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sexta-feira, 29 de novembro de 2019

LULA TOMOU NA TARRAQUETA — CHUPA QUE É DOCE, JARARACA!



Como eu disse no post anterior, o julgamento do processo sobre o Sítio de Atibaia pelo TRF-4 chegou a ser suspenso, foi remarcado, e depois mantido por ordem do ministro Edson Fachin. A sessão começou na manhã da quinta-feira e se estendeu até o final da tarde. Afinal, vivemos tempos de votos intergalácticos, e o desembargador João Pedro Gebran Neto, relator da Lava-Jato no TRF-4, demorou horas para concluir a leitura do seu, que tinha mais de 350 páginas. Dias Toffoli, se lhe tivessem dado corda, provavelmente ainda estaria explicando o dele, no caso do compartilhamento de informações de transações suspeitas ligadas a investigações criminais sem prévia autorização judicial. Aliás, esse julgamento também teve prosseguimento na tarde de ontem, quando foram colhidos os votos faltantes e estabelecido o placar de 8 votos a 3 — ao final, o presidente da Corte e relator do processo aderiu à maioria e retificou seu voto, mudando o placar para 9 votos a 2 a favor do compartilhamento.

Com essa decisão, deixou de valer a liminar de Toffoli que, em julho, atendendo um pedido da defesa de Flávio Bolsonaro — feito dentro de um recurso apresentado por donos de um posto de gasolina em São Paulo — suspendeu ao menos 935 investigações. Em tese, foi esse recurso que os ministros julgaram, a despeito de a defesa do senador ter pegado carona no processo alegando que, a exemplo do que ocorreu em relação aos donos do posto, o MP-RJ teve acesso às informações de seu cliente sem autorização judicial. Toffoli, no entanto, parece achar que todo mundo é idiota, pois enfatizou diversas vezes que o caso do filho do pai não estava em discussão.

Os efeitos que a queda da liminar terá no governo é coisa que ainda iremos descobrir, já que o famigerado "Caso Queiroz" fede mais que peixe podre. Quanto à UIF (ex-Coaf), que Toffoli incluiu "de alegre" nesse julgamento, também se formou maioria a favor do compartilhamento dos dados, mas não ficou decidido se o Ministério Público pode encomendar ao órgão informações de pessoas específicas para fins de investigação. Dado o avançado da hora (devido, em grande medida, ao boquirrotismo dos eminentes ministros), a regulamentação ficou para a sessão da próxima quarta-feira, 4.

Segundo Josias de Souza, a suprema montanha pariu o óbvio ao reconhecer que os órgãos de controle foram criados para controlar, e que, quando submetidos a indícios de crimes, têm a obrigação de compartilhar os dados com as autoridades encarregadas de investigar e denunciar criminosos. Dizia-se que o STF cogitava restringir o compartilhamento para proteger o cidadão. Proteção do cidadão tornou-se um luxuoso eufemismo para conversa fiada. O texto da Constituição prestigia a privacidade do cidadão, mas o escudo constitucional não pode ser erguido para proteger criminosos. Sobretudo num país como o Brasil, em que a corrupção se tornou endêmica.

O resultado do julgamento precisa produzir pelo menos duas consequências. A primeira, inquestionável, é o reconhecimento de que Toffoli fez uma lambança ao congelar a investigação contra Flávio Bolsonaro e outros 935 inquéritos. Na semana passada, ao proferir o voto mais longo e confuso da história da Corte, seu presidente se referiu à Receita e ao Coaf como fornecedores de material para "investigações de gaveta, que servem apenas para assassinar reputações" (deveria se desculpar pela generalização). A segunda consequência, ainda pendente de verificação, é o descongelamento dos inquéritos — o que envolve Flávio Bolsonaro e todos os demais.

Toffoli chamou de "lenda urbana" a informação de que o julgamento diz respeito também ao filho do presidente da República. Não tem nada a ver, disse ele. No Supremo, nada virou sinônimo de tudo. Zero Um precisa abandonar o cinismo das firulas jurídicas. Passa da hora de o filho do presidente levar meio quilo de explicações à balança da Justiça.

Voltando ao caso da badalhoca vermelha e seu folclórico Sítio Santa Bárbara, a decisão unânime da 8ª Turma do TRF-4 me passou a impressão de que, ao contrário dos ministros do STJ, os desembargadores não se curvaram à pressão de Gilmar Mendes et caterva. Para quem não se lembra, no dia 23 de abril passado, a 5ª Turma do STJ, criticada pela Maritaca de Diamantino por "endossar as decisões dos desembargadores do TRF-4 nos casos da Lava-Jato", reduziu a pena do ex-presidente ladrão, antecipando sua progressão para o regime semiaberto. Mas a subserviência foi desnecessária, pois o próprio Supremo se encarregou de rever sua jurisprudência sobre a prisão após condenação em segunda instância, abrindo as portas das celas de Lula, Dirceu e milhares de condenados que aguardavam presos o julgamento de seus recursos nos tribunais superiores.

Com a decisão de ontem no TRF-4, o bocório de Garanhuns, que, além dos processos do tríplex e do sítio, responde a outras oito ações na Justiça Federal do Paraná, São Paulo e Distrito Federal, teve a pena aumentada pelo colegiado (de 12 anos e 10 meses para 17 anos, 1 mês e 10 dias). Não voltará para a prisão imediatamente, devido à estapafúrdia decisão do STF que passou a proibir o cumprimento da pena após condenação por uma juízo colegiado, mas basta o Supremo negar seus recursos para que ocorra o trânsito em julgado da sentença condenatória (isso se a suprema facção pró-crime não inventar moda, o que não é de todo impossível).

Cristiano Zanin, o engomadinho, deve embargar a decisão da 8ª Turma do TRF-4 e apelar ao STJ e STF, a exemplo do caso do tríplex, no qual impetrou mais de 100 recursos e chicanas protelatórias de todas as cores e sabores — e ainda alega que seu cliente não teve direito à ampla defesa naquele processo. Aliás, diante desse disparate, Raquel Dodge chegou mesmo a afirmar que o ex-presidente confunde “direito à ampla defesa” com “direito à defesa ilimitada, exercida independentemente de sua utilidade prática para o processo, em razão do mero ‘querer’ das partes”.

Fato é que, mesmo condenado em três instâncias no caso do tríplex e em duas no do sítio, o fiduma de Garanhuns, continua solto, debochando dos juízes de carreira que o apenaram, já que o STF, que articulou sua libertação, há muito que deixou de ser composto por juristas de renome. Segundo José Nêumanne, o que há por lá são empregadinhos que abrem portas e carregaram pastas dos chefões das organizações criminosas da política e da gestão pública, recompensando seus ex-superiores com a impunidade na prática. E é bem por aí.

Na visão sempre abalizada de Merval Pereira, o combate à corrupção ganhou duas batalhas judiciais na última quarta-feira. No TRF-4, a condenação de Lula por unanimidade, com aumento da pena e dos dias-multa determinados pela juíza substituta Gabriela Hardt, que respondeu temporariamente pela 13ª Vara Federal do Paraná até que o juiz federal Luiz Antônio Bonat fosse efetivado no posto. No STF, quando se formou maioria favorável ao compartilhamento de dados pelos órgãos de fiscalização com o Ministério Público e a Polícia federal sem prévia autorização judicial.

Os dois casos são emblemáticos, diz Merval, porque superam obstáculos impostos no embate que se trava há algum tempo sobre a amplitude ou limitação da Operação Lava-Jato e assemelhadas. O resultado do julgamento em Porto Alegre é mais importante, dada a decisão unânime de não fazer o processo retornar às alegações finais da primeira instância. Segundo os desembargadores, ainda que a decisão do STF sobre a ordem das alegações finais deva ser respeitada, é preciso demonstrar o prejuízo causado ao não permitir que os réus falem depois dos delatores. Ainda não foram definidos os limites dessa decisão. O procurador-geral Augusto Aras defende que ela não se estenda processos já encerrados, e ministra Cármen Lúcia, no seu voto, concordou com a tese de que os réus devem apresentar as alegações finais antes dos delatores, mas, para que haja nulidade em sentenças já proferidas, é preciso que demonstrem que foram prejudicados. Existe a possibilidade de o Supremo limitar o alcance da decisão, beneficiando somente réus que pediram, ainda na primeira instância, o direito de apresentar seus memoriais por último, e que provarem que foram prejudicados por não terem sido atendidos.

Cá entre nós e a torcida do Flamengo, querer que os juízes de primeira instância "adivinhassem" que um belo dia o Supremo tiraria da cartola uma aleivosia de tal calibre seria um completo absurdo, mesmo em se tratando a facção pró-crime dos togados supremos. Isso sem mencionar que o próprio ministro Dias Toffoli sugeriu a seus pares que os casos deveriam ser analisados individualmente e só haveria anulação da sentença quando e se os réus comprovassem prejuízo real ao exercício da ampla defesa — o que não aconteceu no processo do demiurgo de Garanhuns. O presidente do TRF-4, desembargador Carlos Eduardo Thompson Flores, disse em seu voto que o STF terá de enfrentar uma questão que a Suprema Corte dos Estados Unidos já enfrentou, decidindo há anos que uma medida que atinja processos já concluídos só vale a partir da sua promulgação, sem retroceder, para não causar insegurança jurídica.

