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segunda-feira, 18 de março de 2024

DANDO NOME AOS BOIS

 

Quem dá a chave do galinheiro às raposas não pode reclamar do sumiço das galinhas, e quem vota em políticos que se elegem para roubar, roubam para se reeleger e legislam em causa própria não pode reclamar da corrupção. 

Nos idos de 1970, o "rei" Pelé e o "presidente" Figueiredo alertaram para o perigo de colocar brasileiros e urnas no mesmo ambiente; passados 50 anos, o eleitorado apedeuta ainda não aprendeu que "agentes políticos" são funcionários públicos pagos com dinheiro dos impostos para servir aos interesses da nação. 

Uma rápida vista d'olhos nos "eleitos" desde a redemocratização (não que a situação fosse muito melhor antes de 1964) sugere que galinhas criarão dentes antes de que a ralé escalada pelo Criador para povoar esta banânia descobrir que político não deve ser endeusado, mas cobrado — e penabundado se mijar fora do penico. 
 
Na eleição solteira de 1989 — a primeira pelo voto popular desde 1960 — havia 22 postulantes ao Planalto, entre
 os quais Ulysses Guimarães e Mário Covas. Acabou que o esclarecidíssimo eleitorado despachou Collor e Lula para o segundo turno. O caçador de marajás de mentirinha derrotou o desempregado que deu certo de verdade, mas se envolveu com corrupção e renunciou horas antes do julgamento de seu impeachment.

Com a deposição do "Rei Sol", Itamar Franco foi promovido a titular. Tendo o sucesso do Plano Real como cabo eleitoral, Fernando Henrique derrotou Lula em 1994; picado pela mosca azul, comprou a PEC da reeleição (detalhes nesta postagem) e derrotou Lula em 1998. Mas já não restavam ao tucano de plumas vistosas novos coelhos para tirar da velha cartola, e Lula venceu Serra em 2002 e Alckmin em 2006. 

Em 2010, o "cara" de Barack Obama escalou uma gerentona de araque para manter aquecida a poltrona que tencionava voltar a ocupar dali a quatro anos, mas madame pegou gosto pelo poder, promoveu o maior estelionato eleitoral da história e venceu Aécio Neves em 2014 — com a menor diferença de votos desde a eleição de Juscelino em 1955. 
 
Promovido de vice a titular pelo impeachment da "mulher sapiens", Michel Temer 
conseguiu baixar a inflação e a Selic e aprovar o Teto dos Gastos e a Reforma Trabalhista, mas seu "ministério de notáveis" revelou-se uma notável confraria de corruptos, e o fato de ter sido citado nas delações da Odebrecht (43 vezes somente na do ex-diretor de relações institucionais da empreiteira não ajudou) não contribuiu para a popularidade de um presidente visto como traidor e golpista pelos petistas e malvisto pelos que comemoraram o final do governo petista (por ter sido vice de Dilma e presidido o maior partido da base aliada do governo petista por 15 anos).

Observação: Num primeiro momento, a troca de comando foi como uma lufada de ar fresco numa catacumba. Após 13 anos e fumaça ouvindo os garranchos verbais de um semianalfabeto e as frases desconexas de uma  destrambelhada, um presidente que não só sabia falar como até usava mesóclises era um refrigério. 

Quando vieram a público o áudio da conversa de alcova com o carniceiro de luxo Joesley Batista e o vídeo de Rodrigo Rocha Loures arrastando uma mala de dinheiroTemer viu seu sonho de entrar para a história como "o cara que recolocou o Brasil nos trilhos" se transformar no pesadelo de se tornar primeiro Presidente denunciado no exercício do cargo por corrupção, formação de quadrilha e obstrução da Justiça. 

