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domingo, 3 de setembro de 2017

EM RESUMO, ISSO É BRASIL


Michel Temer faz sua segunda viagem à China desde que assumiu a presidência. Bem que poderia ficar por lá, mas, não. Ele deve voltar a tempo das comemorações do Dia de Independência e de receber a segunda flechada de Rodrigo Janot, agora por obstrução da Justiça e associação criminosa. A expectativa era de que haveria três denúncias distintas, mas, a duas semanas de deixar o cargo, o procurador-geral tem pressa.

A primeira denúncia, por corrupção passiva, foi sepultada a poder de conchavos espúrios com as marafonas da Câmara, mas como não houve pagamento integral do michê, alguns congressistas venais, insatisfeitos com sua insolência, podem mudar de lado nesta segunda votação ― não por louváveis razões de caráter republicano, naturalmente; se fosse esse o caso, a primeira denúncia teria seguido adiante, pois foi embasada em gravações de áudio e vídeo de arrepiar. Mas estamos no Brasil, e as coisas nem sempre são o que parecem ser, nem produzem os efeitos que deveriam produzir. Haja vista a decisão do TSE (por 4 votos a 3) de não cassar a chapa Dilma-Temer, no julgamento do século que descambou para espetáculo de circo mambembe, onde Gilmar Mendes ensinou que a contundência das provas varia conforme o grau de amizade entre o presidente da Corte e o acusado.

A arrogância e a soberba desse “ministro supremo” são notórias. Dias atrás, ele mandou soltar o chefe da máfia do transporte público do Rio de Janeiro, cuja prisão havia sido decretada pelo juiz Marcelo Bretas ― que tornou a mandar prender o investigado e foi novamente desautorizado pela encarnação togada do deus Hórus. Em mais uma imperdível lição, Mendes nos ensinou que o cachorro é que abana o rabo, e não o rabo que abana o cachorro.

A declaração ofensiva, vulgar e imprópria de um juiz da Suprema Corte foi repudiada pela sociedade em geral e pelos magistrados em particular. Mas ela nada tem de atípica, uma vez que falta de comedimento do ministro boquirroto nas relações com seus pares e juízes subalternos na hierarquia do Judiciário também é pública e notória.

Para qualquer pessoa minimamente racional, o fato de o ministro ter sido padrinho de casamento da filha de Jacob Barata Filho com um sobrinho de sua mulher, Guiomar Mendes, que trabalha no escritório de advocacia que defende Barata, que é sócio de um cunhado de Mendes numa empresa de ônibus, seria motivo mais que suficiente para o magistrado se dar por impedido de atuar no caso. Mas não o “todo-poderoso”, para quem o juiz deve se afastar do caso quando é “amigo íntimo” das partes, e essa qualificação não contempla padrinhos de casamento.

O procurador-geral arguiu o impedimento e pediu suspeição de Mendes nos casos relacionados a Barata; a ministra Cármen Lúcia pediu que o divino se manifeste, após o que, como Presidente do STF, ela pode decidir monocraticamente, submeter à questão ao plenário ou deixar a decisão por conta da 2ª Turma ― composta por Celso de Melo, Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli e Edson Fachin, além do próprio Gilmar Mendes.

Parte dos ministros entende que, como o impedimento foi arguido em um pedido de habeas corpus e a competência para análise desse recurso é da Turma, o plenário não poderia invadir esse espaço ― e, claro, as possibilidades de Mendes ser derrotado seriam menores do que no plenário. Já o regimento interno prevê que as arguições de impedimento ou suspeição sejam analisadas pelo plenário do Supremo, mas, nos últimos 10 anos, todos os 80 pedidos semelhantes foram rejeitados monocraticamente pelo presidente da Corte.

A ministra Cármen Lúcia avalia que levar o caso para julgamento pelos ministros pode deixar o Supremo “exposto”, mas sabe da necessidade de dar um desfecho para a situação. Há integrantes da Corte que tentar costurar uma saída honrosa para o ministro, sugerindo que o colega se declare suspeito no caso Barata Filho.

A conferir.

