Mostrando postagens classificadas por data para a consulta ponte para o futuro. Ordenar por relevância Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens classificadas por data para a consulta ponte para o futuro. Ordenar por relevância Mostrar todas as postagens

sexta-feira, 4 de outubro de 2024

A CAIXA DE PANDORA — O MITO E A REALIDADE

NÃO ESPEREIS O JUÍZO FINAL; ELE SE REALIZA TODOS OS DIAS.

 

"Abrir a Caixa de Pandora" é uma metáfora para ações que desencadeiam consequências maléficas e irreversíveis. 

Segundo a mitologia grega, Pandora ("aquela que tem todos os dons") foi criada por Hefesto e Palas Atena a mando de Zeus, que queria castigar Prometeu ("aquele que pensa antes") por roubar o fogo dos deuses e dá-lo aos homens. 

Depois de ganhar um dom de cada divindade de Olimpo, Pandora recebeu de Zeus uma caixa que jamais deveria ser aberta e a missão de seduzir Epimeteu ("aquele que pensa depois"). Encantado com a beleza da moça e ignorando as advertências do irmão, Prometeu, sobre aceitar presentes do deus dos deuses, Epimeteu tomou a moça como esposa (e eu que achava que "presente de grego" tinha a ver com a lenda do Cavalo de Troia). 
 
Quando criou a mulher, Deus também criou a curiosidade. A curiosidade levou Pandora a abrir a caixa e libertar todos os males que recaíram sobre a humanidade. Mas a esperança, que é "a última que morre", ficou presa no fundo da caixa, talvez para nos dar forças para lutar contra as adversidades, mesmo que o mal muitas vezes vença o bem.
 
Revisito essa fábula por três motivos: 1) sempre gostei de mitologia; 2) muita gente usa essa metáfora sem saber sua origem; 3) insistir no erro esperando produzir um acerto é a melhor definição de imbecilidade que eu conheço. 
 
Em momentos distintos da ditadura, Pelé e o general Figueiredo alertaram para o perigo de misturar brasileiros com urnas em eleições presidenciais. Ambos foram muito criticados, mas o tempo provou que eles estavam certos. O eleitores fazem nas urnas, a cada dois anos, o que Pandora fez uma única vez. Só que não por curiosidade, e sim por ignorância. E como ensinou o Conselheiro Acácio (personagem do romance O Primo Basílio), as consequências vêm sempre depois. 
 
A ditadura militar resultante do golpe de 1964 durou 21 longos anos. A reabertura, lenta e turbulenta, não se deveu ao "espírito democrático" dos presidentes-generais Geisel e Figueiredo, mas ao ronco das ruas e à pressão da imprensa, que se intensificaram em 1984, depois que uma manobra de bastidor sepultou a emenda Dante de Oliveira

Em janeiro do ano seguinte, Tancredo Neves derrotou Paulo Maluf por 480x180 votos de um colégio eleitoral formado por 686 deputados, senadores e delegados estaduais. A exemplo da Viúva Porcina (aquela que foi sem nunca ter sido), Tancredo entrou para a história como nosso primeiro presidente civil desde João "Jango" Goulart, mas baixou ao hospital horas antes da cerimônia de posse e morreu 38 dias e 7 cirurgias depois.

A raposa mineira levou para a sepultura a esperança de milhões de brasileiros e deixou de herança um neto que envergonharia o país e um mix de puxa-saco dos militares, oligarca da politica de cabresto nordestina, escritor, poeta e acadêmico que se chamava José Ribamar Ferreira de Araújo Costa, mas era conhecido como José Sarney

Sem o carisma e o traquejo administrativo do finado, Sarney tentou descascar o formidável abacaxi econômico (inflação, dívida externa e desemprego nas alturas) através de uma série de pacotes de medidas econômicas baseadas no congelamento de preços e salários. Ao final de sua aziaga gestão, a inflação estava em 4.853% ao ano, mas os prefeitos haviam voltado a ser eleitos diretamente, a Constituição Cidadã fora promulgada (aumentando de 4 para 5 a duração de seu mandato) e a primeira eleição presidencial direta desde 1960, realizada.   
 
