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sexta-feira, 30 de maio de 2025

O PAÍS DA CORRUPÇÃO — 9ª PARTE

PIOR QUE O BANDIDO TRAVESTIDO DE POLÍTICO É O IDIOTA TRAVESTIDO DE ELEITOR, QUE VOTA NESSE TIPO DE GENTE.

Em momentos distintos da ditadura, Pelé e o general Figueiredo alertaram para o risco de misturar brasileiros e urnas em eleições presidenciais — e foram duramente criticados. Mas como contestá-los, se lutamos tanto pelo direito de votar para presidente e elegemos Collor, Lula, Dilma e Bolsonaro?


Nunca saberemos como estaria o Brasil se o golpe de Estado de 1889 não tivesse ocorrido. Ou se a renúncia de Jânio não tivesse levado ao golpe de 64. Ou se nosso primeiro presidente civil — eleito indiretamente após 21 anos de ditadura — não tivesse levado para o túmulo a esperança de milhões e deixado um neto que envergonharia o país e um vice que pavimentaria a vitória de um pseudo caçador de marajás sobre um desempregado que deu certo na primeira eleição direta desde 1960.

 

Muita coisa podia dar errado no capítulo final da novela da ditadura. Em 1984, o último dos cinco generais presidentes da ditadura — que, entre outros dislates, disse preferir o cheiro dos cavalos ao cheiro do povo e que "daria um tiro no coco" se fosse criança e seu pai ganhasse salário-mínimo — confidenciou a Henry Kissinger, então secretário de Estado dos EUA, que uma parte das Forças Armadas apoiava a volta do governo civil, e a outra estava disposta a tudo para evitar que "os esquerdistas tomassem o país". Figueiredo considerava Tancredo uma pessoa capaz e moderada, mas cercada por muitos radicais de esquerda que talvez não conseguisse controlar.

 

No imaginário nacional, Tancredo foi o melhor de todos os presidentes — mas só porque, a exemplo da Viúva Porcina (personagem da novela Roque Santeiro), "foi sem nunca ter sido". Por uma trapaça do destino, ele baixou ao hospital horas antes da cerimônia de posse e morreu 38 dias e sete cirurgias depois — ironicamente, no feriado que homenageia o Mártir da Independência. Também não dá para saber o que aconteceria se ele tivesse governado, mas sabe-se que a posse de José Sarney ecoou como a gargalhada do diabo nos estertores da ditadura. 

 

Sarney  não tinha ideia do tamanho do "abacaxi" que seria assumir a presidência sem ter indicado seus ministros e herdando uma inflação de 220% ao ano. Cinco anos depois, entregou a Collor a faixa presidencial e uma superinflação de 1.800%, mudou seu domicílio eleitoral do Maranhão para o recém-criado estado do Amapá e conseguiu se eleger senador. Conta-se que, depois que pendurou as chuteiras, ao ser informado pela filha Roseana — então governadora do Maranhão — de que um dilúvio deixara metade do estado debaixo d’água, ele perguntou: "A sua metade ou a minha?"

 

Ao lado de Ulysses Guimarães, Mário Covas, Franco Montoro e Fernando Henrique, Tancredo liderou a campanha pelas "Diretas Já". A despeito da maior adesão popular da história, a Câmara sepultou a emenda Dante de Oliveira, que estabelecia a volta das eleições diretas para presidente. Ainda assim, a comoção social foi tamanha forçou a convocação do colégio eleitoral formado por 686 deputados, senadores e delegados estaduais. Em 15 de janeiro de 1985, Tancredo venceu Maluf — que era apoiado pelos militares — 480 a 180 votos.

 

 Ulysses chegou a cogitar disputar mas foi preterido pela chapa mista formada com o PFL de José Sarney Sr. Diretas e entregou a Tancredo o programa denominado Nova República, que previa eleições diretas em todos os níveis, educação gratuita, congelamento dos preços da cesta básica e dos transportes, entre outras benesses. Se tivesse sido ele o escolhido pelo colégio eleitoral, talvez disputasse — e vencesse — a eleição solteira de 1989. Sem Collor no Planalto e Zélia no Ministério da Fazenda, não teria havido sequestro dos ativos financeiros, congelamento da poupança e a sequência de planos econômicos fracassados que precederam o Plano Real. Assim, talvez a redução da miséria brasileira tivesse começado muito antes e hoje houvesse mais gente com salário digno e casa para morar.

