sábado, 14 de maio de 2022

A ESCALADA QUE NÃO VALE A PENA VER DE NOVO


Chamava-se “Escalada” o folhetim que a TV Globo levou ao ar entre janeiro e agosto de 1975. Feita esse necessária contextualização, vamos ao que interessa.
 

Faltam menos de 5 meses para a eleição presidencial (eu diria “eleições” se houvesse ao menos a certeza de que haverá segundo turno, lembrando que, desde FHC, em 1994 e 1998, nenhum postulante a inquilino do Planalto liquidou a fatura de uma pancada só). A julgar pelo que está exposto na vitrina, a terceira via virou Viúva Porcina — aquela que foi sem nunca ter sido. Restam João Doria e Simone Tebet — que, somados, têm menos votos que o perdedor convicto Ciro Gomes. Ou um pouco mais que isso.

 

Dados divulgados pela Genial/Quaest na quarta-feira 11 indicam que, depois de crescer oito pontos percentuais em três meses e reduzir de 22 para 14 pontos a desvantagem em relação a Lula, o candidato à reeleição parou de crescer em maio e está com 31% da intenções de voto (contra 46% do ex-presidiário). Ciro e Doria registraram, respectivamente, 9% e 4%. Nos dois principais cenários pesquisados, o picareta dos picaretas supera numericamente a soma dos demais adversários (46% a 44%), o que, em tese, lhe dá chance de vencer no primeiro turno.

 

Ao escolher Braga Netto para vice, Bolsonaro deixou claro (pela enésima vez) que pretende buscar nas Forças Armadas o respaldo para o autogolpe. “Só Deus me tira da Presidência”, disse o “mito” dos apalermados em diversas oportunidades. Caso seja reeleito, seu segundo mandato será uma gestão totalitária, com novos e mais virulentos ataques ao Congresso e ao STF. Se o resultado das urnas não lhe for favorável, o capetão tentará anular o processo alegando fraude. Não à toa, ele vem atacando a democracia e a Justiça Eleitoral e tentando intimidar que se coloca em seu caminho. E como desgraça pouca é bobagem, a alternativa é o ex-presidiário (ora na versão "ex-corrupto").

 

Parte da culpa por esse descalabro é eleitorado — que dela não está disposto a abrir mão. Os motivos que levam a essa singela conclusão são de uma obviedade ululante. Da feita que eles foram enumerados em diversas oportunidades, poupo o leitor (e a mim) de mais uma desgostante repetição. Relembro apenas que, a despeito de os demais postulantes à Presidência em 2018 estarem mais para um elenco de filme de horror que qualquer outra coisa, nada justifica a escalação da marionete do então presidiário e do duble de mau militar e parlamentar medíocre para o embate final.     

 

Bolsonaro é a encarnação cuspida e escarrada do escorpião da fábula. Só não vê quem não quer — como as “instituições”, que pecam por subestimá-lo e não defenestrá-lo, a despeito dos famigerados discursos golpistas de Sete de Setembro. De nada adianta prender cães danados na corrente; para evitar o mal maior, é imperativo sacrificá-los. 

 

Déspota em estado bruto e eivado de ambições golpistas inegáveis, o mandatário de fancaria almeja a volta da ditadura do coturno sob seu comando. A escalada de discursos radicais é a prova provada da vileza de suas intenções. Mas, e daí? — como disse o próprio, sobre a possiblidade de milhares de brasileiros perderem a vida para a Covid. 

 

Reconhecer o óbvio seria o primeiro passo para desativar a bomba-relógio programada para explodir daqui a cinco meses. Mas de que adiantam 145 pedidos de impeachment se o presidente da Câmara é seu guardião constitucional e deve o cargo a Bolsonaro e ao escuso “orçamento secreto”? Para que servem todas as evidências de crimes comuns contra o pajé da cloroquina se o chefe da PGR age se porta como um patético vassalo? 

 

Com a rasura intelectual e o pendores psicopáticos que fazem parte de sua natureza, o caudilho em gestação alimenta o que há de mais primitivo e tosco em certos setores da sociedade. Nada do que ele diz é verdade, mas qualquer coisa que disser arrancará aplausos de seus seguidores fanáticos e os estimulará a defender causas obscurantistas, quando não criminosas. 


A ficha precisa cair. Um candidato em pleno comando da máquina conspira para piorar o ambiente com medidas onipotentes a granel. Não há como ser conivente com seu “jeitinho” arrivista. Reações tímidas e condescendentes custarão caro a um povo que já não tem condições sequer de pagar por um botijão de gás (e quando tem, não lhe sobra dinheiro para comprar o que cozinhar, de modo que dá no mesmo). 

 

A cabeça de um golpista, diz o jornalista Carlos José Marques, funciona de maneira diferente, diabólica, e pega a todos de surpresa porque suas estultices são desprezadas, menosprezadas, relativizadas ou tratadas com desdém. Não há como combater tais ameaças com tapinhas nas costas ou cafezinho. A época do deixa disso já ficou para trás. Um novo estágio de risco foi escalado. Os confrontos diuturnos com o Judiciário já não são simples cortina de fumaça. Bolsonaro quer peitar a Justiça e extinguir ordem democrática constituída. E o pior é que, se ninguém se opuser, ele vai conseguir.

 

Para concluir: seis anos atrás, durante o mandato-tampão do vampiro do Jaburu, eu publiquei um texto de Guilherme Fiúza (quando o conspícuo jornalista ainda não se havia tornado bolsonarista de carteirinha, talvez porque o bolsonarismo ainda não se havia cristalizado). Reproduzo um excerto:

 

Os dias eram assim: José Carlos Bumlai, o laranja da revolução, o amigo fiel do chefe da gangue progressista e solidária que arrancou as calças do povo, é solto pelo STFJosé Dirceu foi o próximo da lista da alforria, identificado como maestro do Mensalão e do Petrolão, ou seja, um guerreiro do povo brasileiro pelo direito sagrado de garfar os cofres públicos sem perder a ternura. 


O ideal é que a Justiça dê liberdade logo a todos esses heróis da história recente, para que eles possam começar tudo outra vez. Caminhando e cantando e seguindo o cifrão. Vamos parar de perseguir esses revolucionários estoicos. Ligue a TV e veja como eles eram lindos. E românticos. O fato de terem chegado ao poder e acabado todos em cana por ladroagem é um detalhe. 


Ninguém quer ficar lembrando notícia ruim. Se Hollywood pode cultivar Hugo Chávez como salvador do Terceiro Mundo (a Venezuela sangrenta e arrasada não coube no roteiro), por que não podemos continuar envernizando os anos de chumbo? A revolução de Jim Jones também foi linda. Por que ficar lembrando aquele incidente no final, com a morte de uns 900 seguidores por suicídio e assassinato? Mania de botar defeito em tudo.


A libertação de Bumlai e Dirceu é um episódio emocionante se você imaginar quanto os amigos deles lutaram por liberdade nos anos 1960. Quem disse que utopia não vira realidade? Valeu a pena sonhar: depois da ditadura vem a abertura (da porteira). Eles até se compararam a Nelson Mandela ― ou seja, estão com a maquiagem em dia. Basta dar uma retocada quando o carcereiro chegar, e correr para os braços do povo como ex-presos políticos. O Brasil adora esse tipo de herói. A cama de Lula está feita. 