Em 15 de novembro de 1989, o cardápio de postulantes ao Planalto oferecia 22 opões, incluindo Ulysses Guimarães, Mário Covas e Leonel Brizola. E o que fez esclarecido eleitorado ao quebrar o jejum de urna de 29 de urna? Escalou Lula e Fernando Collor para disputar o 2º turno. O caçador de marajás de mentirinha venceu o desempregado que deu certo, mas o envolvimento no esquema PC lhe rendeu um impeachment.
 
Observação: Em maio do ano passado, o STF condenou Collor a 8 anos e 10 meses de reclusão, mas ele continua livre, leve e solto graças a um pedido de vista apresentado pelo ministro Dias Toffoli na véspera do último carnaval. Em contrapartida, qualquer "reles mortal" que acessar o Xwitter durante a suspensão ordenada pelo ministro Alexandre de Moraes corre o risco de ser multado em R$ 50 mil. Dá para acreditar numa coisa dessas?
 
Com a deposição do Rei-Sol, o baianeiro e namorador Itamar Franco foi promovido a titular, nomeou Fernando Henrique ministro da Fazenda e editou o Plano Real, cujo sucesso pavimentou o caminho que levou o grão-duque tucano a vencer o pleito presidencial de 1994 no 1º turno. Em 1997, picado pela mosca azul, sua alteza comprou a PEC da reeleição

Como quem parte, reparte e não fica com a melhor parte é burro ou não tem arte, o tucano de plumas vistosas disputou a reeleição em 1998 e foi eleito no 1º turno, mas em 2002, sem novos truques para tirar da velha cartola, não conseguiu eleger seu sucessor.
 
Após três derrotas consecutivas, Lula venceu José Serra e deu início aos 13 anos, 4 meses de 12 dias de lulopetismo corrupto que só foi interrompidos em 2016, com o impeachment de Dilma Rousseff, a inolvidável gerentona de araque

Num primeiro momento, a troca de comando pareceu uma lufada de ar fresco numa catacumba: depois de mais de uma década ouvindo garranchos verbais de um ex-retirante semianalfabeto e frases desconexas de uma mandatária incapaz de juntar lé com cré numa frase que fizesse sentido, ter um presidente que sabia falar – e que até usava mesóclises – era um refrigério.
 
Temer conseguiu reduzir a inflação (que havia retornado firme e forte sob Dilma) e aprovar o Teto de Gastos e a Reforma Trabalhista, mas seu prometido "ministério de notáveis" se revelou uma notável agremiação de corruptos e sua "ponte para o futuro", uma patética pinguela. 

A conversa de alcova gravada à sorrelfa por Joesley Batista só não derrubou o vampiro do Jaburu porque sua tropa de choque – capitaneada pelo deputado Carlos Marun – comprou votos das marafonas da Câmara para escudá-lo das "flechadas de Janot". Apesar do desgaste, o nosferatu claudicou como "pato manco" até o final do mandato-tampão e transferiu a faixa para Jair Bolsonaro. 
 
Sem a proteção do manto presidencial, o vampiro que tinha medo de fantasma chegou a ser preso, mas foi socorrido pelo desembargador Ivan Athié, então presidente da 1ª Turma do TRF-2, que havia sido afastado do cargo durante 7 anos por suspeitas de corrupção e venda de sentenças, mas fora reintegrado em 2011, quando o STF trancou o processo contra ele. E viva a Justiça brasileira!
 
Ao acompanhar o golpe de Estado que levou Napoleão III ao poder, Karl Marx concluiu que a história acontece como tragédia e se repete como farsa. O Barão de Itararé dizia que político brazuca é um sujeito que vive às claras, aproveita as gemas não despreza as cascas, e o saudoso maestro Tom Jobim (que era brasileiro até no nome), ensinou que o Brasil não é para principiantes. E com efeito. 
 
Em 2018, havia 13 postulantes ao Planalto. Nenhum deles empolgava, é verdade, mas por que se arriscar a acertar com Geraldo Alckmin, Álvaro Dias, Henrique Meirelles ou João Amoedo quando se podia pode errar com certeza escalando para o embate final um mau militar e parlamentar medíocre travestido de "outsider antissistema" e um patético bonifrate do então ex-presidiário mais famoso do Brasil?