Observação: A insegurança jurídica criada pelas jurisprudências de ocasião de alguns ministros supremos é tão ou mais assustadora que os disparates de Jair Bolsonaro & Filhos. Felizmente, se Deus quiser o Diabo deixar, estaremos livres do decano no ano que vem, de Marco Aurélio Mello em 2020 e de Rosa Weber e Ricardo Lewandowski em 2023. Isso se a PEC da bengala não for revogada ou se o imprevisível tiver voto decisivo na assembleia dos acontecimentos; basta lembrar que Teori Zavascki, indicado por Dilma em 2012, continuaria ministro até 2023 se não tivesse morrido numa mal explicada queda de avião em janeiro de 2017.  

Enfim, caso o Congresso aprove a prisão após a condenação em segunda instância, o que parece bem encaminhado, o crápula de nove dedos voltará para a cadeia, pois os anos de condenação dos dois processos serão somados, e ele precisaria cumprir 1/6 do total antes de progredir para o regime semiaberto, sem mencionar os demais processos, cujas prováveis condenações podem elevar sua pena a mais de 200 anos. 

Na avaliação sempre ácida, mas eivada de um requintado senso de humor, do jornalista e comentarista político Josias de Souza, o TRF-4 foi implacável com Lula devido ao sem-número de evidências de que o ex-presidente petralha se corrompeu. Ao pendurar no pescoço da cascavel uma segunda medalha de corrupto, o colegiado deixou no ar uma dúvida incômoda quanto à adequação do nome do tribunal que representa a última instância do Judiciário brasileiro: STF ou STL? Supremo Tribunal Federal ou Supremo Tribunal do Lula? A dúvida não é impertinente. Ao contrário, é plenamente justificável.

Não fosse pela recente decisão do Supremo de revogar a regra que permitia a prisão de condenados na segunda instância, Lula estaria nesse momento fazendo a mala para retornar à cadeia. Graças ao Supremo, esse risco foi substituído pelo velho cenário em que os condenados com dinheiro para pagar advogados recorrem em liberdade até o infinito ou a prescrição dos crimes — o que chegar primeiro. Generoso, o pedaço do STF que compõe o STL ainda ofereceu à defesa do criminoso a possibilidade de requerer a anulação do processo. Fez isso ao determinar que réus delatados devem falar por último nos processos, depois de tomar conhecimento das alegações finais dos delatores. Os advogados pediram a anulação, mas o TRF-4 negou. Prevaleceu o entendimento segundo o qual os juízes não poderiam adivinhar que o Supremo criaria uma nova regra, que não estava prevista em nenhuma lei, para beneficiar os condenados.

Os advogados de Lula vão recorrer. Os recursos chegarão ao STF. Ou ao STL. Hoje, o combate à corrupção no Brasil depende dos humores do Supremo Tribunal do Lula.  

domingo, 24 de novembro de 2019

PERGUNTAS QUE NÃO QUEREM CALAR



Em seu comentário no Jornal da Gazeta da última sexta-feira, o impagável José Nêumanne salientou que o atual presidente do STF — guindado a ministro em 2009 por indicação do maior câncer que se instalou no Palácio do Planalto desde a redemocratização deste arremedo de república de bananas — não teve QI suficiente para ser aprovado em 2 concursos para juiz de primeira instância em São Paulo, mas é extremamente hábil no uso de truques sujos para prolongar as benesses de sua monocracia de malandro. 

Para Nêumanne, o Maquiavel de Marília  não proferiu aquele voto abaixo da crítica por burrice, mas por esperteza. O que ele quis foi imitar o saudoso Chacrinha — conforme, aliás, eu havia mencionado numa postagem anterior —, que dizia não ter vindo para explicar, mas para confundir. Tudo isso faz parte de um plano, traçado desde julho, para conseguir vantagens com suas decisões monocráticas e adiar o máximo possível a votação em plenário para continuar gozando as benesses que vem usufruindo e continuará a fazê-lo com elas. Dando tempo e jeito, assista ao vídeo abaixo:


Merval Pereira, por sua vez, ponderou que a estupefação causada pelo voto cuja leitura Toffoli levou mais de quatro horas para concluir, na abertura do julgamento sobre o compartilhamento de dados entre os órgãos de persecução penal e os de investigação, foi provocada pela tentativa de voltar atrás sem deixar clara a mudança. De tão obscuro, voto teve de ser explicado mais tarde por uma nota oficial.

Pesquisas como a do economista Felipe de Mendonça Lopes, da FGV, mostram que, com o televisionamento ao vivo dos julgamentos, os votos ficaram maiores em média 26 páginas, o que aumenta o tempo de leitura em cerca de 50 minutos. O ministro Luis Roberto Barroso definiu bem o momento: “Seria preciso chamar um professor de javanês”, referindo-se ao livro “O Homem que Sabia Javanês”, de Lima Barreto, sobre um vigarista que, sem saber nada do idioma, se apresentou como professor  de javanês a um barão que colocara um anúncio em busca de alguém que lhe ensinasse a língua. A utilização de métodos econométricos dá a certeza de que a mudança de composição do plenário do Supremo não tem nada a ver com o aumento do tamanho dos votos, mas sim a transmissão ao vivo. Já houve quem propusesse o seu fim, mas parece uma decisão impossível de ser revista, devido à cobrança sempre maior da transparência das decisões, o que não necessariamente significa clareza.

Quanto à obscuridade da linguagem, Merval disse ter se lembrado de um ciclo de palestras que coordenou na ABL sobre a influência do barroco em nossa cultura. Um dos aspectos abordados pelo ex-ministro e presidente do Supremo, Nelson Jobim foi justamente o juridiquês, esse idioma parecido com o português, mas salteado com termos em latim, que nos acostumamos a ouvir durante a transmissão dos julgamentos pela televisão. Jobim criticou as transmissões, avaliando que, com elas, os votos ficaram mais longos. Mas ressaltou a vantagem da transparência do processo decisório do Supremo, não obstante o Brasil continue sendo o único país do mundo que transmite os julgamentos do STF ao vivo, em tempo real. De acordo com o jurista, o uso radical da linguagem mais culta e o excesso de erudição têm o objetivo de “transmitir potência no discurso”, e o formalismo da linguagem jurídica já virou piada, mas “ainda assim, insistimos em usar o juridiquês no Brasil”, pois “a ornamentação linguística” sinalizaria um jurista mais preparado. E definiu assim o falar empolado: “Comunicação sem clareza é uma forma eficaz de esconder ignorância no assunto sobre o qual se fala”. E, com efeito, falar difícil é fácil; o difícil é falar fácil.

A pergunta que não quer calar é: Por que não escolher os ministros supremos da mesma foram como se faz no STJ, a partir de uma lista tríplice criada pela plenário da Corte e submetida ao Presidente da República, que indica o seu preferido, que então é sabatinado na Comissão de Cidadania, Constituição e Justiça do Senado e, se aprovado, avalizado pelo plenário da Casa? Ou, melhor ainda, mediante um concurso para o qual poderiam se inscrever ministros do STJ e desembargadores dos Tribunais Regionais, por exemplo? Isso evitaria, ou pelo menos minimizaria, as indicações eminentemente políticas. Vale lembrar que Lula e Dilma concederam a toga suprema a nada menos que oito apaniguados, dos quais sete continuam ativos e operantes (a exceção fica por conta do falecido Teori Zavascki, que foi indicado pela anta vermelha para preencher a vaga aberta com a aposentadoria compulsória do ministro Cezar Peluso).

Outra pergunta que não quer calar: Por que Davi Alcolumbre, atual presidente do Senado e do Congresso Nacional, vem engavetando sistematicamente todos os pedidos de abertura de processos de impeachment contra ministros supremos (lista orgulhosamente encabeçada por Gilmar Mendes e Dias Toffoli)? Será que não há entre os 81 senadores 48 parlamentares dispostos a pressionar essa versão revista e atualizada de Renan Calheiros, só que com algumas arroubas a mais?  

E mais uma: Até quando nos submeteremos a preceitos constitucionais estabelecidos por uma assembleia constituinte, durante a "ressaca" dos 21 anos de ditadura militar, que resultaram numa Carta Magna onde a palavra “Direito” é mencionada 76 vezes, enquanto "Dever" surge em quatro oportunidades e "Produtividade” e “Eficiência” em duas e uma, respectivamente. Aliás, o que se poderia esperar de um país com 76 direitos, 4 deveres, 2 produtividades e 1 eficiência, senão uma política pública de produção de leis, regras e regulamentos divorciadas do mundo real e não raro escritas para fomentar o crime e favorecer os criminosos?

