Apesar de divergirem no percentual de preferência do eleitorado, todas as pesquisas apontam Lula e Bolsonaro como prováveis adversários no segundo turno. Algumas não descartam sequer a possibilidade de o petralha liquidar a fatura no dia 3 de outubro.
UM BATE-PAPO INFORMAL SOBRE INFORMÁTICA, POLÍTICA E OUTROS ASSUNTOS.
terça-feira, 31 de maio de 2022
A VOLTA DA FÊNIX MITOLÓGICA — MAS PODEM CHAMAR DE TERCEIRA VIA
Apesar de divergirem no percentual de preferência do eleitorado, todas as pesquisas apontam Lula e Bolsonaro como prováveis adversários no segundo turno. Algumas não descartam sequer a possibilidade de o petralha liquidar a fatura no dia 3 de outubro.
sexta-feira, 13 de agosto de 2021
O TEMPO PERGUNTOU PRO TEMPO QUAL É O TEMPO QUE O TEMPO TEM...
O TEMPO PERGUNTOU PRO TEMPO QUAL É O TEMPO QUE O TEMPO
TEM. O TEMPO RESPONDEU PRO TEMPO QUE NÃO TEM TEMPO PRA DIZER PRO TEMPO QUE O
TEMPO DO TEMPO É O TEMPO QUE O TEMPO TEM.
Para o professor e historiador Marco Antonio Villa, não
é nenhum exagero pensarmos já, imediatamente, no Brasil pós-Bolsonaro,
pois a reconstrução nacional — que será longa, difícil e complexa — precisa ser
iniciada o quanto antes, e deve começar o afastamento de todos que contribuíram
com o maior genocídio da história deste país.
Por outro lado, não se pode culpar quem, em 2018, viu em Bolsonaro
a única alternativa à volta do lulopetismo corrupto, responsável pela profunda
insatisfação da sociedade civil com a elite política e o funcionamento dos
poderes constituídos. Até porque o desejo de renovação é legítimo e como tal
deve ser louvado. O detalhe — e o diabo mora nos detalhes — é que oportunistas,
extremistas e reacionários se aproveitaram do momento para se venderem como a
personificação do anseio da população.
Eu concordo plenamente. Aliás, como bem disse Abraham
Lincoln, pode-se enganar a todos durante algum tempo e alguns por todo o
tempo, mas não se pode enganar a todos o tempo todo. Quando se deram conta de que
o rei estava nu, muita gente que apoiava o capitão — incluindo alguns que chegaram
a fazer parte do governo — se desiludiram com o "mito" de pés de
barro. E não sem razão.
Faltando pouco mais de um ano e quatro meses para a pior
gestão desde a redemocratização terminar, só apoia um presidente que conspira diuturnamente
contra a Constituição, os princípios democráticos e o ordenamento legal
republicano quem flerta com o nazifascismo e o genocídio ou visa locupletar-se com
a maior pandemia sanitária dos últimos séculos.
Com a Teoria da
Relatividade Geral, Einstein demonstrou que a percepção da
passagem do tempo depende de diversas variáveis. Mas o Brasil não é para
amadores — como ensinou certo maestro brasileiro até no nome. O fato é que o celebre
físico alemão não levou em conta (e nem poderia) algumas sutilezas surreais do
país do futuro em que até o passado é incerto. Vamos a alguns exemplos.
Lula foi condenado a mais de 20 anos de prisão em
regime fechado por 10 magistrados de três instâncias do Judiciário. Depois de
passar míseros
580 dias na cadeia, o petralha teve
a ficha-suja lavada e os direitos políticos restabelecidos. Agora,
graças a memória curta (ou a falta de miolos) de uma parcela significativa do
eleitorado, o criminoso de Garanhuns desponta nas pesquisas como provável
vencedor da eleição presidencial de 2022 (se houver, pois Bolsonaro não
quer).
A dublê de pastora e deputada carioca Flordelis, que
responde por homicídio triplamente qualificado (acusada de ser a mandante do
assassinato do marido, o também pastor Anderson do Carmo) foi
cassada na última quarta-feira — note que o crime ocorreu em junho de
2019 e, segundo alguns de seus pares, ela vinha se valendo do mandato para
evitar a prisão, coagir testemunhas e atrapalhar as investigações.
