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sexta-feira, 23 de agosto de 2024

BURACOS DE MINHOCA ATRAVESSÁVEIS (CONTINUAÇÃO)

MELHOR UM FIM HORROROSO AINDA DO QUE UM HORROR SEM FIM.

No filme Superman, o protagonista volta ao passado voando no sentido oposto ao da rotação da Terra a uma velocidade superior à da luz. Em tese, isso poderia funcionar no mundo real, mas na prática a teoria é outra.

Nada com matéria pode se mover mais rápido que a luz no vácuo (299.792.458 m/s), lembrando que os fótons são partículas sem massa e sem peso. Mas ir além da velocidade da luz talvez não baste para voltarmos ao passado, já que, em nível macroscópico, a seta do tempo aponta sempre para o futuro. Mas isso não quer dizer que jamais poderemos assistir ao desembarque de Cabral e sua trupe em Pindorama, por exemplo.

Buracos de minhoca são distorções no espaço-tempo causadas por objetos supermassivos. Acredita-se que eles possam funcionar como atalhos cósmicos, encurtando a distância entre dois pontos, neste ou em outro universo, no presente ou em outro momento da linha do tempo.

Observação: Para entender isso melhor, imagine uma folha de papel com um X na margem superior um Y na inferior. Se a folha for dobrada ao meio, os pontos X e Y podem ser trespassados por um alfinete. Assim, um buraco de minhoca permitiria ir de um ponto a outro no espaço-tempo em questão de segundos, mesmo que, numa linha reta, a distância entre eles fosse de milhares de anos-luz.

Ao contrário dos buracos negros, que já foram avistados e fotografados, os buracos de minhoca ainda são uma projeção teórica. Mas Carl Sagan ensinou que "ausência de evidência não é necessariamente evidência de ausência", e vários cientistas — incluindo o descobridor do sistema heliocêntrico, o pai da desinfecção, o criador da imunoterapia e o proponente da deriva continental — foram alvo de chacota até o tempo provar que eles estavam certos. 

CONTINUA DEPOIS DA POLÍTICA 

Escorado numa decisão do STF, o presidente Lula disse que o avanço do Congresso Nacional sobre o Orçamento da União é "uma loucura" — e com razão, já que as emendas parlamentares representarem quase 24% do bolo orçamentário. Igualmente fora de esquadro foi a demora do Lula presidente em constatar o que o Lula candidato externou ao apontar o absurdo da sistemática no manejo daqueles recursos. Na época, o palanque ambulante prometeu dar um jeito na desordem mediante tratativas com o Parlamento, mas em um ano e meio de governo fez vista grossa à continuidade da metodologia repaginada do orçamento secreto vetado pelo STF em 2022.

A desvantagem na correlação de forças entre Executivo e Legislativo explica a atitude do xamã petista, mas a justifica num político tido, havido e autoproclamado ás no exercício do convencimento e o mais experiente dos governantes desde Tomé de Souza.

A impressão que se tem é de que o presidente tem medo de um Parlamento diante do qual suas celebradas qualidades de articulador são insuficientes. E ele não é o único a pisar em ovos. Em recente entrevista, o presidente do TCU, Bruno Dantas, qualificou os abusos como um "descuido" do Congresso (o que não se justifica, pois ali há distração, o foco é total nos interesses de suas excelências).

O uso do Supremo como muro de arrimo ocorreu também no caso da desoneração das folhas de pagamento, quando o Planalto se escorou em liminar do ministro Cristiano Zanin para obter um trunfo na mesa de negociações com os congressistas. 

A corte também procura amenizar os efeitos de suas decisões, defendendo negociação em torno da exigência de nitidez no trato das emendas. É de se perguntar como poderia o conceito de transparência abrigar o sentido de meio-termo.

 
Um novo estudo sugere que uma compreensão mais aprimorada da gravidade pode comprovar a existência desses "túneis cósmicos", mas daí a usá-los para cortar caminho vai uma longa distância (sem trocadilho). Mesmo que a força gravitacional do horizonte de eventos do buraco negro que hospeda o buraco de minhoca não fechasse a passagem antes que qualquer objeto conseguisse transpô-la, a radiação Hawking certamente causaria sua destruição.
 
Num artigo baseado teoria da gravidade híbrida  que permite maior flexibilidade nas relações entre matéria/energia e espaço/tempo  o físico João Luís Rosa sustentou a possibilidade de criar um buraco de minhoca estável e atravessável usando 
algum tipo de matéria exótica. Segundo ele, a energia negativa da matéria escura poderia estabilizar o túnel pelo tempo suficiente para a travessia, mas o problema é que a existência de matéria exótica no universo ainda é mera suposição.

