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sábado, 1 de junho de 2019

BRASIL — UM PAÍS QUE NÃO PODE DAR CERTO



O Banco Central derrubou a Selic (taxa básica de juros) dos 14,25% ao ano — índice que vigorou de setembro de 2015 a outubro de 2016 —, para 6,5% a.a. em maio do ano passado, e a manteve nesse patamar desde então, mês a após mês. Não pretendo fazer aqui fazer um juízo de valor dessa medida, do ponto de vista econômico, mas apenas salientar que ela provocou uma queda dramática nos rendimentos das aplicações financeiras, afetando, inclusive, as Cadernetas de Poupança, que rendem 70% da Selic mais TR (taxa referencial).

Por outro lado, o spread bancário (diferença entre a remuneração que a instituição financeira paga ao aplicador para captar um recurso e o quanto ela cobra para emprestar o mesmo dinheiro) continua nas alturas. Para se ter uma ideia, as taxas médias cobradas no rotativo dos cartões de crédito e no cheque especial continuam próximas de 300%. No cartão, o juro médio para pessoas físicas caiu de  299,4% para 298,6% ao ano, entre março e abril de 2019, e no cheque especial, no mesmo período, avançou de 322,7% para 323,3% ao ano.

Um país assim não pode mesmo dar certo.

Para encerrar, sobre as manifestações convocadas dias atrás por centrais sindicais, partidos de esquerda e militantes travestidos de professores, com direito a achincalhe a jornalistas que cobriam o protesto e, portanto, estavam fazendo seu trabalho:

terça-feira, 28 de maio de 2019

AINDA SOBRE AS MANIFESTAÇÕES


Se não houve consenso sobre o número de municípios em que o povo saiu às ruas no último domingo, seria esperar demais que as opiniões dos analistas fossem convergentes em relação ao resultado. Para alguns, o governo saiu fortalecido; para outros, a adesão ficou abaixo do esperado. Como na velha história do copo pela metade, pode-se dizer que ele está meio cheio ou meio vazio, a critério de cada um. Há quem diga que os protestos fariam mal de qualquer jeito, fossem volumosos, fossem pífios.

Particularmente, concordo com José Nêumanne, para quem a impressão que elas deixaram, não tendo sido espetaculares como os bolsonaristas esperavam nem mínimas como previam seus adversários, é que a cidadania em marcha traz sempre bons resultados para a democracia e produzem um equilíbrio maior entre os Poderes da República. Os que são contra o governo recorrem a soluções estapafúrdias e covardes, como o recall planejado no Senado à sombra de Davi Alcolumbre, que ainda não deu conhecimento ao público da fraude transmitida para todo o País em sua escolha para o lugar antes ocupado por Renan Calheiros. Os atos trouxeram como novidade para os dois lados da dicotomia política brasileira nomes de ministros apoiados aos berros nas concentrações populares numa advertência de que o povo sabe mesmo o que quer. O presidente deveria aprender a governar para todos e os mandachuvas do Congresso, a ficarem no espaço restrito de suas cumbucas.

