quinta-feira, 28 de junho de 2018

AINDA SOBRE LULA E A LIMINAR QUE LIVROU DIRCEU DA CADEIA



A decisão de soltar o guerrilheiro de festim, tomada na última terça-feira pela 2ª Turma do STF, não é definitiva. Trata-se de uma liminar em habeas corpus, concedida por 3 votos a 1, a pretexto de “o paciente não ser prejudicado com a suspensão do julgamento” (resultante do pedido de vista do ministro Fachin). O decano da Corte, ministro Celso de Mello, não participou da sessão, mas a maioria “pro reo” teria sido estabelecida mesmo que ele estivesse presente. Aliás, Fachin vem sendo sistematicamente derrotado pelo “trio garantista do Supreminho”, embora isso tenda a mudar a partir de setembro, quando Toffoli assumir a presidência da Corte e a ministra Cármen Lúcia, atual presidente, substituí-lo na 2ª Turma — como se vê, há males que vêm para o bem.

Dirceu foi condenado a 30 anos e 9 meses de prisão, e as chances de a sentença ser revertida nas instâncias superiores são pífias. Mas a Constituição reza que ninguém pode ser considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença condenatória, a despeito de a jurisprudência vigente no Supremo ser de que, uma vez condenado por um juízo colegiado, o réu pode começar a cumprir a pena, sem prejuízo de poder recorrer às instâncias superiores. Como se sabe, esse entendimento não é pacífico e vem suscitando frequentes rusgas entre alguns ministros, notadamente entre Gilmar Mendes, o laxante togado, e seu colega Luis Roberto Barroso, que classificou recentemente o “ministro-deus” de “mistura do mal com o atraso e pitadas de psicopatia.

O ministro Edson Fachin pediu vista do processo e o julgamento foi suspenso, mas não sem que Toffoli, relator da ação, propusesse a concessão de uma liminar para que Dirceu permanecesse fora da cadeia até, pelo menos, o mérito da reclamação ser julgado — no que foi prontamente acompanhado por Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski. Daí o placar de 3 votos a 1, sendo de Fachin o único voto contra a liminar. 

Quando Fachin liberar a ação para julgamento de mérito, é possível que Dirceu continue livre, leve e solto até sabe Deus quando. Como dito linhas atrás, além do princípio constitucional da presunção de inocência, há que se levar em conta que a jurisprudência vigente no Supremo permite ao colegiado que condenou o réu determinar ou não a prisão sua prisão. Foi essa “possibilidade” que colocou Lula na cadeia em abril, já que o TRF-4 determinou ao juiz Sérgio Moro que expedisse o competente mandado de prisão contra o petralha.

O fato de Dirceu ter sido beneficiado pela tal liminar não significa necessariamente que Lula também o será (aliás, Lula já foi beneficiado por uma medida semelhante, por ocasião do julgamento de um pedido de habeas corpus preventivo, às vésperas da Semana Santa). Mas onde há fumaça, há fogo, diz um velho ditado.  

Na reclamação que resultou na concessão da liminar a Dirceu, seus advogados alegam que a possibilidade de detenção após condenações em segunda instância é apenas uma possibilidade — e não uma obrigatoriedade —, e que, nestes casos, a prisão deve ser fundamentada. Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli pensam exatamente desse modo sobre as prisões após sentença de segundo grau, e Celso de Mello parece rezar pela mesma cartilha, embora dê uma no cravo e duas na ferradura.

O plenário do Supremo já decidiu que não é preciso fundamentação às ordens de prisão de condenados em segunda instância, mas os “garantistas” de plantão têm manifestado publicamente que, para eles, a questão está em aberto e será analisada novamente em breve. Assim, aplicam seu entendimento em casos concretos envolvendo prisões após sentença de segundo grau.

Como se não bastasse, a defesa de Dirceu sustenta que, ao autorizar a prisão do ex-chefe de Toffoli após sua condenação em segunda instância, o TRF-4 desrespeitou uma decisão tomada em abril de 2017 pela própria 2ª Turma do STF, que lhe concedeu um habeas corpus e converteu sua prisão em medidas alternativas — Mendes, Lewandowski e Toffoli votaram pela soltura do guerrilheiro do povo brasileiro” naquela ocasião.

Observação: A Justiça do DF deu prazo de cinco dias para Dirceu se apresentar ao juiz Sérgio Moro, em Curitiba. A determinação é da juíza Leila Cury, da Vara de Execuções Penais, segundo a qual cabe à Justiça paranaense determinar quais medidas cautelares devem ser aplicadas durante a soltura — "inclusive para instalação de nova tornozeleira eletrônica, se for o caso”. Com isso, as regras de cumprimento da liberdade devem ficar a cargo da 13ª Vara Federal do Paraná, onde o processo teve início. Caberá ao juiz Moro, inclusive, determinar onde o ex-ministro ficará morando enquanto aguarda o fim do julgamento.

É preocupante é o fato de essa decisão da segunda turma afetar todo o conceito de prisão em segunda instância no Brasil, em especial nos casos da Lava-Jato e, sobretudo, no do demiurgo de Garanhuns, que não só pleiteia aguardar em liberdade o julgamento de seus infindáveis recursos, mas também quer disputar as próximas eleições. Como a questão ainda não foi revista pelo plenário do Supremo — o que teria efeito vinculante, ou seja, valeria para todos os casos análogos —, a liminar concedida a Dirceu afronta a súmula do TRF-4 que determina especificamente a prisão de condenados após esgotados os recursos na segunda instância do Judiciário. Por outro lado, a maioria dos ministros parece inclinada a entender que a prisão não pode ser automática, pois há necessidade de fundamentação. Por essas e outras, a insegurança jurídica campeia solta.

Observação: A decisão reabriu o debate sobre prisões após condenação em segundo grau. “Enquanto essas ADCs não forem julgadas, esse tema ficará em aberto e as turmas e os magistrados não estão adstritos a um julgamento específico tomado em plenário. Urge, e faço eco às palavras do ministro Marco Aurélio, já tarda o julgamento das ADCs”, disse Ricardo Lewandowski.

Voltando ao caso específico de Lula, a concessão da liminar a Dirceu sugere que, se o julgamento do recurso do molusco não tivesse sido retirado da pauta, o sacripanta provavelmente teria sido solto. Daí porque Fachin resolveu enviar o caso ao plenário; se o submetesse à 2ª Turma (como queria a defesa do criminoso), ele certamente seria voto vencido. E como o ministro deu prazo de 15 dias para o Ministério Público se manifestar, o recesso do Judiciário, que começa no final desta semana, nunca veio em momento tão oportuno.


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