sexta-feira, 15 de março de 2024

A VOZ DAS PESQUISAS  



Sempre desconfiei de pesquisas eleitorais, sobretudo quando elas são feitas com muita antecedência. Acerta o placar quem espera o apito final (e isso se o VAR não atrapalhar). Magalhães Pinto dizia que "política é como nuvem" e Ciro Gomes, que "eleição é filme e pesquisa é frame". Na melhor das hipóteses, elas são um "instantâneo" do humor do eleitorado num determinado momento, e isso se admitirmos que a opinião de 2 mil gatos pingados espelhe o pensamento de 150 milhões de eleitores.

Em 2018, todos os institutos davam de barato que Dilma seria a senadora mais votada, mas ela ficou em 4º lugar; que Bolsonaro perderia de qualquer adversário no segundo turno, mas ele venceu por uma diferença de quase 12 milhões de votos. Eduardo Suplicy, outro "eleito" por antecipação, foi penabundado após 27 anos de Senado; Geraldo Alckmin obteve menos de 5% dos votos, e Marina Silva, 1%. No Nordeste  tido e havido como o solo sagrado onde Lula realizaria o milagre da ressurreição —, o PT teve 10 milhões de votos a menos do que em 2014 e perdeu em cinco das sete capitais da região.
 
Lula começou a semana com a ressaca de opinião pública produzida pelas pesquisas Quest, Ipec (ex-Ibope) e Atlas. Embora simule tranquilidade, a petralhada exsuda bagos de preocupação. No segundo turno da campanha, chegou-se a falar na "sorte" de um país que dispunha de um líder popular com força para se contrapor ao obscurantismo antidemocrático de Bolsonaro. Depois de 15 meses de gestão, só um idiota não vê que a tal "frente ampla" que mandou o mito do arcaísmo para casa não foi capaz (e nem será) de desintoxicar a conjuntura nacional.
 
Confie-se ou no resultado das pesquisas, a impressão que fica é a de que Lula não consegue convencer o eleitorado de que "o Brasil voltou" para uma posição mais vantajosa do que sob Bolsonaro. O fato de o bolsonarismo se manter sólido evidencia que o petista não só é incapaz e conquistar eleitores do rival como vem se distanciando do eleitor mediano que ajudou a elegê-lo em 2022. Enquanto o alarme da impopularidade toca, seus operadores políticos tentam convencê-lo de que é preciso circular não no exterior, mas no Brasil. Mas a pergunta é: circular para quê? 
 
No primeiro ano de sua terceira gestão, Lula tentou passar uma borracha na era da destruição. Fechou a fábrica de demolição que seu antecessor instalou no Planalto, recriou programas de antigos governos petistas e colocou em pé o Desenrola. Mas o efeito positivo começou a se dissipar no oitavo mês, quando as linhas de aprovação e desaprovação iniciaram um processo de aproximação nas pesquisas.

O petista repete ad nauseam que foi perseguido e injustiçado, mas quem tem olhos enxerga o abismo que separa a anulação de sentenças do conceito de inocência. Saltam aos olhos dois fatos: 1) A Lava-Jato exorbitou, mas a corrupção confessada e ressarcida não é uma obra de ficção; 2) Lula não foi absolvido nos vinte e tantos processos abertos contra ele; foi "descondenado" porque maioria das ações foi anulada ou arquivada pela prescrição resultante do deslocamento de Curitiba para Brasília.
 
O PT e seu pontífice demoram a perceber que o câncer da corrupção não será extirpado com discursos. Numa fase em que a tentativa de rescrever a história inclui as canetadas com que o ministro Dias Toffoli anulou multas bilionárias que empresas concordaram em pagar após confessarem seus crimes, a parcela minimamente pensante do eleitorado pede argumentos compreensíveis, não lero-lero político. 

Lula disse que as pesquisas servem como "instrumento de ação e de mudança da sua estratégia de governo", mas suas ações sinalizam uma opção preferencial pela inação e pela perseverança no erro: "A gente tem de entendê-la como uma fotografia em função do momento em que você está vivendo...". Eleito por pequena margem com um discurso de "pacificador", sua excelência chega a um ano e três meses de governo perdendo apreço até entre seus eleitores mais tradicionais, mas continua insistindo que "a polarização é boa se a gente souber trabalhar os neutros para que a gente possa criar maioria e governar o Brasil." 
 
