sexta-feira, 14 de junho de 2019

“AQUI É O HACKER!” E A GREVE GERAL



Além das supostas mensagens trocadas por Moro, Dallagnol e integrantes da Lava-Jato no Paraná, vem a lume agora que outros membros do MP receberam torpedos suspeitos, aparentemente do celular do conselheiro Marcelo Rabello de Souza, dando conta de que as falas do ex-juiz e do coordenador da força-tarefa eram apenas uma amostra do que está por vir. Questionado pelo grupo, o remetente respondeu: "AQUI É O HACKER".

Rabello afirmou que não estava usando o aparelho no momento em que as mensagens foram enviadas, e que não estaria fazendo uma brincadeira com os colegas diante da gravidade da situação, fazer uma brincadeira dessas seria uma puta irresponsabilidade. A PF já havia instaurado um inquérito para investigar ataques feitos por hackers aos celulares de procuradores atuam na Lava-Jato em Curitiba, no Rio e em São Paulo, e outro procedimento foi aberto mais recentemente para apurar ataques ao celular do ministro Sérgio Moro. Na última segunda-feira, o corregedor nacional do MPF instaurou reclamação disciplinar para apurar a troca de mensagens envolvendo Deltan Dallagnol (veja mais detalhes no post anterior).

O assunto já deu no saco, mas vale comentar que a complexidade operacional e o custo de um ataque dessa magnitude sugere que não se trata de trabalho amador, e que não se deve descartar a possibilidade de alguém de dentro da empresa que administra o aplicativo de mensagens ter colaborado com o(s) cibercriminoso(s). O Telegram não negou que houve um ataque a seus sistemas, mas afirma que o vazamento pode ter decorrido da ação de um malware (programa de computador com propósitos maliciosos) ou porque as vítimas não se valeram da verificação de duas etapas no aplicativo.

A exemplo das investigações sobre o atentado contra o então candidato e hoje presidente Jair Bolsonaro — que se arrastam há 9 meses sem produzir resultados relevantes —, é possível que a PF não descubra o responsáveis), embora seguir o dinheiro levaria a quem financiou a operação e ao(s) mandante(s) do crime. Sem mencionar que qualquer Sherlock de botequim atentaria para o fato de que Deltan Dallagnol e Sérgio Moro serem vistos como algozes de políticos corruptos, que Moro é (ou era) virtual candidato a uma cadeira no STF e que Dallagnol é (ou era) um provável candidato a substituir Raquel Dodge no comando da PGR. Dito isso, tirem os leitores suas próprias conclusões.

A merda bateu no ventilador e vai feder por um bom tempo. Mas há muita especulação e poucos fatos nesse furdunço. O que me parece inacreditável é o país simplesmente parar por conta de um vazamento de material claramente obtido de maneira ilegal, e, pior, que já se fale em abertura de CPI — tramada por culpados e cúmplices do Congresso —, no afastamento do ministro e outras bobagens que tais. Moro se prontificou a prestar esclarecimentos no Senado e na Câmara, mas não seria o caso de convocar, primeiro, o tal Gleen Greenwald, responsável pelo site que vazou o conteúdo ilegal e cujo viés de esquerda é público e notório?

Bolsonaro finalmente quebrou o silêncio sobre esse imbróglio. Disse que o que Moro fez pelo Brasil não tem preço, que o ex-juiz expôs as vísceras do poder, a promiscuidade do poder no tocante à corrupção, que o PT quase quebrou a Petrobrás, saqueou o BNDES e fundos de pensão para encher as burras de companheiros comunistas lá fora e de amigos do rei aqui dentro, e que as provas contra Lula não foram forjadas. O presidente questionou também a veracidade da troca de mensagens publicada pelo Intercept e afirmou que, se suas conversas privadas vieram a público, ele, Bolsonaro, também será criticado. Ao ser questionado sobre se considerava normal que um juiz e um procurador conversem sobre uma investigação em curso, devolveu a pergunta sobre se o normal é "conversar com doleiros" (ponto para ele).

Resumo da ópera: A mais nova iniciativa contra a maior operação anticorrupção já realizada na história se escora em um crime: a invasão dos celulares de autoridades. A questão agora é ajustar a euforia dos encrencados à realidade. O palco para esse ajuste será, como de hábito, o STF, onde duas correntes já se mostram visíveis — uma, capitaneada por Gilmar Mendes, o inigualável, para quem prova obtida ilegalmente pode ser usada para inocentar um injustiçado (leia-se Lula), e outra, pelo ministro-relator da Lava-Jato, segundo o qual: "A Lava-Jato é uma realidade. Não acredito que essa realidade venha a ser afastada por qualquer circunstância conjuntural". No meio das vozes há um monturo de fatos malcheirosos: o saque à Petrobras, as delações em série, a devolução de bilhões roubados do Estado, as condenações e as prisões de corruptos e corruptores poderosos… Comprometer tudo isso seria uma tragédia. Retroceder como resultado de um crime cibernético seria um escárnio. Tomara que o bom senso prevaleça.

Atualização: A defesa de Lula pediu a inclusão das mensagens vazadas pelo Interceptor como prova de que Moro foi parcial na condução do caso do tríplex — como se a culpabilidade de molusco não tivesse sido reconhecida por três desembargadores do TRF-4 e quatro ministros do STJ. Na petição apresentada ontem ao ministro Edson Fachin, relator dos processos da Lava-Jato no Supremo, quatro advogados do petralha afirmam que as reportagens com as mensagens “revelam a conjuntura e minúcias das circunstâncias históricas em que ocorreram os fatos comprovados nestes autos”, “tudo a demonstrar situações incompatíveis com a ‘exigência de exercício isento da função jurisdicional’ e que denotam o completo rompimento da imparcialidade objetiva e subjetiva”. A exemplo do que fez na última terça-feira com o pedido de anulação dos julgamentos do TRF-4, a 2ª Turma do STF (composta por Cármen Lúcia, Edson Fachin, Celso de Mello, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes) deve mandar para o plenário a decisão desse HC, cujo julgamento está marcado para o próximo dia 25, e que já foi rejeitado em diversas instâncias da Justiça, o decano será o fiel da balança, pois, de Lewandowski e Mendes, sabemos perfeitamente o que devemos esperar

Enquanto isso, sob o pretexto de protestar contra a reforma previdenciária, trabalhadores de diversas categorias estão sendo convocados para uma greve geral, nesta sexta-feira, pelas centrais sindicais CUT, CTB, Força Sindical, CGTB, CSB, UGT, Nova Central e distintíssima companhia, além do PT e seus satélites, entidades estudantis e opositores ao governo de Jair Bolsonaro. A manifestação nacional contra a reforma da Previdência foi programada há meses, mas novos temas foram adicionados ao protesto, como é o caso do contingenciamento de verbas da educação, “escândalos” ligados à família de Bolsonaro e seus ministros, e por aí segue a procissão.

E viva o povo brasileiro!