Em 2018, o STF condenou o primeiro parlamentar na (hoje
extinta) Operação Lava-Jato. A decisão da corte (a mesma que lavou a
ficha do ex-presidente corrupto mencionado linhas atrás) foi prolatada 1.183
dias; ou 169 semanas; 39 meses; ou 3 anos, 2 meses e 26 dias depois que o
então procurador-geral Rodrigo Janot entregou sua primeira lista
de parlamentares suspeitos de envolvimento no Petrolão. Nesse
entretempo, o ex-juiz federal Sergio Moro condenou 132 pessoas (tecnicamente,
foram 203 condenações, pois alguns acusados foram sentenciados mais de uma vez)
a penas que, somadas, totalizavam quase 2 mil anos de prisão.
Em novembro de 2016, graças
ao voto de minerva do ministro Dias Toffoli (o grande jurista
que foi
reprovado em dois concursos para juiz em São Paulo, ambas as vezes na
etapa preliminar, que avalia apenas conhecimentos gerais e noções básicas do
Direito), o STF reverteu a jurisprudência que permitia o início da
execução provisória da pena após a confirmação da sentença condenatória por um
juízo colegiado (a célebre "prisão em segunda instância").
Diante da chiadeira geral, deputados
e senadores se mobilizaram para restabelecer o status quo ante. No
Senado, pretendia-se promover uma alteração no Código de Processo Penal; na Câmara, alterar a Constituição através
de uma PEC. Mas aí veio o recesso,
depois a Covid, e então o assunto caiu no esquecimento.
Observação: A alteração no CPP pode ser feita em poucas semanas, ao passo que a proposta de
emenda constitucional tem tramitação mais lenta e burocrática, além de depender
da aprovação, em dois turnos, de 308 dos 513 deputados e 49 dos 81 senadores.
Agora a contrapartida: há coisa de um mês, as duas Casas
Legislativas aprovaram a toque de caixa um jabuti a Lei de Diretrizes
Orçamentárias com um "jabuti" que praticamente triplicou
o valor do fundo eleitoral. Na Câmara, a proposta teve 278 votos a
favor, 145 votos contra e uma abstenção; no Senado, o placar ficou em 40 votos
favoráveis ao projeto e 33 contrários. Bolsonaro tem até
o próximo dia 23 para decidir se sanciona ou veta esse descalabro.
Além de aumentar o Fundo Eleitoral para R$ 5,7
bilhões, o Congresso se movimenta para adotar duas medidas que têm
influência nas eleições do ano que vem: turbinar o Fundo Partidário —
aquele que é pago todos os anos às legendas — e retomar a propaganda das
legendas no rádio e na TV fora do período eleitoral. Em 2021, o Orçamento prevê
R$ 979,4 milhões para o Fundo Partidário. Para 2022, a estimativa é de
que o valor aumente para R$ 1,061 bilhão. Um projeto aprovado no Senado
em julho, porém, traz a volta da propaganda das siglas e aumenta os recursos do
Fundo Partidário para financiar as inserções no rádio e na TV. Se a
proposta receber o aval da Câmara e for sancionada pelo presidente, o valor passa
a R$ 1,3 bilhão no ano que vem. Somados os dois fundos (eleitoral e
partidário), o gasto público com as eleições de 2022 pode chegar a R$ 7
bilhões, um patamar inédito.
Antes de encerrar, vale salientar que:
1) desde o início da pandemia o
preço dos alimentos aumentou 15% no país. A taxa é quase o triplo da
inflação geral registrada no mesmo período, 5,2%.
2)125,6
milhões de brasileiros sofreram com insegurança
alimentar durante a pandemia. O número equivale a 59,3% da população
e se baseia em pesquisa realizada entre agosto e dezembro de 2020.
3) Em abril deste ano, o Brasil tinha 85,9 milhões de
ocupados, 3,3 milhões a menos do que no mesmo mês de 2020. No pior momento
da crise, quase 1,4 mil brasileiros eram demitidos por hora, diz
levantamento do IDados.