Eduardo Bolsonaro foi crucificado por dizer que bastariam um soldado e um cabo para fechar o Supremo (a questão é que, no contexto em que ele disse o que disse, só os muito hipócritas teriam classificariam a frase como provocação). Mais recentemente, votou a ser malhado por declarar, em entrevista à jornalista Leda Nagle, que  "[...] se a esquerda radicalizar a esse ponto, vamos precisar dar uma resposta, e essa resposta pode ser via um novo AI-5, pode ser via uma legislação aprovada via plebiscito, como ocorreu na Itália, mas alguma resposta vai ter que ser dada". Pode-se não concordar com o "radicalismo" do filho do presidente, mas não dá para negar que o que Lula vem fazendo desde que foi solto, graças à vergonhosa jabuticaba suprema que revogou a possibilidade da prisão após a condenação em segunda instância merece, sim, uma resposta à altura. A questão é que a família real-presidencial tem seus esqueletos no armário, tanto é que o próprio Jair Bolsonaro se fechou em copas depois que Dias Toffoli e Gilmar Mendes blindaram seu primogênito das investigações no caso Fabrício Queiroz, que fede feito gangrena e cujo fedor começou a se espalhar antes mesmo das eleições passadas.

Haveria muito mais a dizer, mas hoje é domingo, e domingo pede cachimbo. Portanto, o resto fica para amanhã.      

sábado, 23 de novembro de 2019

NÃO PRECISA EXPLICAR, EU SÓ QUERIA ENTENDER



Depois de proferir em toffolês um voto de proporções siderais e de ocupar boa parte da sessão seguinte tentando explicar o que nem ele próprio entendeu, Dias Toffoli passou a palavra para o dono da calva mais luzidia do STF e, ao final do voto do colega, suspendeu o julgamento do recurso que definirá se informações sigilosas de órgãos de controle podem ser compartilhadas com o Ministério Público sem autorização judicial.

Salvo chuva, salvo engano, o julgamento prosseguirá na sessão ordinária da próxima quarta-feira, quando votarão os demais ministros por ordem inversa de antiguidade. O problema é o ritmo imprimido aos trabalhos pelo atual presidente da Corte — o mesmo cidadão reprovado duas vezes seguidas no concurso público para juiz de Direito e que não pode, por consequência, ser juiz em nenhuma das quase 5.500 comarcas do Brasil, mas preside a mais alta corte de justiça do país, para onde foi promovido pelo Padim Lula em 2009, graças aos "bons serviços" prestados ao PT, a José Dirceu e ao próprio Lula. Enfim, restam 8 sessões até o início do recesso do Judiciário, e faltam os votos de 9 ministros. Façam as contas.

De acordo com Josias de Souza, do célebre voto que Toffoli demorou quase 5 horas para ler e cujo teor ninguém entendeu direito dando a impressão de que o ministro procurava ideias desesperadamente, como um cachorro que esqueceu onde escondeu o osso  e das explicações complementares que ocuparam boa parte da sessão de quinta-feira, vislumbra-se no horizonte uma reversão de expectativas que pode extinguir a blindagem concedida a Flávio Bolsonaro pelo Maquiavel de Marília e reforçada pela Maritaca de Diamantino.

Observação: Se Toffoli perorou por quase cinco horas seguidas, e nem seus pares na Corte entenderam patavina do que o homem estava dizendo, imagine-se, então, o público que paga a subsistência dos onze supremos togados e em nome de quem eles dão expediente em seu palácio brasiliense. Ao final, o ministro Luís Roberto Barroso fez a única sugestão prática para desvendar a massa bruta de palavrório despejada sobre a sessão: “Vamos chamar um professor de javanês”.

Segundo J.R. GuzzoToffoli e seus parceiros de facção no STF são hoje a pior ameaça ao estado de direito, às instituições e à democracia no Brasil. Não são os “bots” das redes sociais, as “milícias”, a “extrema direita” e sabe lá Deus quem mais. São eles. Em geral, suas excelências fazem isso ordenando que os criminosos sejam protegidos e tenham direito à impunidade, sobretudo nos casos de corrupção. Mas a destruição da lei e a proibição de se prestar justiça no Brasil inclui, também, a incapacidade funcional de entender questões básicas de Direito. Estamos tendo mais uma prova disso. Senão vejamos.

Depois de congelar o inquérito contra Flávio Bolsonaro e outras 935 investigações, depois de enfiar o ex-Coaf num processo que tratava exclusivamente da Receita Federal, depois de requisitar os dados sigilosos de 600 mil pessoas e empresas, depois de tudo isso, Toffoli finalmente reconheceu ser "absolutamente constitucional" o compartilhamento de dados do Coaf com o Ministério Público e a Polícia Federal sem autorização judicial. Ou seja: a pretexto de socorrer o primogênito do presidente desta banânia, Toffoli paralisou desnecessariamente, durante quatro longos meses, investigações que deveriam estar em franco andamento.

Segundo a votar, Alexandre de Moraes reforçou a constitucionalidade da atuação do ex-Coaf, agora chamado de UIF, e sustentou que também a Receita Federal tem o dever de compartilhar com o Ministério Público o resultado da apuração de delitos tributários, algo que Toffoli ensaiara limitar, em contradição com a jurisprudência do próprio Supremo. Antes que a sessão de quinta-feira terminasse, alguns togados — entre os quais Edson Fachin, Rosa Weber, Marco Aurélio e Ricardo Lewandowski manifestaram seu desconforto em discutir a atuação do Coaf num julgamento sobre a Receita. Ainda que seja impossível antecipar os veredictos de suas excelências, há no plenário da Corte um jeitão de virada.

A certa altura, Fachin como que constrangeu Toffoli a reconhecer que, prevalecendo seu voto ou o voto de Alexandre de Moraes, a liminar que enviou ao freezer os casos de Zero Um e outros 925 investigados iria para o beleléu. Confirmando-se a derrubada da liminar, Toffoli deveria se auto incluir, na condição de réu, no processo secreto que abriu para investigar ataques contra o Supremo e seus membros, visto que, no momento, ninguém desmoraliza mais o tribunal do que seu presidente (cujo mandato, salvo impeachment ou outro imprevisto qualquer, termina somente em setembro do ano que vem).

sexta-feira, 22 de novembro de 2019

DILMA DISCURSAVA EM DILMÊS; TOFFOLI VOTA EM TOFFOLÊS


O voto tamanho XGG de Dias Toffoli — cuja leitura, na sessão da última quarta-feira, levou quase cinco horas — me fez pensar se o presidente da nossa mais alta Corte não teria sido "tomado" pelo espírito de Abelardo Barbosa, mais conhecido como "Chacrinha", que se notabilizou pela frase: "Eu não vim para explicar, vim para confundir". Tanto é que a maioria do togados supremos deixaram a sessão sem entender o que, de fato, seu presidente quis dizer naquele interminável pregação (talvez a mais longa de toda a história centenária do STF).

Sem citar a liminar que concedeu monocraticamente a Flávio Bolsonaro, Toffoli acatou o recurso extraordinário do MP no processo sub-judice, anulando a decisão do desembargador José Marcos Lunardelli (que havia tornado ilegal o compartilhamento de dados da Receita com o MP, sem autorização judicial, na condenação do casal Hilario e Toyoka Hashimoto pelo crime de sonegação fiscal), e reafirmou que o UIF (ex-Coaf) pode compartilhar relatórios de inteligência financeira, mas desde que incluam somente informações de movimentações globais das pessoas físicas ou jurídicas e que não haja “encomenda” contra determinada pessoa. Disse ainda o nobre ministro que, em relação ao compartilhamento de representações fiscais da Receita com o MP, este deve instaurar uma investigação ao receber as informações e encaminhar o caso para a Justiça, que, a partir da instauração da investigação, possa acompanhar todo o desdobramento do caso.

O voto quilométrico surpreendeu a todos, tanto pelo tamanho e pela linguagem tortuosa quanto por abrir caminho para a retomada do compartilhamento de dados entre os órgãos de fiscalização e os de investigação. Mas a cereja do bolo foi tentar convencer a todos de que em momento algum ele, Toffoli, teria impedido que os inquéritos prosseguissem, atribuindo essa "fake news" a agentes públicos mal intencionados e a órgãos de imprensa que divulgaram essas informações de forma "terrorista". A pergunta que fica é: se foi mesmo assim, por que o ministro levou tanto tempo para se explicar? Se constatou que sua liminar estava sendo usada indevidamente para lhe atribuir a obstrução das investigações de lavagem de dinheiro e corrupção, por que, então, não expediu prontamente uma nota oficial ou convocou uma coletiva para dar conta do "equívoco" e acabar com o “terrorismo” da imprensa?

No que diz respeito ao hoje senador Flavio Bolsonaro, sujeito não tão oculto nesse julgamento, a defesa do filho do presidente alega que o repasse dos dados ao MP sem autorização da Justiça caracterizaria quebra de sigilo, mas o fato é que a quebra do sigilo fora autorizada pela Justiça, e uma proibição do uso desses dados significaria impedir ad aeternum a investigação de zero um. Como bem observou um desembargador do TRF-2 a propósito de outro assunto, “se tem rabo de jacaré; couro de jacaré, boca de jacaré, então não pode ser um coelho branco”.