Ocorre que a matemática usada para teorizar os buraco de minhoca é baseada na Relatividade Geral, que não é compatível com a física quântica — o que não quer dizer que as equações de Einstein estejam erradas, mas que alguma coisa está faltando —, e a suposta existência de matéria exótica é limitada à escala quântica. 

Ainda assim, o cosmólogo lusitano acredita que os efeitos gravitacionais necessários para garantir a atravessabilidade do atalho cósmico aconteçam naturalmente com a modificação da gravidade, dispensando as propriedades gravitacionais repulsivas da matéria exótica. "Modifique a gravidade e você poderá viajar com segurança por um buraco de minhoca para o que quer que esteja do outro lado", ele afirmou em entrevista ao site UFO

Ainda segundo Rosa, a teoria da gravidade modificada será comprovada pelo estudo das estrelas próximas de Sagitário A* — buraco negro supermassivo com cerca de 35 milhões de quilômetros de diâmetro que foi descoberto em 1974 no centro da Via Láctea

Como disse Einstein, "o impossível só é impossível até que alguém duvide e prove o contrário".

domingo, 3 de março de 2024

ESTE É UM PAÍS QUE VAI PRA FRENTE


Uma filosófica anedota sobre a criação do mundo e as versões romanceadas do descobrimento, da Independência e da República explicam por que o eterno "país do futuro" (que nunca chega) se tornou uma republiqueta de bananas.

Pindorama virou colônia em 1500, Reino Unido a Portugal e Algarves em 1815, Império em 1822 e República em1889 (dos Estados Unidos do Brasil até 1967 e Federativa do Brasil a partir de então). Ao longo de 134 anos, 38 presidentes foram alçados ao cargo via voto popular, eleição indireta, linha sucessória e golpe de Estado. Nos últimos 98, apenas Dutra, Juscelino, Lula e FHC concluíram seus mandatos. Bolsonaro foi (até nisso) um ponto fora da curva.

Uma vez confirmada sua derrota nas urnas, o Messias que não miracula se encastelou no Alvorada e lá ficou até a antevéspera da coroação de D. Lula III, quando então desabalou para Orlando (EUA) e se homiziou na cueca do Pateta por 89 dias, enquanto aguardava o desenrolar dos acontecimentos urdidos aqui por seus comparsas golpistas. 

Bolsonaro entrou para a história como o pior mandatário desde Tomé de Souza e o único, desde a redemocratização, que sobreviveu ao mandato, tentou a reeleição e não conseguiu. Se não tivesse conspirado 24/7 contra a democracia, se associado à Covid, rosnado para o Congresso e o Supremo e se amancebado com Fabrício QueirozCarla ZambelliFernando Collor, milicianos e que tais, talvez seu sucessor continuasse gozando férias compulsórias na carceragem da PF em Curitiba.
 
Ninguém é mais responsável do que Bolsonaro pela merda que o Brasil virou nos últimos anos (não que antes fosse muito melhor). E o pior é que, por mal dos nossos pecados, esse circo de horrores não acabou: nem bem vestiu a faixa presidencial, Lula começou a trabalhar pelo retorno do bolsonarismo

Lula e Bolsonaro se merecem, mas os brasileiros de bem não merecem nenhum dos dois.

terça-feira, 6 de fevereiro de 2024

UMA PIADA CHAMADA BRASIL

 

O Brasil, também conhecido como "o país do futuro que tem um longo passado pela frente', é uma piada desde os tempos de Cabral. Despida do glamour fantasioso atribuído pelos historiadores, a Proclamação da República foi o primeiro de dezenas de golpes de Estado político-militares — como a revolução de 1930, a implantação do Estado Novo, a deposição de Getúlio e o golpe de 1964, entre outros. 

Dos trinta e tantos brasileiros que ascenderam à Presidência via voto popular, eleição indireta, linha sucessória ou golpe de Estado nos últimos 134 anos, oito foram apeados do cargo, começando pelo protagonista do golpe que substituiu a monarquia constitucional parlamentarista do Império pelo presidencialismo republicano e se tornou o primeiro presidente do Brasil. Temeroso de ser deposto pelos adversários, Deodoro da Fonseca vetou a Lei do Impeachment. Quando o veto foi derrubado, simplesmente dissolveu o Congresso, como se o país ainda estivesse no Império e ele, Deodoro, fosse o imperador.
 
