MEDIOCRIDADE
ATIVA É UMA MERDA.
Em poucas palavras, a sobrealimentação, principal responsável
pelo downsizing
dos motores, consiste em forçar a entrada de mais oxigênio na
câmara de combustão. Esse efeito pode ser obtido através do aproveitamento dos
gases expulsos da câmara no ciclo de descarga (ou seja, usando uma energia que
seria desperdiçada) ou “pegando carona” na rotação do virabrequim (através de
um sistema de polias e correia que rouba potência do motor para fazer o motor
gerar mais potência). Tanto num caso como no outro, propulsores de capacidades cúbicas reduzidas geram mais torque e potência (conforme o ajuste da pressão do compressor, o ganho de potência pode variar de 50% à 300%), consomem menos combustível e poluem menos a atmosfera.
Observação: Ao nível do mar, 23,14% da massa do ar atmosférico é composta de oxigênio. Para conseguirmos mais massa para o mesmo volume de ar, de duas uma: ou reduzimos a temperatura, ou aumentamos a pressão. Reduzir
a temperatura de admissão de forma que os ganhos sejam significativos requer um
equipamento de grande porte e alto custo. Além disso, temperaturas muito baixas comprometem a vaporização e consequente a homogeneidade da mistura — é
isso que acontece com nossos carros nas manhãs frias de inverno, quando o motor
demora a “pegar” e engasga até a temperatura normal de funcionamento ser alcançada. Portanto, a solução mais viável é aumentar a pressão, e é aí que entram os compressores. Em linhas gerais, eles comprimem o ar que está sendo admitido e o
enviam para os cilindros com maior densidade, permitindo que mais combustível
seja injetado e mais potência seja gerada.
A ideia da sobrealimentação
surgiu no século XIX, mas foi somente em 1905 que o suíço Alfred Büchi descreveu o turbo, em sua patente, como “uma máquina
reciprocante na qual a energia cinética dos gases de escape moveria um eixo ligado
a uma turbina, que serviria como pré-compressor para o ar admitido pelos
cilindros” — aliás, uma definição exata de como funcionam os turbocompressores atuais.
Inicialmente, o sistema era usado apenas em motores de grande deslocamento
volumétrico, como os de navios, trens e aviões — nestes últimos, além de aumentar
a potência, o turbo minimizava os efeitos da rarefação do ar em grandes
altitudes. Na indústria automobilística, depois de estrear em motores a diesel
de caminhões, essa inovação chegou às pistas quando a Cummins inscreveu nas 500 Milhas de Indianápolis um carro com motor
turbodiesel (ele não venceu a prova, mas percorreu todas as 500 milhas sem
parar nos pitstops). Nos veículos de passeio, o primeiro modelo “turbinado” foi o Chevrolet Corvair Monza Spyder, cujo flat-6 de 2.4 litros,
auxiliado pelo turbocompressor, produzia 151 cv.
Se fôssemos detalhar o funcionamento do compressor mecânico
e do turbo, jamais terminaremos esta sequência de postagens. Então, resumindo a história em poucas palavras, o compressor mecânico fornece torque de
forma mais linear do que o turbo, além de não estar sujeito ao turbo lag — “atraso” decorrente do tempo que a turbina demora para “encher” e gerar pressão positiva
no coletor de admissão, e que pode culminar com um indesejável tranco.
Observação: A última vez
que eu ouvi falar em compressor mecânico
em veículos nacionais foi quando a Ford
lançou o Fiesta 1.0 Supercharger, em
2002, com um compressor mecânico que aumentava sua potência de 65 cv para 95 cv a 6.000 rpm, e o torque, de 8,9
kgfm a 3.650 rpm para 12,6 kgfm a 4.250 rpm. Se na versão aspirada o
carrinho demorava 18,2 segundos para ir de 0 a 100 km/h e atingia 150 km/h de
velocidade máxima, na Supercharger
ele alcançava 100 km/h em 13 segundos e atingia respeitáveis 176 km/h de
velocidade máxima. Todavia, devido ao tamanho avantajado do compressor mecânico
e o estresse a que o motor era submetido pelo uso de correia e polias levaram a Ford a abandonar o Supercharger. Hoje em dia, esses compressores são usados apenas em
motores grandes, como os V8 5.0 e V6 3.0 da Jaguar Land Rover, o V8 6.2
LT4 do Chevrolet Camaro e o V8 5.0 do Mustang Shelby, cujo público alvo prioriza o desempenho sem se preocupar com custo e
consumo mais elevados.
