oportunamente. Para o grupo de Doria, o ideal seria abandonar de vez o aplicativo e ampliar o uso das urnas eletrônicas (cedidas pela Justiça Eleitoral e instaladas em Brasília, neste domingo, para as demais capitais e cidades com, no mínimo, 200 mil habitantes. Aliados de Leite, por sua vez, pregam usar cédulas de papel. Como se vê, tomar decisões é um grave problema para o tucanato. Sempre que houver mais de um banheiro no imóvel, tucano que é tucano mija no corredor!

Segundo a revista Veja, é a primeira vez que um partido faz prévias nacionais para a escolha do candidato. Tradicionalmente, as legendas escolhem a chapa por aclamação, em uma decisão dos presidentes e demais dirigentes de cada sigla. O PSDB, sempre em cima do muro (dizem que os tucanos são tão indecisos que mijam no corredor casa haja mais de um banheiro na casa) optou por um modelo em que todos os filiados puderam se inscrever para a votação, mas com votos tendo um peso diferente na apuração final. A adesão foi baixa: dos mais de 1,3 milhão de filiadas, apenas 39 mil fizeram o cadastramento.

E inegável que a disputa interna exacerbe as divergências pré-existentes na sigla, mas espera-se que os postulantes preteridos ponham de lado suas diferenças e apoiem o vencedor em prol do objetivo em comum, que é derrotar o verdugo do Planalto ou o pontífice da seita do inferno. Comenta-se à boca pequena que Leite e Virgílio são mais maleáveis do que Doria, que não abrirá mão de disputar a Presidência.

Oficialmente, o circo eleitoral começa em 16 de agosto do ano que vem, dez dias antes do purgativo "horário político gratuito" no rádio e na tv — gratuito no nome, pois quem paga a fatura desse anacronismo somos nós. Bolsonaro e Lula estão em campanha desde sempre. O capetão-cloroquina — que prometeu acabar com o instituto da reeleição e afirmou que não nasceu para ser presidente, mas, sim, para ser militar — fez da reeleição seu projeto de governo (ou de poder, melhor dizendo; governar que é bom, néris de pitibiriba). Já o ex-presidiário de Curitiba pulou do xilindró para o palanque, na certeza de que a suprema banda podre lavaria sua ficha imunda e transformá-lo-ia em "ex-corrupto", permitindo-lhe dispensar o bonifrate em 2022.

Não se sabe ao certo quantos serão os candidatos à Presidência no ano que vem, mas sabe-se que o único sem partido é o atual inquilino do Planalto. Nossa legislação eleitoral veda candidaturas avulsas, mas não faltam siglas para todos os gostos (são 33 partidos registrados no TSE e mais de 70 em "fase de formação").

Devido a de$entendimento$ com o laranjal de Luciano Bivar, Bolsonaro deixou o PSL em novembro de 2019 e vem buscando desde então um partido para chamar de seu. Depois que o "Aliança pelo Brasil" foi para a cucuia, o capitão passou a buscar uma quadrilha, digo, uma agremiação que o aceite e lhe dê a chave do cofre. O senador Flávio Rachadinha, príncipe herdeiro do sultão do bananistão, e que já passou pelo PP (duas vezes), PFL, PSC, PSL e Republicanos, migrou para o Patriota em maio com o objetivo de organizar a mudança do papai — que acabou não acontecendo.

Bolsonaro já arrastou a asa para o PP do senador Ciro Nogueira e do deputado-réu Arthur Lira e flertou com o Republicanos, sempre com Valdemar Costa Neto, babalorixá do PL, atuando nos bastidores. Ao final, o charme do mensaleiro e ex-presidiário conquistou seu coração, mas a troca de gentilizas ocorrida durante o feriadão da proclamação da República — com direito a "vá pra puta que pariu" e "vá tomar no cu, você e seus filhos" (gente fina é outra coisa) — resultou na suspensão do enlace.

