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segunda-feira, 31 de janeiro de 2022

VERGONHA NACIONAL


Na política não há inocentes, só culpados. E isso vale também para o eleitorado, uma vez que maus políticos não brotam em seus gabinetes por geração espontânea. 

Vale relembrar a velha anedota segundo a qual o Senhor das Esferas, acusado de protecionismo durante a criação do Mundo por favorecer a porção de terra que futuramente tocaria ao Brasil, assim se pronunciou: "esperem para ver o povinho de merda que eu vou botar lá." Dito e feito.

Churchill dizia que a "democracia é a pior forma de governo, à exceção de todas as outras". Mas que "o melhor argumento contra a democracia é cinco minutos de conversa com um eleitor mediano. Já o general Figueiredo (que era um sábio e não sabia) disse certa vez que "um povo que não sabe sequer escovar os dentes não está preparado para votar".

A nefasta dicotomia político-ideológica semeada por Lula et caterva, regada pelos tucanos e estrumada pelo bafo do capetão e seus soldadinhos de chumbo alastrou-se país afora, alcançando, inclusive, as cúpulas dos Poderes. Foi por isso que a parcela pensante do eleitorado apoiou o bolsonarismo boçal em 2018, já que a alternativa era a volta do lulopetismo corrupto. E deu no que deu.

Três anos sob os desmandos de um anormal não foram suficientes para a récua de muares munidos de título de eleitor aprender a lição. A julgar pelas pesquisas, teremos novamente eleições plebiscitárias neste ano, e seremos obrigados — mais uma vez — a apoiar quem não queremos para evitar a vitória de quem queremos menos ainda. 

Resta-nos a esperança de o imprevisto ter voto decisivo na assembleia dos acontecimentos, fazendo com que um dos dois “salvadores da pátria” saia de cena. Mas isso é apenas um exercício de futurologia baseado não em fatos, mas na esperança que acalentamos de um futuro melhor.

Desgraçadamente, falta ao Congresso probidade e vergonha na cara. Mas o que esperar de uma instituição composta em grande parte por investigados, denunciados e réus — e os insignes parlamentares que não se enquadram numa dessas categorias certamente viriam a se enquadrar se a alta cúpula do Judiciário não estivesse tomada por defensores atávicos da impunidade? Volto a dizer que quando se dá a chave do galinheiro a uma raposa e ela encarrega outras raposas de investigar o sumiço das galinhas... enfim, acho que deu para entender.

Nossas leis são criadas por políticos que se elegem para roubar, roubam para se reeleger e se escudam no abjeto foro especial por prerrogativa de função. Esqueça a história de que “todos são iguais perante a lei”. Sempre houve, há e continuará havendo “os mais iguais que os outros”. 

Presidente e vice, ministros de Estado, senadores e deputados federais só podem ser processados e julgados no STF, e os eminentes togados são rápidos como guepardos quando se trata de conceder habeas corpus a seus bandidos de estimação, aumentar os próprios salários e conceder a si próprios toda sorte de mordomias, mas lerdos como cágados pernetas na hora de julgar ex-presidentes corruptos e sanguessugas aboletados no parlamento.

Fala-se muito da politização do Supremo, mas os ministros só agem quando são provocados. E são os próprios congressistas, descontentes com essa ou aquela situação, que pedem a interferência dos magistrados em assuntos que caberia ao parlamento decidir. Foi assim com a instalação da CPI do Genocídio, que só seguiu adiante depois que uma liminar do ministro Luís Roberto Barroso pôs fim à fleuma (também chamada de “mineirice”) do presidente do Senado. E esse é só um exemplo.

Não quero dizer com isso o STF não erra. Erra, e muito, até porque os ministros são seres humanos (alguns se julga semideuses, mas isso é outra história). Em dezembro de 1914, em aparte à um discurso do senador Pinheiro Machado, Ruy Barbosa disse que o Supremo pode se dar ao luxo de errar por último. Décadas depois, Nelson Hungria, príncipe dos penalistas brasileiros, fez eco ao “Águia de Haia” dizendo que o STF tem “o supremo privilégio de errar por último”.

Todos os poderes da República são guardas da Constituição. A Administração pode se considerar isenta de cumprir lei inconstitucional, mas jamais estará isenta de cumprir decisões do STF. A menos, é claro, que se mude esse entendimento constitucional.

Não há democracia que funcione sem “toma-lá-dá-cá” se mais de 30 partidos disputam fatias de poder e verbas do Erário. E o apetite dessa escumalha é pantagruélico. Haja vista o valor absurdo que foi estabelecido para o “fundão” eleitoral  dinheiro que é roubado de nós para ajudar a eleger quem vai nos roubar na próxima legislaturaE fodam-se os 14 milhões de desempregados, os não sei quando milhões de brasileiros que não têm dinheiro sequer para uma refeição decente por dia. E assim por diante.

Gastar bilhões para eleger essa caterva quando falta dinheiro para investir em segurança, saúde e educação, por exemplo, é um escárnio. E a divisão desse butim é feita levando em conta, entre outros fatores, os votos para Câmara e Senado recebidos pelos partidos na eleição anterior. Em 2018, o “fundão” foi de cerca de R$ 2 bilhões — pouco mais de um terço do valor estabelecido para as eleições de 2022. 

É muita demagogia qualquer um chegar aqui e dizer que nós não vamos ter um fundo eleitoral público para financiamento das campanhas”, disse o tal deputado-réu que preside a Câmara. “Hoje a única maneira que temos para evitar que tráfico, milícias e contraventores financiem e façam a má-gestão da política é com um financiamento público, claro e transparente.”