Lula confunde alhos com bugalhos quando lembra que o país foi polarizado durante décadas pelas disputas entre PSDB e PT
Quando perdeu a eleição, José Serra parabenizou o adversário. FHC presenteou-o com uma transição de mostruário, passou-lhe a faixa e foi para casa. Bolsonaro sonegou ao país o reconhecimento da derrota, tramou uma virada de mesa, estimulou o acampamento que pedia intervenção militar na frente do QG do Exército e foi assistir desde a Flórida à intentona de 8 de janeiro e agora percorre a conjuntura à procura de encrenca. Na era da polarização PSDB X PT, o bico mais afiado da oposição no Congresso era o de Tasso Jereissati, um oposicionista de punhos de renda. Hoje, Lula rala uma oposição protagonizada por gente como Nikolas Ferreira, um guerrilheiro de redes sociais. 

Sobre a má avaliação da economia, Lula disse: "Até agora, preparamos a terra, aramos, adubamos e colocamos a semente. Cobrimos a semente. Este é o ano em que vamos começar a colher o que plantamos". Foi como se ecoasse o Delfim Netto da ditadura, época do "milagre econômico": "Antes de repartir o bolo, é preciso esperar que ele cresça." Se observasse o "filme" exibido pelas pesquisas, o presidente perceberia que as curvas da aprovação e da desaprovação aproximam-se desde agosto do ano passado. 
 
No corredor da existência, a paciência fica sempre na primeira porta. Convém a um governante bater de leve, sob pena de enfurecê-la. Lula exagera nas batidas. Se esperasse um pouquinho mais, talvez começasse a pensar antes de falar.

Com Josias de Souza

quinta-feira, 14 de março de 2024

A MÁQUINA DO TEMPO DE RON MALLET

O TEMPO É O GRANDE LADRÃO DA MEMÓRIA.


A espada de Dâmocles que pende por um fio sobre o senador Sérgio Moro pode cair no dia 1º de abril. Lula afirmou que só vai sossegar depois que foder o ex-juiz que o condenou, mas disse que a provável cassação de seu algoz é um erro político. Pode parecer um contrassenso, mas não é. Lula vê Moro como um morto-vivo no Congresso, um senador sem qualquer influência, mas receia que sua cadeira seja conquistada extrema-direita bolsonarista. Imagina-se que a ex-primeira-dama Micheque pode seja a "sujeita oculta" do temor presidencial. 


De acordo com o astrofísico Ron Mallet, é possível usar o laser para formar um "feixe de luz circundante" capaz de produzir uma curvatura no espaço-tempo e, através desse "túnel", voltar ao passado ou avançar para o futuro. 


Em entrevista à CNN, o cientista ensinou que gravidade não é uma força, mas uma dobra feita no espaço por objeto massivo, e ecoou Eistein sobre o espaço-tempo poder ser distorcido pela matéria. Mas sua teoria não entusiasmou a comunidade científica, que até admite a possibilidade (teórica) de viajar para futuro, mas não de retornar ao passado. 

 

O desejo de reencontrar o pai, morto quando Mallet tinha 10 anos, despertou seu interesse do físico pela viagem no tempo. Ele construiu "uma respeitável carreira acadêmica" estudando os buracos negros e a teoria da relatividade geral, mas reconhece que sua "máquina do tempo" ainda não foi comprovada na prática, e que existem desafios significativos a serem superados  entre os quais a necessidade de criar fontes de energia extremamente poderosas e materiais capazes de suportar as enormes forças geradas pela rotação do anel laser.


Podemos comparar o passado a um lugar distante para onde gostaríamos de viajar, mas as viagens "de verdade" dependem basicamente de quanto podemos gastar, enquanto uma visita a tempos idos esbarra nas leis da física. Sabe-se que o tempo acelera e desacelera conforme a velocidade com que um objeto se move; a uma velocidade próxima à da luz, o tempo passa mais lentamente para o viajante do que para quem ficou na terra, como ilustra o paradoxo dos gêmeos (que foi comprovado experimentalmente com o uso de relógios atômicos em aviões). 


De acordo com o astrofísico Paul Sutter, voltar ao passado é admissível à luz da teoria da relatividade geral. Em sua concepção, o tempo é a progressão aparente dos eventos do passado para o futuro, numa evolução que parece ser contínua e irreversível. Einstein teorizou que a experiência do fluxo do tempo é relativa (dependendo do observador e da situação), contrariando a ideia do “relógio mestre” de Newton, que mantinha o tempo sincronizado em todo o universo. 


