Mostrando postagens classificadas por data para a consulta barroso filho da puta. Ordenar por relevância Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens classificadas por data para a consulta barroso filho da puta. Ordenar por relevância Mostrar todas as postagens

sábado, 26 de novembro de 2022

PERDEU, MANÉ, NÃO AMOLA!


Somente a notória capacidade de autoconvencimento dos idiotas explica o fato de um grupelho de bolsonaristas radicais continuarem acreditando que seu "mito" venceu as eleições. Mas Valdemar Costa Neto não é idiota. Ele se sujeitou a fazer o jogo de Bolsonaro por interesses financeiros, e acabou que a coligação "Pelo Bem do Brasil" foi multada em R$ 22,9 milhões por litigância de má-fé na mesma penada que rejeitou o pedido de revisão dos votos e mandou investigar Costa Neto e o engenheiro eletrônico Carlos Rocha, contratado pelo PL para auditar as urnas, por “crimes comuns e eleitorais com a finalidade de tumultuar o regime democrático brasileiro”. 
 
A multa milionária causou um racha na coligação. Republicanos e PP alegam que Costa Neto agiu sem consultá-los e por isso o PL deve arcar sozinho com o ônus financeiro. Para essa caterva, faz sentido bancar os arroubos golpistas do mandatário enquanto não houver perda de dinheiro e o risco de ir para o cadafalso. 
 
Na última quinta-feira, os comandantes militares avisaram seu comandante-em-chefe de que não existe unidade nas Forças Armadas para tirar os tanques da garagem visando contentar "patriotas" que continuam bloqueando estradas e montando acampamento diante de quartéis. Chico Alencar escreveu na revista Fórum que "não dá para contemporizar com condutas criminosas". Para os baderneiros, processo e multa por atentar contra a democracia. 
 
Num artigo igualmente brilhante, o colunista e contestador por natureza Ricardo Kertzman anotou que o valor da multa estipulada pelo ministro Alexandre de Moraes não representa nem de perto o dano que esse bando de golpistas vêm impingindo ao Brasil e à democracia. Ordeira ou não, pacífica ou não, com camisa da CBF ou boné do MST, manifestações que defendem golpe militar são crimes previstos em lei. A despeito de erros e abusos cometidos por "Xandão" aqui e acolá, prossegue o articulista, a pena imposta ao PL e a Costa Neto é risível e irrisória — seja porque o dinheiro do partido é nosso, seja porque a justiça só será feita quando o pajé do PL e toda essa gente estiverem atrás das grades.

Em outro artigo lapidar, Mario Sabino escreveu que Luís Roberto Barroso tem seu respeito pessoal e intelectual. Dos atuais ministros do STF, prossegue o jornalista, Barroso é o que deve contar com a única biblioteca interessante, para muito além dos livros jurídicos. "Não concordo com todos os seus votos, mas vejo neles fundamentos sólidos, excelente raciocínio e ótima retórica. Nos julgamentos a que assisti, suas raras exaltações fora, marcantes — entre as estrelas do tribunal, é dele que menos se espera uma palavra fora do lugar."

 

Sabino diz ainda que, por ter respeito pelo ministro, toma a liberdade de dizer que ele errou feio ao reagir a um bolsonarista que o provocou em Nova York. Como era de esperar, a fala viralizou nas redes sociais e serviu para que batessem na tecla de que o magistrado atua com viés político e favoreceu Lula enquanto presidia o TSE, quando na verdade ele sofreu ataques inadmissíveis ao defender a segurança das urnas eletrônicas — como quando foi chamado de filho da puta pelo presidente da República.

 

Ao reagir à provocação com frase de bandido que rende a vítima, quem perdeu não foi o “mané”, mas o ministro, que deixou de lado a temperança, encorpou o discurso golpista e ofendeu não só uma chusma de idiotas, mas também — ainda que de forma involuntária — 58 milhões de brasileiros que votaram em Bolsonaro. Independentemente da péssima qualidade do eleitorado tupiniquim, os servidores públicos (e os ministros do STF são servidores públicos) devem tratar respeitosamente aqueles que pagam seus nababescos salários.

 

Triste Brasil.

terça-feira, 6 de setembro de 2022

INCOMPETÊNCIA OU MORTE

 

Depois de visitar o "PR" com Walter Delgatti — o Vermelho, réu na Justiça Federal por invadir celulares de centenas de personagens públicos —, a deputada bolsonarista Carla Zambelli publicou no Twitter uma foto ao lado do marginal e escreveu: "Muita gente deve realmente ficar de cabelo em pé (os que têm) depois desse encontro fortuito. Em breve novidades"Em contatos informais com a imprensa, a assessoria de Bolsonaro disse o presidente foi “pego de surpresa”, que recusou qualquer serviço do hacker e que repreendeu a deputada. Mas tudo de maneira extraoficial, sem qualquer reprimenda pública. Considerando quão verdadeiros costumam ser os pronunciamentos do presidente, o episódio foi mais uma amostra do que se deve esperar da campanha eleitoral nas próximas semanas (a quem interessar possa, recomendo ler a matéria que Cláudio Dantas e Wilson Lima publicaram na revista eletrônica Crusoé sob o sugestivo título "A campanha da sujeira"). 


Observação: Desde julho, o TSE já mandou excluir da internet ao menos 17 conteúdos irregulares a partir de pedidos de presidenciáveis ou de seus aliados, numa média de uma publicação a cada três dias, informa O GloboNo total, o tribunal recebeu, desde o início do ano, 124 ações por propaganda irregular relacionadas aos candidatos ao Planalto, que incluem de remoção de vídeos com discursos ofensivos e fake news. Mais de um terço delas (37%) foi rejeitada. Os partidos da coligação de Lula foram responsáveis pela metade das ações no TSE (62). No entanto, somente 9 foram aceitas totalmente ou parcialmente até agora. A equipe de Bolsonaro, por sua vez, entrou com 17 pedidos. Dois deles foram aceitos.


 

De acordo com a Justiça Eleitoral, mais de 156 milhões de brasileiros estão aptos a votar. A julgar pelo resultado das últimas eleições, a maioria dessas pessoas não deveria participar sequer de uma eleição para síndico de condomínio. 

Sérgio Moro e João Doria poderiam ter rompido a abjeta polarização, mas foram excluídos do pleito. Ciro Gomes e Simone Tebet dificilmente mudarão o quadro, mas poderão ao menos levar a disputa entre Lula e Bolsonaro ao segundo turno. Ao fim e ao cabo, será eleito o candidato que mentir mais e melhor.
 