Continua...

quinta-feira, 30 de novembro de 2023

CADA VEZ MELHOR...


Três ministros do STF elogiaram as indicações feitas por Lula, mas deputados e senadores da oposição não pouparam críticas. Caso o nome de Dino venha a ser confirmado, sete dos 11 ministros serão indicações de petistas. Vale lembrar que, durante a campanha, Lula disse que “mexer na Suprema Corte para colocar amigo é um retrocesso. Quanto à indicação de Gonet à PGR, além de atender aos interesses do morubixaba, ela agrada também ao STF e parte do MPF. Tanto Gonet quanto Dino precisam ter seus nomes aprovados pelo Senado. O Planalto esbanja otimismo, mas no caso de Dino a rejeição tende a ser maior.

Churchill disse que não há melhor argumento contra a democracia do que cinco minutos de conversa com um eleitor mediano; Figueiredo, que um povo que não sabe escovar os dentes não está preparado para votar; Saramago, que a cegueira é uma questão particular entre as pessoas e os olhos com que nasceram; Ferreira Gullar elogiou a ascensão de um operário à presidência, mas lembrou que Fernandinho Beira-Mar também veio do "seio do povo"; e Karl Marx ensinou que "a história sempre se repete como tragédia ou farsa". No Brasil dos nossos dias, porém, está cada vez mais difícil saber o que é tragédia e o que é farsa. 

Lula é tido e havido como um "animal político", mas Arnaldo Jabor o definiu como um "fenômeno religioso", "de fé" — como as igrejas que caem e matam fiéis, e os que sobram continuam acreditando. Com um povo analfabeto e manipulável e emparedando instituições democráticas e poderes moderadores, o petista criou uma igreja para seu partido dirigir. E eleger o "anticristo", em 2018, só piorou o que já era bastante ruim.

O ato em memória de Cleriston Pereira da Cunha — convocado para o último domingo por Silas Malafaia e apoiado por Jair Bolsonaro e seus miquinhos amestrados  foi o cinismo levado às fronteiras do paroxismo. Os hipócritas agem como se não tivessem nada a ver com o peixe, mas o espelho revela o olhar cínico e deslavado da culpa. 


Os principais jornais falaram "alguns milhares" de manifestantes, mas a adesão ficou ficou muito aquém da esperada — o que não desanimou o ex-ministro bolsonarista Ricardo Salles e sua trupe de contestar (mais uma vez) o resultado das urnas e incitar o confronto com o Supremo, como se o capítulo eleitoral de 2022 não tivesse terminado. 


Em decisão proferida na véspera do dia nacional, o ministro Dias Toffoli (indicado por Lula para o STF em retribuição aos bons serviços prestados ao PT) declarou imprestáveis as provas oriundas dos acordos de leniência da Odebrecht e, de quebra, perorou que a prisão de seu benfeitor foi "o verdadeiro ovo da serpente dos ataques à democracia, um dos maiores erros judiciários da história do país".  A decisão foi criticada por diversas associações de advogados e dos Juízes Federais. No dia seguinte, o Instituto Não Aceito Corrupção afirmou que a linguagem foi "exageradamente politizada" e fugiu à "técnica imparcial" que deveria ser aplicada numa decisão do STF.

Observação: Tanto o Executivo quanto o Legislativo e o Judiciário merecem todo o respeito como instituições. mas o mesmo não se aplica aos presidentes dos Poderes, parlamentares e magistrados. Respeito não se impõe, conquista-se, e agentes públicos que não se dão ao respeito não podem exigi-lo daqueles a quem eles deveriam servir.

Em meio às rusgas entre o STF e o Congressoos senadores aprovaram a toque de caixa uma PEC de conteúdo anódino. Eliminados os excessos e os retrocessos, a sobra mais relevante foi o bloqueio liminares monocráticas contra decisões do presidente da República e leis do Congresso. É improvável que a proposta seja chancelada pela Câmara  a reação dos ministros deve estimular Arthur Lira, que é cliente de caderneta das liminares protetivas do STF, a enfiá-la no gavetão dos assuntos pendentes (que ele costuma abrir conforme sua conveniência).

Os togados exageraram em sua reação à PEC. Sob refletores, o mais enfático foi Gilmar Mendes, que chamou a proposta de "cadáver outrora enterrado", criticou "investidas desmedidas e inconstitucionais" do Legislativo" e disse que a Corte não é composta por covardes e que "os autores dessa empreitada" são "inequívocos pigmeus morais". Horas depois, acompanhado dos colegas Moraes e Zanin, o semideus das togas foi ao Alvorada a convite de Lula, que convocou um regabofe para jogar água na fervura.

 

O general-senador Hamilton Mourão postou nas redes sociais que "alguns ministros se dizem traídos pelo governo", ensejando a suposição de que "houve um acordo", e sugere que o propósito era a eleição do petista-mor. Assiste razão ao ex-vice-presidente. O devido processo legal não deveria frequentar palácios nem magistrados jantar ou negociar com partes processuais. 


Do alto de seu Olimpo particular, os supremos togados demoram a perceber que guardar ressentimentos é como tomar veneno na suposição de que os adversários serão intoxicados. Reza a Constituição que os Poderes da República devem ser harmônicos e independentes entre si. A harmonia foi para o beleléu há tempos. Consolida-se agora a subversão da independência. 