Observação: Na relatividade especial, publicada em 1905 no artigo "A Eletrodinâmica dos Corpos em Movimento", Einstein escreveu que relógios em movimento funcionam lentamente, que quanto mais rápido nos movemos no espaço, mais lentamente progredimos no tempo, e quanto mais próximos da velocidade da luz estivermos, maior será esse efeito (vale destacar que dois relógios atômicos posicionados em alturas diferentes produzem medições diferentes, ainda que a diferença de altura entre eles seja de alguns milímetros).

 

Faltam explicações mais concretas e consensuais para a possibilidade de viajar no tempo. Um vídeo em que se vê uma bola a subir e cair no solo está na ordem correta ou inversa? Não se sabe. A maioria das leis e equações usadas pelos físicos é simétrica no tempo e, portanto, pode ser revertida. Mas aí entra o conceito de entropia — uma espécie de medida da desordem das partículas num sistema físico, que parece respeitar um fluxo de tempo. Curiosamente, basta alguém teorizar sobre viagens no tempo para uma parte da física vir e acabar com a festa. No caso em tela, a estraga-prazeres é 2ª lei da termodinâmica, segundo a qual entropia aumenta sempre num sistema fechado, e essa evolução não pode ser revertida

 
Falhas na teoria de Mallet foram expostas por Ken D. Olum e Allen Everett, do Departamento de Física e Astronomia da Tufts University, mas nem tudo são críticas. No livro "Como construir uma máquina do tempo", o 
escritor britânico de ciência Brian Clegg afirmou que nem todos concordam que o dispositivo planejado pelo astrofísico americano poderia funcionar, mas essa possibilidade é interessante o suficiente para que se promova uma tentativa experimental.

 
Mallet vem tentando conseguir fundos para realizar mais experimentos, mas deixa claro que "não é como no cinema; não vai acontecer depois de duas horas, ao custo do que você paga pelo ingresso". Quando perguntado sobre as implicações éticas de voltar ao passado, ele cita o filme de 1994 "Timecop — O Guardião do Tempo", no qual Jean-Claude Van Damme interpreta um policial que trabalha para uma agência que regulamenta viagens no tempo. W se diz fã do filme “Interestelar”, que lida com ideias sobre como o tempo impacta pessoas no espaço diferentemente de pessoas na Terra e cujo embasamento científico foi alavancado pelo envolvimento do Nobel de física Kip Thorne.

Às vésperas de completar 79 anos, Mallet dificilmente conseguirá voltar fisicamente à Nova York dos anos de 1950, mas, graças à magia do cinema, ainda pode ter um vislumbre do passado onde sonha em encontrar o pai uma última vez.  

quarta-feira, 13 de março de 2024

NÃO HÁ NADA COMO O TEMPO PARA PASSAR... (FINAL)


O tempo passou, os ventos mudaram e subproduto da escória humana que elegemos em 2018 tornou-se o pior mandatário desde Tomé de Souza e o primeiro desde a redemocratização que tentou a reeleição, mas foi barrado nas urnas. 

Confirmada sua derrota, o "mito" dos "patridiotas" se encastelou no Alvorada até a antevéspera da posse do sucessor, quando então fugiu para a Flórida (EUA) e se homiziou na cueca do Pateta por 89 dias, esperando o desenrolar dos acontecimentos urdidos em solo pátrio por seus comparsas golpistas. Acabou que o golpe não prosperou, a Hora da Verdade chegou e o depoimento do general Freire Gomes tornou sua prisão questão de "quando". 

Ao contrário dos demais fardados que participaram da intentona golpista (e do próprio Bolsonaro), o ex-comandante do Exército respondeu todas as perguntas dos agentes federais. Nas palavras de um ministro do STF, seu depoimento é mais valioso do que uma delação, pois contém revelações de uma testemunha, não de um criminoso à procura de benefício judicial.

ObservaçãoMauro Cid deixou a PF no início da madrugada de ontem, após depor por quase 9 horas. O conteúdo está sob sigilo, mas sabe-se que ele responderia todas as perguntas. Durante os atos de 25 de fevereiro, Bolsonaro disse que "golpe é tanque na rua", e que vinha sendo acusado de golpe por causa de "uma minuta de um decreto de estado de defesa". Como se costuma dizer, o peixe morre pela boca.
 