4) A taxa de desemprego ficou em 14,6% no trimestre encerrado em maio. Isso representa um contingente de 14,8 milhões de pessoas buscando por uma oportunidade no mercado de trabalho no país.
terça-feira, 29 de maio de 2018
AINDA SOBRE AS PRÓXIMAS ELEIÇÕES
Observação: O presidente se diz propenso a desistir da reeleição e promete apoiar o candidato que se comprometer em manter seu “legado” e lhe garantir “proteção” no final do mandato. O ex-ministro Meirelles parece ser o nome mais indicado, até porque tem cacife para financiar sua campanha com dinheiro do próprio bolso e vem se mostrando disposto defender o governo em suas andanças Brasil afora, desde que sem citações ao nome do presidente nem eventos ao lado dele.
No ano passado, com um projeto de lei relatado na Câmara pelo deputado Vicente Cândido, do PT, e gerido no Senado por ninguém menos que o senador Romero Jucá, fizeram uma mágica que multiplicou dramaticamente, numa tacada só, os valores que a população deste país será obrigada a entregar aos políticos no decorrer de 2018. É uma conquista notável para os anais da arte de roubar. Quatro anos atrás a mesada anual das gangues que fazem o papel de “partidos” no Congresso Nacional era de 300 milhões de reais. Foi aumentando, aumentando, e agora, diante da necessidade de “defender a democracia”, está reforçada por estes novos 1,7 bi. A desculpa é que há eleições este ano e as doações de “caixa 2”, imaginem só, foram proibidas pelos nossos tribunais superiores. É mais ou menos assim: como está teoricamente mais difícil praticar crime eleitoral, chama-se o público para fornecer o dinheiro que os criminosos desembolsavam até agora.
quarta-feira, 15 de abril de 2020
BOLSONARO-2022, A CANETA E O FI-LO PORQUE QUI-LO
O presidente da República, na condição de servidor público — do mais alto escalão, é verdade, mas ainda assim um servidor público —, deve servir ao povo (e não se servir do povo, mas isso é outra conversa) e ao povo dar satisfações de seus atos. Mas Bolsonaro acha que governar é jogar para a plateia, manter a peteca no ar até que chegue a hora de se reeleger. Por isso, em vez de governar para o povo e pelo povo, busca agradar os bolsomínions, ou por outra, manter sua tribo mobilizada, em pé-de-guerra.
Na primeira, o presidente resolveu comer um sonho numa padaria (e aproveitou o embalo para abraçar e tirar fotos com funcionários). O filho e deputado Eduardo Bolsonaro e o ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, notório puxa-saco do capitão, o acompanharam nessa aventura. Nos vídeos que circularam nas redes sociais dava para ouvir vizinhos da padaria gritando: “Vai pra casa”.
Na segunda, numa escapada até a cidade goiana de Águas Lindas (a meia hora de Brasília), Bolsonaro visitou as obras de um hospital de campanha que oferecerá 200 leitos para pacientes com a Covid-19, e tirou sua máscara (a de pano, naturalmente) para saudar com beijos e apertos de mão um grupelho de 50 apoiadores que chamava de traidor o governador do estado (vale lembrar que Ronaldo Caiado rompeu com o presidente no mês passado, quando o chefe do Executivo Federal incentivou as pessoas a voltarem "à normalidade". O general Luiz Eduardo Ramos, ministro da Secretaria de Governo, e (ele de novo) Tarcísio de Freitas acompanharam o capitão, mas nem Mandetta nem Caiado se aproximaram dos populares. Questionado pela imprensa sobre a atitude do presidente, o ministro reforçou: “as recomendações valem para todos os brasileiros”.
O distanciamento social é um dos principais pontos de divergência entre o presidente e Mandetta, a exemplo do uso da hidroxicloroquina para o tratamento do coronavírus, defendido por Bolsonaro mesmo sem pesquisas conclusivas sobre sua eficácia e possíveis efeitos colaterais. Como diz o ditado, "quem pode mais chora menos". O prego mais saliente é o que leva a martelada.