Josias de Souza, com o humor cáustico que caracteriza seus comentários no Jornal da Gazeta, explicou que o Toffoli se expressou num idioma muito parecido com o português, só que muito mais confuso: o toffolês. Quem conseguiu ouvir toda a explanação sem cochilar ficou com a impressão de que ele votou a favor da imposição de condições para o compartilhamento de dados sigilosos sem autorização judicial. O ex-Coaf não poderia entregar aos investigadores senão dados genéricos. Detalhamentos, só com autorização judicial. A continuidade dos inquéritos congelados desde julho — o de Flávio Bolsonaro e outras 935 investigações — ficaria condicionada a uma análise caso a caso. As restrições seriam ainda maiores para a Receita Federal. Após apalpar os dados enviados pelo Fisco, o MP seria obrigado a comunicar imediatamente a abertura de uma investigação ao juiz, que supervisionaria o inquérito.

As explicações soaram claras como a gema. Munidos de todas as informações transmitidas por Toffoli, os repórteres tiraram suas próprias confusões e, um tanto constrangidos, cercaram o orador no início da noite para lhe pedir que trocasse em miúdos o voto que começara a ler no expediente da manhã. "Em relação ao Coaf, pode sim compartilhar informações", declarou Toffoli. "Mas ele é uma unidade de inteligência. O que ele compartilha não pode ser usado como prova. É um meio de obtenção de prova." Então, não haveria nada de novo sob o Sol, pois a coisa já funciona exatamente assim. Mais tarde, em novo esforço de tradução do toffolês para o português, o gabinete de Toffoli informou que, no caso do Coaf, não há novas limitações. Como assim? Considerando-se que os relatórios produzidos pelo órgão não incluem documentos detalhados, poderiam continuar circulando no formato atual. Se é assim, por que diabos o descongelamento do inquérito contra Flávio Bolsonaro e os outros 935 dependeriam de análises posteriores? Nada foi dito sobre esse paradoxo.

Em seu voto-latifúndio, Toffoli disse que o MP não poderia, em hipótese nenhuma, "encomendar relatórios" ao UIF (novo nome do Coaf). Na tradução do gabinete, procuradores e promotores podem requisitar complementos de informações recebidas da unidade de inteligência. Toffoli repetiu várias vezes a expressão "lenda urbana". Fez isso, por exemplo, ao assegurar que o julgamento iniciado nesta quarta não tem nada a ver com Flávio Bolsonaro, reiterando a doutrina Saci-Pererê ao sustentar que a liminar que concedera em julho, a pedido da defesa do primogênito do presidente, havia paralisado "poucos processos".

Faltou explicar por que considera o congelamento de 935 inquéritos pouca coisa. Alguns ministros esforçaram-se para reprimir uma risadinha enquanto ouviam Toffoli. Com a ironia em riste, um dos colegas de presidente do Supremo referiu-se ao voto dele como "uma grande homenagem ao Dia da Consciência Negra." Num flerte com o politicamente incorreto, o ministro declarou: "O voto do relator foi um autêntico samba do crioulo doido". Vivo, Sérgio Porto, o magistral criador do samba, discordaria. Seu crioulo entoou: "Joaquim José / Que também é / Da Silva Xavier / Queria ser dono do mundo / E se elegeu Pedro II". Não dizia coisa com coisa, mas era taxativo. Dias Toffoli, por gelatinoso, terá de explicar-se novamente diante dos seus pares, pois vários deles foram dormir ruminando dúvidas sobre o voto de dimensões amazônicas.

O fato é que Toffoli começou com dois pés esquerdos a leitura do seu voto. Logo de início, o presidente do STF produziu duas pérolas. A primeira: "Aqui não está em julgamento o senador Flávio Bolsonaro". A segunda: "poucos processos foram paralisados por sua decisão; seus críticos é que tentaram criar um "clima de terrorismo".

Foi graças a um habeas corpus da defesa de Flávio Bolsonaro que Toffoli enfiou o Coaf dentro de um processo que envolvia apenas a Receita Federal. Foi por conta do mesmo recurso que Toffoli congelou o inquérito que corre contra o filho do presidente e outros 935 processos fornidos com dados do Coaf. Toffoli jura que o vínculo do filho do presidente com o processo, assim como o Saci-Pererê, jamais existiu. Mas o advogado do zero um estava presente na sessão da Suprema Corte. Assim como as autoridades que cuidam dos outros 935 processos travados por Toffoli, o defensor de Flávio Bolsonaro esfregava as mãos, na perspectiva de que o caso contra seu cliente seria anulado. Quer dizer: Ao contrário do Saci, o interesse dos encrencados é real e tem múltiplas pernas. Dependendo da decisão a ser tomada pelo Supremo, o UIF é que pode sair do julgamento como uma "lenda urbana", um órgão de controle mudo e sem pernas.

AtualizaçãoA sessão suprema de ontem foi dedicada integralmente à complementação (ou tentativa de explicação) do voto de Toffoli e ao voto do ministro Alexandre de Moraes. Para os que não sabem, depois do relator, que é o primeiro a votar, os ministros se pronunciam por ordem de antiguidade, do mais recente para o mais antigo. Pelo que se pôde entender do voto de Toffoli — que fica mais difícil de interpretar a cada vez que seu autor tenta explicá-lo —, Moraes, que votou pela validade do compartilhamento de dados financeiros do UIF (antigo Coaf) e da Receita Federal com o Ministério Público sem autorização judicial, teria aberto a divergência, ainda que parcial, levado o placar a 1 a 1. Na sequência, o julgamento foi suspenso, devendo ter prosseguimento na sessão da próxima quarta-feira (27). Considerando que ainda faltam os votos de 9 ministros e que o Judiciário entre em recesso no dia 20 de dezembro, não está afastada a possibilidade de o resultado final ser conhecido somente em fevereiro do ano que vem.

quinta-feira, 21 de novembro de 2019

O MAQUIAVEL DE MARÍLIA E O COAF


Depois de ser reprovado em dois concursos para magistratura, ambos na fase inicial, que testa conhecimentos gerais e noções básicas de Direito dos candidatos, o Maquiavel de Marília foi guindado por Lula ao STF, em retribuição aos valorosos serviços prestados ao PT, às campanhas de Lula, ao "cumpanhêro" José Dirceu, e por aí afora.

Na sessão plenária do último dia 7, o eminente magistrado levou horas para concluir a leitura do voto com o qual desempatou o placar de 5 a 5 sobre a prisão em segunda instância (alinhando-se, naturalmente, com a fação pró-crime do Supremo). E como não há nada tão ruim que não possa piorar, frisou, na abertura da sessão de ontem, que o processo sub-judice "nada tem a ver com Flávio Bolsonaro", embora não tenha feito qualquer referência ao fato de a liminar que decretou em meados deste ano ter suspendido quase 1000 investigações baseadas em dados fornecidos pelo Coaf, inclusive as que miram sua mulher e a mulher do colega e mentor Gilmar Mendes.

Depois das manifestações da PGR e da defesa do réu, Toffoli monopolizou o microfone por mais de 4 horas, que foi o tempo necessário para a leitora do voto que talvez tenha sido o mais longo de toda a história do tribunal. Além de se mostrar mais prolixo que o decano e o vice decano da Corte — casos clássicos de irremediável paixão pelo som da própria voz —, o ministro conseguiu superar até mesmo a enigmática Rosa Weber, que se notabilizou por perorar numa espécie de Dilmês Castiço que nem ela própria compreende.

Dado o grau de impenetrabilidade de suas considerações, Toffoli não foi capaz de dirimir as dúvidas de seus pares, mas o que mais me chamou a atenção em sua verborrágica diarreia foi ele dizer que seu voto alinhavava todos os elementos necessários à formação da tese (a decisão terá efeito vinculante e norteará as instâncias inferiores), e ainda que precedesse essa pérola com "a devida vênia dos que eventualmente divirjam", parecia não ter dúvidas de que poucos ousariam discordar de seu entendimento. Mas não foi bem essa a impressão que ficou no final da sessão, quando vários ministros buscaram esclarecimentos, e o mestre de cerimônias do supremo circo de horrores achou por bem suspender os trabalhos até a tarde desta quinta-feira. Vamos acompanhar e ver que bicho dá.   



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Então fica combinado assim: Dias Toffoli, presidente do STF, pediu e obteve cópias de todos os relatórios de inteligência financeira produzidos pelo antigo Coaf (hoje UIF) nos últimos três anos. Mas não os leu. Pediu para quê, então? Isso não ficou claro até agora. Talvez tenha pedido à falta do que fazer. Ou pedido para testar se sua autoridade seria desafiada – e ela não foi. Quem se arriscaria a cair em desgraça junto ao ministro mais supremo do Supremo?

