A proposta de adiar o julgamento do habeas corpus de Lula
não partiu de Rosa Weber (ao
contrário do que eu aventei nesta postagem), mas foi ela quem
primeiro defendeu o “congelamento da situação jurídica do paciente” até decisão
final de pedido. Aliás, especulava-se que algum ministro favorável à prisão
após condenação em segunda instância pedisse vista do processo ― coisa que Lewandowski,
Toffoli, Marco Aurélio ou Gilmar
Mendes certamente teriam feito se a balança pendesse claramente para o lado
de quem acha que Lula não está acima
da lei e que deve aguardar na prisão o julgamento dos recursos que ainda vier a
interpor. Mas não foi o caso.
É preciso ter em mente que a jurisprudência ora vigente foi estabelecida por uma
decisão apertada (6 votos a 5), mas continuará vigendo enquanto as ADCs (Ações Declaratórias de
Constitucionalidade) que contestam a prisão em segunda instância não forem
julgadas. Por isso, o salvo-conduto que 6 ministros
concederam ao petralha, impedido o cumprimento da lei até que o STF julgue o mérito do seu HC, foi um verdadeiro presente de
Páscoa.
Espera-se que o julgamento seja retomado na próxima quarta-feira,
4, mas não se descarta a possibilidade de algum ministro favorável ao ex-presidente
pedir vista, adiando novamente a decisão e mantendo Lula fora da cadeia por uma liminar provisória que não teria prazo para terminar.
Nesse entretempo, Marco Aurélio
continuaria pressionando a presidente Cármen
Lúcia a pautar o julgamento das ADCs
― que também pode ser objeto de um pedido de vista ―, mas o fato é que enquanto
isso o molusco continua solto, em caravana pelo país, ainda que sob
saraivadas de ovos, tomates e até tiros.
A intenção do PT
é manter viva a fábula da candidatura de Lula até que o TSE negue seu
registro, o que deve acontecer em agosto. Com isso, o ex-presidente reforçaria
sua imagem de perseguido, injustiçado, e canalizaria os votos da patuleia para o candidato que ele indicasse para
disputar o pleito em seu lugar. Mas sempre existe o risco de “rasgarem” a Lei da Ficha Limpa ― como
fez Dias Toffoli no caso do senador cassado Demóstenes Torres, na última
terça-feira, justamente num momento em que a situação do ex-presidente condenado
está para ser decidida. A decisão foi monocrática e ainda precisará ser referendada
pela 2ª Turma do STF, mas, considerando quem são os demais integrantes daquela turma...
Como desgraça pouca é bobagem, uma eventual mudança no
entendimento do STF sobre o
cumprimento provisório da pena a partir da condenação em 2.º grau não
beneficiaria somente a Lula e outros "criminosos do colarinho-branco", mas também assassinos, traficantes, estupradores e bandidos
de toda espécie. Assim, os avanços que alcançamos no combate à corrupção seriam
anulados, trazendo de volta a proposta feita lá atrás por Romero Jucá ― o senador da suruba ―, de se costurar um acordão para estancar a sangria (representada pela Lava-Jato).
Talvez não hoje nem amanhã, mas mais cedo ou mais tarde o STF deverá rever a questão da prisão em
segunda instância e do fim do foro especial. No que concerne ao foro, até isso não seria ruim, já que esse privilégio existe apenas para facilitar a vida dos
poderosos. Por outro lado, com a prisão dos réus somente depois do trânsito em
julgado da condenação, seria uma festa para os poderosos, que roubaram milhões
e, portanto, podem contratar excelentes criminalistas. Mesmo sendo condenados
em primeira instância, essa corja esgotaria a caudalosa cachoeira de
recursos em liberdade, e a morosidade da Justiça, combinada com as
chicanas jurídicas, resultaria fatalmente na prescrição dos crimes ― um filme a que todos
nós já assistimos antes da Lava-Jato.
O busílis da questão é estabelecer de uma vez por todas se a prisão
dos réus antes do trânsito em julgado das sentenças condenatórias (ou seja,
antes que sejam esgotadas todas as possibilidades de apelação em todas as
instâncias do Judiciário) fere ou não a presunção
de inocência. Mas isso já é assunto para a próxima postagem. Até lá.
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