Ninguém é mais responsável do que Bolsonaro pela merda que o Brasil virou nos últimos anos (não que antes fosse muito melhor). Mas nenhum politico com cargo eletivo brota no gabinete por geração espontânea. Pelé e o general Figueiredo já alertavam para o risco de misturar brasileiros com urnas em pleitos presidenciais. Não obstante, melhor do que simplesmente acusar é conscientizar essa choldra de que políticos não devem ser endeusados, mas cobrados e descartados quando mijam fora do penico. 
 
A polarização esteve presente em todos os capítulos da nossa história, mas ganhou vulto quando Lula plantou a semente do "nós contra eles
— que a rivalidade entre mortadelas e coxinhas regou e  "mico" e seus miquinhos estercaram durante a campanha de 2018. Churchill lecionou que a democracia é a "pior forma de governo, exceto todas as demais", mas pontuou que "o melhor argumento contra a democracia é cinco minutos de conversa com um eleitor mediano". 

Anthony Downs ensinou que "ganha a eleição quem conquista o eleitor mediano", e esse teorema vicejou no Brasil de 1994 até 2014, quando então a reeleição da Mulher Sapiens levou a dicotomia da política para as ruas. 
 
Observação: Desde 2018 que o eleitorado tupiniquim está com a polarização e não abre. E nem bem vestiu a faixa pela terceira vez, Lula arregaçou as mangas e pôs-se a trabalhar pelo retorno do bolsonarismoDe janeiro de 2023 para cá, o matusalém petista e sua cuidadora passaram 70 dias excursionando por 26 países de 4 continentes

Imbuído da certeza de que foi "descondenado" e eleito para ocupar o cargo de Deus, Lula estendeu o tapete vermelho para Nicolás Maduro, acomodou Dilma na presidência do Banco do Brics, indicou para o STF seu amigo e advogado Cristiano Zanin e seu ministro comunista Flávio Dino, chamou da suprema aposentadoria o velho companheiro Ricardo Lewandowski, pegou em lanças contra o presidente do BC e sabotou Haddad ao declarar que a meta fiscal não precisa ser zero

No ano passado, quando uma "pneumonia leve" o obrigou adiar uma viagem à China, Lula disse que estava poupando a voz para o encontro com Xi-Jinping. O detalhe é que nem líder chinês fala português, nem o brasileiro fala mandarim (na verdade, ele não domina sequer o idioma de Camões). 
 
Do alto do seu ego colossal, o Sun Tzu de Atibaia não viu nada de mais no fato de a ministra Anielle Franco requisitar um jatinho da FAB para assistir a um jogo de futebol. Demorou a penabundar a ministra Daniela Carneiro que se envolveu numa esquisita relação eleitoral com milicianos). Manteve no cargo o ministro das Comunicações que usou dinheiro de emendas parlamentares em benefício de sua fazenda no Maranhão, empregou funcionário fantasma no Senado e autorizou o sogro a usar o gabinete ministerial para "despachos informais". 

Em março de 2023, Lula disse que só ficaria bem depois que "fodesse Sérgio Moro". Dias depois, classificou de visível armação um plano do PCC para matar o ex-juiz. No mês seguinte, afirmou que a Ucrânia era tão culpada quanto a Rússia pela guerra no leste europeu. Em julho, agradeceu a África pelo que foi produzido durante a escravidão no Brasil. No final do ano, trombeteou que a ação dos israelenses é tão grave quanto o ataque desfechado pelo Hamas; no mês passado, comparou a ação israelense em Gaza ao Holocausto. 
 
Lula já disse que ditadura na Venezuela é mera "narrativa" e que "o conceito de democracia é relativo". Agora, excursiona pelo mundo da Terra Plana ao comparar os ataques de Bolsonaro ao sistema eleitoral com a resistência da oposição venezuelana ao jogo de cartas marcadas: "Espero que as pessoas que estão disputando as eleições [na Venezuela] não tenham o hábito de negar o processo eleitoral, as urnas, a Suprema Corte." 