Triste Brasil.

quarta-feira, 6 de maio de 2020

NAVEGADORES DE INTERNET — FAVORITOS, BOOKMARKS E OUTRAS CONSIDERAÇÕES

OS FILMES SÃO ILUSÕES EM MOVIMENTO, FORMADAS POR MILHARES DE FOTOGRAFIAS IMÓVEIS.

Depois que navegar na Web passou de novidade a necessidade, usar um navegador de internet tornou-se tão natural intuitivo quanto escovar os dentes. Mas nem sempre foi assim.

Os gigantescos e jurássicos mainframes (que custavam verdadeiras fortunas, ocupavam salas inteiras e tinham menos poder de processamento que uma calculadora de bolso xing-ling atual) surgiram nos anos 1940. Curiosamente, o presidente da gigante IBM, que se tornaria a maior fabricante de computador do mundo, disse, certa vez: “Eu acredito que haja mercado para talvez cinco computadores”.

Trinta anos depois, referindo-se aos ainda incipientes PCs (Personal Computers), o fundador da Digital Equipment Corp. vaticinou: “Não há nenhuma razão para alguém querer um computador em casa”.

O tempo provaria que ambos estava errados (saiba mais sobre a evolução do computador seguindo este link, clicando em Postagem mais recente ao final da leitura e assim sucessivamente, até chegar ao último capítulo).

Na pré-história da computação pessoal, os PCs não tinham drive de HD drive de HD (disco rígido). Os operadores tinham de carregar os programas a partir de fitas magnéticas, semelhantes às miniK7 que o mercado fonográfico popularizou nos anos 1970.

Até o final dos 1980, operar um micro (como os PCs eram chamados então) era bem mais complicado do que hoje em dia. O DOS  (“acrônimo de Disk Operating System ou sistema operacional em disco, numa tradução livre, como foram chamados diversos sistemas operacionais, bastante semelhantes entre si, que dominaram o mercado de PCs IBM e compatíveis entre 1980 e 1995) facilitou bastante essa tarefa, mas exigia alguma intimidade com linguagens de programação e a memorização de dúzias de comandos baseados em textos e parâmetros.

MS-DOS foi o nome que a Microsoft escolheu para batizar sua versão (baseada no QDOS), o sistema operacional propriamente dito nas edições 3.X, nas quais o que aparecia na tela quando o aparelho era ligado não era a área de trabalho, mas o prompt de comando.

Por prompt entenda-se o ponto de entrada para a digitação de comandos internos do computador e do próprio DOS, que era representado pela letra que designa a partição do sistema (geralmente C no caso do HD e A ou B no dos jurássicos disquetes) seguida de dois pontos (:), de uma barra invertida (\) e do sinal de “maior que” (>): C:/>. Outros elementos eram acrescentados conforme se navegava por diretórios, pastas e arquivos. Para convocar o Windows a partir do prompt do DOS (como dito linhas atrás, até o lançamento da versão 95 o Windows era uma simples interface gráfica), digitava-se win à direita do cursor piscante e pressionava-se a tecla Enter.

O MS-DOS foi o primeiro sistema operacional largamente adotado usado em PCs, a despeito de ser pobre em recursos — um de seus maiores defeitos era ser monotarefa — e pouco intuitivo. Os comandos eram sequências de letras, algarismos e caracteres especiais (<, %, $,>, \, $, etc.) que a gente tinha de digitar cuidadosamente, já que bastava um espaço, letra, algarismo ou caractere a mais ou a menos para o sistema nos exibir uma mensagem de erro — daí os “old school hackers” (programadores experientes) dizerem aos “newbies” (iniciantes) que “a máquina faz o que o operador manda, não o que operador quer”.

A janela do prompt daquela época era semelhante à da figura acima, que eu capturei a partir do interpretador de linha de comando do Windows 10 (que oferece duas opções: o prompt de comando e o Windows Power Shell). Repare na figura que, além da unidade seguida dos dois pontos, da barra invertida e do sinal de “maior que”, também é exibido o diretório (local) e a pasta em que os comandos serão executados (no caso, Users/FERNANDO). Mas basta digitar “C..” e pressionar Enter para subir um nível (para a pasta Users) e repetir o procedimento para retornar ao tradicional C:\>.

A partir da edição 95, o Windows deixou de ser uma simples interface gráfica e passou a ser o sistema o sistema operacional propriamente dito, ou quase isso, porque o MS-DOS continuou atuando nos bastidores até 2001, quando a Microsoft lançou o Windows XP, que, por ser baseado no kernel (núcleo) do Windows NT, finalmente cortou o cordão umbilical com o velho sistema. Mesmo assim, as edições subsequentes do Windows continuam integrando um interpretador de linha de comando.

Continua...

quarta-feira, 29 de dezembro de 2021

RETROSPECTIVA — CONTINUAÇÃO

Michel Temer, Eurico Dutra e Nereu ramos são bons exemplos de políticos que ascenderam à presidência a despeito se sua falta de carisma. Isso sem falar no picolé de chuchu, cuja sensaborice contribuiu para o fiasco do tucano nas duas vezes que disputou a Presidência, a despeito de ter sido o político que governou São Paulo por mais tempo desde a redemocratização.

Observação: Comenta-se à boca pequena que Alckmin será candidato a vice-presidente na chapa de Lula (o que é no mínimo vergonhoso), mas não será com as bênçãos de Gilberto Kassab: na semana passada, o cacique do PSD foi curto e grosso: "Eu não estarei com o Lula no primeiro turno, e isso já foi dito a ele. Não é porque é o Geraldo, fulano ou sicrano, é porque teremos candidatura própria". Kassab disse ainda que, para ele, o "projeto redondo" em São Paulo "acabou", e outro nome será procurado.

