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terça-feira, 13 de fevereiro de 2024

O CAÇADOR DE MARAJÁS E O MAQUIAVEL DE MARÍLIA


Themis de pedra que decora a entrada do STF tem os olhos e os ouvidos cobertos por uma venda, talvez para ser poupada do constrangimento produzido pelo ministro Dias Toffoli. Depois de anular provas e suspender o pagamento das multas bilionárias impostas à Odebrecht e à J&F, o nobre magistrado (que, nunca é demais lembrar, bombou em dois concursos para juiz de primeira instância) volta a atacar em pleno Carnaval, agora para acudir o ex-presidente e ex-senador Fernando Collor, que foi condenado em maio de 2023 a 8 anos e 10 meses de reclusão

Quase 8 anos separa a denúncia da condenação, e mais um transcorreu até os embargos de declaração do caçador de marajás de festim começarem a ser apreciados no escurinho do plenário virtual, longe dos refletores da TV Justiça. 

Observação: Embargos declaratórios destinam-se a esclarecer pontos obscuros, contraditórios ou omissos numa decisão judicial, mas não têm o condão de reabrir a discussão do mérito. Alegando problemas na dosimetria e a prescrição de delitos, a defesa de Collor pediu a redução da pena pela metade e contestou o pagamento de R$ 20 milhões por danos morais coletivos, que foge do escopo de uma ação penal. 

Na última sexta-feira, assim que o ministro Alexandre de Moraes votou pelo indeferimento dos embargos, Toffoli vestiu a fantasia de paladino e emperrou o julgamento com um pedido de vista. 

Observação: Os ministros pedem vista a pretexto de precisarem de mais tempo para formar seu entendimento, mas na prática eles utilizam esse instrumento para empurrar o julgamento com a barriga até que a maioria formada não faça mais sentido, ou que alguns de seus pares sinalizem a intenção de mudar o voto. 

Até 2022, o ministro que pedisse vista devolver os autos na segunda sessão subsequente à do pedido, ms essa regra era solenemente ignorada — basta lembrar que o ministro Nelson Jobim (aposentado em 2014) levou quase mil dias para devolver uma ação de reintegração posse. Em 2022, a Emenda Regimental nº 58 fixou o prazo de 90 dias úteis para a devolução dos autos, sob pena de o caso retornar à pauta do plenário ou da turma automaticamente, mesmo sem o voto do ministro que pediu vista.

Em maio do ano passado, oito dos dez ministros (Lewandowski se aposentou um mês antes e Zanin só foi empossado três meses depois) votaram a favor da condenação de Collor. As excessões foram Gilmar Mendes e Nunes Marques. Fachin propôs 33 anos, 10 meses e 10 dias de prisão em regime inicialmente fechado, mas a proposta de Moraes prevaleceu. Quatro dos oito ministros que votaram pela condenação converteram a acusação de organização criminosa em associação criminosa (crime que prevê pena menor), e o empate resultou na pena mais branda. O detalhe — e o diabo mora nos detalhes — é que o prazo prescricional corre pela metade quando o réu é septuagenário. E Collor tinha 73 anos à época de sua condenação. 

Observação: No jargão jurídico, o termo prescrição designa a perda de uma pretensão pelo decurso do tempo, como a perda da pretensão punitiva estatal em razão do decurso do lapso temporal previsto em lei. Daí os criminalistas chicaneiro "empurrarem com a barriga" o andamento processual mediante a interposição de recursos eminentemente procrastinatórios. 

PGR sustentou que Collor tenta "reabrir a discussão da causa, promover rediscussão de premissas fáticas e provas, além de atacar, por meio de via indevida, os fundamentos do acórdão condenatório". Em seu voto, Moraes anotou que a defesa tenta "rediscutir pontos já decididos" durante o julgamento da ação penal. Já o pedido de vista de Toffoli obstruiu a manifestação dos colegas, retardando o encarceramento do condenado. E mesmo que o ministro respeite o regimento interno e devolva os autos em até 90 dias úteis, ainda será preciso reagendar o julgamento e, na sequência, esperar publicação do acórdão para só então dar início à execução da pena. 