 

Nada garante que teria sido assim, mas, mesmo que fosse, o Brasil — esse eterno laboratório de desilusões políticas — ainda teria muito chão para tropeçar. A eleição direta de 1989, com 22 candidatos e uma população faminta por mudanças, virou palco de um espetáculo grotesco que consolidou a crença de que o próximo salvador da pátria viria embalado em promessas vazias, frases de efeito e, claro, uma bela embalagem televisiva. E assim seguimos, entre urnas e urros, tropeçando em nossas escolhas.

 

Continua...

sábado, 17 de maio de 2025

A OBSOLESCÊNCIA DO DESEJO

PEDRA QUE ROLA NÃO CRIA LIMO

Houve um tempo em que cada lançamento da Apple reescrevia o futuro. Filas nas lojas, apresentações coreografadas, sussurros em torno de funcionalidades inéditas, tudo contribuía para uma aura de encantamento difícil de replicar. Mas não há nada como o tempo para passar, e o passar do tempo fez o que era mágico perder o encantamento.
 
A empresa criada em 1º de abril 1975 por Steve Jobs, Steve Wozniak e Ronald Wayne sempre se destacou pela excelência de seus produtos, e alguns deles — como o icônico iPhone — definiram rumos para toda a indústria. 

Até pouco tempo atrás, a expectativa por cada novo lançamento era quase um evento cultural, mas, de novo, não há nada como o tempo para passar, e as pessoas passaram a pensar duas (ou três, ou quatro) vezes antes de substituir um celular em perfeitas condições por um modelo novo — sobretudo quando as diferenças são pontuais ou meramente estéticas. Assim, a "obsolescência programada" (mais detalhes nesta postagem) se tornou, de certo modo, "desprogramada".
 
CONTINUA DEPOIS DA POLÍTICA

À primeira vista, a insegurança pública no Brasil parece ser consequência da proliferação das organizações criminosas, mas, na verdade, o Brasil é uma organização criminosa. Da mesma forma, a corrupção e a impunidade dos parlamentares costumam ser atribuídas ao fisiologismo, mas , na verdade, o maior culpado é o eleitorado ignorante e desinformado, que insiste em eleger políticos da pior qualidade, como comprovam os inquilinos que ocuparam o Planalto desde a redemocratização (não que a coisa fosse melhor antes do golpe de 64 ou durante os 21 anos de ditadura militar, mas enfim).
A Câmara Federal, também chamada de "Casa do Povo", nada fez desde o recesso de fim de ano senão eleger seu novo presidente, discutir uma vexatória proposta de anistia a Bolsonaro et caterva e, en passant, criar 18 vagas adicionais — que não custarão ao erário "míseros" R$ 64,4 milhões, como suas insolências afirmam: considerando que deputado dispõe de uma cota de R$ 38 milhões em emendas orçamentárias, as 18 novas cadeiras representarão uma despesa extra de R$ 748,6 milhões por anoMas não é só. Ao arrepio da Constituição e do Código Penal — e numa clara invasão da competência do Judiciário —, as marafonas da Câmara suspenderam a ação criminal contra Alexandre Ramagem por tentativa de golpe de Estado. Isso apesar da clareza do texto constitucional e do aviso do ministro-relator sobre a impossibilidade de sustar o processo no tocante às acusações referentes ao período anterior à diplomação do parlamentar encrencado.
Emparedado por seus pares, Hugo Motta mandou tocar o barco, mesmo sabendo que ele naufragaria mais adiante — como de fato naufragou: a 1ª Turma do STF decidiu, por unanimidade, que Ramagem continuará respondendo por três dos cinco crimes pelos quais foi denunciado. Motta recorreu, mas  tudo indica que o plenário irá chancelar a decisão da Turma.
Com a robustez de 315 votos a favor da artimanha, os deputados mostraram os dentes e deixaram às togas o trabalho de repor as coisas no lugar. Mas não há no horizonte conserto possível para o desarranjo entre os dois PoderesA intenção dos nobres deputados é clara: criar um precedente para driblar futuras decisões que os desfavoreçam — como no caso das cerca de 80 emendas parlamentares sob investigação no âmbito do Supremo, sob o olho vivo e o faro fino do ministro Flávio Dino. 
Será que é para isso que sustentamos essa cambada?

Evoluindo continuamente em conhecimento e tecnologia, as empresas fazem com que seu produtos — e não os da concorrência — sejam os substitutos naturais da geração anterior. No entanto, quando se concentram em aperfeiçoar dispositivos que já dominam o mercado, elas acabam subestimando (ou mesmo ignorando) inovações disruptivas que, num primeiro momento, parecem inferiores, mas amadurecem rapidamente e tomam seu lugar. 
 