João Batista Figueiredo era insuperável em falta de carisma e papas na língua. Sempre se soube que o último general a governar o Brasil durante a ditadura não nascera para ser figura pública. "Estou fazendo uma força desgraçada para ser político, mas não sei se vou me sair bem: no fundo, gosto mesmo é de clarim e de quartel", afirmou certa vez. Os marqueteiros chapa-branca até tentaram transformar o casca-grossa numa figura popular, com a alcunha de João do Povo, mas deram com os burros n’água.

Entre outras pérolas de sutileza, o militar carioca disse preferir “o cheiro dos cavalos ao cheiro do povo". Quando uma criança perguntou o que ele faria se fosse criança e seu pai ganhasse salário-mínimo, respondeu sem pestanejar que daria “um tiro na cuca”. Sobre a abertura política, esbravejou: "É para abrir mesmo. Quem quiser que não abra, eu prendo e arrebento". Mas nada se compara a sua lapidar constatação de que "um povo que não sabe nem escovar os dentes não está preparado para votar".

Observação: Nas palavras do próprio Figueiredo: "Vejam se em muitos lugares no Nordeste o brasileiro pode votar bem, se ele não conhece noções de higiene? Aqui mesmo em Brasília, eu encontrei outro dia, num quartel, um soldado de Goiás, que nunca escovara os dentes e outro que nunca usara um banheiro. E por aí vocês me digam se o povo já está preparado para eleger o presidente da República."

Figueiredo era racista. Chegou a dizer que “a solução para as favelas é jogar uma bomba atômica”. Outra declaração típica do fardado: "Eu cheguei e as baianas já vieram me abraçando. Ficou um cheiro insuportável, cheguei no hotel tomei 3, 5, 7 banhos e aquele cheiro de preto não saía".

"Pérolas" como essas suscitam uma inevitável comparação entre Figueiredo e Bolsonaro. Há semelhanças, mas o general era autêntico, inclusive na grosseria, e o que o "mito" dos despirocados fala não passa de mise en scène para acirrar a escumalha que lhe dá respaldo nas urnas e nas redes sociais. Como quando disse que cagou para a CPI e que o Omar Aziz tem cara de capivara (o senador rebateu o insulto referindo-se ao ofensor como "aquele carioca que tira proveito de funcionários do próprio gabinete" e que "abre a boca para jogar fezes").

Numa entrevista concedida à Folha em 1978 (que recebeu o Prêmio Esso de Jornalismo), Figueiredo, então chefe do SNI, falou diversas vezes em "Revolução" e justificou muitas de suas opiniões, como ser contra a independência entre os Poderes, a anistia e as eleições diretas para Presidente. Perguntado sobre o eleitorado tupiniquim, respondeu aos entrevistadores: "Getúlio não fez uma ditadura sanguinária e acabou sendo eleito? Vocês sabem que no Rio Grande do Sul houve uma seca, e os eleitores decidiram votar contra o governo, por que não choveu? Um eleitorado não elegeu o Cacareco [rinoceronte do Zoológico de São Paulo]? Então uma coisa dessas tem cabimento?".

A pergunta do finado fazia sentido, mas é absurdo ter saudades dos anos de chumbo, como fazem jovens abilolados de 20~30 anos, que cantam "those were the days" para a ditadura apoiam atos antidemocráticos estimulados pelo “mito” — que teve o desplante de participar pessoalmente de manifestações em que a récua pugnava pelo fechamento do STF e do Congresso, volta do AI-5 e ditadura com Bolsonaro na Presidência — quando sequer haviam nascido naquela época.

Saudosistas de fancaria (como são os apoiadores do nosso mandatário de fancaria) idolatram um passado que nunca existiu. Bolsonaro é uma aberração que foi eleita para impedir a volta do lulopetismo corrupto, quando poucos podiam imaginar que se estava removendo o pino de uma granada de efeito retardado, desarrolhando a garrafa de um ifrit megalômano, abrindo a caixa de Pandora, enfim, deixo a escolha da analogia a critério do freguês.

Desde sua posse, em janeiro de 2019, o dublê de mau militar e parlamentar medíocre nada fez senão articular sua reeleição e cagar solenemente para quem não pensa como ele. De cagada em cagada, o Messias que não miracula vai esmerdeando o lema chauvinista e enjoadinho associado a sua campanha: "Brasil acima de tudo, Deus acima de todos".

segunda-feira, 6 de julho de 2020

DA PRAGA DA CASERNA AO CAPITÃO CAVERNA


MACHO E FÊMEA OS CRIOU — GÊNESIS, 1:27

Quando ainda não existia essa história de “politicamente correto”, a gente puxava assunto perguntando: “Sabe a última do português?” (ou do padre, da loira, do papagaio...). Hoje, não fosse por um mero detalhe, a frase poderia ser “ Sabe a última do Bolsonaro?”. Mas o diabo mora nos detalhes, e quando se trata de estultices bolsonarianas, a última é sempre a penúltima, pois a capacidade de fazer merda daquele a quem entregamos os destinos desta banânia é tão incomensurável quanto o despreparo dos brasileiros para eleger seus representantes e governantes. 