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quarta-feira, 28 de junho de 2017

VOCÊ CONHECE SEU PC? ― Parte II

POBRE, QUANDO METE A MÃO NO BOLSO, SÓ TIRA OS CINCO DEDOS.

Foram milhares de anos até o computador evoluir do ÁBACO ― criado há mais de 3.000 anos no antigo Egito ― para a PASCALINA ― geringonça desenvolvida no século XVII pelo matemático francês Blaise Pascal e aprimorada mais adiante pelo alemão Gottfried Leibniz, que lhe adicionou a capacidade de somar e dividir. Mas o “processamento de dados” só viria com o Tear de Jacquard ― primeira máquina programável ―, que serviu de base para Charles Babbage projetar um dispositivo mecânico capaz de computar e imprimir tabelas científicas, precursor do tabulador estatístico de Herman Hollerith, cuja empresa viria se tornar a gigante IBM.

Nos anos 1930, Claude Shannon aperfeiçoou o Analisador Diferencial (dispositivo de computação movido a manivelas) mediante a instalação de circuitos elétricos baseados na lógica binária, e alemão Konrad Zuze criou o Z1 (primeiro computador binário digital). Com a deflagração da Segunda Guerra Mundial, a necessidade de decifrar mensagens codificadas e calcular trajetórias de mísseis levou os EUA, a Alemanha e a Inglaterra a investir no desenvolvimento do Mark 1, do Z3 e do Colossus, e, mais adiante, com o apoio do exército norte-americano, pesquisadores da Universidade da Pensilvânia construírem o ENIAC ― um monstrengo de 18 mil válvulas e 30 toneladas que produziu um enorme blecaute ao ser ligado, em 1946, e era capaz somente de realizar 5 mil somas, 357 multiplicações ou 38 divisões simultâneas por segundo ― uma performance incrível para a época, mas que qualquer videogame dos anos 90 já superava “com um pé nas costas”. Para piorar, de dois em dois minutos uma válvula queimava, e como a máquina só possuía memória interna suficiente para manipular dados envolvidos na tarefa em execução, qualquer modificação exigia que os programadores corressem de um lado para outro da sala, desligando e religando centenas de fios.

EDVAC, criado no final dos anos 1940, já dispunha de memória, processador e dispositivos de entrada e saída de dados, e seu sucessor, o UNIVAC, usava fita magnética em vez de cartões perfurados, mas foi o transistor que revolucionou a indústria dos computadores, quando seu custo de produção foi barateado pelo uso do silício como matéria prima. No final dos anos 1950, a IBM lançou os primeiros computadores totalmente transistorizados (IBM 1401 e 7094) e mais adiante a TEXAS INSTRUMENTS revolucionou o mundo da tecnologia com os circuitos integrados (compostos por conjuntos de transistores, resistores e capacitores), usados com total sucesso no IBM 360, lançado em 1964). No início dos anos 70, a INTEL desenvolveu uma tecnologia capaz de agrupar vários CIs numa única peça, dando origem aos microchips, e daí à criação de equipamentos de pequeno porte foi um passo. Vieram então o ALTAIR 8800, vendido sob a forma de kit, o PET 2001, lançado em 1976 e tido como o primeiro microcomputador pessoal, e os Apple I e II (este último já com unidade de disco flexível).

O sucesso estrondoso da Apple despertou o interesse da IBM no filão dos microcomputadores, levando-a a lançar seu PC (sigla de “personal computer”), cuja arquitetura aberta e a adoção do MS-DOS, da Microsoft, se tornaram um padrão de mercado. De olho no desenvolvimento de uma interface gráfica com sistema de janelas, caixas de seleção, fontes e suporte ao uso do mouse ― tecnologia de que a XEROX dispunha desde a década de 70, conquanto só tivesse interesse em computadores de grande porte ―, a empresa de Steve Jobs fez a lição de casa e incorporou esses conceitos inovadores num microcomputador revolucionário. Aliás, quando Microsoft lançou o Windows ― que inicialmente era uma interface gráfica que rodava no DOS ― a Apple já estava anos-luz à frente.