O contribuinte, que paga os régios salários dos togados e banca suas mordomias, não tem os olhos e ouvidos cobertos pela grossa venda que o escultor Alfredo Ceschiatti grudou em sua versão da Deusa da Justiça. Assim, a desmoralização da Corte é testemunhada por uma sociedade estupefata. 

Impune, Collor frequenta os salões de Brasília como se nada tivesse sido decidido sobre o seu passado criminal, chegando mesmo a dar as caras no Planalto, por ocasião da posse de Lewandowski no ministério da Justiça, e agora ameaça transformar o inusitado em escárnio desfilando sua face brilhante de óleo de peroba e sua ficha corrida quilométrica na cerimônia de posse de Flávio Dino no Supremo, que deve ocorrer no dia 22.

Com sua intervenção ofensiva, vergonhosa e inútil, Toffoli insultou a sociedade ao subverter o brocardo, reforçando a sensação de que a Justiça no Brasil tarda, mas não chega, e envergonhou o STF ao associaR o Tribunal à percepção de que depois da impunidade vem a bonança. A inutilidade de sua decisão monocrática decorreu do fato da pretensão de Collor não ter a mais remota chance de prosperar. 

Em outras palavras, o Maquiavel de Marília apenas favoreceu o propósito protelatório de um criminoso condenado que, pelo andar da carruagem, pode estar livre, leve e solto para comparecer à canonização de São Lula (em data ainda não fixada pelo Vaticano).

Triste Brasil.

domingo, 5 de novembro de 2023

O OVO E A GALINHA

 

Como gasta mais do que arrecada, o governo precisa buscar dinheiro no mercado de crédito. Isso obriga o BC a manter os juros altos e impede que o Estado avance um milímetro na melhoria do ensino público — que seria a única maneira eficaz de combater o subdesenvolvimento. 

Nada produz mais desigualdade, pobreza e injustiça social do que o déficit, e nada é mais rentável para os que mandam no Estado e se beneficiam com o estouro permanente nas contas oficiais. O campeão absoluto dessa filosofia de governo é o próprio chefe do governo, e por má intenção deliberada: não é de seu interesse político e pessoal — e nem das forças que o apoiam — manter as finanças do país numa situação de equilíbrio. A repercussão das recentes declarações de D, Lula III na mídia sugere que já há alguma impaciência com a fixação (cada vez mais esquisita) de sua alteza em espalhar divagações cretinas pelo Brasil e mundo afora.

Uma parte dos jornalista e analistas acha que se trata apenas de irresponsabilidade, mas outra acha que Lula exibiu, mais uma vez, sua ignorância sem limites. E a coisa deve continuar assim, pois não há ninguém em seu ministério ou entre as pessoas de sua confiança com coragem para lhe dizer que o rei está nu — até porque a maioria acha realmente que ele não está.

***

Quem surgiu primeiro, o ovo ou a galinha? Eis aí uma pergunta que continua causando divergências entre os estudiosos. Estima-se que os ovos surgiram 340 milhões de anos atrás e as galinhas, há coisa de 50 milhões de anos. Elas teriam advindo de uma espécie selvagem que, em algum momento, pôs ovos com embriões, e esses embriões, depois de se tornarem adultos, puseram ovos como os que conhecemos. Segundo um estudo publicado na revista científica Nature, os primeiros ancestrais das aves e répteis podem ter gerado filhotes vivos, e que algumas espécies ovíparas  como as galinhas — evoluíram de ancestrais vivíparos. Consequentemente, o ovo só pode ter surgido depois da galinha. 