Se você não acredita em mim, talvez acredite em Pelé. No início da década de 1970 (auge da ditadura militar), o eterno rei do futebol (então no auge da fama), sentenciou: "O povo brasileiro ainda não está em condições de votar por falta de prática, por falta de educação e ainda mais porque se vota em geral mais por amizade nos candidatos." 

Anos depois, o general João Batista Figueiredo — que concluiu a reabertura política lenta, gradual e segura iniciada na gestão do também general Ernesto Geisel — proferiu idêntica pérola de sabedoria: "Um povo que não sabe nem escovar os dentes não está preparado para votar". Já o ex-presidente Ernesto Geisel era um visionário. Dentre outras profecias que se tornariam realidade, cito a seguinte: "Se é a vontade do povo brasileiro eu promoverei a Abertura Política no Brasil, mas chegará um tempo que o povo sentirá saudade do Regime Militar, pois muitos desses que lideram o fim do Regime não estão visando ao bem do povo, mas sim aos próprios interesses".

Outra previsão digna de nota viria mais adiante, numa entrevista à FGVGeisel disse que "a política entrando no Exército" havia sido algo "mais ou menos tradicional, com raízes históricas, mas que agora, com a evolução, vai acabar." Para ilustrar seu ponto, o general adivinho referiu-se a um deputado federal que convocava militares a voltarem ao poder: "Não contemos o Bolsonaro, porque o Bolsonaro é um caso completamente fora do normal, inclusive um mau militar". E olha só no que deu...

Conhecer o passado é fundamental para entender o presente, projetar o futuro e não repetir os mesmos erros. No Brasil, até o passado é incerto, o que dificulta um pouco as coisas. Para alguns, a única maneira de pôr ordem no galinheiro é devolver o gigante adormecido aos portugueses e começar tudo de novo. Para outros, melhor seria devolver o país aos índios e afundar as naus lusitanas antes que elas ancorassem no litoral da Bahia. 

Considerando que maioria dos nossos problemas é eminentemente política, eu iria mais além, começando por citar o Gênesis (do grego Γένεσις, que significa "origem", "criação", "princípio"), segundo o qual: "No princípio era o Caos, e do Caos Deus criou o Céu e a Terra (...)"

Dito de outro modo: em apenas 6 dias, o Criador transformou o Caos em ordem, criou a luz e separou-a em duas (uma, grande, para governar o dia, e outra, menor, para governar a noite); criou as águas e dividiu-as em duas (e juntou as da porção inferior num só lugar, para que ali emergisse parte seca); cobriu a terra de plantas, povoou-a com todo tipo de seres vivos e, no sexto dia, a cereja do bolo: "Agora vamos fazer os seres humanos, que serão como nós, que se parecerão conosco. Eles terão poder sobre os peixes, sobre as aves, sobre os animais domésticos e selvagens e sobre os animais que se arrastam pelo chão", disse o Senhor das Esferas. E após concluir Sua obra e ver que tudo era bom (?!), abençoou e santificou o sétimo dia, e nele descansou.

Observação: A primeira versão escrita do Antigo Testamento remonta ao século 10 a.C. Desde então seus relatos foram copiados, editados e reescritos inúmeras vezes, até que alguém teve a ideia de juntar a essa compilação no Novo Testamento. E assim formou-se a síntese da mitologia cristã, composta por 66 livros, sendo 39 do A.T. e 27 do N.T., que ficou conhecida mundialmente como Bíblia (do grego "biblion", que significa "livro", "rolo").

Do Gênesis bíblico à teoria do Big Bang, diversos povos construíram versões próprias da origem do universo. Na maioria delas, o Caos seria uma matéria sem forma definida, mas nenhuma suscitou o detalhe que ora lhes revelo:

Antes do Caos já deveria haver políticos, pois foram eles, como toda certeza, que criaram o Caos!

Dica: Para elevar o CAOS a enésima potência, basta adicionar à POLÍTICA uma dose generosa de FANATISMO.

Continua no próximo capítulo.

quarta-feira, 22 de dezembro de 2021

A VITÓRIA DO ESCÁRNIO

Churchill disse que não há argumento melhor contra a democracia do que cinco minutos de conversa com um eleitor mediano.  

Figueiredo — que era um sábio e não sabia — disse que um povo que não sabe escovar os dentes não está preparado para votar

O escritor português José Saramago, Nobel de Literatura em 1998, escreveu que a cegueira é uma questão pessoal entre as pessoas e os olhos com que nasceram

Com a cambada que ascendeu ao Congresso graças à cabeça oca e ao dedo podre do eleitor brasileiro, aprendemos que quem parte e reparte e não fica com a a melhor parte é burro ou não tem arte

Num cenário de terra arrasada, com mais de 600 mil mortos por Covid, mais de 13 milhões de desempregados, mais de 20 milhões de brasileiros passando fome, a inflação de volta à casa dos dois dígitos e a recessão batendo à porta mais uma vez, os nobres congressistas despacham para as calendas as reformas estruturantes, mantêm trancafiadas na gaveta PECs como as da prisão em segunda instância e do fim da reeleição e, felizes como pintos no lixo, derrubam o veto paraguaio do mandatário de fancaria ao fundo eleitoral de R$ 5,7 bilhões.

Essa vergonha contou com o aval de 317 dos 513 deputados federais, unindo governistas, independentes e oposição. Horas depois, por 52 votos contra 21, os senadores ratificaram a decisão da Câmara. Assim, o fundo de financiamento da campanha, criado em 2017 e que ficou em torno de R$ 2 bi nas eleições de 2018 e 2020, será o maior da história em 2022. 