Bem, com certeza estão em algum arquivo do gabinete de Toffoli informações sigilosas que envolvem cerca de 600 mil pessoas (412,5 mil físicas e 186,2 mil jurídicas), muitas delas expostas politicamente e com prerrogativa de função. E ele não as consultou!

Toffoli havia alegado que precisava entender o procedimento de elaboração e tramitação dos relatórios. Se fosse apenas isso, bastaria que um técnico lhe passasse um e-mail contando o que ele queria saber por curiosidade ou extrema necessidade.

Ao decretar o fim da investigação da Receita Federal sobre sua mulher, Roberta Rangel, e a mulher de seu parceiro Gilmar Mendes, Guiomar, o Maquiavel de Marília requereu, sem nenhuma justificativa racional, dados financeiros sigilosos de 19 mil 441 casos envolvendo 600 mil pessoas físicas e jurídicas. E passou a ser proprietário exclusivo dos segredos garantidos por lei de uma miríade de cidadãos indefesos perante seu poder absoluto e ilegítimo. Não foi eleito para isso e sequer passou num concurso público para juiz na primeira instância. Este é um óbvio motivo para seu impeachment, mas sua excelência está salvaguardado porque proibiu o MP-RJ de investigar o primogênito de Bolsonaro por práticas contábeis suspeitas na Alerj, da qual saiu para garantir foro privilegiado por 8 anos no Senado.

Imagine que não fosse o presidente do Supremo que tivesse pedido o que Toffoli pediu, recebeu, mas não acessou. Resistiu à tentação, digamos assim. Imagine que fosse o presidente da República, ou da Câmara dos Deputados, ou do Senado… A gritaria estaria grande. Já se falaria em impeachment. Que direito teria qualquer um deles de conhecer a vida contábil de tanta gente? E assim sem mais nem menos? Por muito pouco, quem hackeou conversas entre procuradores está preso.

Qualquer cidadão no gozo dos seus direitos pode protocolar no Senado um pedido de impeachment de Toffoli. Dará em nada. Como deram em nada até hoje dezenas de pedidos contra outros ministros. Todos foram arquivados. Mas… Nunca se sabe.

Onde fica o direito ao sigilo das pessoas? Nem o ministro mais supremo do Supremo pode violá-lo a qualquer pretexto ou sem nenhum.

A suprema tragédia deve julgar na sessão de hoje a liminar que paralisou as investigações com dados compartilhados pelo COAF sem autorização judicial. A princípio, o plenário ficaria dividido, mas é preciso levar em conta que se estará julgando uma decisão do próprio presidente.

Não há nenhuma explicação para Tofolli ter suspendido todas as investigações no Brasil. E agora descobriu-se que ele pediu e recebeu da Receita Federal processos de mais de 600 mil pessoas. A única explicação para isso é que informação é poder. Ele fez exatamente o que contestou ao suspender os processos. 

O STF está ganhando poderes que não são dele, e ganha porque há um vácuo de poder no pais; há um executivo disfuncional e a partir daí, o Tribunal passou a fazer um papel político de defesa do presidente e de contenção de danos dos próprios ministros que estariam sendo investigados. E um STF superpoderoso assim não funciona numa democracia. Mas votar contra isso é ir contra o presidente, contra a própria corporação. 

Se houver uma visão crítica das atitudes do presidente do STF, será uma reunião plenária muito confusa, conflituosa. Não sei o que irá funcionar: o corporativismo ou o sentido crítico dos ministros. A OCDE disse que em nenhum lugar do mundo se exige autorização judicial para investigações de lavagem de dinheiro e corrupção.

Com Ricardo NoblatJosé Nêumanne e Merval Pereira.

terça-feira, 19 de novembro de 2019

PRA QUEM GOSTA É UM PRATO CHEIO (TERCEIRA PARTE)



Cerca de 15 horas depois de uma das mais abjetas decisões plenárias do STF — cuja composição é hoje a pior de toda a história do tribunal —, Lula já destilava seu ópio para uma penca de militantes. Não foi encontrar os filhos — que tampouco se deram ao trabalho de esperá-lo na saída da prisão —, nem levar flores ao túmulo da ex-primeira dama ou visitar as sepulturas do irmão e do neto (falecimentos que ele explorou com maestria de dentro de sua sala VIP na superintendência da PF em Curitiba). Em vez disso, como o bom mau caráter que é, preferiu escarrar vitupérios contra Bolsonaro e os ministros Moro e Guedes e exortar sua récua de jumentos amestrados a reproduzir no Brasil o que a esquerda chilena vem fazendo no país vizinho.

ObservaçãoLula não visitou os túmulos dos parentes mortos durante a temporada na cadeia porque “eles foram cremados”. A família do irmão Vavá informa: o corpo de Genival Inácio da Silva foi sepultado no Cemitério Pauliceia, em S. Bernardo do Campo. Alguém se surpreende com mais essa mentira vinda da que nasceu para mentir?

O placar de 6 votos a 5 pelo restabelecimento da jurisprudência nefasta que autoriza a prisão somente após o processo transitar em julgado — o que equivale a dizer "no dia de São Nunca" — foi alcançado no último dia 7 com o voto de minerva do Maquiavel de Marília, mas o cenário havia sido delineado na sessão do dia 27 de outubro, quando a ministra Rosa Weber, talvez por pura incompetência, talvez por gratidão a quem forneceu a toga que hoje lhe recobre os ombros — embora Rosa tenha sido indicada por Dilma, em 2011 a calamidade travestida de gente não dava um peido sem a devida aprovação de seu criador e mentor —, mudou o entendimento que mantinha até então e se aliou à fação pró-crime da nossa mais alta corte de injustiça.

Chegou-se a imaginar que o supremo mestre de picadeiro oferecesse uma terceira via, ou que votasse com a ala punitivista, mas, como o escorpião da fábula, o artrópode de toga não foi capaz de agir contra sua natureza e ficou do lado de Lula — responsável por sua nomeação para a Suprema Corte.

Em seu voto, cuja leitura demorou cerca de 3 horas, Antonio Maquiavel Dias Toffoli perorou absurdos com “lenda da impunidade” antes de concluir alegremente que a prisão após o trânsito em julgado não é o desejo de um juiz, mas a vontade do povo brasileiro (não foram exatamente essas suas palavras, mas o sentido foi exatamente esse). Ao final, como quem jogava migalhas aos cães, disse que a Corte não se oporia no caso de o Congresso alterar o CPP e "legalizar" a prisão após a condenação em segunda instância.

Acaba anão quem cuida de coisas pequenas, se deixa envolver por questões menores em detrimento da grandiosidade das decisões e confunde grandeza de espírito de espírito com espírito de grandeza, dizia Ulysses Guimarães. Toffoli preferiu entrar para a história como o presidente do STF que, para favorecer o PT e seu eterno presidente de honra, martelou o derradeiro prego no esquife da maior operação anticorrupção da história deste país, sobretudo porque defecou sobre a Constituição e usou como papel higiênico as páginas que restaram pautando esse julgamento num momento em que Lava-Jato está particularmente fragilizada devido à Vaza-Jato de Verdevaldo das Couves (esse, sim, deveria passar uns bons anos atrás das grades, de preferência num presídio comum, em cela apinhada de estupradores e assassinos contumazes) e ao clima nada alvissareiro para Deltan Dallagnol na suprema usina de injustiças.

E così la nave va. 

sexta-feira, 15 de novembro de 2019

130 ANOS DE REPÚBLICA PARA DAR NISSO?



O presidente de fato do Brasil vestiu a toga de ministro sobre a farda de militante em 2009, levando na bagagem uma fieira de serviços prestados ao PT, a José Dirceu e a Lula e duas reprovações em concursos para juiz de primeira instância (ambas na fase preliminar, que testa conhecimentos gerais e noções básicas do Direito).

Sem currículo nem conhecimento ou luz própria, privado dos laços com a rede protetora do partido e do padrinho, esse filho de Marília seguiu o caminho usual dos fracos: no melhor estilo República Velha, foi buscar apoio em Gilmar Mendes, que é quem melhor encarna a figura do velho coronel político. Uma vez consolidado no habitat, passou a emular os piores hábitos do novo mentor a arrogância incontida, o ego avantajado, a falta de limites e o uso da autoridade da forma mais arbitrária possível. Mas nada disso nos autoriza a menosprezar a capacidade de José Antonio Maquiavel Dias Toffoli. Basta ver como ele conciliou a blindagem de Flávio Bolsonaro (que o papai Jair deve nomear presidente da "Aliança pelo Brasil", caso consiga realmente fundar o partido, que nascerá sob os auspícios de Mercúrio, o deus dos ladrões, e com a pecha da corrupção) com a de sua esposa e a da mulher da maritaca de Diamantino. Mas isso é conversa para outra hora.