Demovido da ideia de renunciar por Eliseu Padilha, Moreira Franco, Carlos Marun, Romero Jucá e outros puxa-sacos que perderiam os cargos e o foro privilegiado se o chefe pedisse o boné, o nosferatu tupiniquim esbravejou — num pronunciamento à nação feito mais de 40 horas depois do furo de Lauro Jardim  que o STF seria "o território onde surgiram as explicações e restaria provada sua inocência". A partir daí, pôs-se a mentir descaradamente para justificar o injustificável, moveu mundos e fundos — especialmente fundos — para se escudar das "flechadas de Janot" e claudicou pela conjuntura como pato manco até o final do mandato-tampão, que se encerrou com a transferência da faixa presidencial para Jair Bolsonaro, o subproduto da escória da raça humana que se elegeu graças a uma formidável conjunção de fatores

Como ensinou o Conselheiro Acácioas consequências sempre vêm depois. Para supresa de ninguém, o deputado do baixo-clero que aprovou dois projetos em 7 mandatos e obteve míseros 4 votos quando disputou a presidência da Câmara (em 2017) se tornou o pior mandatário desde Tomé de Souza — e o primeiro, desde a redemocratização, a não conseguir se reeleger. Se essa criatura repulsiva não tivesse conspirado 24/7, fomentado a Covid, rosnado para o Congresso e o Supremo e se amancebado com Queiroz, Zambelli, milicianos e outros imprestáveis, é possível que o xamã do PT continuasse gozando férias compulsórias na carceragem da PF em Curitiba. 

Uma vez confirmada a derrota nas urnas, o "mito" da extrema-direita radical se encastelou no Alvorada, onde ficou até a antevéspera da posse de Lula, quando então desabalou para os EUA e se homiziou na cueca do Pateta por quase três meses, aguardando o desenrolar dos acontecimentos urdidos no Brasil por seus comparsas golpistas. 
 
Lula merece um capítulo especial, que lhe será dedicado na próxima postagem.

segunda-feira, 17 de outubro de 2022

UM PAÍS SUI GENERIS


O debate foi medíocre, como era esperado de dois candidatos medíocres que um eleitorado medíocre escalou para disputar o segundo turno. A meu ver, ambos saíram menores do que entraram.


O eleitor brasileiro parece desconhecer a máxima segundo a qual fazer sempre a mesma coisa esperando resultados diferentes é insanidade. Na primeira eleição direta para presidente da Nova República, dos 22 postulantes — entre os quais se destacavam Ulysses Guimarães, Mário Covas, Leonel Brizola e Fernando Gabeira —, foram despachados para o segundo turno um caçador de marajás demagogo e populista e um ex-metalúrgico populista e demagogo. 

O perigo de eleger políticos demagogos e populistas aumenta exponencialmente quando o povo é vocacionado a "endeusá-los", entronizando no poder quem sempre lá esteve e sempre. Pode-se atribuir parte da culpa ao Criador, mas não é Dele o dedo podre (ou o casco canhestro) que pressiona alegremente o botão verde da urna, quando vê a foto do candidato que o manterá na sarjeta pelos próximos quatro anos. 
 
Voltando à eleição solteira de 1989, Collor derrotou Lula, mas acabou impichado. Seu vice, Itamar Franco, foi considerado uma figura patética e lembrado pela ressurreição do fusca e pela foto ao lado da modelo sem calcinha Lilian Ramos, mas e foi durante sua gestão que Fernando Henrique e seus "notáveis" criaram o Plano Real, pondo fim a uma hiperinflação de 80% ao mês e propiciando a eleição do tucano de plumagem vistosa no primeiro turno do pleito de 1994. Picado pela mosca azul, FHC conseguiu que o Congresso aprovasse a PEC da Reeleição — essa, sim, a verdadeira "herança maldita" dos governos do PSDB — e tornou a se eleger em 1998, mas não conseguiu emplacar José Serra em 2002.
 
Com a vitória de Lula, o PT criou o Mensalão, que resultou na prisão de petralhas alto coturno — curiosamente, o maior beneficiário do esquema não foi incluído na ação penal 470 (que levou incríveis sete anos da instauração ao julgamento final). Lula foi reeleito e em 2006 e, em 2010, escalou um "poste" para manter aquecida a poltrona que ele pretendia voltar a ocupar dali a 4 anos. No entanto, a criatura pegou gosto pelo poder e, contrariando seu criador, fez o diabo para se reeleger. 
 