Em 2022, as opções era ainda menos atraentes, sobretudo depois que o "establishment" eliminou Sergio MoroJoão Dória e Eduardo Leite da quimérica "terceira via". Mas, de novo, por que correr o risco de acertar votando em Simone Tebet, em Felipe D'ávilaou mesmo em Ciro Gomes (situações desesperadoras justificam medidas desesperadas) quando se podia errar com certeza despachando Lula e Bolsonaro para o 2º turno?
 
Tanto num caso como no outro a maldita polarização fez com que tanto a merda quanto as moscas fossem as mesmas. A diferença foi que em 2018 a parcela minimamente pensante do eleitorado se viu obrigada a apoiar o ex-capitão para evitar que o país fosse presidido pelo fantoche do presidiário, e em 2022, embarcar na falaciosa "Frente Democrática", capitaneada pelo então ex-presidiário "descondenado" para evitar mais 4 anos (ou sabe Deus quantos) sob a batuta do refugo da escoria da humanidade.
 
Há males que tempo cura e males que vêm para pior e com o passar do tempo. Lula 3.0 é uma reedição piorada das versões 1 e 2, e como como nada é tão ruim que não possa piorar, o macróbio petista cogita disputar a reeleição em 2026 (que os deuses nos livrem tanto dessa desgraça quanto da volta do capetão-golpista).
 
As consequências da inconsequência do eleitorado tupiniquim são lamentados todos os dias, inclusive por quem abriu a Caixa de Pandora achando que estava escolhendo o menor de dois males, mas isso só se justifica quando e se não há outra opção. E tanto em 2018 quanto em 2022 havia alternativas; só não viu quem não quis ou não conseguiu porque sofre do pior tipo de cegueira que existe. 
 
Observação: Um levantamento feito pelo portal g1 apurou que 61 pessoas com mandados de prisão em aberto (leia-se fugitivos da polícia) se candidataram a prefeito ou a vereador nas eleições deste ano. A maioria dos casos envolve dívida de pensão alimentícia, mas há suspeitos de estelionato, roubo, homicídio e estupro. 
 
Reza uma velha (e filosófica anedota) que Deus estava distribuindo benesses e catástrofes naturais pelo mundo que acabara de criar, quando um anjo apontou para o que seria futuramente o Brasil e perguntou: "Senhor, por que destinastes a essa porção de terra clima ameno, praias e florestas deslumbrantes, grandes rios e belos lagos, mas não desertos, geleiras, vulcões, furações ou terremotos?" E Deus respondeu: "Espera para ver o povinho filho da puta que vou colocar aí."
 
Políticos incompetente e/ou corruptos que ocupam cargos eletivos não brotam nos gabinetes por geração espontânea; se eles estão lá, é porque foram eleitos por ignorantes polarizados, que brigam entre si enquanto a alcateia de chacais se banqueteia e ri da cara deles. 
 
Einstein achava que o Universo e a estupidez humana eram infinitos, mas salientou que, quanto ao Universo, ele ainda não tinha 100% de certeza. Alguns aspectos de suas famosas teorias não sobreviveram à passagem do tempo, mas sua percepção da infinitude da estupidez humana merece ser bordada com fios de ouro nas asas de uma borboleta. 
 
Não há provas de que boas ações produzam bons resultados – a "lei do retorno" é mera cantilena para dormitar bovinos – mas sabe-se que más escolhas costumam gerar péssimas consequências, como prova e comprova a história desta republiqueta de bananas: nossa independência  foi comprada, a Proclamação da República foi um golpe militar (o primeiro de muitos), o voto é um "direito obrigatório", nossa democracia é uma piada e o sistema político está falido. 
 
Desde 1889, 35 brasileiros alcançaram a Presidência pelo voto popular, eleição indireta, linha sucessória ou golpe de Estado (o número depende de como alguns casos específicos, como presidências muito breves ou interinas, mas isso não vem ao caso neste momento). Oito integrantes dessa seleta confraria – começando pelo primeiro, Deodoro do Fonseca – deixaram o cargo prematuramente, e dos cinco que foram eleitos pelo voto direto desde a redemocratização, dois acabaram impichados. 

Dos mais de 30 partidos políticos que mamam nas tetas dos fundos eleitoral e partidário (ou seja, são bancados pelo suado dinheiro dos "contribuintes"), nenhum representa os interesses da população, e alguns são verdadeiras organizações criminosas. 