Sem ter como elevar sua estatura, o presidente rebaixa o teto de seu gabinete. Sem luz própria, tenta apagar as que iluminam seu caminho.
Se realmente demitir Mandetta, o capitão deveria recrutar São Judas Tadeu, tido como o santo das causas impossíveis, para substituí-lo, e Santo Expedito, o santo das causas urgentes, para assessorá-lo. Também ajudaria se deixasse de lado de lado suas estúpidas disputas ideológicas e governasse o país, pois foi para isso que o elegemos (bom, não exatamente, mas era parte do pacote).
Dependendo do que ocorrer até meados de 2022, nada mais justo que Bolsonaro dispute a reeleição (como fizeram FHC — em cuja primeira gestão essa possibilidade vergonhosa foi incluída na constituição através de uma PEC — e os petralhas Lula e Dilma). Para viabilizá-la, porém, ele precisa deixar de ser o estorvo de seu governo e enfrentar as adversidades sem se deixar governar por elas. Se não abdicar do posto de líder da oposição, seu governo não chegará a 2022.
Se isso lhe for do todo impossível, melhor faria se pedisse o boné e se recolhesse a sua mediocridade. Como já dizia o saudoso maestro Antonio Carlos Brasileiro de Almeida Jobim — brasileiro até no nome — o Brasil não é para principiantes.
terça-feira, 29 de março de 2022
O FAROESTE À BRASILEIRA E A MÁ QUALIDADE DO ELEITORADO CANARINHO
Escrever sobre política no Brasil é como trocar um pneu com o carro em movimento. Como diz o bordão da BandNews, "em um segundo tudo pode mudar". Senão vejamos.
***
No faroeste à brasileira, o xerife que perseguiu o bandido durante todo o filme acaba preso, já que parte da mais alta cúpula do judiciário vestiu a toga sobre a farda de militante. Exemplos de situações surreais como essa não faltam. Cito a absolvição da chapa Dilma-Temer pelo TSE, em junho de 2017, por “excesso de provas” — como salientou o relator do processo, ministro Herman Benjamin —, a “descondenação” de Lula pelo STF, em abril do ano passado, e o caso do procurador Deltan Dallagnol, que foi condenado recentemente a pagar uma indenização de R$ 75 mil ao agora ex- presidiário e pré-candidato à Presidência com mais chances de vencer o pleito de outubro p.f. Corrigido monetariamente e acrescido de juros, o valor da indenização passa de R$ 100 mil, mas o ex-coordenador da Lava-Jato no Paraná recebeu mais de R$ 500 mil em doações via Pix.
Observação: Segundo Dallagnol, os brasileiros fizeram os depósitos espontaneamente, indignados com a injustiça de sua condenação. “Não tenho palavras para o carinho, a solidariedade e o senso de justiça desse gesto”, postou o ex-procurador no Twitter.
Faltando menos de sete meses para as eleições, todas as pesquisas dão conta de que Lula terá 171% dos votos válidos. Mas é bom lembrar que, em 2018, às vésperas do pleito, as pesquisas davam como certa a derrota de Bolsonaro no segundo turno (fosse quem fosse o adversário da vez) e eleição de Dilma para o Senado por MG. Acabou que o então obscuro deputado do baixo clero que surfou na onda do antipetismo e promoveu o maior estelionato eleitoral da história deste país desde a redemocratização venceu o bonifrate do então presidiário de Curitiba por uma diferença de 10,7 milhões de votos, e Dilma, cuja vitória também eram 'favas contadas', ganhou o que a Luzia ganhou atrás da horta.
Os institutos de pesquisa afirmam usar critérios científicos e dados fornecidos pelo IBGE, TSE etc. para definir uma “amostra” da população que represente fielmente todo o colégio eleitoral de um determinado município, estado ou país (conforme o caso). O objetivo é obter, a partir do menor número possível de entrevistas, um nível de confiança de 95%, com uma margem de erro entre dois e três pontos percentuais, para mais ou para menos.