Dilma conseguiu se reeleger (mediante um monumental estelionato eleitoral), mas acabou afastada em maio em maio de 2016 e deposta em agosto, interrompendo 13 anos 4 meses e 12 dias de lulopetismo corrupto — àquela altura, o Petrolão já campeava solto, desviando uma parte dos contratos milionários da Petrobras para contas secretas controladas por integrantes de grupos políticos e econômicos que apoiavam o governo. Com o impeachment da gerentona de araque, seu vice, Michel Temer, assumiu o comando da Nau dos Insensatos, mas foi abatido em seu voo de galinha antes de cruzar a miserável pinguela que o levaria a ostentar a faixa presidencial até o final de 2018 (detalhes nesta postagem).
 
A pergunta que se coloca é: foi para isso que lutamos tanto pelas “Diretas Já”? Desde a redemocratização que o Brasil vem sendo governado como uma usina de processamento de esgoto, onde a merda entra por um lado e sai pelo outro. Entre a porta de entrada, que é aberta nas eleições, e a de saída, que se abre quando muda o governo, a merda muda de aparência, troca de nome e recebe nova embalagem, porém continua sendo merda. 

A merda reprocessada no governo Lula desaguou no governo Dilma e se reprocessou no governo Temer. O material processado pela usina continuou o mesmo nas três fases, durante a compostagem de políticos “do ramo”, empreiteiras de obras públicas, escroques de todas as especialidades, fornecedores do governo, parasitas ideológicos, empresários declarados “campeões nacionais” por Lula, por Dilma e pelos cofres do BNDES. 
 
Temer foi parte integrante da herança que Lula deixou para os brasileiros. A reboque dele, vieram Eduardo CunhaRenan CalheirosJosé Sarney (e família), Romero JucáEliseu PadilhaEunício OliveiraGeddel Vieira Lima etc. E a eles se juntaram empresários “nacionalistas” dos governos petistas, como Joesley e Wesley BatistaEmílio e Marcelo OdebrechtEike Batista e outros capitães da indústria que se tornaram inquilinos do sistema penitenciário nacional.
 
Durante algum tempo, a Lava-Jato nos deu a ilusão de que lei valia por igual para todos. Lula e seus benfeitores da Odebrecht e da OAS foram parar na cadeia, mas o STF mudou (pela enésima vez) a jurisprudência sobre prisão em segunda instância, anulou as condenações do ex-presidiário e pregou no ex-juiz Sergio Moro a pecha da parcialidade.
 
Somada ao notório brilhantismo da malta tupiniquim (falo daquela que se convencionou chamar "eleitorado"), essa formidável sequência de descalabros levou a usina de compostagem a produzir o bolsonarismo. Enquanto Lula oscilava entre a prisão e o Planalto, Bolsonaro, que até então não passava de um dublê de mau militar e parlamentar medíocre, comia pelas beiradas. À luz da Teoria das Probabilidades, um anormal ser eleito presidente da República seria improvável; dois, inacreditável; três, e em seguida, virtualmente impossível. Mas não no Brasil. 
 
Lula ocupou a Presidência de 2003 a 2010; Dilma, de 2011 a 12 de maio de 2016; e Bolsonaro, de 2019 até não se sabe quando. Se vivêssemos num país normal, essa dúvida seria dirimida no próximo dia 30. Como não é, o futuro a Deus pertence. Mas parece que o Capiroto também tem voto decisivo na assembleia dos acontecimentos.

domingo, 14 de agosto de 2022

ERA UMA VEZ, NO PAÍS DAS MARAVILHAS...

 

Por ter exercido apenas cargos de gestão até 2010, Dilma adquiriu o hábito de mandar. No Planalto, incorporou novas "virtudes", como a soberba, a arrogância e a agressividade. Impaciente, queria tudo “para ontem”. Ignorante, posava de onisciente. Contrariada, atirava objetos nas pessoas — grampeadores eram repostos regularmente em seu gabinete. 


As folclóricas "pedaladas fiscais" foram apenas a justificativa mais à mão para o pé na bunda. A estrupícia foi defenestrada por não ter jogo de cintura no trato com o Congresso. Mas seu vice, que foi o grande mentor e o maior beneficiário do impeachment, tinha traquejo político de sobra. 