O Brasil de hoje lembra aquelas fotos antigas de reis africanos, que imitavam os trajes e trejeitos dos governantes de nações mais evoluídas e recebiam aulas de civilização dos oficiais do Império Britânico, mas achavam que para se transformar em soberanos civilizados bastava copiar as vestes e adereços daqueles que lhes falavam das maravilhas da Rainha Vitória ou de Napoleão III. 

O resultado se vê nas fotografias. As mais clássicas mostram negros magros, ou gordíssimos, com uma cartola de segunda-mão na cabeça, calças rasgadas ou remendadas, pés descalços ou calçados com uma bota só, velha e sem graxa. Imaginavam-se nobres, esses coitados, iguais a seus pares europeus, mas, junto com as novas roupas e os acessórios, continuavam usando colares feitos de ossos, pulseiras de metal e argolas na orelha ou no nariz, enquanto eram roubados até o último papagaio pelos que supostamente vieram ensiná-los a ter valores cristãos, avançados e democráticos.
 
O Brasil aparece na foto como uma democracia de Primeiro Mundo, mas a realidade do dia a dia mostra pouco mais que uma cópia barata e malsucedida do artigo legítimo. Nossas eleições são subordinadas a todo tipo de patifaria, do voto obrigatório ao anacrônico horário eleitoral "gratuito", passando por deformações propositais que entopem a Câmara Federal com políticos das regiões que têm meia dúzia de eleitores. 

O resultado é um monumento à demagogia, à corrupção e à estupidez. Acordos políticos são urdidos na surdina por parlamentares que votam com base em seus interesses pessoais. Milícias e fações criminosas têm representantes no Congresso, nas Assembleias Legislativas estaduais e nas Câmaras Municipais. Candidatos só entram em algumas regiões se tiverem proteção dos criminosos, e os moradores são "convidados" a votar na "turma da casa".
 
Os direitos dos cidadãos representam a área mais notável das semelhanças com reis africanos. Nunca houve tantos direitos escritos nas leis nem o poder público foi tão incompetente para mantê-los. O Congresso não representa o povo que o elegeu para tal, e há uma recusa sistemática em combater o crime por parte de nove entre dez políticos com algum peso. Com quase 50 mil assassinatos por ano, o Brasil é um dos países onde a vida humana tem menos valor. 
 
Se nossas instituições funcionassem – e suas excelências não se cansam de dizer que elas funcionam –, a Câmara teria aberto pelo menos um dos quase 150 pedidos de impeachment contra Bolsonaro, e o Centrão não teria transformado a ocupação do Orçamento num processo de bolsonarização das instituições. Pode passar pela cabeça de alguém que exista democracia num país como esse? 
 
Quando nossos nobres parlamentares perderam a credibilidade e o mais alto cargo do funcionalismo público federal passou a ser ocupado por uma sequência de mandatários que, noves fora Fernando Henrique — já foram presos ou respondem a processos criminais, o Judiciário se tornou nosso último bastião. Mas faz tempo que as opiniões e os vieses político-partidários dos eminentes togados (que deveriam ser isentos, imparciais e apartidários) se tornaram públicos e notórios.
 
O Supremo poderia nos ter livrado do aspirante a golpista em diversas oportunidades (motivos para tal não faltaram), mas as excelências que tudo decidem – do destino dos presidentes ao furto de codornas — acharam melhor dar tempo ao tempo, apostando na sapiência inigualável dos eleitores. 

É fato que Alexandre de Moraes impediu a consumação do golpe, mas também é fato que ele já deveria ter tirado de circulação o "mito" dos extremistas de direita, que mesmo inelegível até 2030 faz pose de cabo eleitoral de luxo e articula com seus comparsas no Congresso uma improvável (mas não impossível) anistia a si e aos golpistas do 8 de janeiro. 
 
Como o chanceler Charles De Gaulle não disse, mas a frase lhe é atribuída, "le Brésil n’est pas un pays serieux". 
 
Continua...

quinta-feira, 28 de março de 2024

DE VOLTA AO BIG BANG ETC. — CONTINUAÇÃO

NEM TODAS AS VERDADES SÃO PARA TODOS OS OUVIDOS E NEM TODAS AS MENTIRAS PODEM SER RECONHECIDAS COMO TAIS.