Pleitos plebiscitários forçam a minoria esclarecida a optar pelo candidato "menos pior". Foi assim em 2018 e será assim neste ano, a menos que o imprevisto (ou o TSE) tenha voto decisivo na assembleia dos acontecimentos. Lula continuará mentindo que foi absolvido em todas as instâncias da justiça brasileira e inocentado pela ONU, e falando como se as urnas fossem a máquina do tempo que levará o país de volta para 2002.  Já o "mito" dos patetas anda pra lá e pra cá com um pedaço de defunto, discursa como se falasse para a plateia de 2018 (que não existe mais) e prepara um comício golpista para o feriado da Independência. 
 
As eleições deveriam ser a "festa da democracia", e o bicentenário da Independência, um momento de grandes eventos culturais. Sob Bolsonaro, não se sabe quanto desta quarta-feira será comício e quanto será tentativa de golpe. No ano passado, depois de chamar o ministro Barroso de filho da puta, o chefe do Executivo Federal disse que deixaria de cumprir decisões do ministro "canalha" Alexandre de Moraes. No último sábado, voltou à carga pela enésima vez,  chamando o magistrado de "vagabundo". Se as pesquisas o favorecerem, Bolsonaro desistirá do golpe e se concentrará em ganhar a eleição, caso contrário, só lhe restará o tapetão. Como a diferença ainda não é instransponível, fica a dúvida, pois não é fácil dar um golpe de Estado e tocar uma campanha eleitoral ao mesmo tempo. 
 
Se a prioridade for a reeleição, o sociopata continuará fazendo o que fez na "sabatina" do Jornal Nacional, ou seja, mentindo descaradamente sobre coisas que interessam à população — como emprego, comida e vacina. No caso do golpe, as mentiras deverão acirrar o ódio de seus seguidores mais radicais e prometer sofrimento a inimigos reais ou imaginários. Mentir é a única opção porque, se falar a verdade, Bolsonaro terá de admitir que o inimigo da liberdade é ele. Se fosse sincero, seu discurso de 7 de Setembro terminaria com o grito: "Incompetência e morte!".

ObservaçãoUma semana depois da notícia sobre a aquisição de 51 imóveis em dinheiro vivo pelo clã Bolsonaro, o presidente continua devendo explicações convincentes aos brasileiros. Em entrevistas à Jovem Pan e à Rede TV, ele atribuiu parte das transações ao ex-marido da irmã. "O que eu tenho a ver com ex-cunhado? Não vejo esse cara há um tempão", disse. Mas o levantamento feito pela reportagem do UOL apontou que somente oito dos 51 imóveis pagos em dinheiro foram comprados por essa ramificação da família. Mesmo que fossem excluídos da soma final, ainda restariam 43 imóveis negociados com dinheiro em espécie por integrantes do clã. Nas entrevistas concedidas aos dois veículos que têm por norma apoiá-lo, o presidente sentiu-se à vontade para atacar o UOL. Em um momento de vidência, previu que "vão fazer busca e apreensão" na casa de seus parentes. Disse que isso seria estratégia para desgastá-lo. Em tom de bravata, pediu: "Vem pra cima de mim". No único esboço de explicação sobre o seu patrimônio, Bolsonaro disse que o ex-PGR Rodrigo Janot atestou em 2015 que dois de seus imóveis no Rio foram comprados legalmente. Falta explicar a compra de 49. O Brasil continua aguardando justificativas convincentes para tantas transações em dinheiro vivo. Para alguém que a toda hora repete que conhecer a verdade é uma experiência libertadora, isso deveria ser uma prioridade.
 
Tão impensável quanto conceder um segundo mandato ao capetão é devolver o picareta dos picaretas ao Planalto, pois o país continuaria prisioneiro de velhas pautas e velhos ódios. No livro “O Ressentimento na História”, Marc Ferro ensina que "a revivescência da ferida passada é mais forte do que toda vontade de esquecimento; a existência do ressentimento mostra o quanto é artificial o corte entre passado e presente — um vive no outro, o passado tornando-se presente, mais presente que o presente.”
 
Se a pré-candidatura de Moro tivesse prosperado, ficaria mais difícil para o PT apresentar uma realidade alternativa aos eleitores — Bolsonaro poderia cumprir esse papel, mas tem um telhado de vidro de dimensões latifundiárias. Mas nada garante que Moro na Presidência seria a solução, pois ele enfrentaria enorme resistência no meio político — que o detesta —, e o país já problemas demais para se dar ao luxo de mais 4 anos de paralisia.
 
Com Celso Rocha Barros, Chico Alves Carlos Graieb

quinta-feira, 19 de maio de 2022

O GOLPE DE BOLSONARO E O CASAMENTO DE LULA


No Ensaio sobre a cegueira, o Nobel de literatura lusitano José Saramago anotou que “a cegueira é um problema particular entre as pessoas e os olhos com que nasceram”. E com efeito. As eleições se aproximam, Bolsonaro sobe o tom, mas nem o Congresso, nem o TSE, nem o STF parecem ver o golpe como uma possibilidade real.

 

O Supremo — que o ex-ministro Sepúlveda Pertence definiu como uma arquipélago de 11 ilhas independentes e em constante conflito — é rápido no gatilho quando lhe convém. A depender do acusado e da toga sob a qual o processo está, a decisão pode sair em duas horas, dois anos ou duas décadas. 


Observação: Há no STF uma dezena de ações protocolados entre 1969 e 1987 — anteriores, portanto, à atual Constituição e ao ingresso do atual decano, que representa, juntamente com a PEC da Reeleição, a verdadeira herança maldita do governo FHC.

 

Depois que uma epifania revelou ao ministro Fachin — com seis anos de atraso — a incompetência da 13ª Vara Federal do Paraná para julgar os crimes do ex-presidiário Lula, o plenário do Supremo chancelou por 7 votos a 4 a decisão da 2ª Turma sobre a parcialidade do ex-juiz Sergio Moro. Mas não se viu essa mesma presteza por ocasião dos discursos golpistas de Bolsonaro no último Sete de Setembro. 

 

O ministro Luiz Fux, presidente das togas, deu um "puxão de orelha" no mandatário de fancaria. O senador Rodrigo Pacheco, presidente do Congresso, fez um pronunciamento ainda mais morno e insípido. Dias depois, Bolsonaro leu uma patética cartinha de desculpas, redigida pelo igualmente patético Vampiro do Jaburu, e a paz voltou a reinar em Brasília das Maravilhas.

 

A suprema pusilanimidade vai cobrar seu preço. Resta saber se ainda dá tempo de evitar que o sociopata e seus acólitos transformem a eleição numa batalha campal. O atual presidente da TSE (aquele da epifania) afirmou há alguns dias que “o Brasil não consente mais com “aventuras autoritárias”. Cerca de um mês antes, o ministro Barroso disse que as Forças Armadas estão sendo orientadas a atacar o processo eleitoral, e que existe uma tentativa de levar a corporação ao “varejo da política”. 