Já dizia Magalhães Pinto que "política é como nuvens no céu; a gente olha e elas estão de um jeito, então olha de novo e elas já mudaram". O que essas enquetes refletem é apenas um “instantâneo” do humor da população num determinado momento — e desde que se admita que alguns milhares de entrevistados espelham o que pensam cerca de 150 milhões de eleitores aptos a votar.
Por falar em pesquisas, um levantamento feito pelo DataSenado apontou que 62% dos eleitores têm vergonha do Brasil e 38% gostariam de morar em outro país — entre os mais jovens, esse sentimento é comum a 70% dos votantes. A pesquisa demonstrou também uma queda no interesse da população em geral por política: dez anos atrás, 63% dos brasileiros tinham interesse por política; agora, são 53%, e, desses, apenas 18% declaram ter “alto interesse”. Isso se explica não só pelo baixo nível de conhecimento da população sobre o sistema político e as deficiências no ensino, mas também (e principalmente) pela situação do país como um todo. Com a inflação de volta à casa dos dois dígitos, 12 milhões de desempregados e gente disputando a tapa os ossos que açougues e supermercados jogavam no lixo até não muito tempo atrás, não seria de esperar que política fosse prioridade zero para as camadas menos favorecidas do povo brasileiro. Mesmo assim, a maioria dos entrevistados (67%) acredita que a democracia é a melhor forma de governo, embora 87% estejam pouco ou nada satisfeitos com o atual regime político.
Observação: Foram entrevistados 5.850 cidadãos maiores de 16 anos. Dos eleitores, 58% são das Regiões Sudeste e Sul, 26% do Nordeste, 8% do Norte e 8% do Centro-Oeste. O público é formado por 45% de pardos, 44% de brancos e 10% de negros. O maior grupo (47%) tem até o ensino fundamental completo e 37% vivem em municípios com mais de 50 mil e até 500 mil habitantes. Os ocupados são 60%, enquanto 30% se disseram fora da força de trabalho; e 45% têm renda familiar de até dois salários-mínimos. A maioria dos eleitores (55%) diz não ter posicionamento político. Do restante, 21% dizem ser de direita, 11% de esquerda, 9% de centro e 4% não sabem ou não responderam.
sábado, 11 de novembro de 2023
QUEM FOI QUE INVENTOU O BRASIL... (FINAL)
Rumores de que um misterioso país do ocidente era uma espécie de paraíso terreno, imagem do Éden descrito na Bíblia, começaram a circular no início da Idade Média. Entre os celtas da Irlanda, a terra encantada ganhou o nome de Hy Brazil — lembrando que o nome dado posteriormente a Pindorama deriva do termo fenício "barzil" — que significava "ferro" — ou do celta "bress" — raiz da palavra inglesa bless, que significa abençoar —, nada tendo a ver, portanto, com a madeira "da cor da brasa" que abundava no litoral do Nordeste e de cuja casca os portugueses extraíam a tinta vermelha usada para tingir as vestes mais luxuosas de Lisboa.
Um descobridor alternativo das Américas pode ter sido um religioso celta em busca do paraíso terrestre: A Navegação de São Brandão, escrita na Irlanda por volta do ano 900, conta a história de um monge irlandês que em 556 teria partido pelas águas do Atlântico em um currach (pequeno barco de madeira, coberto de peles e usado por pescadores). Reza a lenda que São Brandão, com uma pequena tripulação de monges-marinheiros, encontrou a fabulosa terra de Hy Brazil, "cheia de bosques e grandes rios recheados de peixes", e voltou à Irlanda para contar a história.
Inobstante a existência de provas irrefutáveis de que fenícios ou celtas tenham estado no Novo Mundo, as chances são consideráveis. A corrente Sul-Equatorial (a mesma que pode ter trazido os chineses ao Brasil) seria o caminho mais provável para exploradores antigos, que, inclusive, dispunham de navios capazes de carregar mais mantimentos que as naus e caravelas portuguesas. Considerando que eles navegaram pela costa da África até o século IV a.C., se um de seus barcos que tivesse entrado por acaso na corrente Sul-Equatorial seria levado diretamente para as praias de Pernambuco. E o mesmo caminho pode ter sido seguido por celtas, romanos e árabes.