Em 2016, a teimosia da aliada Rosa Weber em manter convicção a favor da obrigatoriedade de cumprir o “trânsito em julgado”, mas negar-lhe voto, apoiada na falsa lealdade ao colegiado, levou o petista Dias Toffoli e o tucano Gilmar Mendes a apoiarem o início da pena após terceira instância. Sem respaldo algum sequer na leitura mal feita do texto constitucional, que ampara sua posição original numa quimera mal-intencionada, o primeiro tentou no desespero soltar os chefes da vida inteira, Lula e Zé Dirceu, com truque que naufragou quando 5ª Turma do STJ confirmou por 5 votos a 0 a decisão das instâncias anteriores.

Em 2019, no quinto julgamento em dez anos, ou seja, um a cada dois, Rosa Weber mandou os escrúpulos às favas e garantiu o voto da vitória. Alguns crentes do caráter da dupla Gilmar-Toffoli acreditaram que a chamada modulação do presidente do Supremo poderia ser exatamente a proposta anterior, sepultada pela dura constatação da condenação em três instâncias. A vã ilusão animou até o desavisado relator da Lava Jato, Edson Fachin, a acenar para a possibilidade de apoiar a quimera anunciada, mas nunca cumprida. Só que a iniciativa apenas o fez cair no ridículo mal disfarçado e em descrédito geral.

O voto de Toffoli pela derrubada da autorização de um juiz para o começo do cumprimento de pena após a condenação por um juízo colegiado serviu para confirmar a ignorância de semântica do ministro derrotado em dois concursos para magistrado de primeiro grau. A viga mestra de apoio à teoria da obrigatoriedade constitucional rui à vista de qualquer aluno de curso primário. O inciso 57 do artigo 5.º da Constituição remete às calendas da culpabilidade considerar o indigitado culpado, sem jamais proibir que se o prenda.

Abalam a estrutura do despautério verbetes de dicionários, dos populares aos eruditos, e a dura realidade carcerária: dos presos provisórios no Brasil que são os atingidos pela medida (41,9%), muitos já cumpriram a pena ou nem sequer foram processados. Mas estes são em geral pobres, que não podem pagar advogados que frequentam as Cortes superiores, em Brasília, e dependem de defensores públicos. Estes não fazem o trabalho a cumprir, de vez que se dedicam a apoiar defensores nobres dos suspeitos milionários de viverem à custa do furto do erário, na charmosa tribuna onde são adulados por membros do “excelso pretório”.

Em suma: as ruas estão cheias de condenados que não estão presos porque a rotina policial nas investigações dos crimes violentos é de total incompetência, e as prisões estão superlotadas com desobrigados de frequentar celas, com a pena finda, ou de cidadãos cuja “presunção de inocência” nunca foi questionada, por falta de renda para pagar defesa. O argumento dos seis votos vencedores padece de autenticidade gramatical e do mínimo de sensibilidade social. Expressões como “populismo judicial”, da lavra do Boca do Inferno Gilmar, soam como preconceito de classe, de vez que acusam o povo de incapacidade de ter opinião e maldizem colegas que escutam o clamor popular batendo à porta de covardes. Mas verdade seja dita: a acusação feita pelo Rui Barbosa de Diamantino, amigo de fé do ex-governador Silval Barbosa, de que a imprensa não gosta de povo, serve como uma toga bem cortada nos próprios ombros.

O espetáculo grotesco da última sessão, em que o fundador do Instituto de Direito Público enunciou seu voto, mostrou contradições ainda mais gravosas. Sem espanto geral, Sua Excelência (como seu colega de capa e de voto Marco Aurélio exigiu ser tratado) recorreu a “provas” roubadas pelos “ararahackers” para acusar o ministro Sergio Moro de combinar com a força-tarefa da Lava-Jato, o que comprovaria sua parcialidade. Mas não ocultou a própria combinação com o príncipe do verbo em falso, Dias Toffoli do PT, de assuntos do interesse particular do tema em disputa, em nada coincidente com a questão votada.

Em determinado momento, o presidente pediu a palavra, que lhe foi concedida. E a dirigiu a Alexandre de Moraes, que respondeu sobre certo advogado que esteve para ganhar R$ 1,3 bilhão para dar forma jurídica a uma fundação de procuradores cujo capital seria formado pelo dinheiro devolvido pelos réus da Lava-Jato ao Tesouro. Aparentemente, o terceiro elemento no trio da armação estava fora até do contexto. Afinal, foi a hipotenusa que votou contra o interesse dos dois catetos. Mas não se arriscou a nomear a vítima da infâmia, tarefa transferida para o votante. Gilmar não se fez de rogado: Modesto Carvalhosa, que acusou também de ser falso professor da Faculdade de Direito da USP. Este, livre-docente aposentado, após lecionar por mais de 20 anos nas famosas arcadas, de fato não ficou em primeiro lugar no concurso por uma cátedra. E foi contratado como advogado por acionistas americanos prejudicados pela administração petista, que quase levou a Petrobrás à ruína, episódio que nada tem que ver com a tal fundação. Fundação, aliás, que nem chegou a existir, por desistência do autor da ideia, Deltan Dallagnol, que terá de pagar pelo palpite infeliz em ação de Renan Calheiros, recordista em processos no STF.

O Trio TernuraMoraes, Toffoli e Gilmar — é alvo de ações de impeachment do professor da USP. Depois desse desempenho execrável no plenário, o Maquiavel de Marília disse no domingo subsequente, em que o povo se manifestou nas ruas contra a falseta da Corte dos desiguais: “O Judiciário e a Justiça são feitos para a pacificação social. Se alguém quer se valer da Justiça para uma luta social não vai conseguir. A Justiça não tolerará uma crise institucional e saberá agir a tempo e a hora”. Vale lembrar que, tão logo foi solto, o sem-caráter de Garanhuns acusou o presidente da República de governar para os milicianos do Rio, e não para a população brasileira.

Na verdade, a palavra do togado supremo e atual presidente dos demais supremos togados continua pesando como uma pluma e infectando o ar como uma bactéria mentirosa e sem valor, a não ser para o mal. Mas é propagada. Para o presidente de fato desta república de merda (a que ponto chegamos!), “radicalismo não leva a lugar nenhum; o que se espera é que as pessoas tenham serenidade e pensem no Brasil”. Toffoli declarou, ainda, que “a nação brasileira é devedora das Forças Armadas para a construção do Brasil e para a unidade nacional, assim como o Judiciário”.

Acontece que o momento certo foi a votação em que a gramática foi corrompida e a Constituição adulterada em benefício exatamente de quem é o inspirador da guerra que separa ideologias e regiões, desde que lançou norte contra sul e pobres contra ricos para vencer o anódino Geraldo Alckmin na reeleição conquistada em 2006. No entanto, a carapuça serve a todos, incluindo o ex-presidente tucano Fernando Henrique, que, em sua manifestação depois da soltura de Lula, usou o Twitter para comentar o atual ambiente político brasileiro, no domingo 10. “A polarização aumenta. Sem alternativas populares e progressistas continuaremos no jogo político/pessoal”, afirmou.

A pretensão de ser líder de progressistas condutores das alternativas populares (uma ofensa à gramática, pois alternativa só há uma) reveste o social-democrata de Higienópolis de um ridículo que não chega a ser relevante, de vez que o emplumado tucanato também foi beneficiado pela canetada do eixo Marília-Diamantino com a liberdade concedida ao pioneiro de todos os mensalões, o mineiro Eduardo Azeredo. O prócer foi governador de Minas Gerais e presidente nacional do PSDB, para desonra geral de quem nem sequer jamais incentivou sua expulsão da sagrada legenda.

A bem da verdade, ficou faltando esclarecer que o Conselheiro Acácio da presunçosa toga não é o único nobre presidente de Poder no Brasil a merecer o valor do vintém, que nem existe mais, para a própria palavra. Rodrigo Maia, Davi Alcolumbre e Jair Bolsonaro não o deixam só.

Devido ao fim de semana prolongado e a problemas de saúde, resolvi não postar o Blog nem amanhã, nem domingo. Bom feriadão a todos e até segunda, se Deus quiser.

quarta-feira, 13 de novembro de 2019

SÓ FALTA MORRER PRA CANONIZAR... AMÉM



A composição do STF, que nunca foi grande coisa, ficou pior depois que Lula e Dilma fizeram oito nomeações. Mas nem todos os indicados pela parelha vermelha vestiram a toga por cima da farda. Tanto é assim que 3 dos 6 votos responsáveis pelo formidável coice que levamos na última quinta-feira foram proferidos por apaniguados dos ex-presidentes Sarney, Collor e FHC.

Sempre me chamou a atenção a obstinação dos garantistas de araque pela restauração do entendimento que vigeu durante míseros 7 anos das últimas 8 décadas. Aliás, antes da decisão da semana passada, a possibilidade da prisão após condenação em segunda instância foi debatida nada menos que três vezes nos últimos 4 anos — e mantida todas as vezes, ainda que por estreitíssima maioria. 