Para encurtar a história, a IBM preferiu lançar seu PS/2, de arquitetura fechada e proprietária, a utilizar então revolucionário processador 80386 da INTEL, mas Compaq convenceu os fabricantes a continuar utilizando a arquitetura aberta. Paralelamente, o estrondoso sucesso do Windows 3.1 contribuiu para liquidar de vez a parceria Microsoft/IBM, conquanto ambas as empresas buscassem desenvolver, cada qual à sua maneira, um sistema que rompesse as limitações do DOS. Depois de uma disputa tumultuada entre o OS/2 WARP e o Windows 95 (já não mais uma simples interface gráfica, mas um sistema operacional autônomo, ou quase isso), a estrela de Bill Gates brilhou, e o festejado Win98 sacramentou a Microsoft como a “Gigante do Software”.

O resto é história recente: a arquitetura aberta se tornou padrão de mercado, o Windows se firmou como sistema operacional em todo o mundo (a despeito da evolução das distribuições LINUX e da preferência de uma seleta confraria de nerds pelos produtos da Apple) e a evolução tecnológica favoreceu o surgimento de dispositivos de hardware cada vez mais poderosos, propiciando a criação de softwares cada vez mais exigentes.

Enfim, foram necessários milênios para passarmos do ábaco aos primeiros mainframes, mas poucas décadas, a partir de então, para que "pessoas comuns" tivessem acesso aos assim chamados computadores pessoais ― ou microcomputadores ―, que até não muito tempo atrás custavam caríssimo e não passavam de meros substitutos da máquina de escrever, calcular, e, por que não dizer, do baralho de cartas e dos então incipientes consoles de videogame. Em pouco mais de três décadas, a evolução tecnológica permitiu que os desktops e laptops das primeiras safras diminuíssem de tamanho e de preço, crescessem astronomicamente em poder de processamento, recursos e funções, e se transformassem nos smartphones e tablets atuais, sem os quais, perguntamo-nos, como conseguimos viver durante tanto tempo.

Continuamos no próximo capítulo. Até lá.

SOBRE MICHEL TEMER, O PRIMEIRO PRESIDENTE DENUNCIADO NO EXERCÍCIO DO CARGO EM TODA A HISTÓRIA DO BRASIL.

Michel Temer já foi de tudo um pouco nos últimos tempos. De deputado federal a vice na chapa da anta vermelha; de presidente do PMDB (por quinze anos) a presidente da Banânia; de depositário da nossa esperança de tornar a ver o país crescer a “chefe da quadrilha mais perigosa do Brasil”; e de tudo isso a primeiro presidente do Brasil a ser denunciado no exercício do cargo.

Joesley Batista, o megamoedor de carne que multiplicou seu patrimônio com o beneplácito da parelha de ex-presidentes petistas ― que sempre valorizaram meliantes como Eike Batista e o próprio Joesley (é curiosa a coincidência no sobrenome, mas acho que não passa disso) ―, promoveu Temer ao lugar que, por direito, pertence a Lula, e a este atribuiu “somente” a institucionalização da corrupção na política tupiniquim.

Há quem afirme que a promoção de Temer foi inoportuna e despropositada. Afinal, não foi ele quem sequestrou e depenou o Brasil durante 13 anos, ou roubou o BNDES e passou uma década enfiando bilhões de dólares na Friboi ― que acabou se tornando a gigante J&F, controladora da maior processadora de proteína animal do planeta. Tampouco foi ele quem torturou São José Dirceu para forçá-lo a reger na Petrobras o maior assalto da história do ocidente, recebeu uma cobertura tríplex no Guarujá da OAS de Leo Pinheiro e, ao ser pego com as calças na mão e manchas de batom na cueca, atribuiu a culpa à esposa Marisa, digo, Marcela).

Gozações à parte, as opiniões divergem quanto à delação de Joesley e companhia. Há quem ache que a contrapartida dada pelo MPF e avalizada por Fachin foi exagerada (a despeito da multa bilionária que os delatores terão de pagar, que representa a punição mais “dolorosa” para gente dessa catadura). Outros, como certo ministro do Supremo e presidente do TSE, reprovam o acordo por serem sistematicamente contrários à Lava-Jato e às delações premiadas, às prisões preventivas prolongadas (sem as quais a Lava-Jato nem existiria, ou, se existisse, ainda estaria engatinhando). Felizmente, 7 dos 11 ministros do STF já se votaram pela manutenção de Fachin na relatoria dos processos oriundos da delação da JBS e pela validade da delação propriamente dita (assunto que eu detalhei na semana passada).