Guilherme Fiúza, mais incisivo, publicou o seguinte texto: “E eis que o debate nacional, cada vez mais dominado pela picaretagem intelectual, chega à suprema impostura: em nome da democracia, as novas vozes da resistência cenográfica decretam que uma manifestação de rua — ou, mais precisamente, a ideia de uma manifestação de rua — é autoritária! Nunca se viu nada parecido em tempos democráticos. A rua agora tem dono, que decide quem pode sair de casa. Fascistas são os outros. Nem Lula, que depenou o país e tentou transformá-lo em quintal do PT, ousou atacar a legitimidade de qualquer manifestação no país — fossem meia-dúzia de gatos pingados mandando-o ir para Cuba ou milhões de pessoas pedindo o impeachment de sua sucessora. Você jamais ouviu de Lula uma palavra contra o direito de qualquer pessoa sair à rua para se manifestar sobre o que bem entendesse. Podia dizer que era coisa da elite branca etc., mas ele jamais alegou que um ato de protestar em público era expressão de autoritarismo. Nem Fernando Collor, talvez o governante mais prepotente que o país já teve, vendo um número cada vez maior de pessoas ocupando as ruas pela sua queda, se atreveu a dizer que havia algo de autoritário ou antidemocrático nas manifestações. E olhem que entre os manifestantes havia gente como José Dirceu, Lindbergh Faria e outros famosos impostores — o que não tirava a legitimidade do movimento popular que levou, de forma democrática, ao impeachment dele. Pois bem. Essa democracia que já sobreviveu a prepotentes e larápios tem agora uma novidade quente: personagens que sempre se disseram liberais aparecem dizendo que a manifestação “A” pode, mas a manifestação “B” não pode. Como não têm coragem de dizer que não pode, dizem que um determinado ato público — que eles não poderiam saber o que é antes de acontecer — contém motivação autoritária; que pode ser um golpe contra as instituições; que é mais democrático ficar em casa. Como eles sabem de tudo isso? Nem Dilma, a famosa vidente que previu os tiros contra a caravana de Lula, ousou insinuar que qualquer das inúmeras manifestações de rua contra ela desaguaria num golpe institucional. Sendo que nem mesmo ela — Dilma, a única —, espalhando por aí até hoje que foi vítima de um golpe, se atreveu a sugerir que as manifestações de rua fossem, em si, uma orquestração autoritária. Nem mesmo ela teve a petulância de intervir nas intenções alheias, de decretar qual protesto é legítimo ou não é. Agora o mais grave (sim, é pior ainda): esses novos democratas de butique sabem muito bem que a agenda de reformas — que eles sempre defenderam — está em implantação (da forma que eles sempre pediram) e está também sob risco de sabotagem. Não por divergência de mérito, mas por disputa de poder. E quando surge a iniciativa de pressionar o Congresso contra a sabotagem da agenda que eles sempre pregaram, de que lado eles ficam? Ficam do lado da sabotagem, dizendo que estão lutando contra a ameaça de fechamento do Congresso. A lógica personalizada é boa por isso: se o dono mandar, ela rebola até o chão, na boquinha da garrafa, e não tem que dar satisfação a ninguém. Todo mundo viu o que a imprensa amiga do PT fez na época do impeachment: fotografava faixas de grupinhos pedindo intervenção militar no meio da multidão pedindo a deposição de um governo corrupto e botava na manchete “o viés antidemocrático” do protesto. É horrível isso, não é? Covarde, canalha, etc., certo? Pois é exatamente o que vocês estão fazendo agora, caros liberais arrependidos. Aliás, vocês estão ajudando a esconder a agenda positiva da equipe do Paulo Guedes (que vocês veneravam até anteontem) com a sua chocante indiferença perante ações cruciais como a MP da Liberdade Econômica — engolida e soterrada em meio a esse falatório periférico que vocês travestem todo dia de crise governamental. Parece que tem muita gente querendo protestar contra a sabotagem das reformas (que é um risco) e da informação (que é uma realidade). E, por mais que vocês queiram, essa gente não vai pedir licença a vocês.

Encerro com a avaliação de Ricardo Noblat e um vídeo de Caio Coppola. Começando por Noblat:

Foi uma manifestação fake, a de ontem. Simples de demonstrar. O que disseram a propósito os seus organizadores? E o que disse à noite o presidente Jair Bolsonaro em uma entrevista chapa branca à Rede Record de Televisão? Organizadores e Bolsonaro disseram que milhares de pessoas foram às ruas de mais de 150 cidades para cobrar a aprovação da reforma da Previdência, do pacote anticrimes do ex-juiz Sérgio Moro, e renovar seu apoio ao governo. Fosse verdade, não teria havido espaço para bonecos gigantes que ridicularizaram o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia. Afinal, ninguém mais do que Maia batalha pela aprovação da reforma. E isso todos reconhecem. Bolsonaro, não, só finge apoiá-la. Faz as declarações de praxe. E vez por outra fraqueja, deixando às claras seu raso compromisso com ela. O ministro Paulo Guedes, autor da proposta de reforma, até ameaçou ir embora porque o presidente mais atrapalha do que ajuda. O mercado financeiro dá por seguro que a reforma passará no Congresso e em tempo razoável. Então, por que milhares de brasileiros trocariam a praia e o descanso do domingo para suarem a sol a pino em defesa de uma reforma que não inspiraria tantos cuidados? De resto, em que lugar do mundo multidões se reuniriam alegres e ruidosas para comemorar a supressão de direitos conquistados e menos dinheiro no bolso? Ora, por toda parte, reforma da Previdência é sinônimo de confusão e de gente zangada nas ruas. É fato que a violência por aqui ultrapassou o limite do tolerável. E que o Congresso faz restrições ao pacote de medidas desembrulhado por Moro. Mas isso está longe de significar que o pacote irá para o lixo. Convenhamos: cabe ao Congresso aperfeiçoá-lo, não o engolir a seco. E aqui mora o busílis: na verdade, Bolsonaro e seus devotos querem que o Congresso apenas referende os projetos para ali enviados pelo governo. E que a Justiça se comporte como um poder amigável, dócil às suas vontades, e garantidor de suas iniciativas. Assim, começa a fazer sentido o que se viu e se ouviu, ontem, nas ruas – os bonecos de Maia, faixas e cartazes com duras críticas aos políticos e aos ministros do Supremo Tribunal Federal, palavras de ordem que exaltavam o Mito, o Messias, o presidente, ou simplesmente Jair. Sem financiamento empresarial, sem incentivo de partidos ou dos movimentos sociais organizados, a estudantada surpreendeu o governo e todo mundo no último dia 15 ocupando as ruas de 220 cidades para protestar contra o corte de verbas para a Educação.
Bolsonaro chamou os jovens de “idiotas úteis”. Pois os “idiotas úteis” obrigaram o governo a devolver parte do dinheiro cortado. Usados por Bolsonaro como massa de manobra contra o Congresso e a Justiça, os “patriotas” do dia 26 não terão o que celebrar. Congresso e Justiça não recuarão um passo de suas posições. Darão um tempo para só depois retaliar o governo. Conforme-se Bolsonaro com as regras da democracia. Ou então peça para sair.

Com a palavra, Caio Coppola:



Que cada um tire suas próprias conclusões.

segunda-feira, 27 de maio de 2019

PONTO E CONTRAPONTO




Se não foram um sucesso retumbante, as manifestações promovidas por bolsomínions e afins tampouco foram um fiasco: milhares de pessoas saíram às ruas em 130 dos 5.570 municípios brasileiros — a maioria vestindo verde e amarelo — em defesa da reforma da Previdência e do pacote anticrime e anticorrupção. As mobilizações ocorreram em cidades dos 26 estados e do DF, mas as mais significativas foram registradas em São Paulo e no Rio. Ainda que tenha havido ataques pontuais ao Congresso — sobretudo contra parlamentares do Centrão — e ao STF, não houve registro de badernas, quebra-quebras, confrontos com a polícia e outros incidentes deploráveis que tais. Numa rápido pronunciamento à imprensa, Bolsonaro, sorrindo de orelha a orelha, classificou o movimento “espontâneo” como um recado “para aqueles que, com suas velhas práticas, não deixam que o povo se liberte”. A adesão foi visivelmente menor que nas manifestações pelo impeachment de Dilma — ou mesmo que no protesto do último dia 15. Em Sampa, os manifestantes se concentraram ao redor de sete carros de som espalhados por oito quarteirões da Avenida Paulista, entre a Brigadeiro e a Augusta. O Nas Ruas — que ocupou o espaço que em 2014 foi dos movimentos Brasil Livre e Vem Pra Rua — levou um boneco inflável gigante do presidente e tocou o jingle de sua campanha. Dito isso, vamos adiante.