Por ordem de Bolsonaro o general Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, que deixou o comando do Exército para assumir o Ministério da Defesa, divulgou uma nota chamando Barroso de “irresponsável”. Se levarmos em conta que o próprio Bolsonarochamou Barroso de “filho da puta”, o general até que foi gentil.

 

Em entrevista ao Roda Viva do último dia 16, Rodrigo Pacheco afirmou que há uma linha amarela pintada no chão que nenhum dos candidatos pode atravessar, e que “o resultado das urnas será respeitado por todos, inclusive pelas Forças Armadas”. Segundo ele, os militares não devem ter compromisso político eleitoral. Resta saber se ele combinou com Bolsonaro, seus ministros fardados e os comandantes das FFAA. 

 

Segundo a Folha, alguns presidentes de partidos e pré-candidatos à sucessão presidencial disseram ver os ataques de Bolsonaro ao sistema eleitoral e a ministros das cortes superiores como um comportamento golpista que precisa ser levado a sério. Procurados pela reportagem, os presidentes da Câmara, do Senado e do STF não se manifestaram. Líderes do PP e do PL (partidos que encabeçam o Centrão) e outros pré-candidatos se abstiveram de opinar. Entre as 13 entidades questionadas pela Folha, só duas responderam. 

 

Bolsonaro flerta com o golpismo desde a campanha de 2018. Já deixou claro que não aceitará outro resultado que não seja a sua vitória em outubro. Fux e o Pacheco se fingem de paisagem. A coalizão Pacto pela Democracia lançou o manifesto “Em defesa das eleições” para cobrar a mobilização de instituições em defesa do processo eleitoral. O documento foi entregue aos presidentes do STF e do TSE, mas não se sabe ao certo o que suas excelências fizeram com ele.

 

Em meio a esse cenário dramático, o queridinho do eleitorado (segundo todas as pesquisas), que "se casou eleitoreiramente" com o picolé de chuchu, contraiu núpcias com a socióloga Rosângela Silva, a Janja. Em se confirmando a vitória do petralha, o casamento representará uma bizarra transição da cadeia para o Palácio do Planalto. 

 

Janja e Lula começaram o relacionamento no fim de 2017. No período em que o hoje "ex-corrupto" ficou hospedado na Superintendência da PF de Curitiba, a namorada foi arroz de festa na vigília. Hoje, ela é figura central da campanha. Aparece nas viagens, nos comícios, nos encontros fechados e nos discursos do candidato. Tornou-se parte do marketing eleitoral de Lula, que contrapõe o amor de um candidato apaixonado ao ódio que o PT e seus sectários nutrem por Bolsonaro .

 

É falsa a percepção de que Lula fez uma pausa em sua campanha antecipada para se casar, tanto que inseriu suas núpcias no discurso e na coreografia da campanha. O movimento, que vinha sendo insinuado há semanas. tornou-se explícito no ato de lançamento da chapa Lula-Alckmin (outro casamento pra lá de bizarro, que, agora, deveria render ao petralha uma ação por bigamia). 


Ao discursar, o palanque ambulante declarou que “um cara que tem 76 anos e está apaixonado, que está querendo casar (sic), só pode fazer o bem para esse país”. Com essa retórica de conto de fadas, o molusco usa o casamento para contrapor a atmosfera de amor em que está envolto ao discurso de ódio do adversário.

 

Com objetivo de ser uma cerimônia íntima e pessoal, sem pinta de grande evento político, foi recomendado aos convidados que não ficassem falando no assunto — nem o local foi divulgado previamente. Mas comenta-se que mais de R$ 100 mil foram gastos só com bebidas. O espumante escolhido pelos noivos foi o Cave Geisse Brut, que custa em média R$ 130 a garrafa (podendo chegar a R$ 800, conforme a safra).

 

A julgar por seu comportamento, Janja não será uma primeira-dama decorativa. Ela opina, participa da rotina de Lula de uma maneira que os petistas que privam da intimidade do pajé do PT não estavam acostumados a ver. O casal deve passar a lua de mel em São Paulo, e a agenda externa deverá retomar na semana que vem, com viagem para o Rio Grande do Sul e Santa Catarina. 


Observando-se a movimentação, tem-se a impressão de que, se Lula realmente for eleito, muita gente sentirá saudades da discrição da ex-primeira-dama Marisa Letícia — sobre cuja sepultura o viúvo sapateou, usando como palanque o esquife da falecida.

 

Voltando ao que eu dizia no início deste post sobre a cegueira generalizada diante de um possível autogolpe de Bolsonaro, conta-se que o padre da única igreja de uma bucólica cidadezinha do interior era muito devoto e fervoroso. Um dia, a cidade foi inundada por um temporal diluviano. 


O prelado continuou no altar, rezando fervorosamente. Quando a água lhe chegou à cintura, um homem com uma canoa lhe ofereceu ajuda. “Não precisa, meu filho; Deus há de me ajudar”, disse o religioso. O homem se foi na canoa e o padre continuou a rezar. 


Com a água no beiço, o pároco se recusou a embarcar na lancha da Defesa Civil, afirmando novamente que Deus o salvaria. Minutos depois, já do alto torre, enjeitou a ajuda dos bombeiros, que tentaram resgatá-lo de helicóptero. Quando chegou ao Céu, o batina reclamou a Deus: 


Confiei tanto no Senhor! Por que me abandonou quando eu tanto precisava de Sua ajuda? 


E Deus respondeu: 


Mandei uma canoa e você não subiu; mandei uma lancha e você recusou; mandei um helicóptero e você não embarcou. Queria que eu fizesse o quê?

terça-feira, 26 de abril de 2022

TERCEIRA VIA — O ULTIMATO


No último domingo, o ministro Luís Roberto Barroso afirmou que as Forças Armadas estão sendo orientadas a atacar o processo eleitoral, e que existe uma tentativa de levar a corporação ao que ele chamou de “varejo da política”. O magistrado disse ter a “firme expectativa” de que os militares não se deixarão seduzir por esse “esforço de jogá-las nesse universo indesejável” e que “até agora o profissionalismo e o respeito à Constituição têm prevalecido”. Barroso alertou ainda para o fato de que militares profissionais e respeitadores da Constituição foram afastados, e citou nominalmente Santos Cruz, Maynard Santa Rosa e Fernando Azevedo. Lembrou que os três comandantes das Forças Armadas foram afastados (algo inédito na história recente desta republiqueta de bananas).