 

Caçula temporão de oito irmãos, Michel Miguel Elias Temer Lulia graduou-se em Direito pela USP em 1963 e ingressou na política no ano seguinte, mas só se filiou ao PMDB (hoje MDB), em 1981. Depois de ocupar os cargos de procurador-geral do Estado e secretário de Segurança Pública de São Paulo, o futuro vampiro do Jaburu foi deputado federal por seis mandatos e presidente do PMDB por mais de 15 anos. Em 2009, Temer foi o primeiro colocado entre os parlamentares mais influentes do Congresso. No ano seguinte, aceitou o convite de Lula para disputar a vice-presidência na chapa encabeçada por Dilma


No final de 2015, o nosferatu enviou à "chefa" uma carta (que ele próprio se encarregou de vazar para a imprensa) reclamando de ser um "vice decorativo" e dizendo que sempre teve ciência da desconfiança de Dilma e do PT em relação a ele e ao PMDB. Em resposta, a mandatária afirmou que “não via motivos para desconfiar um milímetro de seu vice, que sempre teve um comportamento bastante correto”, mas logo percebeu que estava enganada. 

 

Assim que a Câmara votou a admissibilidade do impeachment, Temer vazou um arquivo de áudio em que ele falava como se estivesse prestes a assumir o governo. No dia seguinte, Dilma esbravejou que "havia um golpe em curso, e que tinha chefe e vice-chefe" (referindo-se a Temer e a Eduardo Cunha, então presidente da Câmara). 


Madame foi afastada no dia 11 de maio e penabundada em 31 de agosto, quando então o "golpista" passou de presidente interino a titular. Os puxa-sacos de plantão convenceram-no a trocar o Jaburu pelo Alvorada, argumentando que "a mudança atribuiria legitimidade a seu mandato". E assim foi feito. Mas Temer voltou ao Jaburu depois de pouco mais de duas semanas; segundo ele próprio afirmou a VEJA, o Alvorada é assombrado


Como se vê, o Brasil é um país tão surreal que até vampiro tem medo de fantasma.

 

Inicialmente, a troca de comando foi como uma lufada de ar fresco numa catacumba. Depois de mais de 13 anos ouvindo garranchos verbais de um semianalfabeto e frases desconexas de uma destrambelhada, ter um presidente que não só sabia falar como até usava mesóclises foi um refrigério. Para além disso, Temer conseguiu reduzir a inflação, baixar a Selic e aprovar a PEC do Teto dos Gastos e a Reforma Trabalhista. Mas seu ministério de notáveis se revelou uma notável agremiação de corruptos. 

 

Em pouco mais de um mês de governo, caíram os ministros do Planejamento, da Transparência e do Turismo. O primeiro, Romero Jucá — que defendeu um pacto para “estancar a sangria” produzida pela Lava-Jato —, ganhou do presidente uma secretaria criada especialmente para evitar que ele perdesse o foro privilegiado.  Na sequência, caíram o Advogado-Geral da União e os ministros da Cultura e da Casa Civil (foi num apartamento deste último que a PF apreendeu R$ 51 milhões em dinheiro vivo, armazenados em malas e caixas de papelão). Temer se empenhou em preservar Eliseu Padilha e Moreira Franco, que, nas palavras de Joesley Batista, ajudavam o presidente a comandar “a quadrilha mais perigosa do Brasil”.

 

Temer almejava entrar para a história como “o cara que recolocou o Brasil nos eixos”. O sonho durou pouco. Depois que sua conversa de alcova com Joesley Batista foi revelada por Lauro Jardim, o presidente passou a ser lembrado pela célebre frase “tem de manter isso, viu”. O então procurador-geral Rodrigo Janot (outra aberração da natureza) ofereceu duas denúncias contra ele, que não se deu por achado: com a ajuda de sua tropa de choque (capitaneada Carlos Marun, o ridículo), montou sua tenda de mascate libanês na porta da Câmara e passou a oferecer cargos e verbas em troca dos votos das marafonas parlamentares. 


Observação: Nada muito diferente do que Lula tentou fazer durante o impeachment de sua deplorável sucessora. Mas o petralha malhou em ferro frio, e Temer conseguiu que a maioria do lupanar entoasse a marcha fúnebre enquanto as denúncias de Janot eram sepultadas.

 

Corta para julho de 2022:  Um petista habituado às negociações e articulações políticas afirmou em off que o ex-presidente estava propenso a trabalhar por uma aliança em torno de Lula ainda no primeiro turno, em detrimento da candidatura da senadora emedebista Simone Tebet. Como contrapartida, o vampiro pediu que o PT deixasse de se referir a ele como “golpista”. 