O ponto:

Depois de ter distribuído pelo WhatsApp um texto segundo o qual o País é "ingovernável" sem os "conchavos" políticos e de dizer que conta "com a sociedade" para "juntos revertermos essa situação", o presidente Jair Messias Bolsonaro voltou a fazer apelos diretos ao "povo" contra o Congresso — em relação ao qual nutre indisfarçável desprezo, embora tenha sido obscuro parlamentar durante 28 anos. Cresce a inquietante sensação de que o capitão decidiu governar não conforme a Constituição e com respeito às instituições democráticas, mas como um falso Messias cuja vontade não pode ser contrariada por supostamente traduzir os desejos do "povo" e, mais, de Deus. Ao que parece, o presidente passou a acreditar de fato na retórica salvacionista que permeou sua campanha eleitoral, alimentada por alguns assessores e pelos filhos, com o intuito de antagonizar o Congresso – visto como o lugar da "velha política" e, portanto, como um obstáculo à regeneração prometida ao povo.

Ao cabo de cinco meses de governo, em que todos os indicadores sociais e econômicos apresentaram sensível deterioração, fruto de sua inação administrativa e da descrença generalizada e cada vez maior na sua capacidade de governar, Bolsonaro começa a flertar com a "ruptura institucional", expressão que apareceu no texto que o presidente chancelou ao distribuí-lo na sexta-feira retrasada. Diante da repercussão negativa, em lugar de serenar os ânimos e demonstrar seu compromisso com a democracia representativa, estabelecida na Constituição, o chefe do Executivo ampliar as tensões, lançando-se de vez no caminho do cesarismo.

Ao comentar o texto de teor golpista que passou adiante pelo WhatsApp, Bolsonaro disse que "esse pessoal que divulga isso faz parte do povo e nós temos que ser fiéis a ele". E completou: "Quem tem que ser forte, dar o norte, é o povo". Ora, o mesmo povo que o elegeu para se ver livre das proezas lulopetistas elegeu 81 senadores e 513 deputados, além de legisladores e governantes estaduais. Depois, o presidente divulgou em seu perfil no Facebook o vídeo de um pastor congolês que diz que ele (Bolsonaro) foi escolhido por Deus para comandar o Brasil: "Pastor francês (sic) expõe sua visão sobre o futuro do Brasil", explicou o presidente, que completou: "Não existe teoria da conspiração, existe uma mudança de paradigma na política. Quem deve ditar os rumos do país é o povo! Assim são as democracias". O ilustre salvador talvez conheça a história do Congo, porque a do Brasil ele definitivamente ignora.

No vídeo endossado pelo presidente, o tal pastor, um certo Steve Kunda, diz que, "na história da Bíblia, houve políticos que foram estabelecidos por Deus", como "o imperador persa Ciro", e que "o senhor Jair Bolsonaro é o Ciro do Brasil, você querendo ou não". E lança um apelo aos brasileiros: "Não passe seu tempo criticando. Juntem as forças e sustentem esse homem. Orem por ele, encorajem-no, não façam oposição".

Em condições normais, tal exegese de botequim seria tratada como blague, mas não vivemos tempos normais — pois é o próprio presidente que, ao levar tais cretinices a sério, parece de fato considerar sua eleição como parte de uma "profecia". O resumo dessa mixórdia mística é que Bolsonaro acredita ser nada menos que um instrumento de Deus e o porta-voz do "povo". Portanto, quem quer que se oponha a ele não passa de um sacrílego.

Com 13 milhões de desempregados, estagnação econômica e perspectivas pouco animadoras em relação às reformas, tudo o que o País não precisa é de um presidente que devaneia sobre seu papel institucional e político e que, em razão disso, estimula seu entorno e a militância bolsonarista — a que Bolsonaro dá o nome de "povo" — a alimentar expectativas sobre soluções antidemocráticas como um atalho para a realização de "profecias". O reiterado apelo de Bolsonaro ao "povo" para fazer valer uma suposta "vontade de Deus" envenena a democracia e colabora para a ampliação da cisão social entre os brasileiros e destes com a política. A esta altura, parece cada vez mais claro que o capitão não estava para brincadeira quando disse, em março, que não chegou ao governo para "construir coisas para nosso povo", e sim para "desconstruir muita coisa". Espera-se que a democracia brasileira e suas instituições resistam a essa razia.

Com Reinaldo Azevedo.

