Quando o Judiciário
voltar do recesso, em fevereiro, o ministro Gilmar Mendes será substituído
na presidência do TSE pelo colega Luís Roberto Barroso. Até lá,
como plantonista da Corte, ele pode decidir monocraticamente sobre assuntos
urgentes, mesmo fora de sua relatoria. E assim o fez dias atrás, ao conceder habeas corpus a Anthony Garotinho, cujo pedido estava
sob a responsabilidade do ministro Jorge
Mussi. Em seu despacho, o ministro-deus alegou que, solto, o
ex-governador do Rio ― que já havia sido preso, solto, depois preso novamente,
no mês passado, e fazia greve de fome contra a perseguição de que afirma ser alvo
― não ameaça a ordem pública, e que não há fato algum que comprove a
possibilidade de ele atrapalhar a tramitação da ação penal.
A decisão da encarnação tupiniquim de Themis (*) não chega a surpreender. No
início deste mês, Mendes mandou soltar novamente Jacob Barata Filho ―
a quem já havia concedido habeas corpus por duas vezes, derrubando
decisões do juiz Marcelo Bretas (mais detalhes neste vídeo). Tanto nesse caso
quanto no de Eike Batista ― solto em abril ―, o divino foi duramente criticado por não se
dar por impedido. Por que deveria? Porque, foi padrinho de casamento da filha de
Barata com um sobrinho de sua mulher ― dona Guiomar Mendes, que trabalha no escritório de
advocacia que defende o empresário, que é sócio de um cunhado [de Mendes] numa empresa de ônibus.
Para qualquer pessoa minimamente esclarecida, isso seria motivo mais que suficiente para o magistrado se dar por impedido de atuar no caso. Mas Mendes entendeu que o juiz deve se afastar quando é “amigo íntimo” das partes, e essa qualificação não contempla padrinhos de casamento.
Quanto a Eike Batista, o empresário bilionário tão admirado por Lula e Dilma, o ministro não se deu por impedido porque não viu nada de mais no fato de o escritório de advocacia Sergio Bermudes, onde trabalha sua mulher, ter como cliente... Eike Batista
Para qualquer pessoa minimamente esclarecida, isso seria motivo mais que suficiente para o magistrado se dar por impedido de atuar no caso. Mas Mendes entendeu que o juiz deve se afastar quando é “amigo íntimo” das partes, e essa qualificação não contempla padrinhos de casamento.
Quanto a Eike Batista, o empresário bilionário tão admirado por Lula e Dilma, o ministro não se deu por impedido porque não viu nada de mais no fato de o escritório de advocacia Sergio Bermudes, onde trabalha sua mulher, ter como cliente... Eike Batista
Dois meses atrás, a “fotografia
ambulante do subdesenvolvimento brasileiro, mais um na multidão de altas
autoridades que constroem todos os dias o fracasso do país”, revogou
liminarmente a transferência de Sérgio
Cabral para um presídio de segurança máxima. solicitada pelo MPF depois que o ex-governador fez comentários sobre a atividade
empresarial da família do juiz Bretas. Nesta semana, ele abriu as celas de Adriana Anselmo e de Marco Antonio de Luca (respectivamente
mulher e provedor de propinas de Sérgio
Cabral), suspendeu um inquérito por suspeita de corrupção que corria no STJ contra Beto Richa e mandou para o arquivo denúncias criminais contra o
senador Benedito de Lira e os
deputados Arthur Lira, Eduardo da Fonte e José Guimarães. Paralelamente, em duas ações por descumprimento de
preceito fundamental (ajuizadas pelo PT
e pela OAB), o divino suspendeu
liminarmente o uso da condução coercitiva para levar investigados a
interrogatório.