Apesar de ser um exímio estrategista, Temer não só deu com os burros n'água como provocou a ira de Dilma, a irascível, ao destacar durante uma entrevista que madame era “honestíssima”. Não use minha honestidade para aliviar sua traição”, reagiu a estocadora de vento, exsudando ressentimento. 


Embora pudesse render bons frutos eleitorais, a aliança era considerada improvável. Querer que o PT deixe de tratar o impeachment como um golpe seria exigir demais da patuleia.

 

Continua...

terça-feira, 9 de agosto de 2022

A VIDA TEM DE CONTINUAR

 

Pessoas normais miram-se no espelho e veem a própria imagem. Ególatras, megalômanos e lunáticos veem apenas o que gostariam de ver — ou de ser. Isso explica o fato de certo retirante pernambucano que vendeu laranjas, engraxou sapatos e trabalhou como office-boy antes de se tornar torneiro mecânico, eneadáctilo, dirigente sindical, fundador de político e presidente da República se ver como “a alma viva mais honesta do Brasil”. Vampiros, como se sabe, não aparecem em espelhos, e talvez por isso... bem, vamos por partes. 

Em dezembro de 2015, o então vice decorativo de Dilma enviou uma carta à chefa (que vazou por obra e graça do próprio) dizendo que “a palavra voa, mas o escrito fica” — daí ele manifestar por escrito o "desabafo que devia ter feito muito antes" e que sempre teve ciência da absoluta desconfiança da presidanta e do PT em relação a ele e ao PMDBDilma disse que “não via motivos para desconfiar um milímetro de seu vice, que sempre teve um comportamento bastante correto”, mas não demorou a perceber quão enganada ela estava. 

Depois que a Câmara votou a admissibilidade do impeachment da presidanta, o nosferatu enviou a parlamentares peemedebistas uma áudio em que ele falava como se estivesse prestes a assumir o governo. Sua assessoria informou que a mensagem fora enviada por engano, mas a desculpa não colou. No dia seguinte, a ficha caiu e Dilma gritou aos quatro ventos que "havia um golpe em curso, e que ele tinha chefe e vice-chefe" (referindo-se a Temer e a Eduardo Cunha, então presidente da Câmara). 
 
Quando foi promovido a titular, Temer relutou em deixar o Jaburu e se instalar no Alvorada, mas cedeu à pressão de aliados — segundo os quais a mudança “atribuiria legitimidade a seu mandato como presidente”. Só que não chegou a esquentar lugar. Segundo o nosferatu revelou à revista Veja, o Alvorada era assombrado. Vampiro com medo de fantasma era só o que faltava!
 
Num primeiro momento, a troca de comando foi como uma lufada de ar fresco numa catacumba. Após 13 anos, 4 meses e 12 dias anos ouvindo os garranchos verbais de um semianalfabeto e as frases desconexas de uma destrambelhada (que não era capaz sequer de juntar sujeito e predicado numa frase que fizesse sentido), um presidente que não só sabia falar como até usava mesóclises era um refrigério. 
 
Ninguém esperava que os problemas do país fossem solucionados da noite para o dia, mas o fato é que Temer conseguiu reduzir a inflação (que rodava pelos 10% quando ele assumiu), baixar a Selic e aprovar a PEC do Teto dos Gastos e a Reforma Trabalhista. Mas o ministério de notáveis que ele prometeu se revelou uma notável agremiação de corruptos

O primeiro a cair foi Romero Jucá (ou “Caju”, como ele figurava na planilha de propinas da Odebrecht).Em conversa com Sergio Machado, ex-presidente da Transpetro, o nobre político pernambucano defendeu um pacto para “estancar a sangria” (referindo-se à Lava-Jato). Mesmo sem o status de ministro, o caju que caiu do pé continuou no governo, ocupando uma secretaria criada especialmente para preservar seu direito ao foro privilegiado.
 