Agora o contraponto:

Há um avião pronto para decolar, com combustível suficiente para tirar você da seca. Mas você quer saber se tem vascaíno a bordo, qual a religião do fabricante e o signo do copiloto. Assim está o Brasil, com um grupo de abnegados tentando fazer a reforma da Previdência pegar no tranco apesar de vocês, os analistas zoodiacais do neofascismo imaginário.

Até anteontem, o que importava, basicamente, era ter uma tripulação confiável para tirar o Brasil do deserto deixado pela exuberância da DisneyLula. Após uma eleição cheia de artimanhas para tentar reabilitar o poder da quadrilha, o país escolheu o caminho pelo qual, por vias tortas ou não, a tal tripulação confiável chegou à cabine de comando. Mas vocês não querem mais sair do lugar. Aparentemente, vocês trocaram o Posto Ipiranga pelo salão de cabeleireiro, onde uma desavença sobre a novela da véspera é crise grave. De fato, é uma rotina mais agitada e emocionante, pois o Posto Ipiranga é um tédio.

E assim estamos, neste estanho ano da graça de 2019. Enquanto Paulo Guedes, Rogério Marinho, Sérgio Moro e outros grandes trabalham duro para tirar o país do atoleiro, vocês fuxicam rebotalhos de rede social e tocam nos ouvidos da nação as suas cornetas do fracasso. Nada presta, assim não dá, olê-olê-olá. Os velhos trombeteiros do apocalipse, de Ciro Gomes a Roberto Requião, de Jean Wyllys a Gleisi Hoffmann, estão animadíssimos com a chegada de vocês à orquestra.

A reforma está afundando na CCJ — diziam vocês — porque o governo só existe no Twitter (vocês sabem tudo de articulação política), porque Rodrigo Maia mordeu a orelha do cachorro do Bolsonaro, porque o Mourão é o golpista gente boa (vocês estão na dúvida), porque os filhos são fanfarrões (ah, se eles tivessem MBA em etiqueta comparada…) e, acima de tudo, porque vocês encontraram essa fantasia de corregedores perfumados do estorvo bolsonarista e vão fazer cara de nojo para tudo. A reforma passou bem na CCJ, mas vocês continuaram com cara de nojo, dizendo que demorou (!), dizendo que o projeto do Paulo Guedes foi desidratado e não vai prestar, olê-olê, olê-olá.

Sobre essa parte de viver surfando entre meias-verdades, vocês estão provando aos parasitas do petismo que é possível mentir com muito mais classe do que eles fizeram por 13 anos. Aliás, no salão da resistência democrática não se ouviu um pio sobre a fake news da menina que se recusou a cumprimentar o presidente. Podem poupar suas meias-verdades para explicar esse silêncio hediondo: já entendemos que na nova cartilha de vocês não é permitido apontar eventuais picaretagens na imprensa, porque pode ser entendido como discurso bolso-fascista. Incrível como vocês estão mudados (os cabelos continuam os mesmos, mas o juízo… quanta diferença).

Ainda assim, a nova aposta de vocês não é de todo burra. Não há de faltar bizarrices dos Bolsonaros e seus circundantes para alimentar as crises de fofoca que vocês hoje se dedicam a fermentar e espalhar. Vocês são os colunistas sociais da miragem autoritária, uma espécie de reencarnação da Revista Amiga para futricas de coturno. Não deixa de ser um papel na sociedade.

Se apesar de vocês o avião decolar e tirar o Brasil da seca, vocês obviamente vão querer embarcar correndo, pedindo educadamente desculpas pelo atraso. Não tem problema, a tripulação que está dando duro mal sabe de vocês (não dá tempo de ler a Revista Amiga). São democratas — exatamente como vocês fingem ser — e não irão barrar ninguém. Talvez os passageiros a bordo não sejam tão receptivos, mas não dedicarão a vocês nada pior do que uma cara de nojo, como a que vocês hoje fazem para tudo. Nada grave, eles apenas terão entendido quem vocês são.

Com Guilherme Fiúza.