Da redemocratização até os dias atuais já tivemos um presidente eleito indiretamente que morreu sem receber a faixa
, um literato meia-boca, um pseudo caçador de marajás, um baianeiro namorador, um tucano de plumas vistosas (por dois mandatos) um desempregado que deu certo (por dois mandatos) um poste fantasiado de "gerentona" (por um mandato e meio) um vampiro escalafobético (por meio mandato) um mix de militar ruim e parlamentar pior (por intermináveis 4 anos) e — ói nóis aqui traveiz —  o ex-presidiário mais famoso de Pindorama desde o genro de Caminha, que foi conduzido por togas supremas da carceragem da PF para o gabinete presidencial no DF. 
 
Incapaz de aprender com os próprios erros, o inigualável eleitorado tupiniquim tende a repeti-los eleição após eleição. Ao que tudo indica, teremos neste ano mais um pleito plebiscitário, com postulantes à prefeitura de quase 5.600 municípios apadrinhados por Bolsonaro ou por Lula — parece até coisa de Superman x Lex Luthor ou de Coringa x Batman. E ainda dizem que Deus é brasileiro!
 
Nossos políticos se elegem para roubar e roubam para se reeleger. A fé no Executivo se perdeu antes mesmo de renúncia de Jânio pavimentar o caminho para o golpe de 1964 e os subsequentes anos de chumbo. A chama da esperança foi avivada pelos movimentos pró-diretas, bruxuleou com a rejeição da emenda Dante de Oliveira, voltou a brilhar com eleição indireta de 1985 e foi sepultada com o corpo do primeiro presidente civil da "Nova República" 
 que, a exemplo da Viúva Porcina no folhetim global Roque Santeiro, foi sem nunca ter sidoEm 1989, a vitória de Collor sobre Lula pareceu ser uma luz no fim do túnel. Mas logo se percebeu que o Rei-Sol era tão demagogo e populista quanto adversário derrotado. E o resto é história recente. 

Promovido de vice a titular graças ao impeachment do primeiro presidente eleito pelo voto direto desde 1960, Itamar Franco — que conquistou seus 15 minutos de fama ao ser fotografado com a modelo sem calcinha Lilian Ramos — nomeou Fernando Henrique ministro da Fazenda. Nas pegadas do sucesso do Plano Real, o autoproclamado primeiro-ministro informal derrotou Lula em 1994. Picado pela mosca azul, FHC comprou a PEC da Reeleição e tornou a derrotar Lula em 1998 (também no primeiro turno). Mas já não lhe restavam coelhos na cartola.

Em 2002, Lula foi eleito presidenteA reboque de sua vitória, vieram o Mensalão, o Petrolão e a indicação de oito ministros para o STF. As decisões teratológicas dos togados fulminaram a confiança que os brasileiros haviam depositado no Judiciário quando perceberam que nada de bom viria do Executivo e do Legislativo. Em 2012, o país assistiu estarrecido — mas esperançoso — à condenação da alta cúpula do Mensalão; em 2016, comemorou o impeachment da "gerentona de festim". Na sequência, os avanços da Lava-Jato refrearam em alguma medida e por algum tempo o apetite pantagruélico da politicalha corrupta pelo dinheiro dos contribuintes. Mas não há nada como o tempo para passar.
 
A morte é anterior a si mesma. Ela começa antes da abertura da cova e percorre um lento processo. A Lava-Jato morreu sem colher os devidos louros. Foi graças a ela que, pela primeira vez desde a chegada das caravelas, poderosos da oligarquia política e econômica do Brasil foram investigados, processados e condenados. Seu
 velório reuniu gente importante. Seguravam a alça do caixão Jair Bolsonaro, o Centrão e o PT. O STF enviou uma sequência de coroas de flores enquanto preparava a última pá de cal. Que não demorou a chegar. Ironicamente, o sepultamento se deu sob a égide do presidente que, quando candidato, prometeu pegar em lanças contra a corrupção e os corruptos. Mas vamos por partes.
 
Em 2018, era imperativo impedir
 a volta do lulopetismo corrupto — que se estendeu por 13 anos 4 meses e 12 dias e "terminou" com o afastamento da gerentona de araque. Dada a possibilidade de o país vir a ser governado pelo bonifrate do então presidiário mais famoso do Brasil, a minoria pensante do eleitorado teria votado no próprio Capiroto. Com essa opção não estava disponível nas urnas, o jeito foi apoiar o "mito" da direita radical. Como se costuma dizer, situações desesperadoras requerem medidas desesperadas. 