Dito com outras palavras, para sobreviver, os fabricantes precisam tornar seus produtos obsoletos — mesmo que ainda funcionem bem e tenham boa aceitação no mercado. Com ciclos de inovação cada vez mais curtos, gigantes como Apple, Google, Microsoft, Amazon, Motorola, Samsung etc. precisam fazê-lo antes que os concorrentes o façam, e isso torna a obsolescência programada uma estratégia de sobrevivência.
 
A Apple, que por anos foi referência em inovação e longevidade, acabou sucumbindo à obsolescência programada de um modo que muitos consideram mal-intencionado. Um bom exemplo é o "batterygate": a pretexto de preservar a estabilidade do sistema, a Maçã reduziu o desempenho dos iPhones com baterias degradadas sem alertar os usuários. Mas falta de transparência a obrigou a oferecer descontos na troca das baterias e criar novas opções de monitoramento de desempenho no iOS.
 
A empresa de Cupertino sempre se destacou pelos saltos perceptíveis de geração em geração. Hoje, no entanto, uma parcela crescente dos usuários vive uma espécie de "obsolescência ao avesso". Não se trata exatamente da sensação de que seus dispositivos ficaram para trás, mas da percepção de que nada novo realmente relevante os está movendo adiante.
 
Ano após ano, os lançamentos parecem cada vez mais previsíveis — até repetitivos. Antigamente, sempre que um novo iPhone deixava o anterior "parecendo velho", havia um impulso natural pela troca — nem sempre racional, mas emocionalmente legítimo. Hoje, a falta de diferenciação tangível entre gerações sucessivas faz com que o usuário não veja razão para gastar dinheiro na substituição de um smartphone que está funcionando bem por um modelo equivalente. Assim, a interrupção do ciclo do desejo faz com que parte da magia que sempre envolveu a marca se desvaneça: o produto continua funcional, mas o encanto que estimulava a troca periódica já não está mais ali. 
 
A Apple ainda é admirada por seu ecossistema coeso, design refinado e estabilidade, mas já não dita o ritmo da inovação como antes. Ironicamente, ao escapar da obsolescência programada tradicional, ela criou a obsolescência do desejo, ou seja, a perda daquela urgência simbólica que sempre motivou seus usuários mais fiéis. O resultado é uma obsolescência menos agressiva, que não é imposta por limitações técnicas, mas pela ausência de provocação criativa, e que não decorre de chips limitados ou baterias sabotadas, mas de ciclos de inovação que deixaram de emocionar. 
 
Depois de décadas como símbolo máximo da antecipação do futuro, a Apple parece acorrentada à manutenção do presente. Não que tenha perdido a relevância — sua engenharia continua admirável, seu ecossistema segue robusto e sua visão de privacidade permanece exemplar —, mas algo se deslocou no terreno da imaginação. Ao escapar da obsolescência programada tradicional, a marca corre o risco de se tornar obsoleta em sua promessa de reinvenção. 

Nesse cenário, a pergunta que se impõe não é apenas técnica ou mercadológica, mas simbólica: quando foi a última vez que um lançamento da Apple fez o mundo parar por um instante?

Talvez o futuro da Maçã esteja garantido por sua solidez técnica, mas o futuro que Jobs nos prometia, feito de encantamento, ousadia e disrupção, parece suspenso. E quando até o futuro entra em modo de espera, é sinal de que algo essencial precisa ser atualizado.

quarta-feira, 9 de abril de 2025

DE VOLTA ÀS VIAGENS NO TEMPO — 15ª PARTE

AS ROSAS CAEM, OS ESPINHOS FICAM.


Vimos que viajar no tempo é uma possibilidade teórica prevista na Teoria da Relatividade e que os efeitos da dilatação temporalilustrados magistralmente pelo Paradoxo dos Gêmeos, já foram comprovados experimentalmente

Até que a tecnologia permita acelerar uma espaçonave a uma velocidade próxima à da luz, não saberemos o que o século XXX nos reserva nem poderemos saborear um filé de brontossauro com os Flintstones na cidade pré-histórica de Bedrock. Mas talvez isso seja apenas uma questão de tempo: como vimos no oitavo capítulo, um engenheiro da NASA está desenvolvendo um motor capaz de impulsionar uma nave a 99% da velocidade da luz, e existem outras possibilidades promissoras, como motores de Alcubierre e conceitos baseados na energia do vácuo.