Governos devem se preocupar com os preços dos alimentos, mesmo que essa preocupação se deva à queda da popularidade do presidente. O empenho de Lula em tentar conter a carestia geral, que visa reduzir danos pessoais.  pode melhorar as coisas, mas não resolve o problema, já que a perda de prestígio do presidente não se deve unicamente a questões econômicas. 
Nos dois reinados anteriores, as pesquisas qualitativas captavam na seguinte resposta um dos — senão o principal — motivos do sucesso de público: "Os alimentos estão baratos". Mas  nos tempos de antanho o petista tinha a vida facilitada pelo ambiente internacional e, internamente, por uma de punhos de seda. Lidar com a meiguice do PSDB de Fernando Henrique — o vilão que lhe deixou a suposta herança bendita — era pinto diante da ferocidade da extrema-direita bolsonarista troglodita. 
Lula sem filtro sempre existiu; o que mudou foi o grau de tolerância com a personagem que, para piorar, acrescentou ressentimento e adicionou doses cavalares de onipotência a seu desempenho. Sendo ele quem é, não se espera expiação pública, mas seria conveniente que, em suas conversas com o travesseiro, reconhecesse que o ego entumecido e a língua sem tramela têm culpa nesse cartório. Em não o fazendo, corre o risco de ficar prisioneiro das garras do autoengano e ver seu tão sonhado quarto mandato cair da ponte que partiu.

Diferentemente dos buracos negros, que, como vimos, já foram observados e fotografados, os buracos brancos carecem de comprovação científica. Supõe-se que eles sejam regiões do espaço-tempo e da singularidade que funcionam de maneira oposta à dos buracos negros. Se nem a luz escapa de um buraco negro, nada entra num buraco branco, e de onde nada entra, nada pode sair. Mas a astrofísica está longe de ser uma ciência exata, e é justamente essa característica que a torna tão cativante.
 
Muitos astrofísicos sustentam que o buraco branco é uma espécie de regressão no tempo de um buraco negro, e que a singularidade que originou o Big Bang é o melhor exemplo disso. Mas há quem diga que esses "buracos negros invertidos" nunca foram observados de fato e, portanto, não existem — a esta altura vale lembrar Carl Sagan: "A ausência de evidências não é evidência de ausência". 
 
Se um buraco negro "engole" tudo que se aproxima de seu horizonte de eventos em um universo, um buraco branco "vomita" essa matéria em outro universo. Assim, se a matéria do Big Bang for mesmo aquilo que um buraco negro de outro universo engoliu, e que a informação dessa matéria não se perdeu, a existência de universos paralelos é viável à luz da entropia, até porque a energia escura é na verdade a força com que um buraco branco despejou a matéria do outro lado da singularidade, gerando um novo universo.
 
Observação: A maior parte da energia no universo é composta por matéria escura e energia escura, sendo esta última a responsável por mais de 70% da energia total e pela aceleração da expansão cósmica. 
 
entropia é uma grandeza da termodinâmica que mede a evolução dos sistemas de um estado de ordem para desordem. No que tange à passagem de tempo, ela não só explica as mudanças quânticas de um sistema como comprova o próprio tempo como fisicamente real. Em tese, é impossível revertê-la, pois a desordem das partículas aumenta progressivamente num processo unidirecional. 

Da mesma forma que um cubo de gelo não pode "recongelar" dentro de um copo, não se pode voltar no tempo, pois as coisas vão de um estado organizado para um estado desordenado conforme o tempo avança. Isso significa que podemos explicar o passado com as informações em um sistema, mas não podemos prever o futuro, já que, em tese (*), a entropia sempre aumenta e o tempo sempre segue adiante. 
 
(*) Se a quantidade de entropia produzida em um evento for suficientemente pequena, ela pode reverter o tempo, já que o princípio da superposição quântica admite dois estados sobrepostos em um sistema (como na teoria do Gato de Schrödinger). Via de regra, o tempo é um parâmetro sempre crescente, mas, aplicado às setas do tempo, essa teoria sugere que os sistemas quânticos podem evoluir simultaneamente em ambas as direções temporais.
 
A possibilidade de voltar no tempo nos leva de volta (sem trocadilho) aos buracos de minhoca, que, como foi dito em outras postagens, são uma espécie de túnel que interliga dois pontos no espaço-tempo. Teoricamente, isso permitiria que uma espaçonave entrasse por uma boca e saísse pela outra logo depois, ou seja, que percorresse milhares de anos-luz em minutos e chegasse a galáxias diferentes, neste ou em outro universo, no presente ou em outro ponto da linha do tempo.