Somada a uma inusitada conjunção de fatores, o antipetismo ensejou a vitória uma combinação mal ajambrada de ex-militar tosco, truculento e de viés terrorista e parlamentar medíocre (em quase três décadas no baixo-clero da Camara, o dito cujo aprovou míseros dois projetos e obteve míseros 4 votos quando disputou a presidência da Casa, em 2017. E deu no que deu: Bolsonaro se revelou o pior mandatário desde Tomé de Souza, e só não foi expelido do cargo porque contava com a subserviência de um antiprocurador-geral — comprada com a promessa jamais cumprida de uma cadeira no STF) e de um presidente da Câmara conivente  graças ao abjeto orçamento secreto.
 
Observação: O lulopetismo corrupto foi o agente catalizador que levou ao poder o patriarca do clã das rachadinhas e das mansões milionárias, mas foi sua abominável gestão que libertou da catacumba o xamã da petralhada. Se o verdugo do Planalto não conspirasse diuturnamente contra a democracia, não se associasse ao coronavírus, não investisse contra a imprensa, o Congresso e o STF e não andasse de mãos dadas com QueirozZambelli, milicianos, Collor et caterva, talvez o 
pontifex maximus da seita do inferno ainda estivesse gozando férias compulsórias na carceragem da PF em Curitiba.  
 
Com ensinou o Conselheiro Acácio (personagem do romance O Primo Basílio, do escritor português Eça de Queiroz), as consequências vêm sempre depois. E não há nada como o tempo para passar. Em 2022, o fiasco da folclórica "terceira via" levou a mesma minoria pensante que ajudou a eleger o "imbrochável imorrível incomível" em 2018 a apoiar o demiurgo de Garanhuns (alguns até levaram fé na falaciosa frente ampla pró-democracia, mas isso é outra conversa). E deu no que está dando.
 
Reconduzido ao trono com a menor diferença de votos entre candidatos à Presidência no segundo turno desde a redemocratização, o morubixaba petista age como se tivesse sido eleito para o cargo de Deus. Sem se dar conta de que já não esbanja carisma como em 2010, quando se ufanava de ser capaz de eleger até poste, parece confundir o Planalto com o Olimpo da mitologia grega. Livrarmo-nos de Bolsonaro era imperativo, mas a volta de Lula et caterva foi um preço alto a pagar.
 
Não era de esperar que o ex-presidiário multirréu descondenado por togas camaradas cumprisse suas promessas de campanha. Noves fora a de "não descansar enquanto não foder Sergio Moro", naturalmente. E agora a oportunidade lhe bate à porta: o TRE-PR adiou o julgamento do pedido de cassação do ainda senador sob o pretexto de que, para o caso ser analisado, é preciso que o quórum esteja completo. Detalhe: cabe a Lula escolher um dos três nomes homologados pelo Tribunal para a vaga aberta no último dia 27 com a saída de Thiago Paiva dos Santos, representante da classe dos juristas. Mas isso também é outra conversa.
 
No debate promovido pela Band em outubro de 2022, por exemplo, Lula trombeteou que "nomear amigo e companheiro para o Supremo é retrocesso" (referindo-se a Nunes Marques e André Mendonça, indicados por Bolsonaro para as vagas de Celso de Mello e Marco Aurélio). Eleito, indicou o amigo e advogado particular Cristiano Zanin para o lugar de Rosa Weber e Flávio Dino para o de Ricardo Lewandowski, convocou o ex-togado para substituir Dino no comando do ministério da Justiça, e ainda teve o desplante de negar sua relação de amizade com Zanin — que esteve em seu casamento com Janja e a quem chamou de "amigo" em entrevista à BandNews FM.
 
O indicador de corrupção da Transparência Internacional apontou que o Brasil perdeu pontos na luta contra a corrupção sob Bolsonaro e continua descendo a ladeira sob Lula. Com 36 pontos numa escala de 0 a 100, o país despencou da 94ª para a 104ª posição entre os 180 avaliados, ficando atrás da Argentina, da Guiana e da Colômbia, abaixo da média global (43 pontos) e muito abaixo da média entre os membros da OCDE (66 pontos). 
 