Deixando de lado os ovos e as galinhas, um comercial lançado nos anos 1980 por uma famosa fabricante de biscoitos perguntava: "Tostines vende mais porque é fresquinho ou é fresquinho porque vende mais?" Até onde se sabe, ninguém conseguiu desvendar esse esse enigma, mas qualquer pessoa com QI superior ao de uma maçaneta sabe que o lulopetismo — sinônimo de atraso, fisiologismo, corrupção, populismo, autoritarismo e outras mazelas — foi o elemento catalisador que levou Bolsonaro ao poder em 2018. 
 
A rusticidade, a ignorância, a crueldade e a vocação golpista do chefe do clã das rachadinhas trouxeram o chefão petista de volta do quinto dos infernos. Se ele não tivesse conspirado diuturnamente contra a democracia, amasiado a Covid, vituperado a imprensa, o Congresso e o STF, não andasse com Fabrício Queiroz, Carla Zambelli, Fernando Collor, milicianos, bolsokids e rebotalhos que tais, o ex-tudo (ex-corrupto, ex-presidiário, ex-condenado etc.) talvez continuasse gozando suas férias compulsórias em Curitiba.
 
Ninguém é mais responsável do que Bolsonaro
 pela merda que o Brasil virou nos últimos anos (não que antes fosse muito melhor). E o pior é que esse circo de horrores não terminou: nem bem vestiu a faixa presidencial, seu sucessor começou a trabalhar em prol do retorno do bolsonarismo

Observação: O "imbrochável" está inelegível (foi duas vezes condenado), mas outro(a) radical de direita pode lhe fazer as vezes em 2026. Por quê? Porque antes mesmo de completar seis meses de mandato D. Lula III passou pano para Venezuela e Argentina, vituperou a Ucrânia, tretou com os EUA e com o Banco Central e indicou seu advogado pessoal para ocupar a vaga do amigo da finada no STF.
 
Um dos alvos prediletos dos bolsonaristas foi o STF, que Lula transformou, em seus primeiros oito anos de governo, numa confraria de amigos do rei. A indicação de Toffoli — o ex-advogado do PT reprovado em dois concursos para juiz de Direito, abriu os portões do inferno. Na sequência, a segunda esposa de Lula emplacou o amigo de família que, mancomunado com Renan Calheiros, rasgou a Constituição no julgamento do impeachment de DilmaBolsonaro, por sua vez, cobriu com a suprema toga os ombros de Nunes Marques "com que tomou muita tubaína", e do "terrivelmente evangélico" André Mendonça, que foi saudado com pulinhos, urros e falas estranhas pela então primeira-dama. 

Mesmo com tudo que ocorreu no Brasil durante a gestão do lunático genocida, não será de estranhar se começaremos 2027 às voltas com promessas de fechamento do STF, aplicação do artigo 142, pedidos de intervenção militar, sinais por celular para ETS, hino nacional para pneus e colônias de férias da terceira idade nas portas dos quartéis

Além de enxovalhar e rebaixar ainda mais as instituições democráticas e o que sobrou de decoro presidencial, o morubixaba da petralhada alimenta precocemente a fogueira golpista que ainda tem brasas quentes, desperdiçando mais uma oportunidade de levar um mínimo de esperança àqueles que não têm nenhuma pelo país.
 
Evitar esse cataclismo exige um mínimo de decoro do atual mandatário, a quem o antecessor concedeu uma inédita terceira oportunidade de emporcalhar o Brasil. Lula é o ovo, a galinha, o Tostines e sei lá o que mais do bolsonarismo, que, por sua vez, se alimenta do excremento que o lulopetismo produz. 