CONTINUA DEPOIS DA POLÍTICA

A aprovação de um projeto de anistia depende da ronco das ruas. No último domingo, o ato na Paulista concebido para irradiar a força do faraó da direita foi um crepúsculo: segundo dados da USP, apenas 44,5 mil bolsonaristas atenderam ao chamamento — mais que o dobro dos 18,3 mil que se reuniram em Copacabana, mas quatro vezes menos do que os 185 mil que estiveram na avenida em fevereiro do ano passado e menos de 5% da previsão dos organizadores (1 milhão). A título de contextualização, Sampa tem 11,45 milhões de habitantes e a Grande São Paulo, 21 milhões.
Enquanto o STF constrói o sarcófago, os governadores 
Tarcísio, Caiado, Zema e Ratinho Jr. atuam embalsamadores, de olho nos votos dos devotos. Na manifestação, o faraó de fancaria acusou o Supremo de conluio com Lula em 2022, disse que há um plano para matá-lo e reafirmou que vai disputar a Presidência no ano que vem, mesmo inelegível (esquecendo de lembrar ou lembrando de esquecer que ele pode estar na cadeia em outubro de 2026). A construção da vitória da direita em 2026 é mero exercício de quiromancia. Por enquanto, sobressai o constrangimento de erguer uma alternativa supostamente democrática a partir do embalsamamento de uma múmia golpista. 
Sob reserva, líderes do Centrão na Câmara dizem que não concordam com o projeto da anistia, mas que o líder do PL está cumprindo seu papel ao tentar angariar apoios. Bolsonaro insiste que não será beneficiado, mas aliados admitem que a anistia seria a primeira etapa na construção de algum tipo de salvo-conduto, já que o ex-presidente pode pegar até 40 anos de prisão por crimes como tentativa de golpe e de abolição violenta do Estado democrático. O movimento hoje é para que o Congresso dê aval a uma proposta que enquadre os manifestantes do 8 de janeiro apenas nos crimes de dano ou depredação, o que, se aprovado, enfraqueceria a acusação de que Bolsonaro liderou os atos golpista para retomar o poder. 
Depois de três décadas defendendo a ditadura militar, o refugo da escória da humanidade deveria terminar seus dias na cadeia. Lamentavelmente, o risco de isso não acontecer num país como o Brasil é considerável. Basta lembrar que Lula foi preso em 7 de abril de 2018 e solto após míseros 580 dias, embora suas penas nos processos do tríplex e do sítio somassem 25 anos e as sentenças condenatórias tivessem transitado em julgado no STJ. Mesmo sendo septuagenário, o petista sobreviveu para subir a rampa no Palácio do Planalto pela terceira vez e ameaçar disputar a reeleição em 2026 (que Deus nos livre de mais essa desgraça).

Supõe-se que os buracos de minhoca se formem no fundo dos buracos negros e funcionem como atalhos cósmicos, permitindo percorrer quase instantaneamente os milhares ou milhões de anos-lua que separam dois pontos no espaços-tempo, neste ou em outro universo, no presente ou em outro momento da linha do tempo. Todavia, sua existência ainda não foi comprovada experimentalmente — até porque o buraco negro mais próximo da Terra fica a quase 1.600 anos-luz. 

Mesmo que existem, esses "túneis" tendem a ser minúsculos e instáveis (para suas paredes não colapsarem, seria preciso uma grande quantidade de matéria exótica, cuja massa negativa poderia se converter em energia negativa, mas não há evidências de que esse tipo de matéria exista no Universo. Demais disso, tampouco se sabe eles têm "entrada e saída" ou ambas as bocas "engolem" matéria.

ObservaçãoO nome "buraco de minhoca" (ou "buraco de verme", na tradução literal de "wormhole") surgiu de uma analogia usada para explicar o fenômeno: da mesma forma que um verme que perambula pela casca da maçã poderia pegar um atalho para o lado oposto abrindo caminho através do miolo da fruta, um viajante que passasse por um buraco de minhoca poderia chegar ao lado oposto do universo através de um túnel topologicamente incomum. 

Toda a matemática usada para criar buracos de minhoca teóricos se baseia na Relatividade Geral, que não consegue descrever o centro dos buracos negros nem tampouco é compatível com a física quântica. No entanto, o cientista português João Rosa propôs em um artigo publicado no arXiv que a chamada gravidade híbrida generalizada-Palatini — uma extensão da Relatividade Geral que flexibiliza as relações entre matéria/energia e espaço/tempo — permitiria a criação de buracos de minhoca atravessáveis. 

Para contornar a exigência de energia negativa, Rosa sugeriu que as entradas dos túneis fossem estruturadas em camadas, como cascas de cebola duplas e finas, feitas de matéria comum. Essa proposta ainda precisa ser amplamente debatida e testada, mas representa um passo importante na busca por soluções para a viabilidade dos buracos de minhoca.
 