Tudo indica que o casamento ocorrerá de um jeito ou de outro. Segundo o Messias que não miracula, suas chances de ingressar no PL eram de 99,9%. Trata-se não de uma paixão avassaladora, mas de simples pragmatismo: o noivo precisa formalizar a união para "governar" até 2022 e, eventualmente, evitar a cadeia, e portanto deve engolir o xingamento e aceitar as puladas de cerca de Valdemar com Lula — desde que, para manter as aparências, seu consorte evite traí-lo em público.

O affair de Bolsonaro com o Centrão soa como uma velha canção aos nosso ouvidos. Desde que foi expelido do quartel, em 1987, o capitão insurreto perambulou por oito legendas, todas de aluguel. Meses atrás, deu a chave do reino ao senador pepista Ciro Nogueira — que foi nomeado ministro-chefe da Casa Civil — e colocou o próprio destino nas mãos do também pepista deputado Artur Lira — o réu que preside a Câmara e mantém trancados a sete chaves cerca de 140 pedidos de impeachment. Assim, a intenção de se amancebar com a agremiação do mensaleiro e ex-presidiário Costa Neto um dos expoentes do Centrão, com atuação fisiológica ao longo de vários governos — não causa estranheza; pelo contrário: sua alteza irreal deve se sentir em casa entre as marafonas do PL

Com a terceira maior bancada da Câmara, o partido do ex-desafeto (a quem Bolsonaro chamou de corrupto e presidiário durante a campanha de 2018) abocanha fatias consideráveis de fundo eleitoral e tempo de TV, bem como tem razoável capilaridade: em 2020, elegeu 345 prefeitos, ficando em 6° lugar no ranking das legendas que mais elegeram representantes nas prefeituras. Assim, tudo leva a crer que o adiamento do “casamento” não passou de mero acidente de percurso.

Na última quarta-feira, Costa Neto "recebeu carta branca" de seus cupinchas para negociar a devolução do anel de noivado ao dedo do nubente. O problema (ou um dos problemas) é que o ingresso do capetão no partido impedirá (ou pelo menos dificultará) que lideranças do PL apoiem adversários do governo nas próximas eleições, e alguns caciques da sigla são unha-e-carne com Lula e administrações petistas no nordeste.

A récua de muares descerebrados que por alguma razão ainda levam fé na lisura do "mito" podem achar constrangedor ver seu amado líder dividindo espaço na legenda com notórios investigados e suspeitos de envolvimento em escândalos — como o próprio cacique da tribo, que foi condenado e preso no mensalão. Mas Bolsonaro sempre foi adepto das práticas da baixa política e amigo de milicianos. E ainda que assim não fosse, o que é um peido para quem está cagado? Noves fora os inquéritos a que o mandatário de fancaria responde (e que já o teriam apeado do cargo se esta banânia fosse um país sério), quatro de seus cinco filhos (a exceção é a caçula, que tem apenas 11 anos) são alvo de investigações.

A filiação ao PL não será um seguro contra traições, já que o partido sempre se notabilizou pela atuação fisiológica no Congresso e por gravitar no entorno de quem tem mais chances de vencer eleições. Suas carpideiras acompanham o caixão até a beira da cova, mas não pulam dentro dela junto com o defunto. Se Costa Netto resolver não lançar candidato próprio à Presidência no ano que vem, e essa decisão for tomada a partir de abril, quando o prazo de filiação partidária já tiver expirado, o verdugo do Planalto estará fora do pleito.

Receber Bolsonaro interessa ao mensaleiro porque anaboliza as chances do partido de aumentar a bancada no Congresso — que conta atualmente com 43 deputados e 4 senadores. O tamanho da bancada na Câmara é determinante na distribuição dos recursos dos fundos eleitoral e partidário, e se a escumalha que segue o capetão acompanhá-lo na mudança de sigla, Costa Neto será o morubixaba de uma das maiores tribos da nação tupiniquim. Mas é bom lembrar que, se Bolsonaro for derrotado nas urnas — possibilidade que se torna mais provável a cada dia —, o poder de negociação do partido com o futuro inquilino do Planalto ficará fragilizado.