Demorou, mas o magistrado que Bolsonaro chamou certa vez de filho da puta finalmente descobriu que merda fede. Quando "descobriram" (com seis anos de atraso) que Sergio Moro não era competente para jugar Lula (e que foi parcial ao fazê-lo), seus pares lavaram a toque de caixa a ficha imunda do petralha e o reinseriram no tabuleiro da disputa presidencial. Talvez a mesma presteza devesse ter sido demonstrada diante dos discursos golpistas de Bolsonaro no feriado de Sete de Setembro, mas houve apenas um "puxão de orelha" por parte do presidente da Corte Suprema e uma cartinha patética, redigida pelo igualmente patético vampiro do Jaburu, mediante a qual tudo voltou a ser como dantes no Quartel de Abrantes.

A suprema pusilanimidade cobrou seu preço. Resta agora saber se ainda dá tempo de evitar o pior, ou por outra, se o Judiciário vai aceitar bovinamente que o Legislativo lave as mãos e deixe a campanha à Presidência virar batalha campal (ou coisa ainda pior). Aliás, por ordem de Bolsonaro o general Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, que deixou o comando do Exército há cerca de um mês para assumir o Ministério da Defesa, divulgou nota em que chama o togado de "irresponsável" (leia íntegra).

 

Depois da saída de Sergio Moro do Podemos, o general reformado Carlos Alberto dos Santos Cruz — que atuou como comandante das forças de paz da ONU no Haiti de 2007 a 2009, foi escolhido pela Força de Paz da ONU para o comando da Missão de Estabilização das Nações Unidas na República Democrática do Congo em 2013 e foi ministro-chefe da Secretaria de Governo da Presidência do Brasil — pôs seu nome à disposição do partido para a disputa presidencial, mas disse que, caso haja uma convergência dos partidos de centro, apoiará o nome escolhido pela Terceira Via. 

 

Na campanha de 2018, o general apoiou o capetão e fez críticas ao bonifrate do presidiário. Foi convidado para integrar o Ministério e chefiou a Secretaria de Governo no início da gestão, mas acabou se tornando alvo de Olavo de Carvalho e de Carlos Bolsonaro e foi demitido ainda em 2019. Ao fazer seu anúncio, Santos Cruz escreveu o seguinte: " 

 

“As forças políticas de centro precisam mostrar capacidade de apresentar à sociedade brasileira pelo menos mais uma opção viável, equilibrada, para a próxima disputa presidencial. O Brasil não pode ficar com apenas duas candidaturas, extremamente polarizadas, que se alimentam mutuamente e que funcionam como cabos eleitorais recíprocos. O País precisa de mais opções. Não as apresentar é desconsideração com a nossa população.
 

A disputa polarizada tende a ser uma briga de xingamentos e acusações, sem os debates que a sociedade precisa sobre os programas de governo e propostas de solução para os problemas nacionais. Uma disputa entre dois candidatos que não apresentam o que o Brasil precisa: objetivos claros, transparentes, certeza de execução com os compromissos assumidos e esperança no futuro.
 

Os riscos de mais quatro anos com o ex-presidente ou com o atual presidente, ambos com seus grupos já conhecidos, são bastante evidentes: campanha de baixo nível, rasteira; investimento no fanatismo e na manipulação da opinião pública por meio de uma avalanche de fake news cada vez mais profissionalizada e ousada; promoção do "salvador da pátria"; falta de combate à corrupção; e fanatismo que pode desaguar em violência, pelo menos localizada.
 

O Brasil precisa ser líder de práticas democráticas, de seriedade e de responsabilidade política e não de liderança de populismo latino-americano e até mesmo mundial. A democracia precisa ser reforçada e aperfeiçoada com a união nacional e com o respeito às pessoas, às funções e às instituições. O País precisa ser unido e as divergências respeitadas para que possa enfrentar seus graves problemas. Para a solução dos problemas econômicos, da fome, da inflação, da redução da desigualdade social, do auxílio aos necessitados, é fundamental a total transparência e publicidade no orçamento e na aplicação dos recursos públicos, a integração dos órgãos de controle e a responsabilização. O populismo econômico, irresponsável, torna o futuro mais sombrio ainda.
 

Os conflitos entre poderes e os embates políticos precisam ter como resultado a apresentação de propostas de aperfeiçoamento institucional. Os conflitos sem resultados práticos positivos levam apenas à intoxicação social e à esquizofrenia política. O Brasil precisa resolver seus problemas, e isso não se faz em ambiente de conflito, de espetacularização, de show permanente. Isso rouba as energias da sociedade e capacidade produtiva de todos os brasileiros. Precisamos de harmonia, saúde, educação, segurança pública, Justiça, solidariedade etc.

 

Os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário precisam responder aos anseios da população brasileira, tais como a responsabilização, a total transparência da administração pública e o combate à impunidade. No presidencialismo, o comportamento equilibrado do Executivo, sem populismo, é de influência marcante e fundamental para os aperfeiçoamentos necessários à prática política e à melhoria no funcionamento demais poderes e instituições.
 

A política não tem necessidade de ser obscura, regada a dinheiro público, e atender a privilégios e interesses pessoais. A classe política deve e pode se autovalorizar, para que seja vista de maneira mais positiva pela sociedade.
 

É por meio da política que os problemas são resolvidos. Para isso, a política precisa ser desvinculada ao máximo das benesses e dos vícios ligados aos recursos públicos, alguns deles escandalosos.
 

A eleição que se aproxima precisa significar uma oportunidade de possíveis mudanças, de maior seriedade nos compromissos assumidos pelos políticos e de exigências pela população. A eleição precisa significar esperança! Para isso, dois compromissos são fundamentais: o fim da reeleição para cargos executivos, que tantas falsas promessas, deformações de comportamento e prejuízos vêm causando ao Brasil; e o fim do foro privilegiado, para que todos sejam realmente iguais perante a lei e para romper laços que impedem a independência dos poderes, que é um dos princípios da democracia. Essas medidas são necessidades imediatas, independentemente das outras reformas e ações urgentes necessárias para reduzir a desigualdade social, melhorar a Educação, a Economia, a Saúde, a Justiça, a Segurança Pública etc.

 

O Brasil precisa sair da intoxicação ideológica e exigir compromisso e responsabilização legal às promessas não cumpridas em campanhas políticas. Precisa resolver seus problemas reais dentro dos princípios da democracia. As eleições estão aí para isso. Precisamos de novas caras na política e também de novas formas de exigir o cumprimento de promessas!
 

