O leitor certamente já ouviu falar em "tirar castanha com a mão do gato" (se não ouviu, é só clicar aqui). Pois foi exatamente isso que Bolsonaro fez, no último domingo, ao usar o o pontifex maximus da Assembleia de Deus Vitória em Cristo para fazer o que ele próprio não teve peito de fazer: acusar o TSE e o STF de orquestrar "uma engenharia do mal" para prendê-lo. Até os puxa-sacos do "mico" reconheceram que o sermão saiu do tom, mas o "pastor" manteve a pose: "Eu desafio qualquer um a dizer qual é a fake news, qual é a mentira e qual é o ataque. Só mostrei fatos e falei a verdade" disse Silas Maracutaia ao Poder360.
Mudando de assunto, não se pode aceitar com naturalidade a relação promíscua entre religião e Estado, sobretudo em num estado laico. E livrar de impostos os polpudos ganhos de pastores e assemelhados é escarnecer dos "contribuintes" (entre aspas, pois "contribuir" só orna com "imposição" num país que trata salário como renda para fins de tributação).
Ricardo Kertzman anotou em sua coluna: "Não bastasse a 'bancada evangélica' lutar com a faca nos dentes e sem crucifixo nas mãos por cada vez mais poder, 'pastores' financiados pela democracia pregam abertamente de seus púlpitos a cisão social motivada pela política." Isso não vem de hoje, naturalmente, mas o quadro se agravou na gestão do Messias que não miracula.
O problema é que os "pastores" as "ovelhas", e todo esse rebanho vota. Haddad e seu chefe não perdem uma única oportunidade de acusam os "super ricos" de não serem tributados como deveriam (mais uma mentira populista e demagoga do PT), mas se curvam bovinamente à imunidade tributária das igrejas e seus donos.
No picadeiro da Paulista, Malafaia e Michelle trombetearam que "a igreja vai entrar pra valer na disputa eleitoral". Até uma toupeira vê abuso de poder econômico nessa parada. Como bem ironizou o colunista retrocitado, "o diabo é que, em nome do Senhor, tudo pode e é permitido aos engravatados de Deus em Brasília, pois não há Cristo que interfira nisso".
Na quinta-feira 22, o ex-ministro da Justiça que encheu Lula de orgulho ao se declarar "socialista, comunista e marxista" vestiu a suprema toga e depois foi à missa. A posse foi discreta, mas o rega-bofe reuniu cerca de 900 convidados — entre eles Davi Alcolumbre, Juscelino Filho, Renan Calheiros, Fernando Collor, Ibaneis Rocha e Romero Jucá. Já o comedimento, a impessoalidade e a prudência foram impedidos de entrar.
Juscelino — que continua ministro das Comunicação de Lula — responde a processo por supostos crimes de desvios de dinheiro público quando era deputado federal pelo Maranhão (estado natal de Flávio Dino).
Alcolumbre — ex-presidente do Senado — é investigado em dois inquéritos por supostos crimes de "rachadinha" em seu gabinete (assim como o caso envolvendo Juscelino, a relatoria ficará a cargo de Dino).
Calheiros é freguês de carteirinha do STF, inclusive por condutas delituosas supostamente praticadas no âmbito do Postalis. Collor foi condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no âmbito da Lava-Jato (o julgamento de seus embargos de declaração foi suspenso por um pedido de vista de Dias Toffoli).
Jucá — um dos caciques do MDB — é alvo de inquérito por ter sido um dos beneficiados por suposto recebimento de propina da Odebrecht (o caso, que envolve também Calheiros, tramita no STF desde 2017).
Se gostasse de apostas e tivesse tostão para apostar, Andreazza apostaria que o senador eterno será — anomalia natural (o oximoro se impõe) numa Corte constitucional que se dilata sobre a República — ministro-líder do governo num Tribunal há muito à vontade para ser o terceiro turno parlamentar. Em suma, uma escolha pós-Lewandowski que Lula fez para ter um "Xandão" pra chamar de seu.
Triste Brasil.