Eleições presidenciais no Brasil costumam guardar semelhanças com os pleitos anteriores, mas, paradoxalmente, são as diferenças que acabam pautando os resultados. Para além disso, o imprevisto sempre pode ter voto decisivo na assembleia dos acontecimentos. Cito como exemplo a facada que o então candidato do PSL à Presidência levou em Juiz de Fora, a um mês do primeiro turno do pleito de 2018. Não fosse esse lamentável incidente, Bolsonaro não teria escapado de ser feito picadinho pela grandiloquência de Ciro Gomes nos debates televisivos (pode-se simpatizar ou não com o cearense de Pindamonhangaba, mas jamais menosprezar sua oratória.

Segundo o cientista político Murillo de Aragão, desde a volta das eleições diretas que algum grande tema vem prevalecendo, ora vindo do establishment político, ora como uma surpresa. Collor e Bolsonaro, ainda que solidamente incrustados no sistema, surgiram como surpresas para o eleitorado. FHC se viabilizou com o sucesso do Plano Real e foi eleito em 1994 e 1998, ambas as vezes no primeiro turno, graças ao poder que conquistou com o desempenho econômico e a fragilidade da narrativa de Lula, então seu maior adversário.

Em 2002, o picareta dos picaretas se firmou como “surpresa”, mesmo tendo mais de vinte anos de vida pública, e se elegeu na esteira dos equívocos dos barões do Tucanistão e de sua maneira desgastada de fazer política. A era lulopetista se estendeu por mais de 13 anos graças a uma combinação de fatores — entre os quais o desempenho econômico, que então avançava por águas mansas, com as velas enfunadas pelos ventos benfazejos soporados do exterior — que dificilmente se repetirá no médio prazo.

O capital político acumulado pelo petralha lhe assegurou a reeleição em 2006, a despeito do mensalão, e a eleição de sua nefasta sucessora em 2010 e 2014, a despeito da notável incompetência da desinfeliz. Mas então Bolsonaro surgiu do nada, como um rebento bastardo da Lava-Jato e da "descorrupção" que a força-tarefa de Curitiba produziu no establishment político. E a adesão do juiz Sergio Moro à campanha fez com que uma parcela considerável dos brasileiros apoiasse o "mito" — que, como não tardariam a descobrir, tinha pés de barro, calcanhares de vidro e culpa no cartório.

A incompatibilidade chapada entre bolsonarismo e o lavajatismo favorece o ex-presidiário convertido a "ex-corrupto", mas diz um velho ditado que toda araruta tem seu dia de mingau. As denúncias de corrupção endêmica que marcaram as gestões petistas certamente voltarão à baila durante a campanha, e poderão atrapalhar os planos do demiurgo eneadáctilo.

Como dito, todos os pleitos presidenciais desde a redemocratização foram abrilhantados por algum evento inesperado, que acabou afetando as campanhas. A pergunta que se coloca é: o que nos reserva a próxima eleição? The answer, my friend, is blowing in the wind. Mas isso não nos impede de fazer algumas conjecturas.

Até onde a vista alcança, o que se vislumbra é um "trisal" formado pela conjuntura econômica, pela pandemia e pelos índices de rejeição (repulsa?) aos dois primeiros colocados nas pesquisas de intenção de voto, mas a questão do combate à corrução poderá ser relevante para certos setores do eleitorado, podendo converter esse trisal num "ménage a quatre".

A economia estará atrelada ao consumo, renda, retomada das atividades e comportamento da inflação; a pandemia terá seu papel reforçado pelos "equívocos" do governo e o espantoso número cadáveres — potencializado pelo negacionismo de um mandatário psicopata.

Um cálculo mostra que, para cada vítima do vírus maldito (falo do SARS-CoV-2, não do negacionista), pelo menos 100 pessoas são afetadas emocionalmente, o que perfaz mais de 60 milhões de eleitores passíveis de ser influenciados por essa tragédia na hora de votar, ainda que a vacinação continue avançando e o número de mortes diminuindo.

A julgar pelas pesquisas, a substantiva rejeição reduziria a pó as chances de o atual inquilino do Planalto ter o contrato renovado, mas há que levar em conta que no Brasil até o passado é incerto. Por enquanto, o sumo pontífice da seita do inferno é beneficiado pelo recall positivo, mas, quando a campanha esquentar, todos os equívocos e as denúncias que marcaram as gestões do PT aflorarão como a merda que transborda de uma privada entupida quando um incauto aciona a descarga.