(...) Voltando à narrativa da gloriosa revolução socialista contra a direita malvada, a conta fecha de forma comovente. Faça a estimativa do custo de todos os advogados contratados a peso de ouro por nosso batalhão de heróis enrolados com a polícia por anos a fio e conclua sem medo de errar: estão podres de ricos. E é com esses advogados, com essa fortuna e com a boa vontade que esse charme todo suscita nos bons amigos do Judiciário que eles estão articulando a abertura (das celas).

Talvez você ainda se lembre de que Dirceu, em pleno julgamento como réu do mensalão, continuou faturando com o Petrolão (...) Talvez você tenha registrado que, já em 2014, com a força-tarefa de Curitiba a todo vapor desvendando o escândalo, as engrenagens do esquema continuavam em marcha, inclusive para abastecer a reeleição de Dilma, a presidenta mulher revolucionária do bem. Parece incrível, mas os dias eram assim.

Diante de uma quadrilha virtuosa como essa, que parece ter como característica especial a desinibição, é providencial que o STF comece a soltar os seus principais integrantes. Afinal, os fatos mostram que eles não vão fazer nada de mais, afora girar sua fortuna, reciclar os laços de amizade e voltar a irrigar seus negócios – que tiveram 13 anos de esplendor e ultimamente deram uma caída, prejudicados por fascistas invejosos.

Contratar pesquisas de opinião mostrando que Lula já é o próximo presidente e manifestos de intelectuais à la carte está pouco. É preciso que a Justiça tire os revolucionários do xadrez para que Lula não tenha mais de ficar zanzando por aí de jatinho sem saber direito onde pode pousar. Chega de constrangimento. Que a perseguição a esses homens de bem termine de vez e Lula possa chegar cheio de moral diante de Sergio Moro, dizer que o corrupto é ele, e depois comemorar com um churrasco no tríplex de Guarujá, que ninguém é de ferro.


Como se vê, antes de sucumbir ao bolsonarismo boçal o cara era um profeta. 

sexta-feira, 13 de maio de 2022

UM PAÍS SEM ESTADISTAS

 


Há 58 anos, um golpe militar instaurou no Brasil uma ditadura que durou 21 anos e censurou, perseguiu, prendeu, exilou, torturou, matou. O obscurantismo e a estupidez provocaram enorme sofrimento e criaram um apagão na cultura, hiperinflação, arrocho salarial, concentração de renda. Mas nem o período mais nefasto de nossa história produziu um presidente com personalidade mais autoritária do que Jair Bolsonaro, e dá arrepios imaginar o que ele faria se tivesse o poder de um Geisel. E vale destacar que isso não é de todo impossível: os golpes de hoje não se dão com tanques, mas pelo desmonte das instituições, processo em que Bolsonaro vem sendo bem-sucedido. Se ganhar mais um mandato, pode destruir a democracia por completo.

 

É grave que os maiores interessados na preservação da democracia não se mobilizem. Metade do Congresso Nacional, incluindo boa parte da oposição, segue Artur Lira e Ciro Nogueira e se vende a Bolsonaro pelos bilhões do orçamento secreto. Parafraseando Churchill, alimentam o crocodilo na esperança de serem devorados por último.

 

Ainda mais grave é que os progressistas não consigam se organizar para enterrar Bolsonaro em outubro. Alckmin, sabotado Doria, migrou para o PSB para ser vice de Lula. A adesão, eleitoreira, não inclui agenda programática. O picolé de chuchu fica calado enquanto o ex-presidiário ataca bandeiras históricas do PSDB. A adesão serve apenas para que o cabeça da chapa finja que acena ao centro.

 

Leite disputou as prévias tucanas e foi derrotado. Quis ganhar no tapetão e perdeu. Decidiu abandonar o partido para ser candidato, desistiu ao perceber que não teria chance, mas ainda quer jogar a final, mesmo tendo sido derrotado na semifinal. Ciro Gomes tampouco cogita renunciar. Moro aceitou ser ministro de um presidente que, como juiz, ajudou a eleger. Mas não tem preparo político nem proposta convincente como democrata. Anunciou sua desistência não por desprendimento, mas porque se viu emparedado. Melhor teria sido — para ele e para o país — se tivesse ficado na 13ª Vara Federal de Curitiba.

 

Doria já se desentendeu com Alckmin, Leite, Jereissati, Aníbal e o presidente do partido, Bruno Araújo. Se não consegue unir os tucanos, que dirá a oposição. Em um gesto unilateral e inesperado, anunciou a desistência de concorrer à Presidência, jogando o PSDB no caos. Depois, desistiu de desistir, e ninguém sabe no que isso vai dar.

 

Lula lutou pelo impeachment de todos os presidentes não petistas exceto Bolsonaro, que poupou por acreditar ser mais fácil de derrotar. Poderia negociar uma agenda comum com o centro e até vencer no primeiro turno, mas segue defendendo propostas incendiárias. Quer governar sozinho, como sempre fez.

 

O PT não mudou. Em 1985, na eleição indireta entre Maluf, homem da ditadura e corrupto notório, e Tancredo, democrata indiscutível e de caráter ilibado, o partido dos trabalhadores que não trabalham determinou o voto nulo e expulsou quem votou no democrata. Tancredo venceu, mas não exerceu a Presidência — sabendo-se doente, atrasou a internação por medo de que os militares impedissem a redemocratização; acabou internado de emergência na véspera da posse e morreu semanas depois.

 

Estadistas como Tancredo sacrificam interesses pessoais e até a vida pelo país. Os políticos de hoje parecem dispostos a sacrificar o país pelos próprios interesses, e se arriscam a sacrificar os dois.


 

Com Ricardo Rangel

CRAPWARE, BLOATWARE E OUTROS INUTILITÁRIOS

SÓ GOSTA DA SEGUNDA-FEIRA QUEM TEM AMANTE NO TRABALHO.

Os termos “bloatware” e “crapware” (bloat = entulho; crap = merda) designam aplicativos freeware (gratuitos) ou shareware (comerciais) que vêm instalados nos PCs (de mesa, portáteis ou ultraportáteis), de navegadores estranhos a lojas de apps, galerias e que tais.


Observação: Clique aqui para detalhes acerca das diversas modalidades de distribuição de software e aqui para saber mais sobre desinstalação de programas.


Embora o crapware seja comumente associado smartphones com sistema Android, desktops de grife e notebooks das marcas ASUS, LG, Dell, Samsung, Lenovo e Positivo, entre outras, trazem uma vasta coleção de inutilitários, sem falar nos itens da Windows Store que a Microsoft começou a embutir no Windows quando o promoveu a serviço (felizmente, eles são mais fáceis de remover do que o crapware que recheia o Android).


Todo programa ocupa espaço e consome recursos (notadamente memória RAM e ciclos de processamento). Em tese, tudo que não faz parte do sistema operacional pode ser descartado; na prática, é mais fácil falar do que fazer, mesmo porque inutilitários removidos a duras penas costumam ressurgir quando o Windows é reinstalado a partir da cópia de segurança ou quando o celular é revertido às configurações de fábrica. 