Já vimos esse filme e sabemos como ele termina.  

domingo, 22 de outubro de 2023

O IMPEACHMENT E UM POUCO DE HISTÓRIA


Velhos vícios são inimigos acastelados que só a morte pode expurgar. O Partido dos Trabalhadores — fundado em 1980 com o fito de fazer política sem roubar nem deixar roubar — começou a chamar o impeachment de Dilma de "golpe" antes mesmo de o deputado Eduardo Cunha, então presidente da Câmara Federal, dar seguimento ao pedido. Passados sete anos, Lula e seus acólitos voltaram à carga

No final de agosto, o ex-tudo (ex-retirante, ex-metalúrgico, ex-sindicalista, ex-presidiário e ex-condenado) trombeteou que é preciso buscar uma forma de reparar a injustiça sofrida por sua pupila em 2016. A ideia — que ganhou coro com a presidente da sigla, Gleisi Hoffmann — é fazer uma devolução simbólica do mandato a Dilma, a inigualável, como o Congresso fez em 2013 com João Goulart (que foi destituído pelo golpe de 64). 

A patuleia diz que a gerentona de araque foi inocentada pelo TRF-1 das "pedaladas fiscais", mas o que o tribunal fez foi manter (por 3 votos a 0) o arquivamento da ação de improbidade administrativa sem resolução de mérito. A despeito as alegações de Lula et caterva de que a "companheira" foi julgada por "uma coisa que não aconteceu", sua deposição foi bem fundamentada juridicamente e chancelada pelo STF. Golpe foi a maracutaia urdida pelo PT e apoiada por Renan Calheiros e Ricardo Lewandowski  que então presidiam, respectivamente, o Senado e d Supremo  para evitar a cassação dos direitos políticos da ré. 

O processo de responsabilização e destituição de um Presidente da República por crime de responsabilidade é previsto na Constituição Cidadã, que, em seu artigo 52, dispõe que "cabe ao Senado Federal processar e julgar o presidente e o vice-presidente da República por crimes de responsabilidade", e que a condenação resulta na "perda do cargo, com inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública". 

Mesmo assim, Dilma não perdeu os direitos políticos — ao contrário de Collor, impichado em 1992. que ficou inelegível por 8 anos a despeito de ter apresentado sua carta-renúncia horas antes do julgamento, como se fosse possível condenar alguém à perda do cargo depois de esse alguém ter renunciado.

ObservaçãoO sequestro das poupanças e o envolvimento no esquema PC minaram o relacionamento de Collor com todas as classes braseiras. Eleito pelo minúsculo PRN, o "Rei Sol" dependia vitalmente do apoio de outros partidos para governar, e nunca conquistou uma base sólida. Já o vampiro do Jaburu, que foi às cordas quando veio à tona suas conversas nada republicanas com Joesley Batista, comprou no atacado os votos das marafonas doa Câmara e chegou ao final de seu mandato, ainda que como um patético pato manco.
 
Dilma negou os desvios ocorridos na Petrobras, mesmo tendo presidido o Conselho de Administração da estatal e atuado como ministra-chefe da Casa Civil e ministra de Minas e Energia antes de ser alçada ao Planalto. E ainda manteve Graça Foster no comando da petrolífera de fevereiro de 2012 a fevereiro de 2015. “Foi sob a gestão de Graça que parte do 'saque' à Petrobras foi realizado", ressaltou o jurista Ives Gandra da Silva Martins. 
Os juristas que protocolaram o pedido de impedimento em desfavor da petista argumentaram que ela agiu como se não soubesse das irregularidades na Petrobras. 

Dilma foi penabundada mediante um processo constitucional e teve amplo direito de defesa. Foi condenada porque os parlamentares entenderam houve crimes de responsabilidade. Afirmar que ela não tinha ciência do aparelhamento nas estatais, da promiscuidade com empreiteiras, dos superfaturamentos milionários e das escaramuças no Orçamento com fins eleitorais é fazer pouco caso da inteligência de quem tem ao menos dois neurônios funcionais.
 
Dilma nunca foi política nem demonstrou vocação para gerir o que quer que fosse. Prova disso é que quebrou duas lojinhas de badulaques importados do Panamá em apenas 17 meses — e isso quando a paridade entre o real e o dólar favorecia esse tipo de negócio. Só foi escolhida por Lula para manter aquecida a poltrona presidencial até ele poder voltar a ocupá-la porque José Dirceu e outras estrelas do alto escalão do PT estavam no xadrez — e porque o palanque ambulante convertido em camelô de empreiteiro não teve peito para levar adiante o "golpe via emenda constitucional" que lhe garantiria um terceiro mandato. 