Segundo o astrofísico americano Ron Malletque construiu uma respeitável carreira acadêmica estudando buracos negros e a Relatividade geral, seria possível usar o laser para formar um "feixe de luz circundante", produzir uma curvatura no espaço-tempo e, atravessar esse "túnel" e voltar ao passado ou avançar para o futuro. Mas ele reconhece que sua "máquina do tempo" ainda não foi comprovada na prática, e que existem desafios significativos a serem superados — entre os quais a necessidade de criar fontes de energia extremamente poderosas e materiais capazes de suportar as enormes forças geradas pela rotação do anel laser.

Continua...

quarta-feira, 5 de março de 2025

AINDA VALE A PENA TER UMA LINHA FIXA RESIDENCIAL?

UMA PEQUENA FENDA AFUNDA GRANDES BARCOS.

 
Menos de um ano depois de Alexander Graham Bell registrar a primeira patente de um aparelho telefônico, D. Pedro II mandou ligar o Palácio da Quinta da Boa Vista às residências dos ministros do Império, inaugurando a telefonia no Brasil. Um século mais tarde, algum gênio da ditadura militar criou o execrável Sistema Telebras, que só foi sepultado em 1998, durante o segundo mandato de FHC.  
 
Até a privatização das Teles, obter uma linha telefônica exigia aderir ao famigerado "Plano de Expansão", comprar um lote de ações da estatal que atendia a localidade e aguardar a instalação, que deveria acontecer em 24 meses, mas chegou a demorar 15 anos no município paraense de Cachoeira do Arari. 

CONTINUA DEPOIS DA POLÍTICA

Depois de chegar à presidência com o primogênito investigado por “rachadinhas” na Alerj, Bolsonaro não só costurou um acordo de engajamento com o ministro Dias Toffoli — que resultou em quatro meses de paralisação da investigação com uma só canetada em 2019 —, mas também distribuiu cargos a uma série de pessoas ligadas ao ministro Gilmar Mendes, que votou junto com Ricardo Lewandowski e Nunes Marques para blindar 01 contra decisões do juiz de primeira instância Flávio Itabaiana.
As três togas formaram maioria, novembro de 2021, para garantir ao filho do pai a bizarrice de um ex-deputado estadual manter o foro no TJRJ depois de virar senador, a despeito da decisão anterior do STF no sentido de levar casos de parlamentares federais à primeira instância após o fim do mandato durante o qual os alegados crimes ocorreram.
Ninguém deu muito bola para a notícia de que o governo Bolsonaro havia empregado o primo de Gilmar no ministério da Justiça e Segurança Pública, além de ter-se empenhado, por meio do Itamaraty, na vitoriosa campanha do advogado do ministro para ocupar uma cadeira de juiz na Corte Interamericana de Direitos Humanos. Meses antes, em 29 de abril de 2020, durante a posse de André Mendonça como ministro da Justiça, o então presidente já havia exaltado Gilmar, " que jamais se furtou de dar seu voto em prol do Brasil".
Em 8 de abril de 2024, já encrencado com a Justiça em razão dos inquéritos sobre a trama golpista de 2022 e as invasões de 8 de janeiro de 2023 aos prédios dos Três Poderes, Bolsonaro fez campanha presencial para o irmão de Gilmar, Chico Mendes, eleito prefeito de Diamantino, no Mato Grosso. Em 26 de fevereiro de 2025, Gilmar blindou Flávio mais uma vez, negando dois recursos do MPRJ para reabrir o caso das “rachadinhas”, esvaziado graças a decisões de anulação de quebras de sigilo tomadas no STJ pelo desembargador João Otávio de Noronha, que Bolsonaro prometia indicar ao STF caso abrissem novas vagas com ele no poder. O próprio Gilmar atuou, inclusive, para manter decisões de Noronha, como no caso do relaxamento da prisão do operador Fabrício Queiroz e de sua esposa, Márcia Aguiar.
Não à toa, depois que Alexandre de Moraes enviou o inquérito da trama golpista para julgamento na 1ª Turma do STF, a defesa do capetão tenta levar o caso a plenário, onde Nunes Marques e André Mendonça podem pedir vista, atrasar o julgamento e dar votos contrários, e Gilmar e Toffoli serem mais complacentes que Cristiano Zanin e Flávio Dino, que os advogados do ex-presidente tentam afastar do julgamento por já terem movido ações contra ele.
Nos bastidores, o bolsonarismo trata a ala de Gilmar e Toffoli como o "Centrão do STF", legitimando a expressão nascida e popularizada no portal O Antagonista. Embora Gilmar tenha criticado publicamente o golpismo, Toffoli tenha se reaproximado de Lula e Bolsonaro não tenha mais a caneta na mão, a esperança de quem já agradou e foi agradado por pessoas poderosas é a última que morre na República do Escambo. Leia mais em Gilmar barra reabertura do caso das ‘rachadinhas’ de Flávio.
Às vésperas do Carnaval, Gilmar disse que não há razão para o reconhecimento do impedimento de ministros da Corte para julgar a denúncia da PGR contra Bolsonaro sobre a trama golpista. Segundo ele, os pedidos de suspeição não podem ser uma estratégia para tentar afastar os relatores dos processos, embora seja natural e legítimo que a defesa os faça. o ministro Luís Roberto Barroso, presidente de turno do STF, negou tanto o pedido de suspeição de Alexandre de Moraes, apresentado pela defesa do general Braga Netto, como os de impedimento de Zanin e Dino. Pelo regimento interno da Corte, cabe às duas turmas julgar ações penais, e como o relator faz parte da 1ª Turma, a acusação será julgada por ela. .