Independentemente da adesão às manifestações pró-Bolsonaro, líderes dos partidos que comandam o Congresso definiram um pacote de medidas para limitar o raio de ação do presidente. Avaliação uníssona colhida pela Folha entre congressistas é que o capitão tem demonstrado incapacidade de governar (quando a isso, é impossível discordar). Além de acelerar discussões sobre impeachment (aí já entramos no campo minado das asnices), a insatisfação encontra lastro e incentivo no mundo empresarial e financeiro, o que faz deputados e senadores assumirem a dianteira de iniciativas como as reformas da Previdência e tributária. "Vai ser necessário ignorar o governo, não tem outra saída", afirma o deputado Elmar Nascimento, líder do DEM na Câmara. O lema dessa caterva parece ser "Desinformação acima de tudo, ignorância acima de todos". Que Deus nos ajude.

Tanto os seguidores atávicos do presidiário de Curitiba quanto os do ex-astrólogo autoproclamado guru e rei da grosseria não são maioria, são apenas barulhentos. A maioria é formada por pessoas com desejo genuíno de construir um país próspero, justo e feliz. O problema é que muitas dessas pessoas estão sendo manipuladas pelo medo, a reboque de notícias falsas.

domingo, 26 de maio de 2019

É O FIM DA PICADA!



O balanço das repercussões das manifestações pró-governo e contra tudo e todos fica para amanhã, dado o horário em que eu posto o Blog. Até lá, seguem algumas considerações sobre o pseudo caçador de marajás — exemplo pronto e acabado do lobo que perde o pelo, mas não larga o vício, e que é uma das muitas provas vivas do despreparo do nosso eleitorado. Na sequência, mais um texto irreprochável do jornalista J.R. Guzzo.

Collor foi primeiro presidente eleito pelo voto direto após o fim da ditadura militar — ditadura essa que, como viemos a saber recentemente, não passou de uma ilusão de óptica. Ele também se destacou por ter confiscado a poupança do brasileiros e por abrir a lista dos presidentes impichados na nova república. Agora, além de responder na Justiça por rapinar o Erário, Fernandinho é acusado de fazer o mesmo com o patrimônio da família, por não repassar aos sobrinhos sua cota-parte no lucro das empresas do clã.

No âmbito familiar, o ex-presidente impichado e ainda senador — ele renunciou às vésperas de ser defenestrado pelo Congresso, mas teve os direitos políticos cassados mesmo assim — exibe um sólido histórico de transtornos, desavenças e traições. No passado, brigas com os irmãos Pedro e Leopoldo e crises no casamento com Rosane; no presente, além de ser réu na Lava-Jato e investigado e responder a outros seis inquéritos, é acusado por cinco sobrinhos — que, juntos, detêm 15% da Organização Arnon de Mello — de apropriar-se do patrimônio da família. Perdeu o pelo, como dito no início, mas não abandonou o vício que o notabilizou.  

Fernando (nome dado em homenagem ao ex-presidente, que se tornaria inimigo figadal do irmão) e Victor têm juntos 15% do grupo. Os dois nunca viram um centavo do lucro das empresas nem receberam balanço contábil desde a morte de Pedro. Leopoldo teve três filhos, mas eles não podem exigir parte do patrimônio porque o pai vendeu sua participação acionária ainda em vida.
Representantes do clássico coronelismo nordestino, os Collor de Mello usufruem a rara combinação de dinheiro e poder. Seus negócios englobam bens como a TV Gazeta, afiliada da Globo, duas rádios, um jornal, uma gráfica e um edifício de treze andares em Maceió. Estima-se que o conjunto chegue a 250 milhões de reais. 

Essa é apenas a parte visível do iceberg, pois há outros bens, de caráter reluzente, que também têm sido alvo de disputa. Segundo matéria publicada em VEJA, o inventário da matriarca, Dona Leda (1916-1995), é descrito em 162 páginas, quatro delas dedicadas a joias e pedras preciosas, como uma pulseira de 18 gramas de ouro e 21 esmeraldas e um colar de ouro de 18 quilates de 102 gramas com onze fios de pérolas e brilhantes, além de vasos chineses, lustres de cristal Baccarat e obras de arte, como uma tela a óleo com a imagem da própria Leda pintada por Cândido Portinari. Embora as peças façam parte do testamento da matriarca, os herdeiros não sabem onde elas foram parar, e apontam o dedo para Fernando Collor, sabidamente useiro e vezeiro em misturar o que é dele e o que é dos outros.

