SE TODO MUNDO FALASSE SOMENTE DO QUE REALMENTE ENTENDE, O SILÊNCIO SERIA INSUPORTÁVEL.Sabe-se que índios usavam tambores e sinais de fumaça para se comunicar, que Alexander Graham Bell registrou a primeira patente de um aparelho telefônico em 14 de março de 1876, e que D. Pedro II ficou tão encantado com a novidade que o Brasil se tornou o segundo país do mundo a ter telefone.
O que muitos não sabem (ou não se lembram) é que até o final dos anos 1990, quando FHC sepultou o abominável Sistema Telebras (criado pelos militares em 1972), as linhas telefônicas custavam os olhos da cara e demoravam anos para ser instaladas. No município paraense de Cachoeira do Arari, a espera era tamanha (15 anos) que alguns aderentes do famigerado "Plano de Expansão" da Telepará morreram antes de terem o gostinho de dar um telefonema.
Até o final dos anos 1970, quando o DDD e o DDI foram implantados nacionalmente, fazer uma chamada interurbanas ou internacional exigia passar pela telefonista e esperar horas até a ligação ser completada, sem falar que as tarifas eram caríssimas. Mas não há nada como o tempo para passar.
A telefonia móvel celular começou a ser testada experimentalmente no início do século passado, e os primeiros aparelhos para automóveis surgiram nos anos 1940. O Mobilie Telephony A, lançado pela sueca Ericsson na década seguinte, pesava 40 kg e era tão grande que precisava ser acomodado no porta-malas. Em 1973, a americana Motorola lançou o DynaTAC 8000X, que media 25 cm x 7 cm e pesava cerca de 1 kg. A "nova" tecnologia entrou em operação no Japão e na Suécia em 1979, mas o tamanho avantajado do hardware, a autonomia medíocre da bateria e o longo tempo de recarga desestimularam as vendas.
O primeiro celular vendido no Brasil foi Motorola PT-550 (um "tijolão" de 800 g). Os demais modelos dos anos 1990 eram igualmente grandes, desajeitados e caros. Habilitar uma linha era trabalhoso e custava os olhos da cara. A insuficiência de células (antenas) restringia o sinal às capitais e grandes centros urbanos, e a profusão de "áreas de sombra" limitava ainda mais o uso dos aparelhos. O preço das ligações era proibitivo e, para piorar o que já era ruim, pagava-se tanto pelas chamadas efetuadas quanto pelas recebidas. Mas, de novo, não há nada como o tempo para passar.
A privatização das Teles estimulou a concorrência entre as operadoras, que passaram a oferecer aparelhos subsidiados e planos com chamadas ilimitadas para qualquer parte do país e franquias de dados (nem sempre generosas) para acessar a Internet através de suas redes móveis. Assim, com mais celulares do que habitantes no Brasil, os "orelhões" desapareceram das esquinas e os usuários de linhas fixas minguaram.
Até 2007, os aparelhos encolhiam e a gama de funções crescia a cada lançamento. Com o lançamento do iPhone, a Apple levou a concorrência a lançar seus smartphones, e com isso o que já era bom ficou melhor, só que maior: a a partir do momento em que os telefones móveis se tornaram computadores pessoais ultraportáteis, a miniaturização deixou de fazer sentido.
Observação: Vale destacar que o primeiro telefone móvel capaz de acessar a Internet não foi o iPhone, mas o Nokia 9000 Communicator — lançado em 1996 —, mas a conexão só era possível na Finlândia.
Embora não haja nada como o tempo para passar, o espaço-tempo é uma espécie de pano de fundo para todos os fenômenos do Universo, onde o trânsito pelas três dimensões espaciais se dá por "vias de mão dupla". Até não muito tempo atrás, achava-se que a quarta dimensão — a do tempo — fosse uma via de mão única, mas, de novo, não há nada como o tempo para passar.