Ao contrário dos buracos negros — cuja existência já foi comprovada —, os buracos de minhoca permanecem no campo das teorias. Mas se eles forem tão comuns quanto as estrelas e possuírem entradas com raios entre 100 e 10 milhões de quilômetros, como acreditam alguns astrofísicos, detectá-los é apenas uma questão de tempo. 
 
Continua...

sexta-feira, 16 de fevereiro de 2024

ACABOU O CARNAVAL



Costuma-se dizer no Brasil que o ano começa depois do Carnaval, e que o bom humor dos brasileiros termina na Quarta-Feira de Cinzas — isso quando sobrevive até lá. Mas vamos por partes.

Em 2016, o impeachment de Dilma foi como uma lufada de ar fresco numa catacumba: depois de 13 anos ouvindo garranchos verbais de um ex-retirante semianalfabeto e frases desconexas de uma gerentona de araque, ter um presidente que sabia falar e até usava mesóclises foi um refrigério. Temer conseguiu baixar a inflação e aprovar o Teto de Gastos e a Reforma Trabalhista, mas seu "ministério de notáveis" revelou-se uma notável agremiação de corruptos e sua "ponte para o futuro", uma patética pinguela. Como se não bastasse, uma conversa de alcova nos porões do Jaburu só não o derrubou porque as marafonas da Câmara, que o escudaram das "flechadas de Janot". 
 
O fim de "dois mil e dezechega" trouxe um alívio efêmero, pois 2017 começou com rebeliões em presídios, greve na PM e a morte de Teori Zavascki. Na sequência, houve de tudo um pouco: de incêndio criminoso em creche e massacres em escolas a escândalos políticos e uma série extraordinária de desastres naturais. 

O ano seguinte começou com intervenção federal no RJ e greve de caminhoneiros. Em abril, a prisão de Lula foi uma vitória da Lava-Jato no combate à corrupção, mas também acirrou a polarização e fortaleceu o combo de um mau militar e parlamentar medíocre que, surfando no antipetismo e usando o episódio da facada como pretexto para não ir aos debates, derrotou o bonifrate do então presidiário mais famoso do Brasil. 
 
Na condição de refém da Câmara, Temer terminou seu mandato-tampão como "pato manco" (como os americanos se referem a políticos que chegam ao fim do mandato desgastados a ponto de os garçons palacianos demonstrarem seu desprezo servindo-lhes o café frio) e entregou a faixa presidencial àquele que se tornaria o pior mandatário tupiniquim desde Tomé de Souza

Noves fora os bolsomínions — um bando de imbecis travestidos de militantes comandados por um imbecil travestido de presidente —, pouca gente acreditava que Bolsonaro faria um bom governo, mas quase ninguém imaginava que tê-lo no timão da Nau dos Insensatos seria como enfrentar, a um só tempo e de uma só vez, as Sete Pragas do EgitoAo longo de longos quatro anos, o mito dos patriotas de fancaria se esmerou em manifestações golpistas, negacionistas e anticientíficas. Enquanto a "gripezinha" produzia cadáveres em escala industrial, o "presidentezinho" ria e dizia: "E daí?" 

Observação: Não fosse o Brasil uma republiqueta de bananas, Bolsonaro ter-se-ia sagrado cavaleiro da Ordem dos Impichados, presidida pelo caçador de marajás de araque e secretariada pela nefelibata da mandioca. Créditos para tal não lhe faltavam; o que faltou foi Rodrigo Maia, Arthur Lira e Augusto Aras fazerem o que determina a Constituição de 1988.
 
O cenário atual provavelmente seria outro se o capitão-sacripanta não conspirasse diuturnamente contra a democracia, não se associasse ao coronavírus, não investisse contra a imprensa, o Congresso e o STF, não andasse de mãos dadas com Fabrício QueirozCarla Zambelli e milicianos da pior espécie. Enfim, de nada adianta chorar sobre o leite derramado — como ensinou a mulher sapiens, "depois que a pasta de dente sai do dentifrício, ela não volta pra dentro do dentifrício". Mas não há nada como o tempo para passar.
 