Mas a criatura tomou gosto pelo poder e "fez o diabo" para se reeleger, destruindo o pouco que se aproveitava da obra do criador. Ela contou com os serviços de marqueteiros de primeiríssimo time, como João Santana e sua mulher, Mônica Moura — presos na 23ª fase da Lava-Jato e soltos mediante o pagamento da fiança de R$ 31,4 milhões — e dispôs de recursos milionários oriundos do propinoduto da Petrobras, que lhe permitiram tirar Marina Silva do páreo no primeiro turno e derrotar o José Serra no segundo. 

Observação: Marina voltou a disputar a Presidência em 2014, primeiro como vice de Eduardo Campos (o partido que ela havia fundado no ano anterior não conseguiu registro junto à Justiça Eleitoral a tempo de disputar o pleito) e depois como titular, devido à morte de Campos num acidente que continua alimentando teorias conspiratórias. Com essa reviravolta, a ex-doméstica, ex-seringueira e ex-ministra chegou a ser cotada para disputar o segundo turno contra Aécio Neves, mas foi tirada do páreo por Dilma, embora tenha obtido 2 milhões de votos a mais que em 2010.
 
Após derrotar Aécio por uma vantagem de 3.46 milhões de votos válidos, o "poste" de Lula pariu a maior crise econômica da história deste país. Em sua fase mais delirante, desfilava com bolsas das grifes Hermès e Vuitton e degustava pratos sofisticadas, vinhos caríssimos, bombons ChocopologieUS$ 250 a unidade de 42 g — e chocolates Delafee recobertos de fios de ouro 24K. Quando estava de dieta, ela mordia um pedacinho do chocolate e descartava o resto na lixeira

Em viagens ao exterior, a versão tupiniquim da Rainha Má se hospedava nos melhores hotéis e frequentava os mais finos restaurantes. Durante uma visita à Califórnia, torrou US$ 100 mil só com aluguel de carros — foram contratados 25 motoristas para levar a comitiva brasileira de lá para cá a bordo de limusines, vans, ônibus e até um caminhão. A visita durou apenas único dia, mas o contribuinte brasileiro arcou com o custo da circulação da frota inteira durante duas semanas. Para completar a comédia, o governo só pagou a locadora porque depois de ser ameaçado de cobrança judicial nos EUA.
 
No Brasil, o presidente da República é um gigante de pés de barro, já que depende da base aliada, dos acordos com as oligarquias e do dinheiro das empresas para governar. Em vez de mandar no sentido absolutista, nosso mandatário é mandado. Os que tiveram capacidade política e diplomática terminaram seus mandatos, mas Dilma nunca teve essas qualidades e, pior, sempre se cercou de assessores tão ou mais mal preparados do que ela própria (caso de Erenice GuerraGleisi Hoffmann e Aloízio Mercadante, para ficar somente nos mais notórios). 

Tanto Fernando Henrique quanto o proprio Lula semearam alianças com grandes legendas, mas Dilma e seus ineptos negociadores as deixaram morrer  não à toa, a debacle da gestão da gerentona de araque ganhou força quando a aliança com o PMDB definhou.

O Estado brasileiro funciona à base da corrupção. Negociações entre Executivo e Legislativo acontecem na maioria das democracias, mas a maneira como são feitas no Brasil é absolutamente delirante. Nossa Constituição é claramente parlamentarista, mas a adoção do parlamentarismo foi rejeitada pelo esclarecidíssimo eleitorado tupiniquim no plebiscito de 1993, o que enfunou as velas do presidencialismo de cooptação. E deu no que está dando. 