Quando a tecnologia celular desembarcou no Brasil, os aparelhos custavam caríssimo, a habilitação era demorada e problemática, a cobertura era restrita às capitais e algumas grandes metrópoles, a escassez de células (antenas) prejudicava o alcance e a intensidade do sinal, o minuto de ligação custava os olhos da cara e até as chamadas recebidas eram cobradas. Com a privatização das Teles, a livre-concorrência ensejou a oferta de aparelhos subsidiados, planos pré-pagos e, mais adiante, pacotes com chamadas ilimitadas e franquias de dados para navegação na Web. 

Por outro lado, os "orelhões" foram aposentados e o mercado de telefonia fixa fechou 2024 com 22,2 milhões de linhas ativas — pouco mais da metade dos clientes que tinha 10 anos antes, no auge do setor. As quedas se dão de forma consecutiva desde 2015, sendo os maiores recuos registrados de 2023 para 2024 (-12,9%) e de 2018 para 2019 (-10,7%). Em contrapartida, havia 86,2 milhes de linhas de celular ativas em 2005; em 2024, esse número era da 263,4 milhões. O pico foi em 2014, com 280,7 milhões de linhas.

No Claro Net Ilimitado Brasil Total, R$ 35 mensais dão direito a ligações ilimitadas para telefones fixos e celulares de qualquer operadora em qualquer lugar do país (usando o 21), identificador de chamadas, siga-me, chamada em espera, conferência a três e bloqueio de ligações. No pacote mais em conta da Claro para celular, paga-se R$ 29,99 mensais por chamadas locais e interurbanas ilimitadas (para telefones fixos ou celulares de qualquer operadora), 12GB de franquia de dados, WhatsApp ilimitado, identificador de chamadas, caixa postal e SMS incluídos no pacote.
 
A TIM oferece o TIM Fixo Local Plus por R$ 41,85 mensais, que inclui ligações ilimitadas para telefones fixos e móveis de qualquer operadora local. O TIM Fixo Brasil Total Plus custa R$ 52,35, mas dá direito a ligações interurbanas para números de qualquer operadora em nível nacional, e o TIM Fixo Total LDI Plus, que custa R$ 59,90 mensais, inclui 150 minutos de ligações internacionais.

Resumo da ópera: Telefones fixos são mais baratos, não ficam sem bateria, não estão sujeitos a "áreas de sombra", são menos suscetíveis a quedas, furtos e roubos, e têm vida útil significativamente maior que a dos celulares, mas estes servem para navegar na Web, acessar redes sociais, trocar mensagens, fotos e vídeos, participar de videoconferências e fazer chamadas internacionais gratuitas pelo WhatsApp. A escolha, como sempre, depende do perfil e da preferencias pessoais de cada um, lembrando que "quem tem dois tem um e quem tem um não tem nenhum".

E como hoje é quarta-feira de cinzas...


sexta-feira, 17 de janeiro de 2025

PONTOS A PONDERAR...

DE PENSAR MORREU UM BURRO.

Quem leu O Príncipe sabe que o bem deve ser feito aos poucos e mal, de uma só vez. Mas a récua de muares que atende por "eleitorado" certamente não leu, e repete a cada dois anos o que Pandora fez uma única vez.
 
Churchill ensinou que a democracia é a pior forma de governo, exceto por todas as outras já tentadas, mas ressaltou que o melhor argumento contra ela é uma conversa de cinco minutos com um eleitor mediano. Se tivesse conhecido o eleitor brasileiro, o estadista britânico certamente reduziria esse tempo para 30 segundos.