O Windows (independentemente da versão) dispõe de uma ferramenta nativa para desinstalar programas, mas produtos de terceiros não só facilitam o processo como eliminam resíduos que o desinstalador nativo costuma deixar passar (algumas ferramentas chegam mesmo monitorar as instalações para criar “instantâneos” das configurações e reimplantá-las por ocasião de uma eventual desinstalação). 


SlimComputer PCDecrapfier ajudam a separar o joio do trigo; para quem valoriza desinstalações como manda o figurino, o Revo Uninstaller e o IObit Uninstaller são sopa no mel (mais detalhes nesta postagem).


Continua...

quinta-feira, 12 de maio de 2022

A FESTA DA DEMOCRACIA (FINAL)


Os pré-candidatos à Presidência ainda não estão oficialmente em campanha, mas Bolsonaro jamais despiu a fantasia de candidato à reeleição e Lula subiu palanque tão logo deixou sua cela VIP em Curitiba. Quando as campanhas realmente começarem, a coisa vai esquentar. A julgar pelo que já aflorou desse esgoto a céu aberto, teremos neste ano a disputa mais suja — e quiçá sangrenta — desde a redemocratização nesta republiqueta de bananas. 


A menos que o imprevisto tenha voto decisivo na assembleia dos acontecimentos, o segundo turno será disputado por dois mestres em populismo e pós-doutores em demagogia, e o esclarecidíssimo eleitorado escolherá entre um ex-presidiário que deixou a cadeia graças a uma decisão teratológica da justiça “cumpanhêra” e um lunático que, se houvesse Justiça como manda o figurino em terra brasilis, já teria sido apeado da Presidência (e possivelmente acabaria na cadeia). 


Por essas e outras, desconfie de tudo que você lê e ouve e só acredite em metade do que vê com os próprios olhos, pois as coisas nem sempre são o que parecem. Para não ser feito de bobo, confira a veracidade das notícias em sites de jornais e revistas de grande circulação ou recorra ao G1 Fato ou Fake, à Agência Lupa e ao Projeto Comprova, entre outros serviços que se propõem a separar o joio do trigo.


Ricardo Noblat é petista de carteirinha, mas não há como discordar quando ele pondera que eleger um presidente no primeiro turno não é lhe passar um cheque em branco. Afinal, não foi em 1994 nem em 1998, quando FHC foi eleito e reeleito, ambas as vezes derrotando Lula no primeiro turno, (por 54% a 27% e 53% a 31% dos votos válidos, respectivamente). Mas a eleição deste ano não será uma eleição normal, até porque o presidente que aspira a um novo mandato não é um presidente normal. 


Nenhum outro mandatário desta banânia conspirou tanto contra a democracia restabelecida no país depois de 21 anos de ditadura militar quanto Bolsonaro. O discurso do ódio e da destruição do que o capetão chama de “sistema” está na boca de quem? Qual foi o presidente que mais tencionou o país de 1985 para cá? Qual foi o único que recomendou às pessoas que se armassem? Qual foi o que menos demonstrou empatia pelos que sofrem? Qual foi o que mais desvalorizou a vida alheia?


Os preparativos do golpe avançam e podem ser vistos por quem tem olhos para ver. Serão maiores as chances de o golpista dar com os burros nágua se qualquer outro candidato for eleito no primeiro turno com uma maioria confortável de votos. Quanto mais expressiva for essa vitória, menor será o risco de golpe. 


Curiosamente, o ex-capitão parece fazer questão de tornar as coisas mais fáceis para o ex-presidiário. Tão fáceis que bastou o líder nas pesquisas anunciar que sua prioridade é restaurar a democracia e reconstruir tudo o que o postulante à reeleição destruiu — saúde, educação, ciência, meio ambiente cultura... — para que a mistura de lula com chuchu fosse vendida como manjar. 


Impossível discordar da prioridade atribuída à democracia e à reconstrução da administração pública. Mas o desafio é bem maior do que misturar lula com chuchu numa chapa ou numa receita de risoto replicada nas redes sociais. Será necessário administrar diferenças internas para apresentar um cardápio econômico mais denso e palatável. Para ficar nos exemplos superficiais, o petista defende mudanças na política de preços da Petrobras e abomina as privatizações. 


O ex-tucano e outros conservadores que o pajé do PT deseja atrair para sua caravana querem a paridade internacional dos preços dos combustíveis e a desestatização de empresas como a Eletrobrás, e aprovam a venda de subsidiárias da Petrobras.


A despeito dos ataques ao sistema eleitoral e das ameaças às instituições, Bolsonaro avançou nas pesquisas eleitorais. O crescimento empurra Lula para um discurso do tudo-ou-nada democrático. Quanto maior for o número de aliados, mais aguado tende a ficar o programa de governo. 


Para atrair eleitores não convertidos, a pregação torna-se evasiva.

Sumiram do pronunciamento lido por Lula no sábado referências à reforma trabalhista, por exemplo. Nem revogação nem revisão. Nada! Aprisionado dentro das quatro linhas do discurso escrito, o molusco indigesto preferiu equiparar a defesa dos direitos trabalhistas a uma pregação anódina em favor da retomada do crescimento econômico.


Num ambiente assim, diz Josias de Souza, é preciso cuidar para não produzir uma decepção pós-eleitoral. Supondo que Lula prevaleça, Bolsonaro vai para casa. Nem por isso a inflação acabará, os empregos ressurgirão e o endividamento dos brasileiros desaparecerá. É preciso informar quais são os planos para melhorar a mistura.


Pode-se anunciar boa comida da boca pra fora. Mas é da boca pra dentro que se descobre a qualidade do prato. O risco à democracia não pode ser confundido com cheque em branco. Convém adicionar tempero à receita. Sob pena de encurtar o intervalo entre a eventual consagração e a desilusão.


Noblat diz que não pede votos para Lula (fica a critério de cada um acreditar ou não), mas apenas recomenda que se eleja um presidente no primeiro turno, qualquer um, menos Bolsonaro. O problema (e isso sou eu quem diz) é que a maldita polarização favorece os extremistas extremados, e a conspirata capitaneada por Bivar et caterva tirou Moro do páreo.


Resta saber quem disputará o Planalto contra nhô-ruim e nhô-pior. Eu votaria em Doria, em Tebet, até em Ciro, mas jamais em Bolsonaro ou em Lula.


TODO CUIDADO É POUCO

POLÍTICA SE FAZ UM DIA DEPOIS DO OUTRO


Diferenciar websites “legítimos” dos potencialmente perigosos está mais difícil a cada dia, donde a palavra de ordem é confiar desconfiando e redobrar os cuidados nas compras online. 


Recomenda-se evitar o uso cartões de débito e, no que diz respeito aos cartões de crédito, utilizar sempre que possível cartões pré-pagos ou versões “virtuais” do cartão atrelado a sua conta bancária. Igualmente importante é informar somente os dados indispensáveis à transação. Diferentemente de um relógio, um par de tênis ou outro produto a ser entregue em sua casa, um software shareware é obtido via download e a licença (chave de ativação), enviada para o endereço de email cadastrado no ato da compra. Portanto, não há motivo para informar seu endereço físico e outros dados que não os do cartão.