Ao fim e ao cabo, os três temas poderão servir de ponte para que um candidato alternativo transite com sucesso em meio à polarização, sobretudo se ele trouxer uma boa abordagem para o quarto tópico: o combate à corrupção. O que nos leva a Sergio Moro, cuja pré-candidatura já foi objeto de postagens recentes e voltará a sê-lo em meus próximos textos, já que este se estendeu mais do que eu pretendia.

quinta-feira, 19 de agosto de 2021

RECORDAR É VIVER

 

"A eleição de Jair Bolsonaro marca a ascensão ao poder de uma direita liberal na economia e conservadora nos costumes, num fenômeno que tem potencial para mudar profundamente o rumo político e social do Brasil pelas próximas décadas", comemorou a Gazeta do Povo em 31 de outubro de 2018.

Já o G1 publicou o seguinte:  "Candidato do PSL derrotou o petista Fernando Haddad no segundo turno, com 55% dos votos, e foi eleito o 38º presidente do Brasil. Capitão reformado do Exército e deputado federal desde 1991, Bolsonaro se elegeu com promessas de reformas liberais na economia e um discurso conservador, contrário à corrupção, ao PT e ao próprio sistema político."

Soando menos empolgado, o Estado de Minas assim se pronunciou: "As declarações controversas do deputado Jair Bolsonaro aos poucos se transformaram de piadas compartilhadas nas redes sociais em ideias defendidas por milhões de apoiadores. Em momento de grave crise política que o país atravessa, o capitão reformado do Exército se tornou porta-voz das insatisfações de grande parte da população."

Na mesma matéria, o especialista em marketing político Gaudêncio Torquato anotou: "Durante a campanha, Bolsonaro e sua equipe fizeram várias ações que deixam claro que ele não tem a intenção de unificar o país. Seu filho falou em fechar o Supremo, e ele falou sobre expurgar adversários políticos. [...] São falas preocupantes, mas Bolsonaro apostou nesse tipo de declaração ao longo de sua carreira política. A população brasileira continuará dividida a partir de 2019. E isso trará dificuldades ao governo de Bolsonaro. Seu maior desafio será conjugar uma política dura de contenção de gastos com o discurso populista de campanha. [...] Como militar, ele defende o nacionalismo e um Estado forte e intervencionista. Mas seu guru econômico, Paulo Guedes, é liberal e quer privatizar as estatais. Até onde poderá ir? Eletrobras? Petrobras? Bolsonaro também garante que reduzirá os ministérios, mas terá que enfrentar a realpolitik, em que os partidos querem abocanhar espaço em troca da governabilidade. Ele promete que não fará uma gestão compartilhada. Como será sua relação com o Congresso? Ou seja, pairam muitas dúvidas sobre nosso futuro."

Já este humilde escriba assim se manifestou (o texto a seguir condensa o conteúdo de três postagens que publiquei entre o final de outubro e o começo de novembro de 2018; para conferi-las na íntegra, selecione o ano e o  mês em questão no campo "Arquivos do Blog"):

Passadas apenas 30 horas da confirmação da vitória do candidato do PSL, seria no mínimo leviano conjecturar como será seu governo e como ele enfrentará os desafios que lhe serão impostos, sobretudo após eleição mais imprevisível, polarizada e conturbada desde a redemocratização. Mas é possível fazer algumas considerações. Isto posto, vamos a elas.

Depois que os militares voltaram para os quartéis e José Sarney assumiu a presidência — devido à morte de Tancredo Neves —, elegemos pelo voto direto Fernando Collor de MelloFernando Henrique CardosoLuiz Inácio Lula da SilvaDilma Vana Rousseff e Jair Messias Bolsonaro.

O pseudo caçador de marajás foi impichado e substituído pelo vice, Itamar Franco; o tucano FHC e os petistas Lula e Dilma se reelegeram, mas gerentona de araque foi impichada em 2016, quando então Michel Temer foi promovido a titular e encarregado de concluir o governo de transição cujas luzes se apagarão (melancolicamente) daqui a dois meses.