Em julho, quando o Congresso aprovou o fundão de R$ 5,7 bi, uma reportagem da Folha baseada em estudo do Movimento Transparência Partidária abrangendo dados de 25 das principais nações deu conta de que o Brasil seria o campeão desse tipo de gasto, tanto nominalmente (em dólar), quanto proporcionalmente a seu PIB.

Bolsonaro, que está em campanha pela reeleição desde 1º de janeiro de 2019 e se amancebou recentemente com o PL do mensaleiro ex-presidiário Valdemar Costa Neto será um dos grandes favorecidos pela derrubada de seu veto, visto que o partido ocupou a 8ª colocação no ranking das siglas que mais receberam dinheiro na campanha de 2018.

O uso de dinheiro público para financiar campanhas eleitorais cria divergência entre os grupos de sustentação de Bolsonaro. Para a base ideológica, o capetão deveria sinalizar que é contrário ao fundo, mas o Centrão — coalizão de partidos que passaram a integrar a base do governo após a liberação de cargos e emendas — quer rios de dinheiro para torrar nas próximas eleições.

Para justificar um aumento tão significativo no fundo, a politicalha argumenta que na eleição de 2022 há um número maior de candidatos. De fato, com 33 partidos, 23 dos quais com representação no Congresso, e mais de 80 aguardando registro no TSE, não há dinheiro que baste nem outra maneira de governar o país que não esse espúrio presidencialismo de cooptação (que Bolsonaro vituperou durante a campanha, dizendo que a "velha política do toma-lá-dá-cá" não teria lugar no seu governo). Mas não vale a pena gastar boa vela com mau defunto explicando por que não se deve levar em conta o que o "mito" dos despirocados diz.

"Não tem solução ideal. Nós não temos o financiamento privado [de campanha]. A gente precisa discutir isso", disse Arthur Lira, o réu que preside a Câmara e é um dos mandachuvas do Centrão. Já o pajé da cloroquina, pressionado por sua récua de apoiadores, chegou a dizer que o valor do fundão era "astronômico". Mas não demorou para deixar o dito pelo não dito e, pior, afirmou que não vetaria o valor total para não incorrer em crime de responsabilidade, mas que barraria o que chamou de "excesso".

Já perdemos as contas de quantos crimes de responsabilidade Bolsonaro cometeu desde que tomou posse, e só Deus e o diabo sabem quantos mais serão cometidos até o final de sua funesta gestão, já que o sultão do bananistão conta com a blindagem de Aras na PGR e de Lira na Câmara (o procurador finge que investiga o presidente, e o réu que manda e desmanda na Casa do Povo diz que não tem prazo para decidir o que fará com os 141 pedidos de abertura de processo de impeachment).

O fundão é dinheiro público, até porque o governo não gera recursos. Quando você compra pão na padaria, abastece o carro no posto ou a despensa no supermercado, você está contribuindo para o fundão. Ademais, se o valor mínimo legal é de R$ 800 milhões, como justificar a elevação da pilhagem a quase R$ 6 bi se falta dinheiro para a Saúde, para a Educação e para o Auxílio Brasil?

O Congresso tem movido montanhas para conseguir recursos abundantes e livres de fiscalização ou de limites de qualquer natureza para o ano eleitoral. Tudo em nome de um "bem maior", naturalmente. Mas não fala em remanejar despesas e reluta a dar nomes aos bois quando se trata das famigeradas "emendas de relator" — ou do "orçamento secreto", como queiram. 

Como que cúmplices da ladroagem institucionalizada, integrantes da mais alta cúpula do Judiciário vem se dedicando em tempo integral a anular, seletivamente, um sem-número de processos — como o que provou a prática de rachadinha no gabinete do então deputado Flávio Bolsonaro e os que condenaram por corrupção Eduardo Cunha e Sérgio Cabral

De uma hora para outra, suas excelências se deram conta de que as punições a crimes como desvios de recursos, cobrança de propina ou enriquecimento ilícito foram todas aplicadas nas instâncias erradas e pelos juízes errados — mesmo tendo tramitado por anos sem que ninguém tivesse se dado conta de nada.

Felizes com a virada nos ventos, os mesmos que comemoram a prescrição dos processos de Lula e a possível aliança com ex-tucano Geraldo Alckmin se referem aos tucanos Aécio Neves e José Serra como denunciados por corrupção, esquecendo-se, mui convenientemente, de que são todos alvo da mesma investigação.

Nos bastidores das negociações entre os partidos, tudo é possível. Alckmin e Lula são só a face mais visível das conversas que comportam composições de todo tipo — do PT com o PSD de Gilberto Kassab e, se necessário, até com o União Brasil (fusão do DEM com o PSL). 

Bolsonaro se amancebou com PL do mensaleiro e ex-presidiário Valdemar Costa Neto — e disse estar se sentindo em casa —, enquanto mantém no governo o PP de Ciro Nogueira e Arthur Lira, a quem não se cansa de bajular.

O grande consenso nacional é que não deve haver limites para ganhar a eleição. A campanha será sangrenta e o funil, estreito. Mas até aí, noves fora o "astronômico fundão", nenhuma novidade. 