É hora de a classe política mostrar alternativas para a sociedade brasileira. Pelo menos uma! Todas as forças políticas de centro precisam se unir e apresentar mais opções para os eleitores. Opções essas que tragam esperança de novo comportamento político, de futuro, de desenvolvimento com união e paz social. O Brasil não pode seguir no caminho indicado pela polarização. Há necessidade URGENTE de sair da armadilha do radicalismo.” 

sexta-feira, 1 de abril de 2022

O MEC, AS IDAS E VINDAS DE DORIA E DE MORO E O FANTASMA DO GOLPE



 

Em 1986, quando acompanhou o então presidente Sarney numa visita oficial a Portugal, o saudoso deputado Ulysses Guimarães comentou com os anfitriões que o direito ao voto no Brasil havia sido estendido aos analfabetos, e ouviu de um interlocutor que "em Portugal não havia analfabetos".


A despeito do Mobral, do Projeto Minerva e de outros programas que tais, a educação nunca foi prioridade para o governo brasileiro. Até porque povo politizado reivindica e não vota em populistas demagogos. O MEC sempre teve mais serventia como moeda de troca e cabide de emprego do que qualquer outra coisa. Para a população, que é quem paga a conta, a pasta é tão “útil” quando o ministério da marinha do Paraguai


A descoberta de que pastores comandavam um balcão de verbas derrubou o ministro-pastor Milton Ribeiro e levou o presidente fazer por pressão o que deixou de fazer por obrigação. Resta saber quem vencerá o cabo de guerra que tem como prêmio o orçamento bilionário do ministério ora acéfalo. Tanto o Centrão quanto a Bancada Evangélica estão de olho na cadeira ocupada interinamente por Vitor Godoy Veiga. 

 

Mudando de um ponto a outro: João Doria desistiu de concorrer à Presidência. A princípio, ele não ia sequer disputar a reeleição para o governo de São Paulo, segundo foi veiculado na manhã de ontem. O Estadão disse ainda que o tucano deixaria o PSDB e que Garcia, surpreendido pela notícia, pediu demissão da Secretaria de Governo.

 

Comenta-se nos bastidores que a decisão foi uma jogada do governador para tentar obter apoio público do partido e de aliados à sua candidatura presidencial. Apesar de ter ganhado as prévias tucanas para ser o candidato à presidência, Doria sofria com a falta de apoio dentro do ninho, onde a ala encabeçada por Aécio Neves vem manifestando apoio a Eduardo Leite — que renunciou ao governo gaúcho na última segunda-feira e anunciou que não deixará o partido


No Brasil, os políticos não confirmam sentados o que disseram em pé. Demais disso, nunca se mente tanto quanto antes de uma guerra, durante eleições e depois de uma pescaria. Doria ficou de falar à imprensa no final da tarde (de ontem) e, como diz o bordão da BandNews, em um segundo tudo pode mudar. 


AtualizaçãoApós carta da direção do PSDB, o governador de São Paulo voltou atrás e manteve a ideia original de renunciar ao cargo para ser candidato à Presidência da República este ano. O anúncio oficial foi feito às 16h de ontem. Por outro lado, lideranças do Podemos acusaram Sergio Moro de trair a sigla ao migrar para o União Brasil depois de ser pressionado a trocar seu domicílio eleitoral do Paraná para São Paulo. Mais um pré-candidato à presidência que abandona a “duvidosa terceira via” pela “quase certeza de sucesso” na disputa por uma cadeira no Senado ou na Câmara Federal. Ou não (clique aqui para mais detalhes). Resta saber se Doria vai mesmo continuar no páreo e quais serão as consequências da desistência de Moro (caso ela se confirme) na campanha do tucano.


Também nesta quinta-feira 9 ministros do governo Bolsonaro se desincompatibilizam do cargo em busca de novos pastos — no Senado, na Câmara ou num governo estadual. Seria uma ótima notícia se a escolha dos substitutos não ficasse à cargo do mandatário de fancaria: quando o problema é o burro, de nada adianta trocar as rodas da carroça.


Mas isso é do mais o menos. Preocupante mesmo é a recaída de Bolsonaro, que voltou a ameaçar o Judiciário quanto ao resultado das eleições no mesmo dia que a alta cúpula dos fardados publicou nota chamando o golpe de 1964 de "marco histórico da evolução política brasileira".

 

Em seus últimos discursos, o presidente vem dando a impressão de que deve aproveitar a reforma ministerial para ampliar sua influência no comando do Exército — aos desavisados, vale lembrar que estamos em ano eleitoral, que o capitão concorrerá à reeleição e que todas as pesquisas dão como favas contadas a vitória do ex-presidiário de Curitiba —, o que explica a promoção do general Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, atual comandante do Exército, para o cargo de ministro da Defesa. Basta ler as entrelinhas para perceber que o fantasma do golpe volta a nos assombrar qual egum mal despachado.

 

Bolsonaro é useiro e vezeiro em defender o voto impresso, inventar mentiras sobre as urnas que o elegeram para sucessivos mandatos, insinuar que as FFAA colecionam indícios de suposta vulnerabilidade do sistema eleitoral e atacar ministros que do STF e do TSE — tendo inclusive chamado publicamente Luís Roberto Barroso de filho da puta e Alexandre de Moraes de canalha — isso não é “liberdade de expressão”, mas sim “avacalhação”. 

 

Quem dá asas a cobra arrisca-se a ver o ofídio voar. Nenhum presidente da “Nova República” vituperou tanto a democracia e flertou tanto com o golpe como Bolsonaro. Em qualquer democracia que se desse minimamente ao respeito, os discursos do último Sete de Setembro resultariam no afastamento do cargo e abertura de inquérito. Curiosamente, os ataques do capitão não produziram maiores consequências para além de escancarar suas reais intenções — ou alguém ainda acredita que haverá transição pacífica de poder se Bolsonaro permanecer no cargo até 1º de janeiro do ano que vem? 

 

Observação: O ministro Luiz Fux fez um dos discursos mais incisivos da história do STF, mas que deveria ter sido feito em 2019, quando o presidente participou de manifestações antidemocráticas na porta do QG do Exército. 

 

"Nós defendemos a liberdade [...] até com o sacrifício da própria vida", bradou Bolsonaro, na última quarta-feira, uma claque de potiguares convertidos. Quem o ouvia pensava que o regime estivesse prestes a entrar em colapso. Não se sabe que surpresas o mandrião palaciano prepara para o final do ano, mas é impossível deixar de notar que há um quê de Donald Trump em sua retórica. 

 

Nos Estados Unidos, a insurreição que se seguiu à derrota eleitoral de Trump durou seis horas e produziu mortes e vexames. Hoje, despacha na Casa Branca o rival Joe Biden. Bolsonaro talvez aproveitasse melhor o seu tempo concentrando-se nos planos para virar votos, não a mesa.