Com relação aos aplicativos que você instala no smartphone ou no tablet, faça o download a partir da loja do fabricante do aparelho ou do Google Play (ou da App Store, no caso do iPhone e do iPad). Isso não garante que você não levará gato por lebre, mas reduz significativamente os riscos. E fique atento às permissões que os programinhas solicitam — uma lanterna, por exemplo, não precisa ler seus emails ou acessar sua lista de contatos, também por exemplo. 


Fuja de promessas mirabolantes e de ofertas imperdíveis. Na política, o candidato que mais promete costuma ser o que menos cumpre. Nas compras online, sites com anúncios de mais e conteúdo de menos, ou que o induzam a instalar seja lá o que for para ter pleno acesso ao conteúdo da página, têm tudo para ser arapucas. 


Se o link para o site vier a bordo de email de procedência duvidosa (o fato de o remetente da mensagem ser conhecido não garante que foi ele quem a enviou), clique no endereço com o botão direito, selecione “copiar link” ou “copiar o endereço da página”) e faça uma busca no Google. No caso de links “encurtados”, recorra a um serviço que os reconverta em links convencionais, como o CheckShortURL. 


O URLVoid não só indica qual site é responsável pelo URL como também informa quando o domínio foi registrado, sua posição no ranking do Google e quantos avisos de reputação maliciosa foram registrados por sites de varredura. O VirusTotal usa mais de 50 ferramentas diferentes para checar arquivos e links suspeitos, e apresenta os resultados em poucos segundos (ou minutos, dependendo do tamanho do arquivo). 


Outra opção interessante é o Zulu URL Risk Analyzer. Basta digitar (ou copiar e colar) o endereço do site e clicar em Submit URL — quanto maior o número de barrinhas verdes, menor a chance de você ter problemas.

quarta-feira, 11 de maio de 2022

A FESTA DA DEMOCRACIA (CONTINUAÇÃO)


No último sábado, o ex-presidiário Lula da Silva lançou sua pré-candidatura em ato político realizado em São Paulo. Como aprendeu a ler durante os 580 dias em Curitiba, o petralha se ateve ao discurso escrito pelos marqueteiros, evitando, assim, falar mais bobagens do que as habituais. Se tivesse ficado em cana por mais tempo, talvez ele aprendesse também a escrever, mas isso é outra conversa. 
Com a voz roufenha e o dedo em riste, o abantesma vermelho exaltou o “legado petista”, mas tomando o cuidado de não mencionar os mais de R$ 40 bilhões roubados da Petrobras (parte dos quais foram recuperados pela Lava-Jato, mas isso é outra conversa). 

O deus pai da Petelândia voltou a dizer que foi vítima de uma implacável perseguição político-jurídica — aleivosia que ganhou corpo com a estapafúrdia decisão do comitê de Direitos Humanos da ONU, exarada depois que o plenário do STF avalizou uma decisão monocrática do ministro Luís Edson Fachin, segundo a qual os processos contra o ex-presidente ex-presidiário não deveriam ter sido julgados pela 13ª Vara Federal Criminal de CuritibaNa mesma solenidade, Geraldo Alckmin, o eterno picolé de chuchu, que se sujeitou a ser vice na chapa do molusco, jurou lealdade e disse que “Lula vai bem com chuchu”. Patético.

Aos trancos e barrancos, Bolsonaro — que é alvo de quase 150 pedidos de impeachment, só não foi defenestrado porque aparelhou as instituições e é considerado pela maioria da população minimamente pensante o pior mandatário desde Tomé de Souza — se aproxima da linha de largada com cerca de 1/3 de aprovação (não confundir com o bom/ótimo). Traçando um paralelo com o cenário de 2014, Dilma tinha cerca de 1/3 de ótimo/bom, ou seja, metade do ruim/péssimo que o atual mandatário tem hoje. Contribuiu decisivamente para a reeleição da gerentona (com uma vantagem de 3,5 milhões de votos num eleitorado de mais de 140 milhões de potenciais votantes) uma campanha duríssima para elevar a rejeição dos adversários.

Um candidato pode se reeleger mesmo com aprovação abaixo de 50%, desde que os índices de rejeição dos concorrentes sejam maiores que o seu. Se Bolsonaro conseguir migrar uma quantidade razoável de eleitores do ruim/péssimo para o regular, a disputa poderá ser decidida voto a voto. Com 35% de aprovação (não confundir com o bom/ótimo), as chances de Bolsonaro são de 36%; se o índice crescer mais 5 pontos, as chances aumentarão para 58%; se chegar a 45%, o sociopata terá 78% de chances de continuar enterrando o Brasil.

Que Deus se apiede desta banânia e ilumine a récua de muares votantes.

WINDOWS 11 — COMO ALTERAR A VELOCIDADE DO PONTEIRO DO MOUSE

SE ACHARES TRÊS REAIS, LEVA-OS À POLÍCIA; SE ACHARES TRÊS MIL, LEVA-OS A UM BANCO.

Os PCs evoluíram muito ao longo dos anos, mas a maneira como interagimos com eles continua basicamente a mesma, a exemplo dos dispositivos de entrada. 


O mouse (dispositivo apontador) foi criado no início da segunda metade do século passado, mas só mostrou a que veio depois que interface gráfica se tornou padrão em sistemas e aplicativos. Nos smartphones e tablets — que são computadores pessoais ultraportáteis —, o dedo do usuário substitui o diligente ratinho, mas isso é outra conversa. 


Supondo que você utilize um desktop ou um notebook em paralelo com seu smartphone — até porque inúmeras tarefas “não combinam” com baixo poder de processamento e pouca RAM, além de sua execução ser mais confortável quando se dispõe de uma tela grande, um teclado físico e um mouse convencional —, talvez tenha se acostumado com a velocidade do cursor, mas o padrão estabelecido pelo sistema nem sempre é o que funciona melhor para todo mundo.


Como nas versões anteriores do Windows, tanto Painel de Controle quanto a janela das Configurações permitem fazer esse ajuste no Win11. Começando pelo fim, basta pressionar a tecla com o logo do sistema juntamente com a da letra “L”, selecionar a opção Bluetooth e dispositivos (no menu lateral à esquerda), rolar a tela para baixo até encontrar a opção Mouse, clicar nela e, em Velocidade do apontador do mouse, mover o botão da barra deslizante para a esquerda ou para a direita.

 

Repare que existem 20 níveis de velocidade, sendo “1” o mais lento e “20” o mais rápido. Por padrão, o sistema mantém o nível 10 (in medio stat virtus, como diziam os antigos romanos). Note ainda que a reconfiguração que você implementar poderá ser revertida facilmente, bastando repetir os mesmos passos.


Se preferir recorrer ao Painel de Controle (que a Microsoft deve eliminar no médio prazo, mas isso é outra conversa), clique no ícone de Buscas da Barra de tarefas e digite “velocidade do ponteiro do mouse”. Na aba “Opções do Ponteiro” da caixa de diálogo “Propriedades do Mouse”, localize a seção Movimento e arraste o botão para a esquerda ou para a direita, conforme deseje reduzir ou aumentar a velocidade do ponteiro.