Observação: As decisões que beneficiaram Adriana e Richa foram
monocráticas; as demais foram tomadas por uma magra maioria de dois votos (de Mendes e Toffoli) a um (de Fachin),
já que Lewandowski e o decano Celso de Mello não apareceram para
votar ― quiçá por terem ficado retidos em algum Shopping de Brasília ou Miami; afinal, o Natal está aí! De duas uma: ou o MP e as instâncias inferiores do Judiciário fazem um péssimo
trabalho, ou a 2ª Turma do STF,
autoconvertida numa espécie de Lapônia,
resolveu provar aos encrencados da República que Papai Noel existe.
A prisão preventiva
é um instrumento processual previsto Código de Processo Penal, e pode ser usada (por autoridade
policial, pelo Ministério Público ou por um juiz) antes da condenação do réu em
ação penal ou criminal, mas desde que atenda alguns pressupostos legais ― (1) garantir a ordem pública e econômica; (2) garantir a conveniência da instrução penal; (3) assegurar a aplicação da lei penal ―, para que não configure cumprimento antecipado de
uma pena à qual o réu nem sequer foi condenado.
Tecnicamente, a concessão habeas corpus a Garotinho
foi respaldada na letra fria da lei, mas nem por isso deixou de ser um tapa na
cara de cariocas, fluminenses e brasileiros em geral, pois
dá aos cidadãos de bem, que não aguentam mais tanta corrupção, a sensação de
que a impunidade ainda campeia solta, malgrado os esforços da Lava-Jato, da PF, do MPF e de parte do
Judiciário. Mas não pretendo discutir esse mérito ― não neste momento ― nem questionar a postura garantista do ministro Gilmar
ou sua cruzada contra o Estado punitivista. A ideia é expor os fatos para que o leitor observe cuidadosamente
quem foi alvo da “bondade” de Mendes
e de seus acólitos no STF ― leia-se Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e, eventualmente, Marco Aurélio Mello (que compartilha o
sobrenome com o primeiro presidente impichado da nova república, que é seu
primo e foi quem o conduziu a nossa mais alta Corte).
Coincidência ou não, as recentes decisões de Gilmar Mendes― chamado pela IstoÉ de “o unânime”, por conta
de sua atuação desagradar tanto a esquerda como a direita ― foram
proferidas dias depois de a revista
Veja publicar quase dez páginas sobre seu envolvimento com Joesley Batista. Através de imagens de
câmeras de segurança, a reportagem mostra um encontro de Mendes e Joesley no Instituto Brasiliense de Direito Público,
do qual o ministro é sócio (com o filho Francisco
Schertel Mendes), e cuja principal fonte de renda é o patrocínio (média de R$ 20 milhões por ano; entre 2008 e
2016, segundo registros oficiais, o ministro recebeu R$ 7,5 milhões a título de distribuição de lucros).
Em agosto passado, depois que Mendes soltou 9 presos da Lava-Jato em uma única semana, Veja publicou uma matéria de capa com a
chamada “O juiz que discorda do Brasil”, e definiu o superministro como o “principal obstáculo do Judiciário na luta que o país vem travando
contra a corrupção. Não sem motivo, como se vê. Tanto é que um dos
abaixo-assinados que circula na Web propondo o impeachment de Mendes já conta com mais
de 1,5 milhão de assinaturas.
A julgar pelo perfil do ministro, que mostra inigualável isenção no julgamento de todas as causas que chegam até ele, não causaria estranheza se seu impeachment caísse no seu colo e ele se decidisse a julgá-lo. Afinal, o que é que tem? Qual o problema?
A julgar pelo perfil do ministro, que mostra inigualável isenção no julgamento de todas as causas que chegam até ele, não causaria estranheza se seu impeachment caísse no seu colo e ele se decidisse a julgá-lo. Afinal, o que é que tem? Qual o problema?
Clique no vídeo abaixo para
assistir ao mais recente bate-boca entre os ministros Mendes e Barroso:
(*) Thémis
(Θέμις), na mitologia grega, era a
deusa-guardiã dos juramentos e dos homens da lei, embora esse papel coubesse
também a Dice (Δίκη), que, na mitologia romana,
correspondia a Iustitia, que
personificava a Justiça.
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