Em Historia General de las Indias e de las Tierras del Mar Oceano, escrito em 1535, o espanhol Gonçalo Fernandes de Oviedo assim descreve o espírito de sua época: "E Deus quis que o Novo Mundo fosse descoberto pelos reis cristãos e seus vassalos, e que eles aceitassem alegremente o trabalho de converter e conquistar os idólatras. Bendito seja o Senhor!". Eram tempos em que os espanhóis invadiam e dominavam as terras descobertas por Colombo "para maior Glória de Deus", e foram os próprios conquistadores que começaram a transformar sua aventura em história: Oviedo, um fidalgo que veio às Américas para colonizar, foi o primeiro "cronista de Índias" da coroa espanhola — ou seja, o historiador oficial encarregado de justificar e glorificar a conquista. A "descoberta" foi descrita como uma vontade divina, e os índios, como infiéis sem civilização que, a exemplo dos negros africanos, deviam se converter ou virar escravos.
Cronistas da época também esculpiram a versão de que nenhum outro "povo civilizado" alcançara o Novo Mundo antes dos ibéricos — já que o dono é quem chegou primeiro, e a ele cabe o direito de ficar rico com isso. O mesmo raciocínio foi adotado dois séculos depois pelos colonizadores ingleses da Austrália: embora a ilha já tivesse sido avistada pelos portugueses em 1522 e pelos holandeses em 1614 — e talvez pelos chineses bem antes disso, até porque, de todos os possíveis descobridores da Oceania, só eles vestiam "longas túnicas", como os misteriosos visitantes das lendas aborígenes e maoris —, o "descobridor oficial" foi o britânico James Cook, que tomou posse da terra em nome da Coroa inglesa(vide capítulos anteriores).
No Brasil, a transformação do apagado Cabral em herói só ocorreu no século XIX. Até então, livros de história mal falavam nele. Em Portugal, também era pouco lembrado: a casa que pertencera a sua família, em Santarém, ficou abandonada por séculos e chegou a virar um prostíbulo. Colombo também permaneceu nas sombras por séculos — e só foi reabilitado em 1866, quando americanos de origem latina criaram o Columbus Day, visando destacar seu na colonização da América numa época em que imigrantes latinos eram desprezados pela elite anglo-saxã. Com o tempo, a celebração da "descoberta" foi exportada para a América Central e do Sul pelos "vencedores" europeus, brancos e cristãos.
Observação: Se a história tivesse sido escrita pelos perdedores, esses relatos certamente adquiririam um tom apocalíptico. No México e no Peru, sacerdotes indígenas decretavam que seus deuses nativos estavam mortos e anunciavam o fim da civilização. O que os "descobertos" pensavam sobre a tal Idade dos Descobrimentos pode ser resumido por um único verso de um poema escrito no México na aurora do Novo Mundo: "Oh meus filhos, em que tempos detestáveis vocês foram nascer!"
Discutir se os primeiros a chegar no Novo Mundo eram chineses, nórdicos ou os espanhóis guarda um certo equívoco histórico. Até porque as Américas já haviam sido descobertas pelo menos 15 mil anos antes, e a Oceania, cerca de 46 mil! Quando os ancestrais dos portugueses ainda viviam na Pré-História, os primeiros ancestrais daqueles que os ingleses batizaram de aborígenes chegaram à Oceania caminhando por terra entre as ilhas do Pacífico e o litoral da Ásia. Em 1999, o arqueólogo brasileiro Walter Neves examinou um crânio feminino encontrado em Minas Gerais e descobriu feições aborígenes. O fóssil foi batizado de Luzia e data de 12 mil anos atrás.
Os tataravôs de Luzia devem ter chegado à América vindos do Sudeste Asiático. Já os ancestrais dos nossos tupiniquins, dos astecas mexicanos e dos apaches dos EUA só começaram a povoar o Novo Mundo no século X a. C., vindos da Sibéria pelo Estreito de Bering. Como o interior da América do Norte estava congelado naquela época, os "prototupis" navegaram até a América Central e, a partir de lá, desbravaram o interior, chegando até os confins da Terra do Fogo.