A ONG registra que marcos legais e institucionais anticorrupção que demoraram décadas para ser construídos ruíram em poucos anos. Que a indicação de Zanin para o STF foi "contrária à autonomia do Judiciário", e que a de Dino teve "perfil político" para um tribunal já excessivamente politizado. Que a não observância da lista tríplice do MPF na indicação de Paulo Gonet para a PGR evidencia que Lula optou por adotar o mesmo método de escolha política usado por Bolsonaro, cujos efeitos desastrosos ainda são sentidos no país. Que o afrouxamento da Lei das Estatais contou com a cumplicidade do Judiciário — foi uma liminar de Lewandowski que suspendeu os efeitos da lei —, e que houve pressões do governo federal e do Congresso para viabilizar indicações políticas (vale lembrar que o foco das investigações da Lava-Jato foi justamente a corrupção na Petrobras). 

O relatório aponta ainda que Lula herdou de Bolsonaro um Centrão mais poderoso e famélico por recursos do Erário (via "fundão eleitoral", emendas parlamentares etc.), e que, quando o STF ter decretou a inconstitucionalidade do "orçamento secreto", Executivo e Legislativo se uniram para preservar o mecanismo espúrio de barganha e os velhos vícios do esquema da gestão anterior. Que o CNJ rejeitou uma resolução para regulamentar a participação de juízes em eventos privados, palestras e atividades acadêmicas, e o Supremo considerou inconstitucional a regra que ampliava as restrições à atuação de juízes em processos de clientes de escritórios de advocacia onde seus familiares trabalham. 
 
Como desgraça pouca é bobagem, o ministro Edson Fachin driblou o regimento da Corte para entregar o "caso Vaza-Jato" diretamente ao colega Dias Toffoli, que não só anulou todas as provas obtidas com o acordo de leniência da Odebrecht (em todas as esferas e para todas as ações) e suspendeu o pagamento de R$ 3,8 bilhões (valor que chegaria a R$ 8,5 bilhões ao final dos 23 anos previstos para o parcelamento). Em sua decisão, o magistrado anotou que, diante das informações obtidas até o momento no âmbito da Operação Spoofing, teria havido conluio entre o então juiz Sergio Moro e procuradores da Lava-Jato em Curitiba para a "elaboração de cenário jurídico-processual-investigativo que conduzisse os investigados à adoção de medidas que melhor conviesse a tais órgãos, e não à defesa em si". 
 
Observação: A alegação de que o processo foi maculado pela falta de acordos de colaboração internacional não se sustenta, quando mais não seja porque as planilhas de propina, extratos bancários, e-mails e registros de retirada de dinheiro foram fornecidos voluntariamente pela Odebrecht. A empresa alegou que fechou o acordo sob coerção, mas não pediu sua anulação — para não perder benefícios como a permissão para voltar a disputar obras públicas e receber empréstimos de bancos estatais, além da garantia de que não seriam mais processadas pelos crimes já confessados. 
 
A liminar do Maquiavel de Marília colocou a Odebrecht no melhor dos mundos, pois ela não terá de pagar mais nada e não perderá os benefícios recebidos. Quem deixa de ser compensado por anos de corrupção bilionária — que nem a empreiteira nem o nobre ministro negaram ter existido — são o Estado e o contribuinte brasileiro. Para piorar, a fila de empresas que querem se livrar de multas bilionárias vem crescendo, já que podem contar com Toffoli e sua noção sui generis de proteção do Estado de Direito.
 
Triste Brasil. 

EM TEMPO: Toffoli determinou que a Transparência Internacional seja investigada por supostamente se apropriar indevidamente de recursos públicos na época da Lava-Jato. A decisão se deu no âmbito de uma notícia-crime apresentada pelo deputado federal petista Rui Falcão, que questiona a cooperação firmada entre o MPF e a organização nos anos da força-tarefa. O ministro diz tratar-se de uma instituição privada, "alienígena" e "com sede em Berlim" que teria recebido valores que, na verdade, deveriam ter sido destinados ao Tesouro Nacional, como previsto pelas normas legais do país. Para surpresa de ninguém, procuradores envolvidos nas tratativas também devem ser alvo dos procedimentos. Em nota pública, a ONG classificou como falsas as informações e afirmou que o memorando que estabeleceu a cooperação expirou em 2019, e que "tais alegações já foram desmentidas diversas vezes pela própria Transparência Internacional e por autoridades brasileiras, inclusive pelo MPF, mas, apesar disso, tais fake news vêm sendo utilizadas há quase cinco anos em graves e crescentes campanhas de difamação e assédio à organização". Fica nítida em mais essa decisão a intenção do Maquiavel de Marília de se reaproximar de Lula. Quousque tandem, Cunha, abutere patientia nostra?