Nosso estadista de fancaria compactua com a farsa da recondução de um tiranete que se mantém no poder por duas décadas e meia graças à manipulação de regras, ao aparelhamento de instituições, à violação de direitos humanos, a corrupção das Forças Armadas, à asfixia a imprensa, à prisão de opositores e à inabilitação de adversários. Um déspota que preside uma ruína que resultou no êxodo de 7 milhões de venezuelanos — boa parte dos quais buscam socorro no Brasil. 

Observação: Noutros tempos, a postura de Lula seria vergonhosa; à luz da conspiração golpista do 8 de janeiro, ela não só ofende quem se juntou ao petismo em 2022 na folclórica "frente ampla" como desnorteia líderes mundiais que deram crédito ao bordão segundo o qual "o Brasil voltou" e agora se perguntam: "Voltou para onde?" Ao pular na frigideira de Maduro, o reizinho carboniza os "valores" que lhe renderam a terceira (e queira Deus que seja a derradeira) passagem pelo Palácio do Planalto.
 
A exemplo de seu antecessor, Lula se tornou refém do Centrão. Quando Lira rosnou que "o Orçamento é de todos, não do Executivo", comprometeu-se a liberar R$ 20 bilhões em emendas a tempo de os parlamentares faturarem politicamente nas eleições de outubro. Após exaltar o óbvio dizendo que Bolsonaro "tentou dar um golpe e sabe que pode ser preso", feriu de morte o transporte por aplicativo enviando ao Congresso um estapafúrdio projeto de lei que "regulamenta" esse tipo de serviço.

A esquerda brasileira é mais atrasada que o Coelho Branco. Parou no tempo nas relações trabalhistas, perde tempo com Maduro e demora a perceber que fazer política como fazia há 20 anos não funciona mais. Parece não ver que o petista subiu a rampa pela terceira vez não por seus méritos, mas pelos deméritos do imprestável que o antecedeu. 

Em 15 meses de (terceira) gestão, Lula não conseguiu reverter a fratura da polarização. Seus índices de desaprovação cresceram no Sul e no Sudeste e os de aprovação diminuíram até no Nordeste. Quem lê as estrelinhas percebe que o gosto pela raiva leva "o cara" de Barack Obama a esquecer que não foi eleito para passar quatro anos passeado e falando mal de um antecessor inelegível. 

Lula permanece acorrentado a uma agenda tóxica que inclui chutar Bolsonaro, afagar o imperador da Câmara e aplacar a celeuma que criou ao encostar o holocausto em Gaza. Por mal dos nossos pecados, noves fora algum ponto fora da cura, ainda lhe restam quase 30 meses para mostrar serviço e mudar de assunto antes do próximo pleito presidencial.
 
Triste Brasil.

terça-feira, 12 de março de 2024

SÃO AS ÁGUAS DE MARÇO FECHANDO O VERÃO...

É A PROMESSA DE VIDA NO TEU CORAÇÃO.

Tarcísio de Freitas é mineiro de Três Corações, mas foi eleito governador de São Paulo pela extrema-direita bolsonarista. No último dia 25, ao discursar na mais paulista das avenidas ao lado do padrinho inelegível e prestes a ver o Sol nascer quadrado, o afilhado se uniu a uma boçalidade. Semanas depois, ao enviar ao legislativo estadual um projeto que cria uma centena de escolas cívico-militares, bateu continência para uma temeridade. As tais escolas serão tocadas pelas secretarias da Educação e de Segurança Pública, comandadas, respectivamente, por Renato Feder, cuja iniciativa mais relevante foi desistir da ideia de tirar São Paulo do programa de livros didáticos do MEC, e pelo capitão Guilherme Derrite, ideólogo da estratégia da matança implementada pela PM na Baixada Santista. Ao afirmar que escolas militares agregam ao ensino "civismo, brasilidade e disciplina", o governador finge não notar que foi justamente esse tipo de pedagogia que resultou na intentona do 8 de janeiro. Ao ecoar no Palácio dos Bandeirantes os mesmos ruídos que Bolsonaro produzia no Planalto, Tarcísio parece não perceber que o tambor faz muito barulho, mas é vazio por dentro, e que esse "vazio" resultou na derrota do "mito" em 2022.