À luz do que já se sabe da operação Hora da Verdade, o autoproclamado imbrochável incomível será processado, julgado e mandado para o xilindró. Dificilmente ficará preso pelo tempo que deveria, já que o Brasil é um país de muitas leis e nenhuma vergonha na cara, o que favorece escandalosamente a impunidade dos poderosos. 

ObservaçãoLula escapou do Mensalão, tropeçou no Petrolão, foi réu em duas dezenas de ações criminais e condenado (em duas, sendo que uma delas transitou em julgado no STF) a mais 25 anos de reclusão. Como todo povo de merda tem o governo e a justiça de merda que merece, o dito-cujo gozou míseros 580 dias de férias compulsórias e, no espaço de poucos meses, foi "descondenado", reabilitado politicamente e reinserido no tabuleiro da sucessão presidencial por togas camaradas, pois era preciso (e era mesmo!) penabundar o verdugo do Planalto (como ensinou Maquiavel, "o fim justifica os meios"). 

Encurralado, Bolsonaro toca seu gado rumo à mais paulista das avenidas. O real objetivo do "ato pacífico em defesa do estado democrático de direito" é intimidar o STF. A parte em que o capitão diz "não compareçam com qualquer faixa ou cartaz contra quem quer que seja" se deve ao receio de ser preso se for flagrado liderando pregações golpistas. Ademais, para "se defender das acusações" existe um foro adequado. 
  
Até agora, o chamado não animou a maioria dos líderes políticos que estiveram com ele na eleição de 2022. Sondados pela Folha, apenas 3 confirmaram presença e 4 disseram que não irão. Os demais não se pronunciaram ou disseram que ainda não têm uma definição de agenda para a data. O governador de São Paulo — eleito com o apoio do ex-presidente e, enquanto ministro da Infraestrutura, endossou a postura negacionista do chefe — já confirmou presença. 

Qualquer que seja o número de participantes, os bolsonaristas dirão que o sucesso foi retumbante. Numa das célebres motociatas, eles contabilizaram 1,3 milhão de motos e disseram que o evento entrou para o Guinness. Acabou que o sistema de monitoramento de pedágios da rodovia dos Bandeirantes registrou a passagem de 3.703 motos e veículos engajados na manifestação pelas praças de pedágio de Campo Limpo, Itupeva e Sumaré. 

Observação: O número citado pelo departamento de propaganda bolsonarista era superior à frota de motocicletas, motonetas e ciclomotores da cidade de São Paulo (que era de 1.260.276 veículos, segundo fontes oficiais). Para reunir 1,3 milhão de motos, os organizadores precisariam de 62% de toda a frota dos 39 municípios da região metropolitana de São Paulo — ou 22% da frota de todo o Estado, que correspondia a 6.015.445 de motos e assemelhados. 

Caso seja processado e condenado pelos crimes de tentativa de golpe de Estado, de abolição do EDD e de associação criminosa, Bolsonaro pode pegar uma pena de até 23 anos de prisão e ficar inelegível por mais de 30 anos.
 
Continua...

sábado, 13 de janeiro de 2024

O 8 DE JANEIRO E A POLARIZAÇÃO (CONTINUAÇÃO)


Sir Winston Churchill ensinou que "a democracia é a pior forma de governo, salvo todas as demais formas que têm sido experimentadas de tempos em tempos", e que "o melhor argumento contra a democracia é uma conversa de cinco minutos com um eleitor mediano." Anthony Downs ensinou que ganha a eleição quem conquista o eleitor mediano, pois os candidatos de esquerda e direita têm garantidos os votos dos eleitores que comungam de suas convicções político-ideológicas.
 
Conhecido como Teorema do Eleitor Mediano, esse axioma vicejou no Brasil de 1994 até 2014, quando então a reeleição de mulher sapiens gerou uma polarização que vazou da política para as ruas. Em 2016, a insatisfação popular deu azo ao impeachment da gerentona de araque e à ascensão de Michel Temer, que prometeu um ministério de notáveis e empossou uma notável confraria de corruptos. Sua "ponte para o futuro" era de vidro e se quebrou quando O Globo publicou uma conversa de alcova gravada à sorrelfa por certo moedor de carne bilionário travestido de x-9. 
 