Embora as dicas sejam elementares, eu achei por bem publicá-las. Na medida em que usam o celular como substituto do PC tradicional durante a maior parte do tempo, as pessoas se atrapalham quando precisam fazer ajustes básicos como estes no sistema do computador.

terça-feira, 10 de maio de 2022

A FESTA DA DEMOCRACIA


A cinco meses da “festa da democracia”, campanhas pela inclusão eleitoral visando à participação dos mais jovens no pleito de outubro resultaram num salto de 45,63%, na comparação com fevereiro, entre adolescentes de 15 a 17 anos. Mas talvez fosse mais adequado dizer “circo da democracia”, já que candidatos estapafúrdios, como José Maria Eymael, Vera Lucia, Leonardo Péricles e Luciano Bivar, entre outros, devem achar que o eleitorado é uma ospália (e não sem razão). E esse elenco de feira de horror seria ainda mais bizarro se Cabo Daciolo, Datena e Pacheco não tivessem desistido de concorrer.

Falar em democracia num país em que o voto é obrigatório para quem tem entre 18 e 70 anos de idade é uma piada. A eleição de nossos "representantes" deveria ser vista como uma ação de eleitores racionais e interessados, mas tudo se faz para conquistar o voto de indivíduos politicamente despreparados e desqualificados nesta banânia, até mesmo levar urnas até tribos indígenas perdidas nos confins da mata amazônica, para que silvícolas que sequer falam português exerçam o “sagrado direito de votar para Presidente”.

Às vésperas de completar 18 anos, minha prioridade era a carteira de habilitação. Alistamento militar e título eleitoral eram meras consequências (e não necessariamente bem vistas) da maioridade. Votei pela primeira em 1978, durante a “abertura lenta, gradual e segura” do governo Geisel — não havia então eleições para Presidente da República, e os governadores dos Estados eram indicados, e não eleitos pelo povo. 

Em 1989, votei no caçador de marajás de araque porque a alternativa era o desempregado que deu certo. Não me lembro em que votei para o Congresso, até porque desculturados políticos como eu não tinham noção da importância do Legislativo. Muita coisa mudou de lá para cá, inclusive a mentalidade dos adolescentes. Mas eu considero oportunista essa campanha maciça pela participação dos “eleitores facultativos” no pleito que se avizinha. Sobretudo porque a disputa será movida mais pelo fígado do que pela razão.

A experiência recomenda desconfiar de pesquisas eleitorais (eleitoreiras?) feitas com muita antecedência. Em 2018, todas elas cravaram a derrota de Bolsonaro no segundo turno e a eleição de Dilma para o Senado. E deu no que deu. 

Em 10 de outubro de 2108, escrevi que o fato de Bolsonaro ter obtido quase o dobro dos votos do bonifrate do presidiário no primeiro turno era sugestivo. Até então, nenhum candidato que passou para o segundo turno na dianteira da disputa presidencial deixou de se eleger. Foi assim com Lula em 2006 — ele obteve 49% dos votos válidos no primeiro turno e derrotou Alckmin no segundo por 60,3% a 39,2% — e com Dilma em 2014 — ela obteve 41,6% no primeiro turno, contra 33,6% de Aécio, e se reelegeu no segundo por 51,6% a 48,4%. Na mesma postagem, anotei que Bolsonaro jamais teria meu voto se houvesse alternativa. E votar no PT não era alternativa. Ter na Presidência um criminoso condenado e preso era um despautério, até mesmo numa republiqueta de bananas como a nossa. E mais uma vez deu no que deu.

Estamos novamente numa sinuca de bico. A terceira via se esfacelou depois que Luciano Bivar implodiu a candidatura de Sergio Moro. Mas o deputado pernambucano pode tirar o jegue da chuva. Ainda que o União Brasil tenha cerca de R$ 950 milhões para financiar as eleições e mais de R$ 250 milhões guardados de anos anteriores, Bivar tem tantas chances de se eleger presidente quanto eu de ser ungido papa. 

Observação: Entre mortos e feridos da implosão, João Doria seria o menos ruim, sobretudo com Simone Tebet na chapa, mas sua rejeição resiste até ao fato (público e notório) de que, não fosse por ele, a imunização contra a Covid só começaria na hora H do dia D.

Quem viver verá.

DE VOLTA AO SMARTPHONE E À AUTONOMIA DAS BATERIAS

O PROBLEMA NÃO É O PROBLEMA, MAS SIM A ATITUDE EM RELAÇÃO AO PROBLEMA.

Quem acompanha nosso Blog regularmente sabe que as baterias dos smartphones não estão mais sujeitas ao “efeito memória” — para quem não se lembra, as antigas baterias de níquel-cádmio tinham sua autonomia prejudicada se fossem recarregadas sem serem totalmente esgotadas —, mas muita gente não sabe que mesmo as baterias de íon-lítio têm a capacidade de armazenagem reduzida depois de um ano de uso.

Dito de outra maneira, a bateria não está viciada porque não apresenta o mesmo desempenho de quando era nova, porque demora mais para carregar ou porque descarrega mais rápido. Isso é uma característica do produto, que vai perdendo gradualmente sua capacidade com o passar do tempo e o uso normal do aparelho. 

Deixar o celular plugado na tomada a noite toda não aumenta a autonomia e ainda pode causar danos, sobretudo se o carregador for daqueles vendidos nos melhores camelódromos do ramo. Por outro lado, a maioria dos modelos fabricados nos últimos anos e respectivos acessórios são projetados para interromper o processo de recarga quando o nível da bateria atinge os 100%.

Ainda que voltagem e a amperagem dos carregadores originais sejam específicas para cada modelo de smartphone, você não terá problemas se usar um carregador emprestado quando sua bateria zera fora de casa. Aliás, o uso de um carregador rápido — que opera de forma não linear, ou seja, com a potência máxima no início do processo, visando restaurar a autonomia do aparelho no menor tempo possível, e reduzida mais adiante, dos 80% até a carga total — só provoca danos se houver alguma falha técnica na bateria ou nos componentes do carregador.  

Carregar a bateria com o celular desligado ou no modo avião agiliza a recarga — ainda que não estejam em uso, os aplicativos rodam em segundo plano e continuam consumindo energia. Você pode usar o aparelho enquanto ele está carregando, mas desde que carregador e bateria sejam originais ou homologados pelo fabricante. Mesmo assim, a recarga levará mais tempo para ser concluída, e aparelho aquecerá mais — e altas temperaturas são inimigas figadais dos smartphones.

Ao lançar o iPhone, em 2007, Steve Jobs transformou o que um telefone móvel de longo alcance em computador pessoal ultraportátil. A partir de então, a profusão de aplicativos desenvolvidos para ampliar ainda mais os recursos e funções do smartphone tornaram o aparelho mais “eclético”. A questão é que as baterias evoluíram (e continuam evoluindo) bem mais devagar. Uma bateria de 5000 mAh ou superior pode aumentar o espaço entre as recargas para dois ou três dias (a depender do perfil do usuário) e o carregamento rápido, reduzir o tempo de recarga para menos de uma hora.