Para concluir: Diogo Mainardi postou n'O AntagonistaO bolsonarismo comemora uma quartelada bananeira de seis décadas atrás. O país do futuro não tem um futuro, só tem um passado – e ele é medonho. De fato, para se livrar de Jair Bolsonaro, que se inspira nos crimes da ditadura, o eleitorado está disposto a votar em Lula, que evoca o movimento contra a ditadura, de quatro décadas atrás, enquanto apaga os crimes da Odebrecht. O tempo não passa – nem no Piaget. Vamos continuar ocultando cadáveres pelas próximas seis décadas.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2022

RESTAURE-SE O IMPÉRIO DA MORALIDADE OU LOCUPLETEMO-NOS TODOS! (PARTE XIX)

 

Em maio de 2019, num ato falho que beirou o sincericídio, Bolsonaro disse a seus baba-ovos: “não nasci para ser presidente, mas sim para ser militar.” E completou: “Não tenho qualquer ambição. Não me sobe à cabeça o fato de ser presidente. Eu me pergunto, eu olho pra Deus e falo: o que eu fiz para merecer isso? É só problema, mas temos como ir em frente, temos como mudar o Brasil.”

Nem a finada Velhinha de Taubaté acreditaria que um presidente que sempre foi amigo de milicianos, partidário da baixa política, adepto das rachadinhas e que jamais havia administrado coisa alguma — nem mesmo carrinho de pipoca em porta de cinema, como registrou José Nêumanne em sua coluna no Estadão — faria um bom governo, mas poucos imaginavam que sua passagem pela Presidência seria tão nefasta.

Covid não estava no programa, mas não é justo atribuir exclusivamente ao vírus maldito todas as agruras infligidas ao povo brasileiro nos últimos três anos, sobretudo porque o despreparo e o negacionismo do pajé da cloroquina foram determinantes para esse resultado.

Em 27 anos de vida pública, o ex-capitão que deixou a caserna pela porta de serviço (ou do desserviço) foi filiado a oito partidos, todos de aluguel. Mas na política o desafeto de hoje pode ser o aliado de amanhã. E vice-versa.

Dois anos depois de se desfiliar do PSL — e de o projeto de criar um partido para chamar de seu dar com os burros n’água — Bolsonaro se amancebou com o PL do mensaleiro e ex-presidiário Valdemar Costa Neto. Detalhe: quando sua alteza ainda se esforçava para aparentar lisura e probidade, um de seus escudeiros cantarolava “se gritar pega Centrão, não fica um, meu irmão” (parodiando o pagode Reunião de Bacana).

Durante a campanha, o próprio Bolsonaro chamou o cacique do PL de “corrupto e condenado”. Em novembro passado, depois de ter flertado com um dúzia de legendas, chegou a mandar o dito-cujo à puta que o pariu — e ouviu em resposta um enfático “vá tomar no cu” (você e seus filhos).

Nos últimos três anos, Bolsonaro não desceu do palanque um dia sequer. Estimulou (e participou pessoalmente) de diversas manifestações antidemocráticas. Flertou incontáveis vezes com o autogolpe. Fomentou um sem-número de crises institucionais. Entre inúmeras motociatas (inclusive em dias úteis e horário do expediente) e uma blindadociata, chamou o ministro Luís Roberto Barroso, presidente do TSE, de “filho da puta”, e o ministro Alexandre de Moraes, do STF, de  “canalha”. Quando a situação ameaçou sair do controle, foi chorar as pitangas na barra da saia do Vampiro do Jaburu, que redigiu, a seu pedido, uma patética carta de retratação.

Continua...

domingo, 30 de janeiro de 2022

A ÚNICA VACINA

 

Eu considerava a reeleição de Dilma o maior estelionato eleitoral da nossa história recente (e não foi por falta de concorrentes de peso), mas Bolsonaro deixou a mulher anta no chinelo e, entre outras bandeiras de campanha que enfiou em local incerto e não sabido, merece especial destaque a de "acabar com a 'velha política' do toma-lá-dá-cá", que jamais passou de mera demagogia. Ninguém fica na Câmara durante 27 anos sem se dar conta de como a banda toca, ou por outra, de que ex-presidentes que tentaram peitar o Congresso — como Jânio, Collor e Dilma, por razões diferentes e não necessariamente republicanas — perderam seus mandatos.

Ao nomear Ciro Nogueira ministro-chefe da Casa Civil, Bolsonaro entregou ao Centrão as chaves do reino e do cofre. Segundo apurou o EstadãoR$ 25,1 bilhões em emendas parlamentares foram destinadas a deputados e senadores da chamada “base aliada”. O STF considerou irregular o uso político dos recursos Mas e daí? Desde sempre que o capitão cria factoides para manter acirrada sua base ideológica e desviar a atenção da mídia de um tema polêmico para outro. 

Em abril de 2020, durante uma manifestação subversiva defronte ao QG do Exército, Bolsonaro discursou: “Nós não vamos negociar nadaTemos de acabar com essa patifaria. Esses políticos têm de entender que estão submissos à vontade do povo brasileiroÉ o povo no poder”. Para não dizer que nada aconteceu, alguns oficiais tiraram selfies e sorriram para a multidão. O inquérito que está sob a relatoria do ministro Alexandre de Moraes avança a passos de bicho-preguiça, juntamente com outras cinco investigações — inclusive a que apura a “suposta” interferência do capitão na PF.

Em agosto de 2021, Bolsonaro convocou uma blindadociata para pressionar o Congresso a aprovar a PEC do voto impresso — que acabou sepultada. Em seu enésimo comício em Santa Catarina, o "mito" referiu-se ao presidente do TSE como "aquele filho da puta do Barroso" — o vídeo foi prontamente apagado do Facebook, mas a ação não foi rápida o bastante para impedir que a cena viralizasse nas redes sociais. Discursando a apoiadores no feriado de 7 de setembro, chamou Alexandre de Moraes de “canalha”. Mas seu destempero foi alvo de críticas, nada além disso. 

O réu que preside a Câmara e serve de cão-de-guarda a cento e tantos pedidos de impeachment latiu, mas não mordeu; o presidente do Congresso reagiu com a mineirice que lhe é peculiar; o presidente do STF foi mais incisivo, mas tudo voltou a ser como antes no quartel de Abrantes depois que o tiranete despirocado leu a patética missiva redigida a rogo pelo folclórico vampiro que tem medo de assombração.