Num primeiro momento, o emedebista obteve relativo sucesso na missão, mas foi abatido em seu voo de galinha pela delação de Joesley Batista. Após fazer o diabo para se esquivar de duas denúncias por atos nada republicanos, aquele que almejava entrar para a história como "o cara que recolocou o Brasil nos trilhos do crescimento" será lembrado como o primeiro presidente denunciado no exercício do cargo pela prática de crimes comuns.

Ainda que aos trancos e barrancos — haja vista o mensalão, o petrolão e outros escândalos de rapinagem revelados pela operação Lava-Jato —, sobrevivemos a uma década e meia de lulopetismo. O retirante nordestino que passou de metalúrgico a líder sindical e, 22 anos após fundar o PT, a presidente da República, não só fez oposição sistemática a FHC, mas também lhe atribuiu uma fantasiosa "herança maldita" — na verdade, o caminho para o sucesso da primeira gestão do petralha foi pavimentado pelo governo do tucano, que, de quebra, lhe assegurou popularidade suficiente para eleger o "poste" que manteria aquecida a poltrona presidencial entre 2010 e 2014, quando poderia voltar a ocupá-la.

Hoje, até as emas do Alvorada sabem que os verdadeiros responsáveis pela derrocada brasileira, sobretudo no âmbito da economia, foram Lula, sua incompetente sucessora e a organização criminosa travestida em partido político e conhecida como PT. Mas o momento é de baixar a bola e resgatar a capacidade de lidar com os contrários.

A despeito da cizânia fomentada por Lula e seu "nós contra eles" assumir proporções gigantescas, notadamente depois que os seguidores de Bolsonaro passaram a retribuir a gentileza, não há, no Brasil, nem 50 milhões de "fascistas", nem 47 milhões de "comunistas".  A rigor, nem os votos recebidos pelos candidatos no último domingo são todos deles. Muitos eleitores que votaram no capitão não eram bolsomínions, simpatizantes nem admiradores de suas propostas, mas gente que não queria (e continua não querendo) ver o Brasil governado por um presidiário. Mutatis mutandis, esse raciocínio se aplica ao candidato derrotado, já que uma parcela significativa dos votos que ele recebeu veio de eleitores preocupados com a possibilidade de a vitória do deputado-capitão servir de "passaporte para a volta da ditadura militar". Sem mencionar que a rejeição a ambos atingiu patamares estratosféricos.

Nada disso teria sido necessário se, no primeiro turno, o "esclarecidíssimo" eleitorado tupiniquim tivesse apostado num candidato mais "de centro". Entre aquela trupe de show de horrores havia candidatos como João Amoedo, Henrique Meirelles e Geraldo Alckmin — aliás, o picolé de chuchu seria uma escolha natural, visto que PSDB e PT disputaram todas as finais dos campeonatos presidenciais de 1994 a 2014.

Mas agora é tarde, Inês é morta. Felizmente, no duelo épico entre "o bem e o mal" do último dia 28 (o que um e outro candidato representava dependia dos olhos de quem os visse) venceu o melhor — ou o "menos pior": Haddad na presidência seria Lula no poder e José Dirceu no caixa.

A vitória de Jair Messias Bolsonaro é um fait accompli, em que pesem as cinco ações em que o presidente eleito e o candidato derrotado se acusam mutuamente de abuso de poder econômico na campanha e pedem um a inelegibilidade do outro.

A ministra Rosa Weber, atual presidente do TSE, disse que as investigações têm um período de "instrução probatória" e o corregedor irá perceber necessidade de provas que definirão maior ou menor necessidade de tempo. Em outras palavras, a Corte pode chegar a uma decisão nos próximos dias ou nos próximos anos — basta lembrar que a ação movida pelos tucanos contra a chapa Dilma-Temer, depois da derrota de Aécio em 2014, só foi julgada em junho do ano passado.

Bolsonaro é réu no STF (decisão da 1ª Turma por 4 votos a 1, vencido o ministro Marco Aurélio) pelos crimes de injuria e apologia ao estupro. A ação, que foi aberta em 2016 e está em fase final, investiga o episódio no qual, em 2014 o deputado afirmou (na Câmara e em entrevista ao jornal Zero Hora) que a colega petista Maria do Rosário "não merecia ser estuprada porque era muito feia e não fazia seu ‘tipo’". 