Com o carregamento de 240W da Oppo, uma bateria de 4500 mAh leva três minutos e meio para carregar 50% de sua capacidade e nove minutos para atingir 100% de carga. Mas essa tecnologia ainda está na fase de testes e deve levar algum tempo para ser disponibilizada comercialmente.

segunda-feira, 9 de maio de 2022

A COREOGRAFIA DA ENPULHAÇÃO

A decisão do ministro Alexandre de Moraes de prorrogar por 60 dias o inquérito sobre violações ao monitoramento eletrônico do deputado Daniel Silveira é uma inutilidade a serviço da desmoralização do STF. Ao desprezar o uso da tornozeleira, o troglodita sapateia sobre a autoridade do ministro; ao protelar a reação, o togado transforma a ordem judicial que emitiu num fator de desmoralização de sua toga. 

Silveira descumpre também, e às escâncaras, a ordem judicial de não participar de atos políticos. Mas discursou em três atos antidemocráticos no 1º de Maio, dois no Rio, um em São Paulo. No dia seguinte — durante debate promovido pelo PTB paulista —, foi indagado sobre o adereço: “Qual tornozeleira?”, troçou o deputado, e, escorando-se em Bolsonaro: “Estou sem ela. Não existe mais nada, ainda mais depois de ter sido perdoado. [...] Presidente perdoou, acabou!

O perdão se encontra pendente de apreciação no plenário do STF, em ações relatadas pela ministra Rosa Weber. Mas o desprezo do parlamentar já produziu reações. Em petição endereçada a Moraes, a Secretaria de Administração Penitenciária do Distrito Federal pediu a devolução da tornozeleira. Recordou que o apetrecho não é gratuito. Não faz nexo pagar diárias por um equipamento desligado.

Quando o deputado se refugiou no plenário da Câmara para impedir que a PF grampeasse seu tornozelo, o ministro Alexandre determinou o bloqueio de seus bens e fixou multa diária de R$ 15 mil diários pelo tempo que durasse a desobediência: "Não só estranha e esdrúxula situação, mas também de duvidosa inteligência a opção do réu, pois o mesmo terminou por cercear sua liberdade aos limites arquitetônicos da Câmara dos Deputados, situação muito mais drástica do que àquela prevista em decisão judicial", afirmou o magistrado. Mais esdrúxula tornou-se sua situação. É como se Silveira tivesse colocado uma tornozeleira metafórica em seu algoz, cerceando-lhe a liberdade de movimentos. 

Mas o poder não aceita desaforos. E quem tem poder precisa exercê-lo na medida exata. Se exorbita, erra o alvo. Se claudica, vira o alvo. Acabou que o togado apresentou ao bolsonarista insurreto — com pelo menos 16 dias de atraso — a conta do escracho: R$ 405 mil. E mandou notificar a Câmara para proceder ao desconto da dívida no contracheque, na proporção de 25% do salário até a quitação. Resta agora ressuscitar o axioma segundo o qual ordem judicial se cumpre.

Perde seu tempo que vem acompanhando o noticiário produzido na Praça dos Três Poderes, nos últimos dias. A menos que aprecie uma coreografia desconexa, onde elefantes da República giram a redor de uma agenda fabricada por um despresidente que dá as costas para as prioridades do brasileiro. Nos penúltimos movimentos, o chefe dos togados se reuniu com o mandarim do Senado e com o ministro da Defesa. Conversaram sobre a eletrificação da democracia e o risco de crise institucional, como se não se dessem conta de que o Brasil real está em outra dimensão.

ObservaçãoApós a reunião com Fux, Pacheco disse considerar "anomalias graves" — como declarações sobre intervenção militar, fechamento do STF ou frustração de eleições — precisam ser combatidas e contestadas "a cada instante".  O jornalista e colunista Valdo Cruz escreveu no g1 que Fux decidiu buscar no Senado o apoio necessário para tentar "esfriar" e contornar a crise provocada por Bolsonaro. Após a conversa, o STF informou, em nota, que Fux e Pacheco falaram sobre o compromisso de ambos para a harmonia entre os poderes, com o devido respeito às regras constitucionais.

São três os principais tópicos da agenda que desafia a sanidade nacional: 1) A discussão sobre a segurança de urnas eletrônicas que funcionam há 26 anos sem jamais ter apresentado um mísero caso de fraude; 2) A interpretação delinquente do artigo 142 da Constituição, que faria das Forças Armadas uma espécie de Poder Moderador da República, com poderes para realizar uma apuração paralela das urnas de 2022; 3) O debate para decidir se Daniel Silveira é um cupim da colônia bolsonarista, do tipo que rói a democracia por dentro, ou se é um herói da resistência contra a tirania do Judiciário.

Numa conjuntura em que faltam dinheiro, emprego e alimentos baratos, Bolsonaro fabrica confusões para desviar as atenções da crise real. Mas a demonização do presidente tornou-se desimportante. Ainda que um mandatário oposicionista seja eleito em outubro (e o candidato à reeleição aceite o resultado das urnas), as dívidas dos brasileiros não sumirão, os empregos não aparecerão e os supermercados não remarcarão os preços para baixo apenas porque o eleito fala mal do antecessor.

Coube ao abafador de pedidos de impeachment esclarecer o sentido do balé que a politicalha de Brasília oferece ao país. "Vamos encontrar uma saída negociada para aliviar um momento de pressão e tensão", disse Lira. Depois que Bolsonaro entregou ao Centrão a alma do governo e a chave dos cofres, as ameaças de ruptura institucional tornaram-se um grande negócio para os operadores do grupo. Ou seja: os elefantes da República dançam a coreografia da empulhação.

Entrementes, em entrevista publicada como matéria de capa pela revista americana TIME, o ex-presidiário ungido à esdrúxula condição jurídica de “ex-corrupto” escalou um salto agulha bem mais alto do que recomendaria a prudência. Ao longo da conversa, oscilou entre o vexame, o desastre e a premonição. Foi vexaminoso ao falar sobre a guerra na Ucrânia. Sobre economia, foi desastroso. Soou premonitório ao desqualificar a ONU, uma organização que o afagaria dias depois. A certa altura, Lula declarou o seguinte: “A gente não discute política econômica antes de ganhar as eleições. [...] Quem tiver dúvida sobre mim olhe o que aconteceu nesse país quando eu fui presidente da República: o crescimento do mercado. [...] Ao invés de perguntar o que é que eu vou fazer, olhe o que eu fiz.” 

Nesse trecho, a manifestação foi burra, presunçosa e ofensiva. Burra porque a história ensina que, numa campanha eleitoral, uma dose de humildade não faz mal a nenhum candidato. Presunçosa porque todo mundo percebe que alguma coisa está muito errada quando um ex-presidente diz ter feito tudo sempre certo. Ofensiva por imaginar que pode reivindicar a Presidência de um país assolado por grave crise econômica sem dizer ao eleitorado o que pretende fazer com a economia.