quinta-feira, 11 de janeiro de 2024

O 8 DE JANEIRO E A POLARIZAÇÃO

A palavra "bíblia do grego "biblion", que significa "livro" ou "conjunto de livros designa uma coleção de histórias fictícias que judeus, cristãos e sectários de outras religiões acreditam ser a "Palavra de Deus". Mas não há, pelo menos até onde eu sei, nenhuma certidão passada em cartório do Céu que dê fé a essa aleivosia.  E Caim pode ter assassinado o irmão devido a uma divergência de opiniões — e não movido por ciúme ou inveja, como afirma o Gênesis. Nesse caso, o primeiro fratricídio da história da Humanidade seria o antepassado mais remoto da "polarização político-ideológica" que tanto mal tem feito a esta banânia nos últimos anos.
 
A dicotomia desembarcou em Pindorama com Pedro Álvares Cabral e sua trupe e teve presença garantida em todos os capítulos da nossa história, mas o quadro se se agravou depois que o lulopetismo plantou a semente do "nós contra eles", a rivalidade entre mortadelas e coxinhas regou quando e o bolsonarismo boçal estrumou e espalhou do Oiapoque ao Chuí. Desde então, o ex-presidiário mais famoso do Brasil e o "mito" dos mentecaptos vêm se esmerando numa repugnante desumanização mútua e se esmerdeando ao estendê-la aos apoiadores dos respectivos rivais. 

Ao final de seu segundo mandato, o xamã petista trombeteou que as eleições de 2010 seriam do nós contra eles, acirrando os eleitores de esquerda contra os de direta. Quando já havia escolhido Dilma para manter aquecida a poltrona presidencial até que ele pudesse voltar a ocupá-la, falou em "extirpar" o DEM (atual União Brasil) da política tupiniquim. Na campanha pela reeleição da gerentona de araque, retomou o vomitativo ramerrão do nós contra eles ao rebater as críticas que sua pupila incompetente vinha colecionando. Em 2016, depois que a dita-cuja foi defenestrada do Planalto, afirmou que "quando os jovens rejeitam a política, a direita raivosa cresce". Enquanto isso, o PT classificava o governo de Michel Temer de "golpista" e "de direita". 
 
Em 2018, quando os desembargadores do TRF-4 aumentaram para 12 anos e 1 mês a pena imposta ao camelô de empreiteiras no caso do tríplex, a estrelinha vermelha Gleisi Hoffmann — que o departamento de propinas da Odebrecht alcunhou de 
"Coxa" e "Amante" — vaticinou que "para prender Lula seria preciso matar muita gente". Mas o tempo provou que ela era uma péssima pitonisa: o ex-presidente gozou 580 dias de férias compulsórias na carceragem da PF em Curitiba, mas acabou que togas camaradas anularam os processos sob o pretexto de que a 13º Vara Federal de Curitiba não tinha competência territorial para julgar o réu. 
 
Durante a pré-campanha de 2022, o palanque ambulante desdenhou dos antigos adversários: "Agora quem acabou foi o PSDB". Em resposta, os tucanos disseram que o PT passou anos tentando reescrever a história, semeando o ódio, perseguindo adversários, dividindo a sociedade e montando uma usina de fake news. Mais recentemente
Bolsonaro lamentou a depredação dos prédios públicos de 8 de janeiro, mas disse que os atos foram uma armadilha da esquerda e não configuram tentativa de golpe. Lula disse lamentar que um presidente sem controle emocional, desmoralizado pela quantidade de mentiras contadas durante toda a campanha, inventasse uma coisa como aquela, e que o mais vergonhoso foi "ele ter inventado e fugido, não ter tido coragem de participar".
 
Segundo o cientista político Pedro Marques, há três tipos de polarização. Na ideológica, as pessoas divergem sobre programas políticos; na
 social, as diferenças sócio-econômicas causam a divisão; na afetiva, até mesmo a imagem e o som da voz de quem integra o time adversário provocam reações viscerais. É fácil reconhecer essa lista de sintomas nesta banânia, que teve um momento semelhante de polarização na última gestão Vargas, quando situação e oposição não dialogavam, não se reconheciam nem autorizavam a existência uma da outra. 

Observação: Em 1954, o suposto suicídio" do déspota adiou uma explosão, mas não evitou que a polarização continuasse crescendo até desaguar no golpe de 1964 — que Bolsonaro tentou reprisar em 2022, e só não conseguiu porque faltou o apoio das Forças Armadas. 