Em 2013, a ex-gerentona de araque (de nada saudosa memória) disse que "faria o diabo" para se reeleger, e repetiu a dose cinco anos depois, quando afirmou que o PT faria aliança até com o diabo para combater Bolsonaro (pode faltar tudo à cria e pupila do ex-presidiário de Curitiba, menos intimidade com o Tinhoso)

Em 2022, vai-se fingir que o dinheiro do toma-lá-dá-cá com emendas parlamentares é limpo, que os limites para os gastos públicos não estão sendo arrombados, que somente os adversários espalham fake news e que é normal "sentir-se em casa" junto de quem, em outro momento histórico, chamou-se de "corrupto" e "condenado".

A impressão que se tem é a de que o meticuloso trabalho de destruição institucional levado a cabo pelo "mito" dos despirocados fulminou também os limites do aceitável. Talvez não haja mesmo outra forma de devolver a política a um nível minimamente razoável, ou de resgatá-la do domínio do terraplanismo, mas é triste constatar que, entre tantas coisas que o bolsonarismo boçal nos tirou, estão o respeito a certos limites e a falta de vergonha de ser cínico.

E viva o povo brasileiro.

quinta-feira, 17 de março de 2022

LULA LÁ...


Política e honestidade raramente andam de mãos dadas. Salvo honrosas exceções, nossos governantes e representantes se servem do mandato em vez de servir ao país. Mas é importante ter em mente que essa caterva não brota nos gabinetes por geração espontânea; se está lá, é porque obteve o aval do "esclarecidíssimo" eleitorado tupiniquim.

O que dizer de congressistas que destinam R$ 4,9 bi para o fundo eleitoral — dinheiro roubado de nós para financiar a campanha de quem continuará a nos roubar na próxima legislatura — quando metade da população não consegue fazer duas refeições por dia, o dólar está nas alturas, o preço dos combustíveis explodiu e a inflação voltou à casa dos dois dígitos?


Desde a redemocratização, cinco presidentes foram eleitos diretamente e dois foram alçados ao posto devido à morte dos titulares. Desses, o “menos pior” foi FHC, que sujou o poleiro comprando votos para a aprovação da PEC da Reeleição. Quanto aos demais, Collor se revelou um caçador de marajás de araque; Lula, um desaculturado exótico; Dilma, uma calamidade; Temer, uma aberração; e Bolsonaro, um dublê de mau militar e parlamentar medíocre que, por mal de nossos pecados, quer porque quer ficar mais quatro anos no poder.


A menos que o imprevisto tenha voto decisivo na assembleia dos acontecimentos, a próxima eleição presidencial tem tudo para ser uma reedição piorada do pleito plebiscitário de 2018. O queridinho do eleitorado, segundo as pesquisas, é o ex-presidiário que teve a ficha imunda lavada nas coxas pela cúpula do Judiciário, e o vice na chapa, o ex-tucano que até não muito tempo atrás comparava o demiurgo de Garanhuns a um “ladrão de carros” e dizia que votar em Lula seria “reconduzir o criminoso à cena do crime”.


Situações surreais como essas causariam espécie — para dizer o mínimo — em qualquer democracia de respeito, mas não no Brasil, onde existem remédios constitucionais para apear do cargo mandatários que se tornam estorvos (que o digam Collor e Dilma), mas falta vontade política para administrá-los. E deixar a solução do problema cargo da récua de muares que atende por “eleitorado” tem sido um péssimo negócio. 


ObservaçãoPelé disse certa vez que o brasileiro não sabe votar, e Figueiredo — o último presidente general da ditadura —, que “um povo que não sabe sequer escovar os dentes não está preparado para votar”. Ambos foram muito criticados por isso, mas o tempo provou que eles estavam certos.


Voltando à questão dos combustíveis, soa ridículo Bolsonaro culpar o ICMS e contar com a “sensibilidade” da Petrobras. Faz sentido o que ele diz sobre a queda do preço do petróleo no mercado internacional não ser repassada às refinarias tão rapidamente quanto os aumentos, como também a crítica ao oportunismo dos donos de postos de combustíveis, que reajustam para cima o valor cobrado nas bombas bem mais rapidamente do que o reduzem (isso quando a redução chega realmente ao bolso do consumidor final). Por outro lado, estaríamos numa situação mais confortável se o atual governo tivesse se valido da Cide para criar um fundo de amortização.


É fato que os antecessores do capitão poderiam ter feito o mesmo e não fizeram — aliás, Lula e seu repulsivo partido quase “quebraram” a Petrobras com o Petrolão —, mas também é fato que, durante a campanha de 2018, o "mito" prometeu gasolina a R$ 2,50 o litro e gás de cozinha a R$ 35 o botijão de 13 kg


Dizer agora que o combustível aumentou no mundo inteiro em decorrência da guerra no leste europeu é servir-se de uma meia-verdade para justificar o injustificável. Prova disso é que, enquanto o brasileiro gasta 25% de um salário-mínimo para encher o tanque de um carro popular, os argentinos gastam 6%, os italianos, 4,8%, e os norte-americanos, 3%.


Não seria de esperar algo muito diferente de um chefe do Executivo que passeia de motocicleta durante o expediente e trava uma verdadeira cruzada contra as vacinas para não dar palanque a seu arquirrival — cá entre nós, não fosse pelo governador de São Paulo, o dublê de general, expert em logística e ministro da Saúde, Eduardo Pesadelo, ainda estaria esperando “o dia D e a hora H” para iniciar o plano nacional de imunização.