Entre os erros cometidos durante sua gestão, o mais escandaloso foi a derrama de verbas públicas do BNDES na caixa registradora de empresas campeãs nacionais que depois se converteriam em financiadoras da corrupção. O erro mais pernicioso foi a expansão dos gastos públicos, no final do segundo mandato, para erguer um palanque vistoso, e o mais ruinoso foi a eleição de Dilma, a inolvidável saudadora da mandioca. Entre 2013 e 2016, sob a dita-cuja, a economia encolheu 6,8%, a taxa de desemprego saltou de 6,4% para 11,2%, foram ao olho da rua cerca de 12 milhões de trabalhadores, e o governo abusou das isenções e subsídios tributários. A despeito disso, os únicos empreendimentos que bombavam no país eram a corrupção e a estagnação.

Observação: Sabe-se pouquíssimo do que Lula planeja fazer se for eleito para um terceiro mandato. Ele estimula a crença de que haverá probidade e prosperidade a partir de 1º de janeiro de 2023. Foi assim, na base da empulhação, que Dilma prevaleceu em 2014. Deu no que está dando.

Ao falar sobre a guerra na Ucrânia, Lula navegou sobre um mar de obviedades para naufragar numa temeridade. Agarrado ao óbvio, flutuou ao mencionar a precariedade do populista Zelensky. Continuou flutuando ao criticar a imprudência dos Estados Unidos e da União Europeia por cutucar Putin com a OTAN para ver se ele mordia. Afundou no instante em que declarou categoricamente que o presidente ucraniano “quis a guerra”. Nesse ponto, a condenação retórica do petralha à invasão da Ucrânia ficou muito parecida com à do sociopata. Se dissesse que é “solidário” com a Rússia, ficaria idêntica. 

A caminho do fundo, Lula ainda teve tempo de desqualificar a ONU. A pretexto de defender a criação de um novo modelo de “governança mundial”, afirmou que a Organização de hoje não representa mais nada. Outra obviedade. Que, no seu caso, acabou soando também como uma declaração premonitória. Lula falou à TIME no final de março. Na semana passada, o Comitê de Direitos Humanos da organização que, segundo ele, “não representa mais nada”, deu uma paulada em Sergio Moro ao concluir, com seis anos de atraso, que o morubixaba do PT teve seus direitos políticos supostamente violados pela Lava-Jato

Quem lê a entrevista fica sem saber se o entrevistado faz campanha para si mesmo ou se virou cabo eleitoral de Bolsonaro. Julgando-se invulnerável, o “grande estadista” escalou o salto agulha como se desejasse ficar mais perto de Deus, mas só encurtou a distância que o separa do capetão.

Costuma-se dizer que o diabo mora nos detalhes, mas alguém já escreveu que é Deus quem está nos detalhes. No Brasil, além do Todo-Poderoso e do Tinhoso, a história também está nos detalhes. A história do favoritismo de Lula, por exemplo, pode ser outra se o picareta dos picaretas não começar a reparar no chão que o seu salto alto pisa. Ou ele se convence de que também está sujeito à condição humana, passando a medir as palavras, ou logo estará bem mais próximo do fiasco.

No palanque do 1º de Maio, soube-se mais adiante, Lula sapateou em cima de verbas públicas. Só o show de Daniela Mercury custou R$ 160 mil ao contribuinte paulistano — dinheiro despejado no ato político por emendas que três vereadores companheiros penduraram no Orçamento municipal. 

Bolsonaro já havia ironizado o evento estrelado pelo rival. Disse que o ato exalava um cheiro de mortadela — referência ao tempo em que esse tipo de evento era bancado pelo imposto sindical. O capitão decerto não perderá a oportunidade de realçar que o embutido das centrais agora é defumado e aromatizado dentro dos cofres públicos. Lula e seus aliados consolidam-se como principais fornecedores da matéria prima usada por Bolsonaro para reduzir a diferença que ainda o separa do líder nas pesquisas. O PT parece desprezar não só os detalhes onde mora o diabo como também a hipótese de Deus estar nos detalhes. O petismo imagina que Deus está em Lula.

Enquanto assistimos embasbacados a essa sucessão de despautérios, o autoproclamado “centro democrático” — ou “terceira via”, tanto faz — não consegue chegar ao tão desejado candidato único. Ao sepultar a pré-candidatura de Moro a pretexto de lançar a de Luciano Bivar, o União Brasil provou que, em política, a união faz a farsa. Bivar explicou que MDB e PSDBnão tiveram a mesma unidade”, daí ter optado por uma “chapa pura”, para “sermos eleitos presidente desse país.” O caso não é de hospício, mas de Procon, pois trata-se de um flagrante de propaganda enganosa.

A unidade do União Brasil é ficção. Um pedaço da sigla preferia Moro. Outra ala quer ser liberada para aderir a Bolsonaro, Lula e até Ciro — o que atrapalhar menos em cada estado. Bivar, que não tinha chances sequer de se reeleger deputado por Pernambuco, exposto na vitrine nacional ganha uma aparência de McBivar, o presidenciável sem picanha. Ou sem votos. 

Numa grande empresa, esse sujeito seria enxotado pelos acionistas; no UB, não corre riscos: embora não contenha um mísero miligrama de interesse público, sua candidatura é 100% financiada pelo contribuinte, já que seu partido abocanha a maior fatia dos fundos partidário e eleitoral, de R$ 956 milhões.

Com a implosão da terceira via, McDoria e McTebet continuarão fazendo pose de presidenciáveis. A dupla tem mais consistência do que Bivar, embora padeça da mesma carência de votos. Ou ambos reagem nas pesquisas, ou PSDB e MDB tendem a transformá-los em suco. Um suco que Lula e Bolsonaro beberão de canudinho. Triste Brasil.

Com Josias de Souza


MALWARE RUSSO PODE REGISTRAR TUDO QUE O USUÁRIO FAZ NO ANDROID

A MELHOR MANEIRA DE EVITAR CONSEQUÊNCIAS É SUPRIMIR AS CAUSAS.

Uma nova praga que afeta o Android registra tudo que o usuário faz enquanto usa o smartphone e de envia os dados para um servidor remoto. Supostamente desenvolvida por um grupo de cibercriminosos ligados ao estado russo, essa ameaça foi identificada por especialistas do Lab52, conforme comunicado divulgado no mês passado. Não está claro como ela se dissemina, mas sabe-se que finge ser um componente do sistema. Uma vez instalada, ela aparece sob a forma de um app chamado “Process Manager”, cujo ícone representa uma engrenagem. 


Quando executado pela primeira vez, o código malicioso exibe uma extensa lista de permissões, entre as quais o acesso à localização, câmera, microfone, armazenamento, contatos, registros de chamadas e mensagens de texto (SMS). Se o usuário lhas conceder, poderá ter mensagens monitoradas, ligações gravadas, fotos e vídeos copiadas, além de ser rastreado. A essa altura, a praga permanece rodando em segundo plano, mas seu ícone desaparece, e, de acordo com os pesquisadores, os dados coletados são enviados para um servidor controlado pelo Turla — grupo que foi um dos participantes do ataque à SolarWinds no final de 2020.


Uma das formas de se proteger de ameaças como essa é revisar as permissões concedidas aos aplicativos e revogar aquelas que forem muito invasivas e/ou despropositadas (lembrando sempre que não faz sentido você conceder a uma lanterna acesso irrestrito a sua lista de contatos, por exemplo). Para quem já tem o Android 12, vale também atentar para os alertas de uso da câmera e microfone, que são emitidos pelo próprio sistema.