A canção "Águas de Março", composta por Tom Jobim em 1972, fala que a chegada do outono traz a promessa de renovação e esperança, talvez porque as consequências trágicas das tempestades de verão se repetem ano após ano. Os telejornais exibem cenas surreais (e alguns parecem se comprazer em exibi-las, diga-se), com botes atravessando ruas e avenidas, carros submersos ou sendo arrastados pela correnteza, árvores caídas, imóveis inundados, moradores reclamando da falta de energia elétrica, e por aí vai. Embora as "tempestades de verão" sejam chamadas assim porque são comuns na estação mais quente do ano, temporais precedidos ou acompanhadas de relâmpagos, rajadas de vento e granizo podem ocorrer em qualquer estação. 

O Brasil é o pais com maior incidência de raios no mundo. O "raio" é uma descarga elétrica atmosférica caracterizada pela emissão de luz e calor. Já o "trovão" (que pode alcançar 120 dB) é o som resultante do aquecimento do ar pela corrente elétrica, e o "relâmpago", a luz emitida quando o raio flui entre nuvens, entre uma nuvem e o solo ou entre o solo e uma nuvem. A tensão varia de 100 mil volts a 1 milhão de volts, a amperagem vai de 20 mil a 200 mil ampères, e a temperatura pode superar em 5 vezes a temperatura da superfície do Sol. O potencial energético de uma tempestade elétrica equivale ao de uma bomba atômica; a diferença é que o artefato libera tudo numa fração de segundo e o corisco a distribui por vários minutos a algumas horas.

 

Observação: É mito que os raios não caem duas vezes no mesmo lugar. O Cristo Redentor, por exemplo, que fica no alto do Corcovado (RJ), é atingido seis vezes ao ano, em média.

 

Quando atingem a rede elétrica, os raios causam sobretensões que podem torrar (literalmente) a fiação dos imóveis e danificar aparelhos elétricos e eletroeletrônicos num raio (sem trocadilho) de muitos quarteirões (daí a importância do aterramento e do uso de tomadas de três pontos). Em caso de falta de energia, recomenda-se desconectar os aparelhos das tomadas e tornar a ligar somente quando o fornecimento for estabilizado. Quando a energia volta, podem ocorrer picos de tensão que chegam facilmente a 500V. Apagões intermitentes (quando a luz acaba, volta e torna a acabar) podem causar quedas de fase (situação em que as lâmpadas acendem, mas ficam fraquinhas) e danos a eletroeletrônicos sensíveis (como modem, roteador, decoder de TV etc.). 

 

Algumas regiões do país vêm sendo castigadas por chuvas bem acima da média para esta época do ano. Num mundo ideal, bastaria consultar a previsão do tempo para evitar compromissos nos horários críticos, mas não vivemos num mundo ideal, e a despeito do avanço da tecnologia nas últimas décadas, continua chovendo em piquenique de meteorologista (Narciso Vernizzi, o "Homem do Tempo" da Jovem Pan, tornava quase infalíveis seus boletins estimando em 50% as possibilidades de "chuvas em pontos isolados"). 


Observação: Se você mora num dos 645 municípios paulistas, envie um SMS com CEP da sua rua para o número 40199 e a Defesa Civil lhe enviará um alerta (também por SMS) sempre que houver previsão de temporais para sua região. 

 

Via de regra, os temporais desabam do meio para o final da tarde, após a temperatura atingir a máxima do dia. Céu escuro, nuvens negras, formigamento na pele e pelos eriçados nos braços são indícios de tempestade elétrica. Se você estiver andando pela rua quando São Pedro abrir as comportas do céu, procure abrigo numa padaria, farmácia, mercado ou outro estabelecimento qualquer. Se estiver de moto ou bicicleta, pare num posto de combustíveis e espere a chuva passar. Ne carro, reduza a velocidade, aumente a distância do veículo da frente, acenda os faróis baixos, acione o limpador de para-brisa e o desembaçador traseiro, ligue o ar-condicionado, regule a ventilação forçada para a velocidade máxima e direcione os defletores para o para-brisa. 


Observação: Se seu carro não tem ar-condicionado nem ventilação forçada, Sr. Flintstone, não há como não se molhar, pois será preciso deixar uma fresta de dois dedos nas janelas para minimizar o embaçamento. Se necessário (e costuma ser necessário), limpe o para-brisas de tempos em tempos com um pano seco  jamais passe a mão no vidro, ou a gordura da pele irá agravar o problema). Substitua as palhetas dos limpadores regularmente e mantenha-as sempre limpas. Verifique se os orifícios do lavador estão desobstruídos e se há água no reservatório.