Inexiste nesta republiqueta de bananas o princípio da responsabilidade. Quando não chantageia o Executivo, o Congresso Nacional é subserviente a ele. E isso vem acontecendo desde o "suicídio" de Getúlio Vargas.

quarta-feira, 18 de outubro de 2023

DE VOLTA AO IMPEACHMENT

 

O impeachment — adaptação anglófona do francês "empêcher" (impedir) — é o elemento mais importante do sistema imunológico dos governos presidencialistas contra chefes de estado que, eleitos para um mandato fixo, incorrem em condutas que colocam em risco a ordem constitucional. No Brasil, é o Congresso que decide se o presidente deve ser afastado por crime de responsabilidade, mas a legitimidade do processo é garantida pelo STF. 
 
Há basicamente três fontes normativas que tratam do impeachment: a Constituição, a Lei 1.079/50 ("lei do impeachment") e o Regimento Interno da Câmara Federal (no parágrafos 1º e 2º do art. 218). Trocando e miúdos, a competência para dar seguimento às denúncias é do plenário da Câmara Federal, embora caiba ao presidente da Casa fazer uma análise preliminar de admissibilidade (em caso de indeferimento, cabe recurso ao Plenário). 

Ocorre que não existem anticorpos contra a inércia do presidente da Câmara, pois nenhuma das fontes retrocitadas estabelece um prazo para essa ele tomar essa decisão. O "recebimento" de que trata o § 2º do artigo 218 da CF remete ao juízo de admissibilidade da denúncia, não ao protocolo do pedido, e assim a determinação de que a denúncia deve ser "lida no expediente da sessão seguinte e despachada à Comissão Especial eleita" só é aplicável após a admissão do pedido. 

Para alguns juristas, a inércia do presidente da Câmara resulta em "indeferimento tácito", mas outros entendem que o regimento interno da Casa lhe dá um poder discricionário, ou seja, permite-lhe decidir quando e se vai analisar analisar a admissibilidade da denúncia. O problema com a primeira interpretação é saber qual seria o prazo para caracterizar o indeferimento tácito — findo o qual o plenário poderia acolher ou não a denúncia à revelia do presidente da Câmara — e, com a segunda, o excepcional poder de barganha que tal prerrogativa confere ao presidente da Câmara sobre o chefe do Executivo. 
 
Desde a Proclamação da República, houve 5 processos de impeachment — o primeiro foi contra Getúlio Vargas (o parlamento o rejeitou, mas a pressão ensejou "suicídio" do caudilho) — e ao menos quatro presidentes renunciaram — Deodoro da Fonseca em 1891; Vargas em 1945; Jânio em 1961; e Collor em 1992. No período "pós-ditadura", dois mandatários foram impichados: Collor, em 1992, e Dilma, em 2016. Bolsonaro foi um sério candidato a engrossar essa lista, já que foi alvo de 150 denúncias (mais que a soma das 31 de Temer, 68 de Dilma e 37 de Lula), mas Rodrigo Maia rejeitou quatro por problemas de assinatura e engavetou outras 56, e Arthur Lira se encarregou de mantê-las em animação suspensa, juntamente com outras 90 que foram protocoladas sob sua batuta. 

PT quer transformar a História do Brasil num despacho a ser publicado no Diário Oficial da União. Para os membros dessa seita infernal, a história é unicamente aquilo que Lula conta, como manda o catecismo básico das ditaduras. A fraude da vez é a anulação do impeachment de Dilma, deposta por ter praticado crime de responsabilidade. No mundo dos fatos, a decisão foi tomada por 367 votos a favor e 157 contra na Câmara e 55 a favor e 22 contra no Senado (uma das maiorias mais arrasadoras que já se formou no Congresso), e sob supervisão do STF. Mesmo assim, para os seguidores do Sistema L a mulher sapiens sofreu um "golpe de Estado". 