Baixar apps apenas da Play Store não é a solução para todos os males, mas ajuda a prevenir incidentes de segurança. Fica a dica.

domingo, 8 de maio de 2022

SABEMOS A QUE PONTO CHEGAMOS; RESTA SABER ATÉ ONDE IREMOS



Antes mesmo do julgamento no STF, Bolsonaro avisou que não “assistiria calado” à condenação do deputado troglodita Daniel Silveira, deixando claro que a concessão do perdão era um ato premeditado de provocação. Questionamentos jurídicos à parte, o efeito político da afronta não se fez na habitual dimensão retórica da bravata, mas escudado numa prerrogativa constitucional para agredir o preceito maior da República. Há quem veja no gesto uma vitória política qualquer que seja o desfecho jurídico da questão, mas nada garante que a maioria da sociedade vá apoiar uma atitude com a qual o presidente se associou ao cometimento de crimes claramente apontados pelo Supremo e que dá um recado inequívoco sobre suas pretensões ditatoriais.

Todos sabemos que é e como se comporta o presidente que elegemos em 2018 para evitar a volta do lulopetismo ao poder. O que não se mostra evidente à primeira vista é a seletividade de sua ousadia: quando sente o perigo, Bolsonaro recua para simular trégua; se avalia o risco como de baixo custo com possibilidade de alto ganho, avança para o confronto, como fez ao se escudar na Constituição para derrubar uma decisão de 10 das 11 supremas togas. Ele age assim, inclusive recusando de maneira debochada o recuo sugestão do ex-presidente Michel Temer — a quem o capitão ouviu após o Sete de Setembro — porque só se interessa pelo próprio destino. A República que se dane.

Se recuou depois dos discursos golpistas do feriado da Independência, Bolsonaro o fez por saber que as togas estavam dispostas a endossar um pedido de impeachment, tornando difícil a inação protetora do réus que preside a Câmara, o que daria ao requerimento um peso diferente em relação aos mais de 140 aos quais Arthur Lira dedicava — e ainda dedica — a mais completa indiferença. Passados sete meses e faltando menos de cinco para as eleições, porém a conjuntura é outra.

Além de não comportar condições objetivas para processo de impedimento, a maior parte do Congresso está dominada pela entrega do manejo do Orçamento da União aos parlamentares do Centrão, hoje ampliado e majoritário. Bolsonaro deixou isso muito claro quando explicou a seus interlocutores nas internas no Palácio que um dos fatores para a concessão da “graça” foi a certeza de que o Legislativo “não teria força para reagir”. Força teria se houvesse vontade, mas na ausência desta prevalece a fragilidade conveniente evidenciada pela via da omissão. 

Sem a sombra da mais ínfima dúvida, o presidente da República é o principal responsável pelo ambiente de confrontação institucional que se caracteriza pelo desequilíbrio entre os três poderes, seja por ações ou omissões lastreadas no excesso. Mas a alta ansiedade que assola o país tem razões que, além do Executivo, o Legislativo e o Judiciário não poderiam desconhecer pela própria razão de suas atribuições.

Há disputa onde a Constituição manda que impere a equivalência das potências de cada um sob o rito da harmonia. A necessidade de respostas firmes do Judiciário e a conveniência da cautela do Legislativo não justificam o embarque na onda do presidente sem o devido senso tático sobre os efeitos dessa ou daquela atitude. O STF clama por respeito e reclama de ser desrespeitado — e com razão, mas nem sempre contribui para se dar ao respeito.

Diferentemente do Legislativo e do Executivo, o Judiciário deve (ou deveria) ser o menos falante fora dos limites dos autos, até pelo seu poder de dar a última palavra. A despeito dos méritos do embate que trava sozinho na defesa do estado de direito, as togas têm se deixado atrair por aquilo que o ministro Barroso chamou recentemente de “fogueira das paixões políticas” para apontar um desvio institucional que muitas vezes a corte tem cometido, dando combustível ao confronto. Isso expõe o caráter autoritário do governo, mas chega a lugar nenhum — ou, por outra, senta praça no centro do terreno do conflito, quando seu papel é o de promover o entendimento conforme o imperativo da lei.

O desmonte da Lava-Jato, a revisão de condenações anteriormente confirmadas por três instâncias, ministros absolutamente parciais anulando decisões por alegada ausência de imparcialidade, nada disso ajuda o STF a atrair a confiança da sociedade. Pior, alimenta a desconfiança. Reagir, sim, é preciso, mas é imprescindível ter frieza e consciência sobre o papel de cada um, sob pena de cair numa dinâmica de extrapolações mútuas, cujo produto é a instituição de um cenário de incivilidade geral com resultados nefastos ao bom andamento dos trabalhos democráticos.

Voltando a Silveira, enquanto abre as portas de cinco comissões permanentes — entre as quais a de Constituição e Justiça — ao vassalo do mandatário, a Câmara mantém fechada (há nove meses) a entrada no Conselho de Ética (como nossos conspícuos parlamentares conhecessem o significado da palavra “ética”) de um pedido de abertura de processo contra o deputado troglodita por quebra do decoro parlamentar — um exemplo da trajetória decadente (por ação e/ou omissão) a que o Congresso tem se imposto ultimamente.

Curiosamente, quanto mais concentra poder com o manejo total do Orçamento da União e o controle dos recursos para financiamento de campanhas, menos prestígio o Parlamento parece interessado em conquistar. Qual a necessidade de prestar esse tipo de homenagem a um deputado flagrantemente indecoroso e que está no centro de um indevido embate entre os Poderes? Nenhuma, a não ser surfar na onda de Bolsonaro, no intuito de “dar uma resposta ao STF”. Esse tipo de reação seria boba não fosse, sobretudo, nefasta ao mandamento constitucional de equilíbrio e harmonia entre os Poderes da República. Um papel lamentável da Câmara ao qual se associa o Senado por fingir que não tem nada com isso, embora tenha, sim. E muito.

Na teoria das fotos e poses, os Poderes Legislativo e Judiciário exercitaram nos últimos dias a harmonia exigida pela Constituição. Na prática, porém, a teoria é outra. Nas conversas desta semana faltou a participação do Executivo. O ministro da Defesa dialoga com os presidentes do STF e do Congresso. Mas ele não representa a Presidência, nem menos as Forças Armadas são um Poder constituído. Mau sinal quando se pretende que o general substitua o presidente nas cenas de entendimento, que a ausência do Executivo signifique recusa ao diálogo direto, tenha partido de uma parte ou de outra.

Uma falta de respeito que se materializa em ações concretas. Da parte do Judiciário quando extrapola os limites dos autos e faz política dando margem a suspeições sobre a função do julgador, e da parte do Legislativo quando ignora as decisões judiciais. Dois exemplos: a indiferença à ordem de prestação de informações sobre o Orçamento Secreto e a omissão às repetidas violações à lei e ao decoro cometidas pelo deputado Daniel Silveira. Harmonia é prática sem a qual a foto não passa de cenografia.

Com Dora Kramer