CONTINUA DEPOIS DA POLÍTICA

Em entrevista publicada pelo The New York Times, Bolsonaro disse que estava tão animado com o convite do Trump que nem ia mais tomar Viagra. Mas tomou na tarraqueta: horas depois, alegando que em diversas ocasiões o indiciado manifestou-se favoravelmente à fuga de condenados no caso do 8 de janeiro e admitiu em entrevista a UOL a hipótese de ele próprio "evadir-se e solicitar asilo político para evitar eventual responsabilização penal no Brasil", Moraes indeferiu o pedido de liberação de seu passaporte
O ministro anotou ainda que Zero Três, intermediário do convite da família Trump ao pai, também endossou a defesa da fuga de condenados. Na véspera, a PGR havia se manifestado contra a ida do capetão à posse de seu ídolo, sustentando que a viagem serve ao "interesse privado" do ex-presidente, em contraposição ao "interesse público", que "se opõe à saída do requerente do país". A defesa de Bolsonaro recorreu, mas Moraes manteve sua decisão
A manifestação de Gonet e as decisões de Xandão são prenúncios do que vem pela frente na excursão do refugo da escória da humanidade pelos nove círculos do inferno. Em outras palavras, o que o PGR e o supremo togado disseram foi que não convém fornecer material para a fuga de um ex-presidente da República que frequenta o inquérito do golpe como uma condenação criminal esperando na fila par acontecer. Nesse entretempoBolsonaro escalou Celso Vilardi, um dos criminalistas mais experientes do país, reforçar o time de defensores do indefensável.
 
Em momentos distintos da ditadura, Pelé Figueiredo alertaram para o risco de misturar brasileiros e urnas em eleições presidenciais. Ambos foram muito criticados, mas como contestá-los se lutamos tanto pelo direito de votar para Presidente e elegemos gente como Lula, Dilma, Bolsonaro?
 
Não se sabe como o Brasil estaria hoje se golpe de Estado de 1889 não acontecesse, Ou se a renúncia de Jânio Quadros não levasse ao golpe de 64 e subsequentes 21 anos de ditadura militar. Ou se Tancredo Neves não fosse internado horas antes de tomar posse e batesse as botas 38 dias e 7 cirurgias depois, levando para a sepultura a esperança de milhões de brasileiros e deixando de herança um neto que envergonharia o país e um vice que promoveu a anarquia econômica e administrativa que levou à vitória de um pseudo caçador de marajás sobre um desempregado que deu certo na eleição solteira de 1989.
 
Usamos o tempo verbal "futuro do pretérito" (chamado de "condicional" até 1959) para falar de eventos cuja concretização depende de uma condição ou para fazer pedidos de forma educada. Embora usemos as palavras "pretérito" e "passado" de forma intercambiável no dia a dia, elas possuem nuances diferentes. Assim, o futuro do pretérito é um futuro que poderia ter acontecido, mas não aconteceu porque estava condicionado a algo que não se concretizou. 
 
No imaginário nacional, Tancredo foi o melhor de todos os presidentes, já que, a exemplo da Viúva Porcina no folhetim Roque Santeiro, "foi sem nunca ter sido" — mutatis mutandis, é como nos discursos fúnebres, onde virtudes que o falecido nunca teve são exaltadas. Conta-se que um padre recém-ordenado assumiu sua paróquia um dia antes da morte do prefeito, que era corrupto, rabugento e malquisto pelos locais. Sem elementos para embasar a homília fúnebre, o batina exortou os presentes a relembrar as qualidades do "nosso querido alcaide". Como ninguém se manifestou, a viúva, constrangida, ponderou: "O pai dele era ainda pior."
 
Muita coisa podia dar errado no capítulo final da novela da ditadura. Em 1984, numa conversa com Henry Kissinger, o ainda presidente João Figueiredo confidenciou que uma parte das Forças Armadas apoiava a volta do governo civil e a outra parte estava disposta a tudo para evitar que "os esquerdistas tomassem o país". Figueiredo considerava Tancredo uma pessoa capaz e moderada, mas cercada e apoiada por muitos radicais de esquerda que talvez não conseguisse controlar. 
 
Como estaríamos hoje se Tancredo tivesse presidido o Brasil? The answer, my friends, is blowing in the wind. De 15 de janeiro de 1985 — quando a raposa mineira derrotou o turco lalau, que era apoiado pelos militares, por 480 a 180 votos de um Colégio Eleitoral composto por deputados federais, senadores e delegados das Assembleias Legislativas dos Estados — até 14 de março, quando baixou ao hospital, ecoaram rumores de que os militares não deixariam o presidente eleito tomar posse, e os boatos ganharam força depois o general Newton Cruz revelou que, a três meses da votação, Maluf o havia procurado para propor um golpe 
 
Alguns conspirólogos alardearam que Tancredo havia sido baleado enquanto assistia a uma missa na Catedral de Brasília (faltou luz durante a cerimônia, e alguns presentes disseram ter ouvido um tiro), outros, que ele havia sido envenenado por militares apoiados pela CIA (por uma estranha coincidência, seu mordomo morreu dias depois, vítima de complicações gastrointestinais). A alteração da causa mortis de "infecção generalizada" para "síndrome da resposta inflamatória sistêmica" deixou muita gente com a pulga atrás da orelha — lembrando que alguns anos antes o papa João Paulo I, com apenas 33 dias de pontificado, foi encontrado morto em seus aposentos (após tomar uma mui suspeita xícara de chá0.
 