Alvo de três "Flechadas de Janot" — o PGR que mais adiante reconheceu ter ido armado ao STF para matar o semideus togado e se suicidar —, 
vampiro que tem medo de fantasma empenhou nossas cuecas em troca de apoio das marafonas do Centrão, mas terminou sua gestão como um patético "lame duck" — termo usado pelos americanos para definir políticos que chegam tão desgastados ao final do mandato que até os garçons demonstram seu desprezo servindo-lhes o café frio.
 
Como desgraça pouca é bobagem, desse caldeirão infernal emergiu o amálgama mal ajambrado de mau militar e parlamentar medíocre que, em 2018, fantasiado de outsider antiestablishment e surfando na onda do antipetismo, impôs ao títere
 do então presidiário mais famoso do Brasil uma derrota acachapante. 
 
Observação: Como eu antecipei numa postagem de novembro de 2021, a maldita polarização transformou o pleito de 2022 em mais plebiscito, obrigando-nos (mais uma vez) a escolher o menor de dois males (lembrando que toda má escolha feita por falta de alternativa continua sendo uma má escolha). E não há nada como o tempo para passar. 
 
Sétimo filho (noves fora quatro que "não vingaram") de um casal de lavradores pernambucanos pobres e analfabetos, Luiz Inácio da Silva nasceu em 1945, conheceu o pai aos 5 anos e retirou para São Paulo aos 7, em 1952, onde morou com o pai, a mãe e os irmãos até que uma surra de mangueira levou dona Lindú a deixar o marido alcoólatra, rude e ignorante e se mudar para um cubículo nos fundos de um boteco do bairro paulistano do Ipiranga, onde Lula trabalhou como auxiliar de tinturaria, engraxate e office-boy até se formar torneiro mecânico e perder o dedo mínimo da mão esquerda num acidente pra lá de suspeito. 
 
Observação: Vale destacar que Aristides Inácio da Silva — que foi alcunhado de "homem das sete mulheres" pelos colegas estivadores, morreu de cirrose em 1978 e foi enterrado numa vala comum: nem dona Lindú, nem as amantes, nem os vinte e tantos filhos que ele espalhou Brasil afora lhe deram um túmulo e um epitáfio. 
 
Estimulado pelo irmão Frei Chico (que não era frade, mas ateu, não se chamava Francisco, mas José, e era membro do Partido Comunista Brasileiro), Luiz Inácio iniciou sua trajetória de sindicalista e ganhou o apelido pelo qual é conhecido até hoje, mas que só incorporou depois de fundar o PT e de ficar em 4º lugar na primeira eleição direta (pós-ditadura) para governador de São Paulo. 

Falando em apelidos, Brizola — que chamava Lula de "cachaceiro" — disse em 1989 que "política é a arte de engolir sapos" — daí o epíteto "sapo barbudo". Em 2002, quando se elegeu presidente pela primeira vez (após três tentativas fracassadas), o xamã do PT ficou conhecido como "Lulinha paz e amor"; em 2006, durante a campanha pela reeleição, ganhou da adversária Heloísa Helena a alcunha de "sua majestade barbuda"; nos bastidores do Planalto, era chamado de "chefe", "grande chefe" e "nine" (numa alusão ao dedo mindinho decepado em 1964, num acidente pra lá de duvidoso); nas planilhas de propina da Odebrecht, identificado como "Amigo" e "Brahma". 
 
Observação: Em meados dos anos 1980, Golbery do Couto e Silva — ex-chefe da Casa Civil em dois governos militares, idealizador do SNI da ditadura e arquiteto da "abertura lenta, gradual e segura" — confidenciou a Emílio Odebrecht que Lula nada tinha de esquerda, que não passava de 
um bon vivant

Em 1986, Lula foi o deputado federal mais votado do país; em 1989, no segundo turno da primeira eleição direta para presidente pós-ditadura, perdeu para Fernando Collor; em 1994, foi derrotado por Fernando Henrique, que tornou a vencê-lo em 1998, sempre no primeiro turno. Em 2002, sua vitória sobre José Serra deu início ao jugo lulopetista que só terminaria 13 anos 4 meses e 12 dias depois, com o afastamento da nefelibata da mandioca. Dois meses antes, ao ser conduzido coercitivamente à PF para depor, Lula esbravejou: "Quiseram matar a jararaca, mas bateram na cabeça, bateram no rabo, e a jararaca está viva como sempre esteve". 
 
Continua...