Irresignada, a ala vencida moveu mundos e fundos para rediscutir o tema tantas vezes quantas fossem necessárias para faze a balança pender pro seu lado, como os dois amigos que disputam no par ou ímpar quem paga a cerveja e o mau perdedor insiste em jogar de novo até sair vencedor. Mas o mais curioso é Gilmar Mendes perorar que (agora que ele conseguiu o que queria) o novo entendimento deve vale per omnia saecula saeculorum, como se a decisão tivesse sido tomada por unanimidade.    

O primeiro beneficiado suprema comédia foi justamente aquele em favor de quem se armou toda a fraude jurídica encenada nos últimos meses. Toffoli nem bem havia acabado de cuspir na cara dos brasileiros e seu ex-patrão já deixava voltava para São Bernardo a bordo do luxuoso jatinho comprado em 2013 por R$ 17,7 milhões pela empresa Brisair Serviços Técnicos Aeronáutica, do casal de apresentadores globais Luciano Huck e Angélica.

Com a decisão tomada pela facção pró-crime do STF — por maioria de um único e miserável voto dado justamente por um ex-funcionário do partido que mais roubou na história brasileira —, a utilização da incomparável coleção de privilégios oferecidos pela lei brasileira a réus da elite, que roubam e pagam chicaneiros de luxo com o dinheiro roubado, volta a permitir que essa caterva fique fora da prisão enquanto o dinheiro não acabar. Mas isso não quer dizer que essa gentalha voltou a dar as cartas. Podem estar soltos e rindo da cara dos 200 milhões de otários que precisam trabalhar para ganhar a vida — mas para roubar de novo precisam estar no governo, e no momento eles não estão no governo.

O essencial neste país, onde seis ministros da mais alta corte de justiça trabalham oficial e descaradamente em favor dos criminosos cinco estrelas, deixou de ser a luta contra a sua impunidade perpétua. O que realmente importa, pelo menos agora e no futuro imediato, é impedir que seja retomado o processo de privatização do Estado em benefício de um partido político, do mundo que gira em torno dele e dos magnatas que compram os seus favores. Esta distribuição geral do bem público para indivíduos, interesses e grupos privados vigora no Brasil desde sempre – mas nunca foi praticada de maneira tão aberta e tão agressiva como nos governos do presidente Lula e de sua sucessora.

Com J.R. Guzzo

segunda-feira, 11 de novembro de 2019

AINDA SOBRE O SUPREMO CIRCO DE HORRORES


Há muito que os cidadãos de bem deste país vêm sendo duramente punidos pelas más escolhas de um eleitorado desinformado e semianalfabeto. Para ficar no período pós-redemocratização, a coisa mais parecida com um estadista que ocupou o gabinete mais cobiçado do Palácio do Planalto foi o grão-tucano Fernando Henrique. Dos demais, não se salvou nenhum. É certo que na maioria das vezes — com destaque para o pleito de 1989 e o de 2018 — as más escolhas decorreram de uma quase absoluta falta de opção. Mas é incontestável que o panorama democrático que se descortinava com a volta dos militares aos quartéis começou a se esvanecer quando o caçador de marajás derrotou o fundador do partido dos trabalhadores que não trabalham, dos estudantes que não estudam e dos intelectuais que não pensam. E de lá para cá a coisa só piorou, sobretudo quando o petralha maldito assumiu o poder e, mais adiante, fez eleger sua abjeta sucessora.

Ao longo das gestões petistas — marcadas por um profundo endurecimento dos aparelhos de repressão do Estado e de suas instituições jurídicas —, foram empossados nada menos que oito ministros supremos, sete dos quais ainda permanecem em suas confortáveis poltrona, escarnecendo de quem banca seus polpudos contracheques. Não fosse a PEC da Bengala (proposta em 2005 e aprovada pelo Congresso uma década depois) ter aumentado de 70 para 75 anos a idade em que a aposentadoria dos ministros passa a ser compulsória, já nos teríamos livrado ao menos dos lulistas de Ricardo Lewandowski e Rosa Weber — além de Celso de Mello e Marco Aurélio, indicados respectivamente por Sarney e Collor.

O desserviço que esses inimigos do povo vêm prestando à nação culminou com a decisão da última quinta-feira, cujas nefastas consequências se fizeram notar já no dia seguinte. Ao deixar a sala VIP onde foi tratado como um rei por 580 dias, Lula serviu a uma cáfila de apoiadores o aperitivo para a lauta refeição que ofereceria, no dia seguinte, defronte do Sindicato de Metalúrgicos de SBC (onde havia se encastelado quando teve a prisão decretada e de onde tripudiou da Justiça por mais de 24 horas até finalmente se entregar). 

Em ambas as vezes, o encantador de jegues disparou vitupérios contra o presidente Jair Bolsonaro (a quem acusou de governar para as milícias), o ex-juiz federal Sérgio Moro (a quem chamou de "canalha"), a Paulo Guedes (a quem ser referiu como "demolidor de sonhos" e atribuiu todas as mazelas do Brasil, como se Dilma jamais tivesse existido), a Lava-Jato e a Rede Globo, além de posar como candidatíssimo a um terceiro mandato (embora esteja inelegível até 2035, quando, se o diabo ainda não o tiver carregado, terá 89 anos de idade).

"Eu estou de volta", sibilou, dedo em riste e cenho transfigurado pelo ódio em rascunho de mapa do inferno. Entre os integrantes da claque amestrada que dividiu com ele no palanque, o eterno bonifrate exibia um sorriso idiota, como que para disfarçar seu visível constrangimento, enquanto narizinho, a eterna "amante", parecia ter um orgasmo cada vez que o chefe da quadrilha defecava pela boca, e um sujeito que eu não consegui identificar fazia uma coreografia esquisita, como as macacas de auditório no programa Sílvio Santos. Não fosse trágico, seria cômico.

Entrementes, movimentos de apoio à Lava-Jato e grupos de direita realizavam manifestações de rua em diversas capitais do Brasil, protestando contra a decisão do Supremo e fazendo um apelo ao Congresso pela aprovação da PEC 410, que autoriza a prisão após a condenação em segunda instância, e pela instauração da "CPI da Lava-Toga". A cobertura da imprensa foi pífia, de modo que não me foi possível descobrir em quantos municípios eles aconteceram e com quantos participantes contaram, mas sei que Sampa, Curitiba, Brasília, Rio e Porto Alegre foram as capitais que mais se destacaram.

Na Câmara e no Senado, tramitam duas PECs diferentes regulamentando a prisão após condenação em segunda instância. Os presidentes das respectivas CCJs, Felipe Francischini e Simone Tebet, prometeram pautá-las nas próximas semanas, apostando na pressão das ruas para sensibilizar os presidentes das duas casas, Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre, que vêm demonstrando resistência ao tema.

Sem prejuízo de outros efeitos deletérios, a decisão dos supremos inimigos públicos jogou mais combustível na já inflamada conjuntura brasileira ao promover um bandido condenado por 20 juízes diferentes em três instâncias do Judiciário (e réu em outras 9 ações penais) a candidato a um terceiro mandato presidencial. No extremo oposto, Bolsonaro recomendou a seus apoiadores incondicionais: "Não vamos contemporizar com presidiário" (mas se reuniu com a cúpula militar do governo e das Forças Armadas para tratar da liberdade do arquirrival), e Moro rebateu na mesma linha do presidente: "Aos que me pedem respostas a ofensas, esclareço: não respondo a criminosos, presos ou soltos. Algumas pessoas só merecem ser ignoradas". Guedes não se manifestou e a Globo se limitou a repudiar as acusações que lhe foram endereçadas.

Graças àquilo que se tornou nossa Suprema Corte, deflagrou-se com mais de três anos de antecedência a sucessão de 2022, e os primeiros discursos soaram como uma declaração de guerra. Lula anunciou que vai sair em caravana pelo país dentro de 20 dias — o que pode ser bom se os paranaenses capricharem mais na pontaria ou se uma bala perdida fizer o que não fizeram aqueles que tiveram chance de golpear a jararaca na cabeça, mas preferiam bater na cauda.

Segundo Josias de Souza, o eleitorado tupiniquim está rachado em três pedaços. Num extremo, um terço pró-Bolsonaro. Noutra extremidade, um terço simpático à radioatividade de Lula. No meio, um terço que reza por moderação enquanto se equipa para decidir a próxima sucessão presidencial. Lula e Bolsonaro parecem subestimar a inteligência da plateia. Um, colecionador de ações criminais, já não retira coelhos da cartola, só gambás. Outro, dedicado à fabricação de crises, não se deu conta de que foi colocado ao volante para dar um rumo à economia, não para passar quatro anos xingando o retrovisor.