 

Caso a visibilidade fique muito prejudicada, pare num estacionamento (coberto) de shopping ou supermercado e espere a chuva amainar. Se o local costuma alagar, suba a primeira ladeira e só retome o trajeto original depois que o nível da água baixar. Na estrada, pare num posto; na impossibilidade, pare no acostamento, ligue o pisca-alerta, feche os vidros e permaneça dentro do carro (ele é um abrigo seguro contra raios não por estar isolado pelos pneus, mas porque as descargas são dissipadas pela superfície metálica e absorvidas pelo solo sem causar danos aos ocupantes). 

 

Alagamentos são sempre perigosos. A enxurrada pode arrastar veículos de grande porte, e a lâmina de água pode encobrir pedras, buracos, bueiros sem tampa e que tais. Se for inevitável passar por um trecho alagado, observe o comportamento do veículo à sua frente — mas não se baseie em ônibus ou caminhões, que, por serem mais altos, atravessam alagamentos que carros de passeio não conseguem transpor. Costuma-se dizer que um trecho inundado é "atravessável" quando o nível da água não ultrapassa o meio das rodas, mas não convém arriscar.


Se realmente não houver alternativa, procure seguir pelo meio da rua — onde o acúmulo de água costuma ser menor do que próximo ao meio-fio. Inicie sua travessia depois que o carro da frente concluir a dele e somente se não vier outro veículo no sentido contrário, já que as "marolas" elevam temporária, mas significativamente o nível da água. Engrene a primeira marcha, use a embreagem para manter o giro do motor em aproximadamente 2.000 RPM, mantenha a velocidade constante e não mude de marcha até alcançar o outro lado. Se o carro tiver câmbio automático ou automatizado, coloque a alavanca seletora na posição 1 (para impedir mudanças de marcha) e dose a aceleração cuidadosamente  sem o auxílio da embreagem, elevar o giro do motor faz as rodas motrizes responderem na mesma medida.

 

Evite parar durante o trajeto. Se isso acontecer e o motor "morrer", tentar religá-lo pode resultar em dados por calço hidráulico. Coloque a transmissão em ponto morto (ou na posição N) e empurre o carro para fora da água. Se tiver um mínimo de habilidade manual e as ferramentas necessárias, retire as velas de ignição e dê a partida (o movimento dos pistões expulsará a água do interior dos cilindros). A menos que os componentes do sistema eletrônico de injeção (como a sonda lambda) tenham sido afetados, basta recolocar as velas, religar os cabos e dar a partida para o motor voltar a funcionar. Mas o procedimento recomendável é chamar um guincho para rebocar o carro até uma oficina confiável, onde o mecânico fará um exame mais detalhado.

 

Aquaplanagem é o nome que se dá à perda de contato dos pneus com o solo quando o veículo trafega sobre uma lâmina de água. Se o volante lhe parecer "muito leve", evite virá-lo bruscamente — se os pneus recuperarem a tração repentinamente, pode não haver tempo de corrigir a trajetória. Se sentir o carro "flutuar", tire o pé do acelerador, mas só pise no pedal do freio (levemente) se houver ABS. Quando os pneus retomarem o contato com o asfalto e você recuperar o controle da direção, siga o "rastro" do carro da frente, mas mantenha distância e esteja preparado para tirar o pé do acelerador e segurar firmemente o volante ao primeiro sinal de aquaplanagem.

 

Ainda que seja mais comum em altas velocidades e/ou com pneus carecas, a aquaplanagem pode ocorrer com pneus em ordem e velocidades inferiores a 60 km/h. E o perigo aumenta em vias sinuosas (dependendo da velocidade e do traçado da pista, pode não haver tempo para recuperar o controle da direção e fazer a curva). Ao menor sinal de água na pista, diminua a velocidade e use uma marcha inferior àquela que você usaria com tempo seco, pois manter o giro do motor mais elevado aumenta a tração das rodas motrizes e favorece a aderência dos pneus.

 

Boa sorte.

segunda-feira, 11 de março de 2024

NÃO HÁ NADA COMO O TEMPO PARA PASSAR E O VENTO... (TERCEIRA PARTE)

 

Ainda sobre a questão da inconstitucionalidade da PEC da blindagem, o que esperar de um arquipélago de 11 ilhas que muda a própria jurisprudência ao sabor dos ventos político-partidários? Ou não foi exatamente isso que o STF fez quando sepultou a prisão em segunda instância? Ou quando anulou as condenações de Lula e reinseriu o "ex-corrupto" no jogo da sucessão presidencial? Ou quando tirou da cartola a suspeição do ex-juiz Sergio Moro? 
 