Observação: No livro "In God's Name", David Yallop popularizou a tese de envenenamento, mas as evidências em que ele se escorou não foram confirmadas pelas investigações, que apontaram "infarto fulminante" como causa mortis. Outras teorias sugerem que o assassinato foi orquestrado por grupos maçônicos ou resultou de uma conspiração envolvendo cardeais que se opunham a suas ideias e às reformas que ele pretendia implementar no Banco do Vaticano. A falta de autópsia e de uma investigação transparente alimentou as teorias conspiratórias, mas a maioria delas se baseia em especulações, rumores e testemunhos duvidosos.
 
A posse de Sarney ecoou como a "gargalhada do diabo" nos estertores da ditadura — que só terminou três anos depois, com a promulgação da Constituição Cidadã, que distribuiu diretos a rodo sem apontar de onde viriam os recursos para bancá-los (e que foi remendada mais de uma centena de vezes em 136 anos, enquanto a constituição norte-americana, que tem apenas 7 artigos, recebeu 27 emendas em 237 anos).
 
Observação: A palavra "direito" é mencionada 76 vezes na Carta, enquanto "dever" aparece apenas quatro e "produtividade" e "eficiência". duas e uma vez, respectivamente. O que esperar de um país que tem 76 direitos, 4 deveres, 2 produtividades e 1 eficiência? Na melhor das hipóteses, uma política pública de produção de leis, regras e regulamentos que quase nunca guardam relação com o mundo real.
 
O último dos 5 generais-presidentes da ditadura — que dizia preferir o cheiro dos cavalos ao cheiro do povo e que daria um tiro no coco se fosse criança e seu pai ganhasse salário-mínimo — se recusou a transferir a faixa para Sarney (faixa a gente transfere para presidente, não para vice, e esse é um impostor), lembrando que o obelisco da política de cabresto nordestina trocou a ARENA pelo MDB para integrar a chapa de oposição.

Sarney nem imaginava o tamanho da encrenca que seria assumir a presidência sem ter indicado os ministros nem participado da elaboração do plano de governo, mas herdado dos militares uma inflação de 220% a.a. Durante sua aziaga gestão, ele enfrentou mais de 12 mil greves e foi vítima de pelo menos um atentado. Em março de 1990, além da faixa presidencial, ele entregou a Collor uma superinflação de 1.800% a.a. e mudou seu domicílio eleitoral do Maranhão para o recém-criado estado do Amapá, onde conseguiu se eleger senador. Em 2014, aos 83 anos, deixou a vida pública para se dedicar à literatura em tempo integral — conta-se que um belo dia a governadora Roseana Sarney telefonou para informar que um dilúvio havia deixado metade do Maranhão debaixo d’água, e ouviu do pai a singela pergunta: "Sua metade ou a minha?
 
Tancredo, Ulysses e Covas lideraram a campanha pelas "Diretas Já", que reuniu mais de 1 milhão de pessoas no Anhangabaú em 1984. O movimento fracassou, mas o político mineiro foi escolhido pelo Colégio Eleitoral. Se ele, e não Sarney, tivesse presidido o Brasil de abril de 1985 a março de 1990, talvez a estabilidade econômica alcançada em 1994 com o Plano Real (conquista que Lula 3 vem tentando reverter) tivesse chegado mais cedo, livrando-nos dos nefastos planos Cruzado, Bresser, Verão e Collor.

Talvez Collor não se elegesse presidente e Lula assistisse à visita de Obama ao Brasil pela TV — sem à oposição ao "Rei-Sol", é possível que xamã da petralhada continuasse como deputado federal (cargo para o qual ele foi eleito em 1986) ou se aboletasse no Senado. Sem Collor, sem Zélia nem sequestro dos ativos financeiros e o congelamento da poupança, que derrubou quase à metade a venda de imóveis residenciais. 
Sem essas medidas heterodoxas e a sucessão de planos econômicos escorados no congelamento de preços e salários, a redução da miséria brasileira poderia ter começado muito antes, e hoje mais gente teria casa para morar.

Nada garante que seria assim, mas poderia ter sido. Só que não foi. 

Triste Brasil.