Os números mostram como o Congresso ampliou seu controle sobre o Orçamento da União ao longo dos anos. O processo começou antes do atual governo, mas cresceu a olhos vistos sob Bolsonaro. Os R$ 25,1 bilhões efetivamente pagos em 2021 representam três quartos dos R$ 33,4 bilhões que foram empenhados (quando o dinheiro é reservado no Orçamento), índice acima de anos anteriores, segundo os dados do Portal do Orçamento do Senado. Para este ano — em que boa parte dos parlamentares disputará eleições — o valor previsto é ainda maior, de R$ 37 bilhões

Para não correr o risco de esse dinheiro ser represado, Bolsonaro assinou um decreto no último dia 13 tirando do Ministério da Economia e dando à Casa Civil a palavra final sobre a gestão orçamentária. Na prática, a liberação dos recursos ficará a cargo do ministro Ciro Nogueira, mandachuva do Progressistas e comandante do Centrão, que passará a decidir sobre Orçamento.

As emendas são indicações feitas por parlamentares de como o Executivo deve gastar parte do dinheiro do Orçamento. Elas incluem desde obras de infraestrutura, como a construção de uma ponte, até valores destinados a programas de saúde e educação. Como mostrou o Estadão, o dinheiro foi utilizado nos últimos anos também para comprar tratores com sobrepreço — o chamado “tratoraço” —, e integrantes do próprio governo admitem que há corrupção envolvendo a liberação desses recursos. 

A despeito de suas promessas de campanha, Bolsonaro usou e abusou da liberação de dinheiro quando precisou de apoio dos adeptos da baixa política. O caso mais emblemático se deu em novembro, quando da votação da PEC dos Precatórios, que abriu caminho para criar o Auxílio Brasil — programa populista que o presidente vai usar como bandeira eleitoral para tentar a reeleição. Na véspera, o governo destinou R$ 1,2 bilhão dos cofres públicos para atender aos interesses dos parlamentares alinhados com o governo. 

Pelo voto de cada parlamentar foram pagos até R$ 15 milhões, como admitiram pelo menos dois deputados ao jornal O Estado de S.Paulo. Além disso, o governo priorizou aliados até na hora de liberar as chamadas emendas individuais — aquelas previstas na Constituição e que garantem a mesma quantia para todos os congressistas. Parlamentares de partidos do Centrão como o PL, o Republicanos e o Progressistas receberam cerca de 70% dos valores destinados a eles; legendas de oposição mais críticas ficaram para trás — PCdoB, Novo e PSOL foram os que receberam menos recursos. 

Políticos da base aliada argumentam que usam as emendas para irrigar programas capitaneados pelos próprios ministérios, o que agiliza o pagamento. Foram eles que mais indicaram recursos pelas transferências conhecidas como “emenda cheque em branco” e “PIX orçamentário”, mediante as quais o dinheiro cai diretamente na conta das prefeituras, ou seja, sem passar pelos ministérios.

A Secretaria de Governo contestou as informações da reportagem do Estadão. Alegou que seus dados são obtidos a partir do Tesouro Gerencial — sistema mantido pelo governo. Mas as informações do Siga Brasil, utilizadas pelo jornal, provieram da mesma base de dados. Questionada, a pasta não forneceu as informações que o Executivo afirma dispor.

Há uma frase lapidar de Abraham Lincoln: “Dê poder a um homem e descobrirá o seu caráter”. Demos o poder a Bolsonaro para evitar que o país fosse governado por uma marionete de presidiário e descobrimos, para além de seu caráter, o péssimo temperamento que o move. O Brasil contabiliza mais de 620 mil óbitos por Covid, boa parte dos quais se deve à desídia e ao viés negacionista do presidente e da caterva que o assessora. Também é conhecida sua falta de empatia e de sensibilidade em relação às vítimas do vírus assassino (falo do biológico) e às pessoas que ficaram sem pais, irmãos, filhos, cônjuges e amigos. 

Em face do exposto, parece-me evidente que nenhum brasileiro que perdeu parentes ou amigos para a pandemia entregará seu voto à reeleição de Bolsonaro — conforme, aliás, dão conta as enquetes eleitoreiras. Com exceção dos apoiadores incorrigíveis do mandatário de fancaria, é preciso ser muito masoquista para desejar a continuidade desse funesto governo.

A pandemia vai acabar um dia. O Sars-CoV-2, a exemplo dos demais vírus, vai se adaptar ao ser humano, e este a ele. Mas a eleição de 2022 engendra 2023, e a Bolsonaro não queremos adaptação. Diante da inércia do Congresso e do STF, o sufrágio é a única vacina contra ele.

quinta-feira, 26 de agosto de 2021

TEMPESTADES PERFEITAS

 

No post do dia 17 de outubro de 2018 eu anotei que "A oportunidade de escolher um candidato 'mais ao centro do espectro político-partidário' se perdeu no último dia 7. Agora não adianta chorar. Resta-nos o Capitão Caverna ou o fantoche do presidiário de Curitiba — o pior dos cenários, sem dúvida, mas previsível à luz da crescente polarização do eleitorado. Não sei o que esperar de Bolsonaro na presidência, mas sei como foi ter o PT no poder. No mais das vezes, é melhor ficarmos com o diabo que conhecemos, mas toda regra tem exceção, e a eleição do próximo dia 28 me parece ser uma situação excepcional."

A eleição daquele dia 28 foi, de fato, "excepcional". Como excepcionais foram os resultados que ela produziu — e continua produzindo. Pudessem ser responsabilizados criminalmente os eleitores despirocados que contribuíram para essa tragédia (falo daqueles que eliminaram, no primeiro turno, juntamente com o pavoroso elenco de filme de terror travestido de postulantes à Presidência, duas ou três opções menos "surreais" do que a parelha remanescente), deveriam ser enquadrados em algum tipo de delictum continuatum.

Trata-se de uma figura de retórica, naturalmente. A récua de muares cometeu a burrada uma única vez (há risco real de reprise no ano que vem, mas isso é outra conversa), e o crime continuado se caracteriza quando o agente, mediante mais de uma ação e omissão, comete dois ou mais crimes da mesma espécie, e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subsequentes ser havidos como continuação do primeiro. No bom português do asfalto, é preciso que haja: 1) mais de um crime da mesma espécie; 2) mais de uma ação; e 3) necessidade de que os crimes posteriores, levando-se em consideração as condições de tempo, lugar, maneira de execução, dentre outros, sejam considerados como uma continuação do primeiro crime.