Discursando no 9º Fórum Jurídico de Lisboa, o ministro Dias Toffoli lecionou: "Nós já temos um semipresidencialismo com um controle de poder moderador, que hoje é exercido pelo STF". Mais absurdo que isso, só a insistência de Bolsonaro em atribuir essa mesma prerrogativa às Forças Armadas, lembrando que o
 "poder moderador" só existiu no Brasil durante o Império, e que o golpe militar que trocou a monarquia constitucional parlamentarista pelo presidencialismo republicano aconteceu há 134 anos.
 
Toffoli foi advogado do Sindicato dos Metalúrgicos de SBC, consultor jurídico da CUT, assessor jurídico do PT e do ex-ministro petralha José Dirceu. Atuou como advogado nas campanhas de Lula à presidência em 1998, 2002 e 2006 e como subchefe para assuntos jurídicos da Casa Civil da presidência da República. Em 2007, foi promovido a AGU; em 2009, a ministro do STFAbrilhantam seu currículo duas reprovações em concursos para juiz de primeiro grau em São Paulo, sempre na primeira fase, que testa conhecimentos gerais e noções básicas de Direito dos candidatos. 
Em 2005, quando o Mensalão veio à tona, Toffoli dava expediente na Casa Civil.

No julgamento do mensalão , o Maquiavel de Marília tentou salvar a pele do ex-chefe (falo de Dirceu). Em 2015, assim que a 1ª lista de Janot foi divulgada, pediu transferência para a 2ª Turma, que ficou encarregada dos processos da Lava-Jato. Partiram dele a sugestão tirar de Curitiba os casos que não tinham conexão com a Petrobras, o pedido de vista que interrompeu a votação da limitação do foro privilegiado de políticos e o voto de misericórdia que sepultou a prisão em 2ª instância. Léo Pinheiro mencionou em sua proposta de colaboração premiada que a OAS fez reformas na casa do ministro, mas a informação vazou e Janot melou a delação.
 
Foi Toffoli quem anulou todas as provas obtidas com o acordo de leniência da Odebrecht, suspendeu o pagamento de R$ 8,5 bilhões imposto à empreiteira e a multa de R$ 10,3 bilhões que a J&F vinha pagando em suaves prestações. Na avaliação ministro, a prisão de Lula em 2018 foi "um dos maiores erros judiciários da história do país", e as informações obtidas no âmbito da Operação Spoofing, um conluio entre Sergio Moro e os procuradores da Lava-Jato para a "elaboração de cenário jurídico-processual-investigativo que conduzisse os investigados à adoção de medidas que melhor conviesse a tais órgãos, e não à defesa em si". 

Observação: Renata Rangel, esposa de Toffoli, presta assessoria jurídica para a J&F no litígio envolvendo a compra da Eldorado Celulose.  O ministro se declarou impedido para julgar ação do grupo em setembro, mas sua decisão de anular as provas do acordo da Odebrecht pode estimular a UTC, a Andrade Gutierrez, a Camargo Corrêa e outras empresas a pedir revisão dos próprios acordos de leniência — como fez a OAS de Léo Pinheiro semanas atrás. 
 
Depois que a Transparência Internacional apontou que o Brasil apresentou piora no combate à corrupção, Toffoli determinou a abertura de uma investigação para apurar possível repasse irregular de R$ 2,3 bilhões para a ONG por meio do acordo de leniência da J&F. De acordo com o relatório da TI, a decisão do ministro foi mais um dos recorrentes ataques do Judiciário ao combate a corrupção. 
 
A autoria da epigrama "restaure-se a moralidade ou locupletemo-nos todos!" já foi atribuída a Rui Barbosa, a Stanislaw Ponte Preta e a Millôr Fernandes, embora a expressão "locupletemo-nos todos" já era usada no Portugal do século 19 para satirizar a ganância e o oportunismo político. A despeito da paternidade imersa em brumas, o impacto cultural do brocardo é inegável, a exemplo de seu simbolismo no combate à imoralidade e à falta de ética e na defesa da justiça e da transparência na sociedade.
 
Continua...