Observação: Tanto Figueiredo quanto Bolsonaro disseram (cada qual a seu tempo e à sua maneira) que a ditadura errou. Para o general que preferia o cheiro dos cavalos ao do povo, o erro foi ele, Figueiredo, ter sido encarregado de orquestrar a abertura; para o capitão caverna, foi terem torturado demais e matado de menos. Está cada dia mais difícil contestá-los, e preocupa-me a sensação de que as declarações infelizes do abilolado zero três podem não ser tão estapafúrdias. A que ponto chegamos!

domingo, 10 de novembro de 2019

O VERDADEIRO PRESIDENTE DO BRASIL



Quem preside o Brasil, atualmente, não é o chefe do Executivo. Tampouco é o Congresso quem legisla. O Judiciário absorveu ambas essas atribuições e, através de um inusitado golpe institucional, vem restaurando o império da corrupção.

Como tudo que é ruim sempre pode piorar, a situação tende a se agravar enquanto a sociedade não pressionar deputados e senadores para que restaurem a prisão em segunda instância e alterem a composição do STF e a forma como os ministros são nomeados, bem como darem seguimento às dezenas de pedidos de impeachment contra os togados que cometeram crimes de responsabilidade (mais de uma dezena dormita nos gavetas de Alcolumbre, a maoiria contra Gilmar Mendes e Dias Toffoli).

"O Supremo se tornou o verdadeiro poder no Brasil, e o poder para o mal", salientou o professor Modesto Carvalhosa em entrevista concedida neste sábado ao Jornal da Manhã da Rádio Jovem.

Segundo o jurista, a suprema jabuticaba podre da última quinta-feira culminou o trabalho que a Corte vinha desenvolvendo há tempos, concedendo habeas corpus em maça para corruptos, empurrando para as calendas o julgamento dos julgamento dos processos e blindando criminosos de investigações em andamento, como fez Toffoli ao atender o pedido da defesa do senador Flávio Bolsonaro (que paralisou todas as ações baseadas em dados obtidos junto ao Coaf e à Receita Federal), tudo com o propósito óbvio e ululante de restaurar, na cara dura, o governo populista de esquerda.

Como se viu ontem após a primeira torrente de solturas, a sociedade brasileira está refém da bandidagem. Em nenhum país do mundo a prisão do condenado depende do trânsito em julgado da sentença — entendimento absurdo, mas defendido por magistrados inimigos do povo com base numa interpretação facciosa do inciso 57 do artigo 5º da Constituição, segundo o qual ninguém pode ser considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença condenatória.

Não é crível nem possível que um "canalha" (para usar a definição que Bolsonaro  escolheu quando finalmente resolveu comentar a libertação de Lula) não possa ser preso após ter sido condenado por um juiz de primeiro grau, três desembargadores do TRF-4 e oito ministros do STJ. Exigir o trânsito em julgado após terceiro ou quarto graus de jurisdição para autorizar prisão do condenado afronta a Constituição e coloca em descrédito a Justiça brasileira. Quando mais não seja porque é na segunda instância que se encerram a produção de provas e a discussão sobre a materialidade do fato. Só não vê isso quem não quer.

Só para relembrar: No STF, que têm 1150 funcionários concursados e cerca de 1700 terceirizados, cada ministro tem direito a até 40 assessores e 3 juízes auxiliares. Manter esse dinossauro alimentado custa aos contribuintes mais de R$ 1 bilhão por ano. Some a isso os R$ 6 bilhões que custam o STJ e o TST, os salários e mordomias de senadores, deputados federais, governadores, deputados estaduais, prefeitos e vereadores e os bilhões tragados pelo ralo da corrupção e veja porque você trabalha 153 dias por ano só para pagar impostos (que consomem 41,80% da sua renda) e o Erário nunca tem dinheiro para investir em Saúde, Educação, Segurança, etc.

Segundo J.R. Guzzo, o Brasil da corrupção, do desprezo pelo império da lei e da impunidade perpétua para os bandidos da elite ganhou de novo. Ganhou por pouco, e teve de ir aos seus piores extremos, em matéria de mentira, falsificação da realidade e prática avançada da trapaça para ganhar, mas garantiu um período de sobrevida para a usina de lixo que processa o que existe de mais tóxico na vida pública e privada deste país.

Os seis ministros que votaram contra a possibilidade de mandar para a cadeia criminosos que foram condenados duas vezes seguidas, por juízes diferentes, vão ficar marcados, para sempre, como os cúmplices do crime em modo extremo no Brasil. Sua decisão, que assegurou aos criminosos o direito de ficarem em liberdade enquanto suas sentenças de condenação não “transitarem em julgado”, não é uma interpretação do que está escrito na Constituição, mas uma deformidade patológica — sem paralelo na lei de nenhum país sério do mundo — cujo objetivo é ajudar um corrupto condenado em duas instâncias, mais a manada de ladrões cevada em seus dois mandatos como presidente e no mandato e meio de sua sucessora. Mais do que tudo, pretende retardar ao máximo a eliminação das piores práticas que envenenam a existência do Estado brasileiro.

Constituição? Direito de defesa? Soberania das provas? Que piada. Eles mesmos, no STF, já tinham decidido ao contrário do que acabam de decidir, deixando claro que condenações em segunda instância são suficientes, sim, para se enviar um criminoso para a penitenciária. Não há nada mais para ser provado a essa altura, e ele pode continuar recorrendo para os tribunais superiores — desde que o faça de dentro do xadrez.

O que a facção dos seis fez agora foi aplicar um golpe, embrulhado em palavrório de vigarista jurídico — “sabença”, “ficto”, “convolar” — para favorecer a sua clientela. Está todo mundo cansado de saber quem é ela: as “criaturas do pântano”, que passam a vida cercadas de advogados e que não entendem a noção, nem sequer a mera noção, de que a maioria das pessoas vive de outra maneira.

Ou o Congresso volta a ser um Poder, ou não haverá esperança para esta republiqueta de bananas.      
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Hoje é domingo, e domingo é dia de massa (a menos que, ontem, você tenha jantado a pizza que eu sugeri no post do dia, porque aí não há dieta que aguente). Preparar uma macarronada parece ser tão simples quanto fritar um ovo, mas não se engane: em ambos os casos o resultado será bem melhor se você seguir algumas dicas simples, mas fundamentais. No que concerne ao macarrão, não basta tirar a massa do pacote, colocá-la para cozinhar, depois escorrer, cobrir com o molho e correr para o abraço (ou para o prato, melhor dizendo). Preparar esse prato como manda o figurino demanda alguns cuidados. Confira:

Água: embora a questão seja controversa, a maioria dos entendidos e palpiteiros de plantão recomenda usar 1 litro para cada 100 gramas de massa. Isso porque, sem espaço suficiente para "dançar" dentro da panela, o macarrão ficará grudento. Adicionalmente, prefira cozinhar o alimento numa panela leve (isso facilita na hora de escorrer), mas grande e bordas altas, no estilo caldeirão. Mesmo para quantidades pequenas de massa, ferva pelo menos 3 litros de água. Sempre adicione o sal (a medida  indicada é de 1 e 1/2 colher de sopa de sal para cada 1/2 quilo de massa) depois que a água ferver (ou ela demorará muito mais tempo para entrar em ebulição), e só então coloque o macarrão na panela. Massas longas, como o espaguete, não cabem inteiras em panelas pequenas, mas partir o feixe ao meio é uma heresia. Em vez disso, coloque-o em pé e vá mexendo delicadamente com uma colher de pau de cabo longo. A porção mergulhada na água irá amolecer, e a que está seca imergirá automaticamente. Continue mexendo até que os fios se "espalhem".

Azeite: o truque do fio de azeite que sua avó usava para o macarrão não grudar é coisa do tempo da sua avó. Hoje, adicionar gordura à água deixará a massa pesada e dificultará a absorção do molho. Mas note que, com massas frescas recheadas, adicionar um pouco de azeite na água evita o atrito e impede que elas abram.

Tempo: confira na embalagem o tempo de cozimento recomendado pelo fabricante. O ideal é que a massa fique "al dente", macia por fora mas levemente resistente por dentro. Para alcançar esse ponto, retire o macarrão da água cerca de 3 minutos antes do tempo indicado e termine o cozimento junto com o molho — que você deve preparar concomitantemente em outra panela. Tenha em mente que massas artesanais ou caseiras (como fettuccine) jamais terão a mesma textura firme de massas industrializadas, demandando, portanto, mais tempo de cozimento. Mas tome cuidado para evitar que fiquem moles demais.

Escorra rapidamente: quando a massa ficar "al dente", escorra-a imediatamente — ou ela continuará cozinhando mesmo com o fogo desligado. Note que escorrer a massa não é lavá-la. Só passe o macarrão em água fria se for usá-lo numa salada.

Adicionalmente: reserve uma concha da água do cozimento (ela lhe será útil para encorpar o molho, devido ao resíduo de trigo que a massa solta na água). Se não quiser terminar o cozimento da massa no molho, providencie para que este fique pronto antes daquela (do contrário o macarrão esfria, perde a textura e gruda). Assim que escorrer a massa, junte-a ao molho, misture até que o caldo envolva todo o macarrão e sirva em seguida. Caso prefira servir a macarrão separado do molho, acrescente a ele um pouco de manteiga ou azeite.

Bom apetite.