Em face do exposto, o Brasil e as Américas foram descobertos várias vezes ao longo dos séculos.
Com Superinteressante
sexta-feira, 17 de setembro de 2021
SE FOR POR FALTA DE ADEUS, "TCHAU, QUERIDO"
O ex-decano Marco Aurélio Mello gostava parafrasear Platão,
repetindo ad nauseam que "vivemos tempos estranhos". Mas
o fato é que o Brasil é um país estranho.
Em apenas uma semana, após assinar um patético documento
intitulado pomposamente como "Declaração à Nação" pelo
respectivo redator — o ex-presidente Michel Temer —, o presidente desta
banânia passou de conspirador-mor da República a respeitador das instituições e
da Constituição.
A súbita conversão ocorreu logo na introdução, onde o
vampiro do Jaburu anota que "o país se encontra dividido entre
instituições", o que, convenhamos, não é fácil entender. Mas já dizia
o saudoso maestro Tom Jobim, brasileiro até no nome (Antonio Carlos
Brasileiro de Almeida Jobim), que o Brasil não é para amadores.
Se a introdução é pouco feliz, o documento fica pior quando expõe
os dez pontos da inútil declaração. Diz que "respeita os outros dois
Poderes e que deve haver harmonia entre eles" — estranho que um presidente
da República, que jurou respeitar a Constituição, tenha de reafirmar esse
compromisso. Como se já não bastasse esse mau sinal, o documento afirma em
seguida que "boa parte dessas divergências decorrem de conflitos de
entendimento acerca de decisões adotadas pelo ministro Alexandre de Moraes no
âmbito do inquérito das fake news."
Só que a epístola não aponta as tais "divergências",
o que desautoriza qualificar os ataques criminosos contra o Supremo e as
injúrias, calúnias e ameaças de morte assacadas contra o Alexandre de Moraes
como simplesmente uma disputa entre intérpretes da Constituição.
Continuando no terreno da mediocridade analítica da complexa
relação entre os Poderes, o miliciano de Rio das Pedras diz — em tom de ameaça —
que ninguém tem direito de "esticar a corda", e relaciona tal
reflexão — digna de um beócio — com a economia e a vida dos brasileiros. E
conclui afirmando que suas "palavras contundentes" foram ditas
no calor do momento. Mas quais palavras? Quais momentos?
O fecho da frase é fantástico, digno do momento político que
vivemos: os ataques à Constituição, as ameaças de golpe de Estado, o estímulo à
violência como método político forma transformados, como num passe de mágica,
em "embates que sempre visaram ao bem comum."
Não cumprir decisão judicial, como o mito dos otários
proclamou que faria em relação às decisões do ministro Alexandre de Moraes,
virou "naturais divergências" na novilingua bolsonarista. E o
epíteto "canalha", como o capetão se referiu ao magistrado,
foi reinterpretado: na versão epistolar, Moraes ganha os atributos de jurista e
professor.
Não fosse trágico, seria cômico o jurista de Rio das Pedras
dissertar sobre o artigo
5º da Constituição — que nunca
leu, registre-se — e lançar luzes milicianas à sua mui particular
interpretação da Carta Magna, dando-nos a saber que ele respeita — ufa, mais
uma vez — as instituições e — como um Péricles do submundo carioca —, assevera
que na democracia os três Poderes trabalham em favor do povo.
Concluiu a "Declaração à Nação" com duas
frases que o Doutor
Pangloss, com seu inveterado otimismo, diria que são enigmáticas, mas
podem ser definidas como o produto de um redator medíocre que desconhece a
Constituição, o pensamento lógico e a língua de Camões.
Afirmou o signatário da missiva que sempre esteve "disposto
a manter diálogo permanente com os demais Poderes pela manutenção da harmonia e
independência entre eles." Manter diálogo é o mínimo que se espera de
quem diz respeitar (e jurou!) a Constituição. Agora não é ele — que personifica
o Executivo federal — quem vai manter a harmonia e independência entre os
Poderes!