Mais recentemente, outra denúncia contra Bolsonaro (desta vez por crime de racismo) foi submetida ao STF, mas o julgamento de seu recebimento foi suspenso pelo pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes, depois que os ministros Marco Aurélio e Luiz Fux votaram pela rejeição e Luís Roberto Barroso e Rosa Weber, pela aceitação.

Segundo a Constituição, "o Presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções". Isso significa que processos anteriores à posse terão sua tramitação suspensa até que o réu deixe o cargo de presidente.

Caso fosse condenado e a decisão transitasse em julgado antes da posse (o que é absolutamente improvável), há duas correntes de entendimento: na primeira, Bolsonaro teria os direitos políticos suspensos, o que impediria a posse; na segunda, crimes definidos em lei como de menor poder ofensivo (injúria, difamação, apologia ao crime etc.) não se enquadram no disposto pela Lei da Ficha-Limpa e, portanto, não acarretariam inelegibilidade. Mas parece ser unânime o entendimento de que "pelo bem da estabilidade política, o presidente eleito não deverá ser condenado antes da posse", e depois que ele assumir, o processo será suspenso.

Declarações polêmicas são a marca registrada de Bolsonaro, que, a exemplo de Ciro Gomes, não tem papas na língua e diz o que pensa antes de pensar no que vai dizer. Diz um ditado que "peixe morre pela boca", mas foi justamente essa postura, digamos, intempestiva, que conquistou dezenas de milhões de votos.

Já o PT usa a estratégia da vitimização. Ultimamente, isso tem funcionado apenas com a patuleia, que dada sua fidelidade canina a Lula e ao partido, não precisa ser convencida de nada.

Picuinhas à parte, a vitória de Bolsonaro reacendeu nossa esperança. Há uma luz no fim do túnel que, pela primeira vez em anos, parece não vir do farol da locomotiva. Claro que o presidente eleito terá um trabalho monstruoso pela frente, e será cobrado "por ter cachorro e por não ter". Um prenúncio dessa oposição ferrenha é a repercussão do convite feito a Sérgio Moro para a "superpasta da Justiça". Como se sabe, a facção esquerdopata pode não prestar como governo, mas é habilíssima como oposição, e certamente criticará tudo que Bolsonaro fizer, e pintará com as cores da aleivosia cada frase que ele disser.

Tudo somado e subtraído, importa, agora, resgatar a capacidade de lidar com os contrários, pois bolsonaristas, petistas, direitistas e esquerdistas são todos brasileiros. E cabe ao presidente eleito governar para todos os brasileiros.

Torçamos, pois, pelo melhor, e façamos votos de que Bolsonaro esteja à altura do desafio — que inclui uma economia em frangalhos, uma recessão cruel e um nível de desemprego em patamares indecentes (problemas que o PT e seus satélites atribuem candidamente a Michel Temer, mas que foram gestados e paridos no governo Dilma, de quem Temer foi vice de 1º de janeiro de 2011 até o momento em que a titular foi penabundada e ele assumiu o posto).

***

Faltam 14 meses para as próximas eleições gerais. Lamentavelmente, a menos que o imprevisto tenha voto decisivo na assembleia dos acontecimentos, teremos um repeteco da situação tenebrosa que nos foi imposta, nas eleições passadas, pela polarização, pela cizânia, pelo negacionismo e pela mais absoluta falta de bom senso  Se o pleito presidencial de 2018 foi um "plebiscito" (no qual o povo repudiou o lulopetismo corrupto), o de 2022 tem tudo para ser um “dilema atroz”. 

A menos que surja alguém capaz de unir os “nem-nem” (nem Lula, nem Bolsonaro), assistiremos impotentes a outro embate entre o lulopetismo corrupto e o bolsonarismo boçal — e sairemos perdendo, independentemente de quem vencer a eleição.

É fundamental (e urgente) refletir sobre tudo isso. Quem não mira o futuro está fadado a viver eternamente a repetição do seu passado.