Triste Brasil.

domingo, 20 de fevereiro de 2022

RESTAURE-SE O IMPÉRIO DA MORALIDADE OU LOCUPLETEMO-NOS TODOS! (PARTE XVIII)

 

Em 1998, quando disputou a reeleição, FHC teve como principal adversário o retirante nordestino analfabeto e malandro que usou o sindicalismo como trampolim para a política, fundou uma agremiação de criminosos disfarçada de partido, sangrou os cofres públicos de 2002 a 2010. E continuou a fazê-lo até 2016, mas tirando a castanha com a mão do gato, ou melhor, do "poste" que escolheu para manter quente a poltrona tencionava voltar a ocupar em 2014. Mas nem tudo saiu como planejado: o cutruca se tornou réu em 20 processos e foi condenado em dois, por 10 magistrados de três instâncias do Judiciário, a mais de 26 anos de prisão. 

Como isto aqui é Brasil, a mais alta corte de Justiça (?!) mudou seu entendimento sobre o cumprimento antecipado da pena, permitindo ao abantesma deixar a sala VIP que lhe serviu de cela após míseros 580 dias. E como as “togas cumpanhêras” anularam suas duas condenações e todos os demais atos processuais nas quatro ações que tramitavam ou haviam tramitado na 13ª Vara Federal de Curitiba, o ex-condenado, transmutado em "ex-corrupto", recuperou os direitos políticos que haviam sido suspensos pela Lei da Ficha-Limpa.

Voltemos ao grão-tucano de plumagem vistosa, que, no último ano de seu primeiro mandato, comprou a PEC da Reeleição. Como quem parte e reparte e não fica com a melhor parte é burro ou não tem arte, FHC foi o primeiro mandatário a usufruir de sua "obra". 

Observação: Em 2014, quando criticou o estelionato eleitoral que foi a reeleição de Dilma, Fernando Henrique ouviu do bocório de Garanhuns: "Vi o ex-presidente falar com a maior desfaçatez: ‘É preciso acabar com a corrupção’. Ele devia dizer quem é que estabeleceu a maior promiscuidade entre Executivo e Congresso quando ele começou a comprar voto para ser aprovada a reeleição". Lula reclamar de corrupção em governo alheio é o mesmo que Marcola, o chefe do PCC, imputar crimes ao arquirrival Comando Vermelho, mas, de novo, isto aqui é Brasil, zil, zil, zil...

Em 2002, após três tentativas frustradas, Lula finalmente conquistou a Presidência, dando início aos 13 anos, 4 meses e 12 dias de lulopetismo corrupto que terminaram com o afastamento da estocadora de vento e a promoção do "vice decorativo" a titular. 

Na visão míope da petralhada, o país estava melhor nos tempos de Lula e Dilma — como a parelha de desqualificados fosse austera e pouco afeita a gastos desnecessários, como Aerolulas, luxuosas suítes no Copa e em hotéis estrelados do mundo inteiro, bolsas Hermès, cabeleireiros Kamura e por aí afora. O gramado do vizinho sempre parece mais verde e o osso que se roeu no passado, mais saboroso que o bife que está no prato. 

Não que haja bife no prato dos brasileiros. Enquanto nosso mandatário de fancaria comemorava com pompa e circunstância seus mil dias de governo — com o dólar nas alturas, crises hídrica e de energia elétrica, inflação galopante e combustíveis, gás de cozinha e alimentos a preços estratosféricos —, brasileiros das classes sociais menos favorecidas disputavam ossos e outros refugos que até pouco tempo atrás iam para as latas de lixo de açougues e supermercados.

Dezoito anos depois de transferir a faixa presidencial ao sultão da Petelândia, FHC finalmente concluiu que merda fede. Ou, em suas próprias palavras, que "a reeleição é dos males — talvez o mais grave — de nosso sistema político". Em seu “mea-culpa”, o barão do tucanistão reconheceu que cometeu um “erro histórico” ao patrocinar a emenda em questão, e que foi “ingênuo” por acreditar que a partir daí os governantes não fariam “o impossível” para se reeleger.

"Ingenuidade" — escreveu Dora Kramer em sua coluna, "foi acreditar na inocência do presidente que fez ele mesmo o “impossível” ao jogar o peso de sua autoridade e prestígio angariado no êxito do combate à inflação para aprovar uma emenda em causa própria, ferindo de morte sua majestade em troca de mais quatro anos no Palácio do Planalto."

Vir agora com ato de contrição — prosseguiu a jornalista em seu imperdível texto — soa a tentativa de diluir responsabilidade por algo que guarda mais relação com a forma do que com o conteúdo. O defeito não está no instrumento existente em várias democracias, mas no uso que se faz dele. Por exemplo: quando da proposta da emenda, por que não se incluiu a obrigatoriedade de o postulante ao mesmo cargo se afastar por um período determinado antes da eleição? 

A Justiça é falha na fiscalização do uso indevido do poder e os grandes partidos, tímidos na contestação aos abusos — pois receiam firmar jurisprudências que venham a lhes criar empecilhos amanhã ou depois, diz Dora, relembrando em seguida uma frase ouvida décadas atrás de Roberto Campos: “Não é a lei que precisa ser forte, é a carne que não pode ser fraca”.

É perfeitamente possível conviver com a reeleição, desde que os políticos não abusem dela e que o povo seja esclarecido e esteja preparado para votar. A propósito, em meados dos anos 1970, auge da ditadura militar, Pelé, então no auge da fama, disse que o brasileiro não sabia votar. Anos depois, numa das muitas pérolas que o notabilizaram, o então presidente João Figueiredo ponderou que "um povo que não sabia nem escovar os dentes não estava preparado para votar".

E viva o povo brasileiro!