Bolsonaro — ou o tosco redator — quer reescrever o caput do artigo
102 da CF (Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a
guarda da Constituição"). O "último mandamento", o
décimo, Bolsonaro agradece o apoio do povo brasileiro (?) e diz: "conduzo
os destinos do nosso Brasil."
A redação é ruim, é verdade. Porém, é possível compreender
que é ele quem conduz o nosso destino! Agora temos o condottiere de Rio
das Pedras. Para piorar, cita, no final o lema integralista que, imagina-se,
deixaria envergonhado Plínio
Salgado — que ao menos sabia escrever, e bem.
O patético documento foi recebido como se fosse um discurso
de Winston
Churchill. Sinal da decadência política do Brasil.
Bolsonaro precisava ganhar tempo para continuar
solapando as instituições. Se León Trotsky falava
em revolução permanente, o "mito" dos bolsomínions age para produzir
o caos permanente. E a crise institucional vai se agravar para além do desastre
econômico, social e sanitário.
Em Os
Bruzundangas, Lima Barreto desenhou um país muito semelhante ao Brasil
contemporâneo. Inclusive, a Constituição estabelecia que para ser elegível o
Presidente "devia unicamente saber ler e escrever; que nunca tivesse
mostrado ou procurado mostrar que tinha alguma inteligência; que não tivesse
vontade própria; que fosse, enfim, de uma mediocridade total." Por
mais estranho que pareça, Jair Bolsonaro consegue ser pior.
Em meio a uma contagem regressiva para o próximo surto de Bolsonarite,
o TSE disparou no rumo do gabinete presidencial uma bala perdida que
desafia o armistício. Por decisão do corregedor-geral da Justiça Eleitoral,
ministro Luis Felipe Salomão, a Corte vai apurar se houve propaganda
eleitoral antecipada e abuso de poder nas manifestações promovidas por
Bolsonaro no 7 de Setembro.
A providência foi tomada no âmbito do inquérito
administrativo sobre a disseminação de mentiras que associam as urnas
eletrônicas a fraudes inexistentes e ameaças ao processo eleitoral de 2022.
Esse inquérito foi aberto no mês passado, por decisão unânime dos sete ministros
que compõem o plenário do TSE.
O TSE coleciona dados para instruir uma eventual
decretação da inelegibilidade de Bolsonaro, o que impediria o presidente
de disputar a reeleição em 2022. Esse tipo de procedimento não depende de
denúncia da Procuradoria-Geral. Ou seja, está fora do alcance da blindagem
de Augusto Aras.
Deseja-se apurar a origem das verbas que financiaram os atos
estrelados pelo mandatário no Dia da Independência, incluindo o custo do
transporte e diárias de manifestantes e a confecção de material em defesa do
voto impresso. Além dos indícios de abuso de poder econômico, os atos podem ser
enquadrados como campanha fora de época, o que é crime eleitoral.
O custeio das manifestações será apurado também em inquérito
aberto no STF sobre agressões à Corte e seus ministros por bolsonaristas
que se envolveram na operação que subverteu os festejos do 7 de Setembro.
O relator desse inquérito é Alexandre de Moraes, que Bolsonaro,
em sua versão moderada, trata como um "ex-canalha".
Já passou da hora de pôr um paradeiro nesse descalabro. Como dizia Giovanni Improtta (protagonizado pelo saudoso José Wilker), "o tempo ruge e a Sapucaí é grande".
sexta-feira, 17 de março de 2017
SOBRE ANEXOS E LINKS... (CONTINUAÇÃO)
Juridicamente, os pedidos de inquérito do Procurador Geral precisam ser acatados para que se dê início a investigações que eventualmente resultarão em denúncias que, se aceitas pela Justiça, levarão a julgamentos e possíveis condenações. Politicamente, todavia, eles produzem o efeito devastador de uma sentença, emprestando ao PGR o “poder” de afastar ministros ― quem for denunciado, disse Michel Temer, será suspenso do cargo; se virar réu, será exonerado.
Ah, e não deixem de assistir a este vídeo; é imperdível: https://youtu.be/0XpTJDOLg0E