Essa obra de ficção vem sendo escrita há sete anos pela esquerda nacional, com apoio de artistas nacionais, de estrelas de Hollywood e até do Papa Francisco. É como dizer que Pilatos foi condenado por Cristo, mas a coisa vai além de uma mentira. PT e suas polícias no governo já cassaram o deputado federal que, quando era coordenador da Lava-Jato, acusou Lula, e agora querem cassar o juiz que o condenou por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. 

Além de livrar todos os milionários corruptos que confessaram seus crimes e devolveram dinheiro roubado, a corja vermelha quer abrir de novo o Tesouro Nacional para eles. Dilma se transformou numa ideia fixa para a esquerda em geral (e para Lula em particular), que se refere sistematicamente a uma decisão constitucional tomada pelo Legislativo e sancionada pelo STF como um "golpe"

No mundo de Lula e do PT, não se perde viagem. Todo peixe gordo que recebe o selo de mártir ganha junto a entrada para o paraíso do Erário Público. Dilma já levou a sua: um emprego na presidência do Banco dos “BRICS”, com cerca de R$ 300 mil mensais de salário, embora a gerentona de araque seja tão capaz de administrar um Banco quanto de pilotar uma nave espacial.

Como se não bastasse, o projeto, agora, é fabricar uma decisão “oficial” declarando que o impeachment não existiu e que a decisão do Congresso foi ilegal (ou alguma outra miragem da mesma família). Nessa balada, vão criar um passado novinho em folha para o próprio Lula, eliminando os fatos e empalando a população com a doutrina suprema da sociedade PT-Rede Globo: "O senhor não deve nada à justiça". 

Enquanto as limitações dos poderes do presidente da Câmara não forem estabelecidas, caberá às instituições da República lidarem com esse vácuo normativo. Nada disso ocorreria se, no plebiscito de 1993, o esclarecidíssimo eleitorado tupiniquim tivesse optado pelo parlamentarismo.

Triste Brasil.

Com J.R. Guzzo

terça-feira, 4 de julho de 2023

COLLOR LÁ... PARTE 5


Frases:
 
"Tentaram me matar em Juiz de Fora há pouco tempo com uma facada na barriga, e hoje levei uma facada nas costas com a inelegibilidade por abuso de poder político" — Jair Messias Bolsonaro.

"Não querem calar um homem, querem calar um povo" — Flávio Bolsonaro, o filho do pai.

"Preciso continuar viajando para 'passar a ideia' de que o governo está trabalhando e realizando" — Luiz Inácio Lula da Silva.

É o fim da picada!

***

Fernando Collor de Mello foi o primeiro presidente da nova república eleito pelo voto popular. Após ser acusado de envolvimento no famigerado "esquema PC" pelo irmão caçula, ele se tornou o primeiro presidente impichado, e, três décadas depois, o primeiro ex-presidente condenado pelo STF. Um currículo e tanto. 

Em entrevista a Veja em maio de 1992, Pedro Collor afirmou que seu relacionamento com o irmão azedou porque Paulo César Farias vinha "tentando destruir" a Gazeta de Alagoas, que foi ameado de morte pelos irmãos de PC e que achava que o mandante era o presidente: "É típico do Fernando usar instrumentos; ele não ataca."

Tesoureiro de campanha e achacador-mor da república durante o governo CollorPC foi indiciado em 41 inquéritos e teve a prisão decretada (em junho de 1993), mas fugiu em seu learjet Morcego Negro — que, segundo os serviços antidroga da Itália, era usado por traficantes de drogas durante o governo Collor. Depois de passar 152 dias despistando seguidamente a Polícia Federal e a Interpol, o testa de ferro de Collor foi reconhecido em Buenos Aires, mas escapou da polícia. Foi visto em Londres meses depois, 11 kg mais magro, sem os indefectíveis bifocais e disfarçado de príncipe árabe), mas tornou a fugir enquanto se discutia sua extradição. Acabou sendo capturado na Tailândia, graças à denúncia de um brasileiro que o viu caminhando pelas ruas de Bangkok.
 