Voltando ao downsizing, a combinação da injeção
direta com a sobrealimentação permitiu o desenvolvimento de motores mais econômicos
e capazes de entregar torque constante a partir de baixíssimas rotações. Nos
modelos com turbo nativo (ou seja, instalado “de fábrica”), nem se ouve mais o
tradicional “espirro” produzido pela válvula de alívio da pressão quando se
tira o pé do acelerador, pois o excesso de ar é redirecionado para o coletor de
admissão ou para o filtro de ar. Por outro lado, o indesejável turbo lag, continua presente, razão
pela qual algumas montadoras vêm optando pelo turbo elétrico, como é o caso da Audi com o SQ7 e-turbo (foto).
No turbo
convencional, o movimento da turbina
(caixa quente), que é acionada pelos gases provenientes do coletor de escape do motor,
é transferido por um eixo a um compressor
(caixa fria), o que aumenta a pressão do ar (ar limpo) que entra no coletor
de admissão. O problema é que em baixas rotações o gases são insuficientes para alimentar satisfatoriamente o compressor, e assim se
dá o turbo-lag.
No turbo elétrico, em vez da caixa quente
acionada pelos gases, um motor elétrico faz funcionar o compressor (independentemente
da rotação do motor) que trabalha em conjunto com outros dois turbocompressores convencionais,
um de baixa pressão e outro de alta pressão. O primeiro fôlego é dado pelo e-turbo, que atua em regimes de giro
baixos e médios. Quando os gases resultantes da explosão da mistura
ar-combustível passam a acionar plenamente os turbos convencionais, o e-turbo aproveita fluxo de ar que passa
por ele para gerar energia elétrica, aumentando a eficiência do motor de 15% a
20%.
Observação: O e-turbo é um voraz consumidor
de energia. Em momentos de pico, ele necessita de até 7 kW (equivalente a 5
secadores de cabelo ligados ao mesmo tempo), potência que, num sistema
convencional de 12 V, precisaria de 583 A para ser gerada. Assim, a Audi optou por vincular a turbina a um
sistema de 48 V, que gera a mesma potência com apenas 145 A. A energia
recuperada pelo e-turbo vai para uma bateria dedicada, mas pode ser aproveitada
pelo sistema de 12 V que alimenta o restante do veículo com o auxílio de um
conversor.
O deslocamento volumétrico do
motor é apenas um dos responsáveis pelo torque e potência que ele produz, e a
sobrealimentação é apenas uma das maneiras de se obter esse resultado. Outra opção que merece algumas linhas é a sobrealimentação química, como é o caso do “Nitro”, que é usado para gerar mais em
provas de arrancada e de velocidade.
O processo consiste em injetar óxido nitroso
(N₂O) na corrente de
admissão — quando aquecido
a aproximadamente 300°C, o “gás do riso” sofre a dissociação de suas moléculas
e libera oxigênio (que representa 36% da sua massa). Somado ao combustível extra injetado, esse aumento de oxigênio faz com que a combustão da mistura
comprimida pelo pistão gere mais energia. E como está liquefeito
sob pressão dentro de uma garrafa, esse gás muda de estado e sofre uma queda sensível de temperatura ao passar pelo difusor e encontrar uma
pressão ambiente muito mais baixa. Com isso, todo o fluxo admitido também sofre
resfriamento, e o resultado é um considerável aumento de densidade. E como a densidade está
diretamente ligada ao ganho de potência...
Para desespero dos puristas, os enormes V8 de
antigamente deram lugar aos V6, e estes vem sendo progressivamente substituídos
por propulsores de 4 ou 3 cilindros, com cilindradas de 1000 CC a 1.600 CC, mas
com torque e potência de sobra, maior economia de combustível e menor emissão de poluentes.
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mesmo.