Depois de ser escorraçado da política no pós-impeachment, Collor voltou-­se para os negócios da família. Em meados dos anos 90, assumiu o controle do grupo, então em boa saúde financeira. Hoje, a Organização Arnon de Mello soma mais de 200 milhões de reais em passivos. De acordo com a PGR, o ex-caçador de marajás de festim usou as empresas da família para lavar R$ 50 milhões, como na compra de um Porsche Panamera, por R$ 550mil, em nome da TV Gazeta. No mês passado, a PGR pediu ao STF a condenação do político a 22 anos e oito meses de prisão por lavagem de dinheiro e corrupção passiva.

As denúncias de irregularidades na distribuição de dinheiro entre os parentes e as acusações de lavagem de dinheiro, ambas ainda sob investigação, são o fio que puxa uma história de relações muito confusas, que não raro terminaram em rompimento. É triste, para dizer o mínimo, a saga da dinastia Collor. O casal Arnon de Mello e Leda Collor formou um clã de poder político e financeiro de longa data. O pai dela foi ministro do Trabalho de Getúlio Vargas, nos anos 30 — antes de voltar-se contra a administração e ser exilado —, além de senador e governador de Alagoas. O dinheiro e o tumulto eram equivalentes dentro do lar. O clima de competição ganhava estímulo dentro de casa, onde a mãe também distribuía carinho de forma desigual. Leopoldo era o favorito na infância, mas na vida adulta ela transferiu o posto de queridinho para Pedro — quando este alavancou as empresas da família, no começo dos anos 90. Feliz, ela tinha feito um testamento em que daria 50% de seu patrimônio a Pedro. Depois que o filho fez as denúncias a VEJA, o documento foi desfeito e D. Leda decidiu testar metade da fortuna às duas filhas mulheres, Ana Luísa, morta em 2013, e Ledinha (ambas sem herdeiros).

Em 1998, outro abalo familiar. Leopoldo emprestou dinheiro ao irmão para a compra do Dossiê Cayman — um calhamaço de documentos falsos para prejudicar FHC. A mutreta foi descoberta, o tucano conseguiu se reeleger e Collor jamais quitou a dívida. Foi o ponto-­final em uma relação de raiva, inveja e competição. Com recursos escassos, os filhos de Leopoldo começaram a andar de transporte público e a comer ovo como “mistura” no almoço e no jantar. Por anos, Leopoldo trabalhou como diretor comercial da Rede Globo no Brasil, frequentando festas chiques regadas a champanhe. Morreu, em 2013, de câncer na garganta, em São Paulo. Não foi feito inventário por uma razão simples: não havia nada em seu nome. Collor impediu o jornal da família de noticiar a morte do irmão.

Fernando Affonso Collor de Mello tem cinco filhos. Arnon e Joaquim, os dois mais velhos, do casamento com a empresária Lilibeth Monteiro de Carvalho, quase não falam com o pai. Dos cinco filhos de Arnon e D. Leda, Fernando e Ledinha são os únicos vivos. Ambos estão rompidos. Apesar do atávico desconforto familiar, os primos buscam reinventar essa narrativa pacificamente. Os filhos mais velhos de Collor são amigos dos herdeiros de Pedro e Leopoldo. Procurado por VEJA, o marajá dos marajás, em nota envida por meio de seus advogados, refutou as acusações de que esconde o patrimônio familiar: “A defesa não vai responder a nenhuma questão relativa às empresas do ex-presidente; isso faz parte da relação entre ele e os sócios, e não faz sentido discutir publicamente”. Como se vê, as desculpas esfarrapadas e a postura arrogante também se repetem.
Passo agora a reproduzir o texto de J.R. Guzzo:

Se existe uma coisa fácil de identificar, no meio deste Brasil tão confuso de hoje, é o sujeito que gosta de ladrão. Falo de gente que manda ou influi em alguma coisa na vida pública — uma “autoridade”, como se diz. A descoberta da turma que dá expediente no Pró-Crime não exige prática nem habilidade. Basta olhar para qualquer dos Três Poderes da República e prestar atenção no seguinte: se a autoridade A, B ou C toma a decisão de mudar daqui para ali a apreciação de qualquer ato de ladroagem, ou o julgamento da conduta de qualquer político, o cidadão já pode ir tirando o cavalo da chuva: a bandidagem de primeira classe conseguiu, mais uma vez, bater lindamente sua carteira — ou, pelo menos, está tentando fazer o possível para isso, e quase sempre leva, quando tenta.

A recente traficância em torno de quem manda no Coaf é um exemplo clássico da primeira modalidade de vigarice que o submundo da “engenharia política” aplica em você. Chega a ser cômico, de tão grosseiro que é, o “modo de usar” manipulado pela politicalha no caso. Que raio pode ser esse Coaf? Uns 99% dos brasileiros não sabem o que é isso, nem querem saber. Mas tenha certeza de que aquele 1% que sabe, porque trabalha no pedaço, sabe extremamente bem o que é esse negócio, para o que serve, como tirar vantagem dele e tudo o mais que se pode imaginar de ruim a respeito. Trata-se de um “Conselho de Controle de Atividades Financeiras” — criado para produzir “inteligência financeira” destinada a combater crimes como a lavagem de dinheiro e o financiamento ao terrorismo. Pois bem: 14 membros de uma Comissão Mista do Congresso, por uma diferença de três votos, decidiram mudar o Coaf “daqui para ali”. Em vez de ficar no Ministério da Justiça, de Sergio Moro, passará para o Ministério da Economia, de Paulo Guedes.

Mas as atividades do Coaf não se ligam muito mais à esfera da Justiça e da polícia do que da economia? Sim, só que ninguém está pensando nisso — o que estão pensando, isso sim, é onde ficaria mais seguro, para eles, encaixar a repartição que vigia a lavagem de dinheiro. Quer dizer que os funcionários da Economia são mais frouxos do que os da Justiça, ou mais dispostos a proteger os criminosos? De jeito nenhum. Não há a menor suspeita de que a equipe de primeira linha montada pelo ministro Guedes possa se meter nesse tipo de coisa. Mas aí é que está: a avacalhação dos políticos brasileiros chegou a tal extremo que qualquer mudança feita por eles levanta automaticamente as piores desconfianças. É como foi dito acima: se mexeram no Coaf, é porque estão atrás de alguma safadeza em seu benefício. O fato de 100% dos deputados e senadores do PT presentes na comissão terem votado a favor da alteração acaba com a conversa: é o selo de garantia definitivo de que a intenção da operação é apoiar a roubalheira.

A segunda modalidade de atuação do Pró-Crime, que muda a esfera onde se julgam os acusados de violar o Código Penal, ficou expressa na também recente decisão do STF, pelo voto decisivo de seu presidente, Dias Toffoli, de mudar para as Assembleias Legislativas o poder real de apreciar os crimes cometidos por deputados estaduais. O Supremo resolveu que eles têm, agora, a mesma “imunidade” dos parlamentares federais. É a ação da “banda podre” do STF, reforçada ultimamente pelo ministro Celso de Mello. De Toffoli, julgado oficialmente, e por duas vezes, sem qualificação mínima para ser juiz de direito, é isso mesmo o que se poderia esperar; ele é um desses casos de “o passado me condena, e o presente também”. De Celso Mello, firma-se a convicção de que a melhor contribuição que pode dar ao país é fazer aniversário no dia 1° de novembro do ano que vem — quando chegará aos 75 anos de idade e terá de ir embora do STF.

Tudo isso é mais um chute nas instituições. Elas vêm sendo destruídas há 30 anos, aliás, como resultado direto da obediência à “Constituição Cidadã” — que foi feita, vejam só, para dar instituições ao Brasil.