Em 1994, PC foi condenado a quatro anos de prisão por sonegação de impostos e a sete anos, em regime semiaberto, por falsidade ideológica. Um ano depois, passou a cumprir a pena em regime aberto e engatou um namoro com Suzana Marcolino, a quem mimava com joias, roupas caras, carro de luxo e uma generosa conta bancária. Apesar da resistência das famílias, o idílio foi intenso, mas breve: apenas seis meses transcorreram entre a saída de PC da prisão e a noite de 22 de junho de 1996, quando ele e a namorada foram na casa de veraneio na praia de Guaxuma, a 10 km do centro de Maceió. 

Os corpos foram encontrados na manhã seguinte, com um tiro no peito de cada um. Embora a propriedade fosse vigiada por quatro seguranças, ninguém ouviu os tiros "porque era época de festas juninas" (!?). O grupo peritos liderado pelo legista Badan Palhares, da Universidade Estadual de Campinas, concluiu que PC foi morto pela namorada enquanto dormia, e que a moça se suicidou em seguida. Em depoimento à polícia, os seguranças disseram que ouviram o casal discutir depois do jantar, assim que os convidados (o irmão Augusto Farias e respectiva namorada) foram embora. 
 
Quem assiste a séries policiais conhece a teoria do “triângulo do crime”, que é baseada em três pressupostos: motivo, técnica e oportunidade. Suzana satisfazia-os todos: o ciúme, o revólver e a alegada embriaguez de PC naquela noite. Segundo as investigações, a arma encontrada junto aos corpos fora comprada semanas antes pela própria Suzana, e havia resíduos de pólvora nas mãos da moça quando os corpos foram encontrados. 

Pessoas próximas ao casal disseram que a "Morsa do Amor" vinha traindo Suzana com Claudia Dantas, filha de um cacique político alagoano. Mas é bom lembrar que PC deveria depor dali a alguns dias numa investigação sobre suposto pagamento de suborno a membros do governo, e que a possibilidade de ele revelar os nomes dos empresários que alimentaram os esquemas corruptos de Collor ensejou a hipótese de "queima de arquivo".
 
Contrariando o laudo de Badan Palhares (que foi acusado pelo ex-governador Geraldo Bulhões de ter recebido R$ 400 mil para apresentar um laudo falso), o legista George Sanguinetti disse que, considerando a localização do ferimento, a posição do corpo de PC 
— que teria sido "arrumado na cama" , a estatura de Suzana — ela era 10 cm. mais baixa que o namorado, que tinha 1,63 m  e o ângulo do disparo, a moça "só poderia ter apertado o gatilho se estivesse levitando". Nas palavras de Sanguinetti, "passional não foi o crime, e sim o inquérito". Suzana foi morta porque estava no lugar errado na hora errada". 

Observação: Os legistas recalcularam a trajetória do projétil e concluíram que, se Suzana estivesse sentada na cama (como indicou a primeira reconstituição), o tiro que a atingiu no pulmão teria passado à altura da cabeça. Mesmo assim, o caso seguiu arquivado. Sanguinetti foi condenado a dois anos de prisão por acusar Palhares de fraude processual, mas cumpriu a pena em liberdade e recebeu proteção policial até 2008. 
 
O verdadeiro autor dos disparos permanece desconhecido. Augusto Farias e mais oito foram indiciados. Na condição de deputado, o irmão de PC tinha foro privilegiado. Seu processo foi remetido à PGR, que recomendou o arquivamento. O STF acatou a recomendação e o caso foi dado por encerrado. Os seguranças foram a júri popular, mas o advogado contratado por Augusto Farias para defendê-los alegou falta de provas, e todos foram absolvidos. 
 
O júri descartou a possibilidade de homicídio seguido de suicídio, alegando que "não há crime passional com único disparo, que o tiro deflagrado foi de profissional, e que Suzana jamais teria condições de ser a autora".

Termina no próximo capítulo.