Carlo Rovelli, Guido Tonelli e outros astrofísicos respeitados internacionalmente teorizam que a "seta do tempo" não precisa necessariamente apontar para o futuro. O que entendemos por tempo é na verdade um fluxo de eventos sucessivos; esse fluxo ocorrer numa direção preferencial, o ontem impõe restrições ao hoje, e o amanhã, que transforma o hoje em ontem, novos limites ao "novo presente" (aquele que chamamos de "futuro").
Deixando a física e a mecânica quântica de lado, parece que o tempo retrocedeu para a Nokia, que vem promovendo há alguns anos a volta dos "dumbphones" (dumb = burro), como ficaram conhecidos os aparelhos celulares de era "pré-iPhone" com o advento do "smartphone" (smart = inteligente). Sem sistema operacional que lhes capacitasse a rodar aplicativos, os primeiros celulares se limitavam a fazer e receber chamadas e SMS (mensagens de texto curtas).
É fato que os dumbphones ganharam novos recursos ao longo do tempo (como relógio, despertador, calculadora, calendário, agenda e alguns joguinhos elementares), mas fato é que eles nunca chegaram ao pés de sues irmãos inteligentes. Por outro lado, uma gama de funções tão espartana prolongava significativamente a autonomia da bateria. Meu saudoso Motorola RAZR V3 (cuja imagem ilustra este post) passava quase uma semana longe da tomada. Mas não há nada como o tempo para passar.
A genialidade de Steve Jobs converteu um jegue num puro-sangue árabe, ou seja, um telefone móvel de longo alcance num dispositivo com 1001 utilidades que também serve para fazer e receber chamadas telefônicas. E o excesso de informação, decorrente do uso massivo do smartphone, ensejou a ressureição do dumbphone. Andar com um celular burro em pleno século 21 cheira a saudosismo, mas está de bom tamanho para quem precisa de um telefone móvel, não de um computador de bolso, ou que se "desintoxicar" das redes sociais.
Os modelos da Nokia, cujo slogan é "dumb phone, smart choice" (telefone burro, escolha inteligente), dispõem de tela colorida, mas de baixa resolução, e teclado numérico analógico. E custam bem menos que seus irmãos espertos (cerca de R$ 300). Quem nunca teve um aparelho com teclado analógico vai estranhar o uso das teclas numéricas para escrever texto, mas, noves fora a tecla 1, cuja função secundária é ligar para o "correio de voz", as demais servem para escrever textos. Se você pressionar a tecla 2 uma vez num campo de texto, você obterá o número 2; pressionado-a duas vezes, a letra "a"; três vezes, a letra "b"; quatro vezes, a letra "c". As demais teclas inserem as demais letras do alfabeto e sinais gráficos que não estão impressos no teclado, como caracteres acentuados, cedilha e pontuação, bem como alternam letras maiúsculas e minúsculas. Caso você precise digitar duas letras iguais em sequência, faça um intervalo de 1 ou 2 segundos entre os toques.
A exemplo dos dumbphones antigos, os novos limitam a diversão fica a joguinhos simples — como o "jogo da cobrinha", cujo objetivo é coletar objetos na tela para ir crescendo sem esbarrar nas laterais. Enviar uma foto para um contato, só via Bluetooth. Mas o preço (baixo) e a autonomia (invejável) da bateria faz deles a solução ideal para quem quer ter um celular de backup ou usar viagens para falar o essencial com familiares e amigos.
Quando compuseram NADA SERÁ COMO ANTES, em 1971, Milton Nascimento e Ronaldo não tinham como prever o advento dos celulares nem (muito menos) o renascimento das cinzas da Phoenix da telefonia móvel. Mas eu jamais trocaria meus Galaxy M23 e Moto g60 por um Nokia 105 NK093 Dual Chip com rádio FM, lanterna e joguinhos pré-instalados (R$ 142,80 na Amazon). Com a devida venia de quem pensa diferente, acho que quem vive de passado é museu.