Outros atos praticadas por outros atores dessa tragicomédia se enquadrariam melhor na definição retrocitada. Até porque a pilha de cadáveres produzidos pela Covid desde o início da pandemia continua crescendo; dia sim, noutro também, quase mil corpos se juntam ao monte, perfazendo um total de quase 600 mil. Segundo um boletim da Fiocruz — que foi um parto para eu conseguir acessar —, dois pesquisadores que depuseram na CPI do Genocídio apresentaram estudos diferentes com idêntica conclusão: a maior parte das mortes por Covid no país poderia ter sido evitada, ainda antes da disponibilidade de vacinas no mercado internacional, se o Brasil tivesse adotado medidas de controle da transmissão do vírus

Para economizar tempo e espaço, relembro apenas o que disse o epidemiologista Pedro Hallal, ex-reitor da Universidade Federal de Pelotas: “O brasileiro tem noção do tamanho da tragédia, perdeu familiares e amigos, mas não consegue entender ainda que boa parte das mortes não precisariam ter acontecido”. Em um dos cálculos entregues à Comissão, pelo menos 400 mil dos então 507 mil óbitos não teriam acontecido se o Brasil estivesse na média mundial de mortalidade pelo novo coronavírus.

Observação: A microbiologista Natália Pasternak, citando o estudo coordenado por Hallal, disse que 3 de cada 4 óbitos poderiam ter sido evitados se houvesse políticas como testagem em massa, rastreamento e isolamento social; investimento em vacinação ao invés de tratamento precoce; além de uma campanha única de conscientização das medidas não farmacológicas, como uso da máscara, higienização das mãos e distanciamento social.

Enfim, grupos de Goiás, Minas Gerais, Espírito Santo, Rio de Janeiro e São Paulo, entre outros, já se mobilizam para as viagens com destino a Brasília (Esplanada dos Ministérios) e à capital paulista (Avenida Paulista), onde o "mito" prometeu discursar no feriado da Independência. O caríssimo leitor (ou a caríssima leitora) já reservou seu camarote?

Isso faz lembrar que, em 2018, na véspera do feriado de 7 de setembro, durante um ato de campanha em Juiz de Fora (MG), o Messias que não miracula foi alvo de um atentado que quase o matou, mas lhe serviu de pretexto para não comparecer aos debates promovidos pelas emissoras de TV, evitando que a oratória populista-demagógica de Ciro Gomes reduzisse pó suas chances de disputar o segundo turno. Curiosamente, embora fosse um garçom desempregado que não tinha um gato morto para puxar pelo rabo, Adélio Bispo de Oliveira, o esfaqueador despirocado, foi prontamente assistido pelo que havia de melhor no âmbito da advocacia criminal.  

Observação: Em novembro do ano passado, o lunático que não come merda nem rasga dinheiro, mas foi diagnosticado como portador de transtorno delirante e considerando inimputável pela Justiça, disse à PF que não se arrepende do ataque, que atribui a um "chamado de Deus". Segundo ele, o presidente é um ‘impostor’. “Ele [Bolsonaro] se tentou passar como um homem, digamos assim, na linguagem popular, um homem de Deus. Aí veio uma revista com um deles que fala que o Bolsonaro é católico, embora foi batizado no Rio Jordão pelo Everaldo, pastor Everaldo. Muitos evangélicos acreditavam que ele fosse evangélico. Ele tentou plantar essa imagem que fosse evangélica, mas não era. Ele é um impostor. Meramente um impostor. Para tentar se apropriar do voto do meio protestante”. E mais: “Quando ele [Deus] disse [para matar Bolsonaro], eu fiquei até surpreso. Na política, o que eu tinha interesse mesmo era o Michel Temer. Esse eu tinha interesse”.   

Voltando pelo rio do tempo até a ilha do presente, já existe intensa movimentação de apoiadores de Bolsonaro para divulgar as caravanas nas redes sociais. Os anúncios são compartilhados em grupos de WhatsApp formados por defensores do presidente, assim como em comunidades do Facebook, com o mesmo propósito. Lideranças políticas locais, em municípios pelo Brasil, também participam da organização das caravanas. 

Segundo o Estadão, em meio às dúvidas no mundo político se parte das Forças Armadas estaria disposta a aderir a uma ruptura institucional, o comandante do Exército, Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, afirmou nesta quarta-feira, 25, que o Exército, a Marinha e a Aeronáutica estão "sempre prontas a cumprir a missão delegada pelos brasileiros na Carta Magna", além de destacar que as FFAA têm como comandante supremo o presidente da República e que também são dirigidas pelo ministro da Defesa, Walter Braga Netto. Eis aí uma tempestade perfeita.

Falando em tempestades perfeitas, foi assim que Josias de Souza classificou a situação que nosso indômito mandatário vem enfrentando ultimamente. Pela terceira semana consecutiva, disse o jornalista, o noticiário foi sacudido por decisões tomadas por Moraes no âmbito do inquérito das fake news. Na primeira semana do mês, o capitão foi empurrado para dentro do inquérito por mentir sobre urnas eletrônicas; na segunda, o bolsonarista Roberto Jefferson foi enviado para a cadeia; a terceira, que começou com uma decisão do TSE que bloqueou a remuneração de sites bolsonaristas que difundem ódio e mentiras na internet, terminou com visitas dos rapazes da PF a 29 endereços — entre eles os do cantor sertanejo Sergio Reis e do deputado bolsonarista "no úrtimo" Otoni de Paula.

A escalada do Judiciário na direção de Bolsonaro e do Bolsonarismo azedou a retórica do presidente — que cumpriu apenas metade da ameaça feita no final de semana passada, abstendo-se de pedir o impeachment de Barroso e concentrando-se, por ora, em Moraes. Mas saiu-se o capitão com a novidade de uma novidade interessante: acionar o STF pedindo que a Corte suprima um artigo de seu próprio regimento interno que lhe permite de investigações ex officio — isto é, sem passar pela PGR.

O pedido de afastamento de Moraes tem como destino o gavetão do presidente do Senado. A ação judicial contra o artigo do regimento do STF é natimorta — servindo, se tanto, para animar os devotos do capitão nas redes sociais e frustrar os órfãos da Velhinha de Taubaté, que acreditaram na possibilidade de restabelecimento do diálogo entre o Executivo e o Judiciário (a menos que por "diálogo" entenda-se o chefe do Executivo chamar o presidente do TSE de "filho da puta").

Contra esse pano de fundo conturbado, deteriora-se a situação econômica. Zonzo, o ministro Paulo Guedes (alguém ainda se lembra do Posto Ipiranga do capitão?) rala sem sucesso para destravar sua pauta na Câmara, enquanto as contas públicas se deterioram, a inflação foge ao controle, os juros sobem, as previsões de crescimento declinam e a atmosfera de ruptura institucional afasta os melhores investidores. A ficha do mercado financeiro parece cair. A de Bolsonaro, não. Agosto ainda nem acabou e o presidente já planeja as encrencas do próximo mês.

Bolsonaro revela-se capaz de tudo, exceto de desperdiçar um naco do seu tempo com atividades, digamos, mais produtivas. Nem mesmo os desgostos de agosto conseguem pôr para trabalhar gente que nunca trabalhou.