O fato é que o peemedebista se apequena mais a cada dia, o que não ajuda em nada o país, como bem sabem os que acompanharam os estertores dos governos Sarney e Collor e de Dilma. Com novas denúncias e acusações surgindo regularmente, o presidente está acossado, fragilizado politicamente e, por que não dizer, mais preocupado com articulações políticas visando à sua defesa do que com a aprovação das tão necessárias reformas que se predispôs a capitanear.

Na última segunda-feira, Temer juntou ao seu invejável currículo a experiência inédita de ser denunciado por corrupção ainda no exercício do cargo (até hoje, nenhum presidente brasileiro havia sido agraciado com tal honraria, embora quase todos tenham feito por merecê-la). E novas denúncias virão em breve, até porque Janot resolveu não pôr todos os ovos na mesma cesta. Como a denúncia passa pela CCJ da Câmara e pelo plenário da casa antes de ser julgada no STF, o Planalto moverá mundos e fundos para barrar o processo, de modo que o fatiamento serve para a PGR ganhar tempo, visando à possibilidade de novos fatos mudarem os ventos no Congresso. A meu ver, bastaria que a voz das ruas voltasse a roncar como roncou no ano passado, durante o impeachment de Dilma, para que a sorte do presidente fosse selada, mas quem sou eu, primo?

Talvez seja mesmo melhor a gente ficar com diabo que já conhece. Nenhuma liderança expressiva surgiu no cenário até agora, e a perspectiva de Rodrigo Maia assumir o comando do País não é das mais alvissareiras. Demais disso, eleições diretas, neste momento, contrariam flagrantemente a legislação vigente, e interessariam apenas a Lula e ao PT, que se balizam na tese do "quanto pior melhor".  

O molusco indigesto continua encabeçando as pesquisas de intenção de voto, mesmo atolado em processos e prestes a receber sua primeira (de muitas) condenações (veja detalhes na postagem anterior). Mas não se pode perder de vista que isso se deve em grande parte ao fato de ele ser o mais conhecido entre os pesquisados, e que isso lhe assegura também o maior índice de rejeição. Enfim, muita água ainda vai rolar por debaixo da ponte até outubro do ano que vem. Se as previsões se confirmarem, Moro deve condenar o sacripanta dentro de mais alguns dias, e uma possível confirmação da sentença pelo TRF-4 jogará a esperada pá de cal nessa versão petista de conto do vigário.

Infelizmente, deixamos escapar a chance de abraçar o parlamentarismo no plebiscito de 1993 (graças à absoluta falta de esclarecimento do eleitorado tupiniquim), e agora só nos resta lidar com a quase impossibilidade de defenestrar um presidente da República, mesmo que ele já não tenha a menor serventia ou que esteja envolvido em práticas pouco republicanas (haja vista os traumatizantes impeachments de Collor e de Dilma). 

Estão em andamento algumas tentativas de tapar o sol com peneira, como a PEC do Senador Antonio Carlos Valadares (PSB/SE), aprovada no último dia 21 pela CCJ do Senado, que inclui na Constituição a possibilidade revogação do mandato do presidente, vinculada à assinatura de não menos que 10% dos eleitores que votaram no último pleito (colhidas em pelo menos 14 estados e não menos de 5% em cada um deles).

De acordo com o texto aprovado, a proposta será apreciada pela Câmara e pelo Senado, sucessiva e separadamente, e precisará do voto favorável da maioria absoluta dos membros de cada uma das Casas. Garantida a aprovação, será então convocado referendo popular para ratificar ou rejeitar a medida. O projeto prevê ainda que será vedada a proposta de revogação durante o primeiro e o último ano de governo e a apreciação de mais de uma proposta de revogação por mandato.

Por hoje é só, pessoal. Até a próxima.

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