Nada de bom pode resultar de um cenário onde desavenças e violência política continuam crescendo. Um passo necessário (embora não suficiente) para recolocar o Brasil nos eixos é drenar a intolerância do discurso político. Quando — e se — isso vai acontecer, só Deus e o diabo sabem.
 
Continua...

sábado, 11 de novembro de 2023

QUEM FOI QUE INVENTOU O BRASIL... (FINAL)

 
Reconheça-se o esforço federal no reforço da vigilância nos portos, aeroportos e fronteiras terrestres para inibir a entrada e o trânsito de drogas no país. Providências são bem-vindas, embora na atual conjuntura sejam insuficientes e, por isso, cercadas de desconfiança sobre sua eficácia. 
Com a decretação da Garantia de Lei e da Ordem, o governo simula a existência de uma política para enfrentar a crise de uma segurança pública em colapso. Quem sofre os efeitos no cotidiano, contudo, não tem obrigação de fingir que acredita. O convívio com o Estado desorganizado frente ao crime organizado não permite a benevolência. 
A GLO é uma ação temporária já tentada em moldes diversos e com o mesmo recurso às Forças Armadas duas dezenas de vezes nos últimos 30 anos. De lá para cá, a situação só piorou. E muito. Aos territórios dominados pelo tráfico acrescentaram-se os controlados pelas milícias, notadamente no Rio de Janeiro, onde o poder público foi cooptado pelo crime e infiltrado na política, na polícia e na Justiça. 
A condição é de "metástase", na definição precisa de Raul Jungmann, que viu a coisa de perto quando ocupou tanto a pasta da Segurança Pública quanto o Ministério da Defesa, e essa metástase se espalha pelo país de tal forma que já se configura em emergência nacional a ameaçar a higidez do Estado de Direito. Mas nisso as autoridades não tocam, preferindo fechar os olhos à necessidade de limpeza. 
Os discursos em defesa da democracia feitos pelos representantes dos Poderes não terão credibilidade nem efetividade enquanto na ala dos representados houver cidadãos reféns do terror. A circunstância fere a soberania estatal e subverte a ordem institucional. Não dá mais para suportar.

***

Séculos antes de Leif içar suas velas (vide capítulo anterior), circulavam no Velho Mundo lendas envolvendo grandes terras desconhecidas do outro lado do Atlântico. Na obra Bibliotheca Historica, escrita no século I a.C., o romano Diodorus Siculus conta que o capitão fenício Himilcon singrou o "Oceano Ocidental" por volta de 500 a.C. e chegou a uma "grande terra, fértil e de clima delicioso", e que descoberta foi mantida em segredo para evitar que outros povos explorassem o lugar.
 
Rumores de que um misterioso país do ocidente era uma espécie de paraíso terreno, imagem do Éden descrito na Bíblia, começaram a circular no início da Idade Média. Entre os celtas da Irlanda, a terra encantada ganhou o nome de Hy Brazil — lembrando que o nome dado posteriormente a Pindorama deriva do termo fenício "barzil" — que significava "ferro" — ou do celta "bress" — raiz da palavra inglesa bless, que significa abençoar —, nada tendo a ver, portanto, com a madeira "da cor da brasa" que abundava no litoral do Nordeste e de cuja casca os portugueses extraíam a tinta vermelha usada para tingir as vestes mais luxuosas de Lisboa.
 
Um descobridor alternativo das Américas pode ter sido um religioso celta em busca do paraíso terrestre: A Navegação de São Brandão, escrita na Irlanda por volta do ano 900, conta a história de um monge irlandês que em 556 teria partido pelas águas do Atlântico em um currach (pequeno barco de madeira, coberto de peles e usado por pescadores). Reza a lenda que São Brandão, com uma pequena tripulação de monges-marinheiros, encontrou a fabulosa terra de Hy Brazil, "cheia de bosques e grandes rios recheados de peixes", e voltou à Irlanda para contar a história.
 
Inobstante a existência de provas irrefutáveis de que fenícios ou celtas tenham estado no Novo Mundo, as chances são consideráveis. A corrente Sul-Equatorial (a mesma que pode ter trazido os chineses ao Brasil) seria o caminho mais provável para exploradores antigos, que, inclusive, dispunham de navios capazes de carregar mais mantimentos que as naus e caravelas portuguesas. Considerando que eles navegaram pela costa da África até o século IV a.C., se um de seus barcos que tivesse entrado por acaso na corrente Sul-Equatorial seria levado diretamente para as praias de Pernambuco. E o mesmo caminho pode ter sido seguido por celtas, romanos e árabes. 
 
Em Historia General de las Indias e de las Tierras del Mar Oceano, escrito em 1535, o espanhol Gonçalo Fernandes de Oviedo assim descreve o espírito de sua época: "E Deus quis que o Novo Mundo fosse descoberto pelos reis cristãos e seus vassalos, e que eles aceitassem alegremente o trabalho de converter e conquistar os idólatras. Bendito seja o Senhor!". Eram tempos em que os espanhóis invadiam e dominavam as terras descobertas por Colombo "para maior Glória de Deus", e foram os próprios conquistadores que começaram a transformar sua aventura em história: Oviedo, um fidalgo que veio às Américas para colonizar, foi o primeiro "cronista de Índias" da coroa espanhola — ou seja, o historiador oficial encarregado de justificar e glorificar a conquista. A "descoberta" foi descrita como uma vontade divina, e os índios, como infiéis sem civilização que, a exemplo dos negros africanos, deviam se converter ou virar escravos.
 
Cronistas da época também esculpiram a versão de que nenhum outro "povo civilizado" alcançara o Novo Mundo antes dos ibéricos — já que o dono é quem chegou primeiro, e a ele cabe o direito de ficar rico com isso. O mesmo raciocínio foi adotado dois séculos depois pelos colonizadores ingleses da Austrália: embora a ilha já tivesse sido avistada pelos portugueses em 1522 e pelos holandeses em 1614 — e talvez pelos chineses bem antes disso, até porque, de todos os possíveis descobridores da Oceania, só eles vestiam "longas túnicas", como os misteriosos visitantes das lendas aborígenes e maoris —, o "descobridor oficial" foi o britânico James Cook, que tomou posse da terra em nome da Coroa inglesa(vide capítulos anteriores).
 
No Brasil, a transformação do apagado Cabral em herói só ocorreu no século XIX. Até então, livros de história mal falavam nele. Em Portugal, também era pouco lembrado: a casa que pertencera a sua família, em Santarém, ficou abandonada por séculos e chegou a virar um prostíbulo. Colombo também permaneceu nas sombras por séculos — e só foi reabilitado em 1866, quando americanos de origem latina criaram o Columbus Day, visando destacar seu na colonização da América numa época em que imigrantes latinos eram desprezados pela elite anglo-saxã. Com o tempo, a celebração da "descoberta" foi exportada para a América Central e do Sul pelos "vencedores" europeus, brancos e cristãos. 
 
Observação: Se a história tivesse sido escrita pelos perdedores, esses relatos certamente adquiririam um tom apocalíptico. No México e no Peru, sacerdotes indígenas decretavam que seus deuses nativos estavam mortos e anunciavam o fim da civilização. O que os "descobertos" pensavam sobre a tal Idade dos Descobrimentos pode ser resumido por um único verso de um poema escrito no México na aurora do Novo Mundo: "Oh meus filhos, em que tempos detestáveis vocês foram nascer!"
 
Discutir se os primeiros a chegar no Novo Mundo eram chineses, nórdicos ou os espanhóis guarda um certo equívoco histórico. Até porque as Américas já haviam sido descobertas pelo menos 15 mil anos antes, e a Oceania, cerca de 46 mil! Quando os ancestrais dos portugueses ainda viviam na Pré-História, os primeiros ancestrais daqueles que os ingleses batizaram de aborígenes chegaram à Oceania caminhando por terra entre as ilhas do Pacífico e o litoral da Ásia. Em 1999, o arqueólogo brasileiro Walter Neves examinou um crânio feminino encontrado em Minas Gerais e descobriu feições aborígenes. O fóssil foi batizado de Luzia e data de 12 mil anos atrás. 
 
Os tataravôs de Luzia devem ter chegado à América vindos do Sudeste Asiático. Já os ancestrais dos nossos tupiniquins, dos astecas mexicanos e dos apaches dos EUA só começaram a povoar o Novo Mundo no século X a. C., vindos da Sibéria pelo Estreito de Bering. Como o interior da América do Norte estava congelado naquela época, os "prototupis" navegaram até a América Central e, a partir de lá, desbravaram o interior, chegando até os confins da Terra do Fogo. 
 
Em face do exposto, o Brasil e as Américas foram descobertos várias vezes ao longo dos séculos.
 
Com Superinteressante