O segundo que sucumbiu à lei da gravidade foi ministro da Transparência, Fiscalização e Controle, que caiu devido a uma conversa — também gravada à sorrelfa por Sergio Machado — em que criticava a Lava-Jato e orientava Renan Calheiros sobre como se comportar em relação à PGR.  Depois foi a vez do ministro do Turismo — que, segundo a delação premiada de Machado, teria recebido R$ 1,55 milhão em propina entre 2008 e 2014. Na sequência, o Advogado-Geral da União foi exonerado por conta de uma discussão com o então todo-poderoso ministro-chefe da Casa Civil (o amigão de Temer em cujo apartamento a PF encontrou R$ 51 milhões em caixas de papelão. 
 
Esse imbróglio resultou na demissão do ministro da Cultura — que alegou ter sido pressionado para aprovar o projeto imobiliário La Vue Ladeira da Barra, onde Geddel tinha um apartamento. O desgaste decorrente do episódio levou à queda do próprio Geddel, que “se demitiu” uma semana mais tarde. Temer se empenhou em preservar Eliseu Padilha, o “Primo”, e Wellington Moreira Franco, o “Angorá”, que o ajudavam a comandar, nas palavras de Joesley Batista, “a quadrilha mais perigosa do Brasil”.
 
Temer, que aspirava a entrar para a história como “o cara que recolocou o Brasil nos eixos”, tornou-se o primeiro presidente no exercício do mandato a ser denunciado por crime comum. Mesmo assim, a nauseabunda tropa de choque do Planalto — capitaneada pelo abjeto Carlos Marun — recrutou um coro de 251 marafonas da Câmara para entoar a marcha fúnebre enquanto a segunda denúncia contra o presidente era sepultada, a despeito da caudalosa torrente de indícios de que ele havia mijado fora do penico. 
 
A honestidade e a lisura no trato da coisa pública — virtudes esperadas de presidentes, ministros, parlamentares, governadores e políticos em geral — há muito fizeram as malas e partiram do Brasil. Para onde? Ninguém sabe, ninguém viu. Prova disso é a sucessão de escândalos-nossos-de-cada-dia, de fazer corar santo de pedra, mas que a população transforma em anedota porque lágrimas não pagam dívidas e a vida precisa continuar. 

sábado, 12 de fevereiro de 2022

RESTAURE-SE O IMPÉRIO DA MORALIDADE OU LOCUPLETEMO-NOS TODOS! (PARTE XII)


— Não renunciarei. repito: não renunciarei. Se quiserem, me derrubem! — rosnou Michel Temer, o dedo em riste demonstrando que o que lhe importava era se manter no cargo a qualquer custo. “Renunciar seria uma confissão de culpa”, asseverou o nosferatu tupiniquim, como se àquela altura suas justificativas estapafúrdias tivessem alguma credibilidade.

Na verdade, (quase) todo mundo queria ver Temer pelas constas, só que ninguém queria fazer o trabalho sujo. Assim, o governo ruiu, mas o mandatário continuou lá, aprovando coisas um tanto sem sentido, apenas para sinalizar que tudo estava na mais perfeita ordem, na mais santa paz (nada muito diferente do que acontece com o atual governo, onde Bolsonaro finge que preside enquanto o Centrão dá as ordens).

Quando a delação de Joesley Batista veio à tona, Temer perdeu a segunda grande chance de renunciar (a primeira foi por ocasião da deposição de Dilma). Comentou-se que ele chegou a pensar seriamente em fazê-lo, mas foi demovido da ideia por Eliseu PadilhaMoreira Franco, Carlos Marun, Romero Jucá e outros assessores puxa-sacos, igualmente investigados ou suspeitos de práticas nada republicanas, que perderiam os cargos e o foro privilegiado se o presidente renunciasse.

Em seu primeiro pronunciamento à nação depois que Lauro Jardim revelou a conversa de alcova de Temer e o moedor de carne bilionário, o presidente disse que o inquérito no STF seria “o território onde surgiram as explicações e restaria provada sua inocência”. E o que fez a partir de então? Mentiu descaradamente para justificar o injustificável, atacou seus acusadores e moveu mundos e fundos (especialmente fundos) para obstruir a denúncia. 

Descartada a renúncia e afastado o impeachment, não só porque Rodrigo Maia decidira empurrar a coisa com a barriga enquanto pudesse, mas também porque o processo demoraria demais e o país sofreria as consequências de outra deposição presidencial, via Congresso, em menos de 18 meses, só restou o inquérito no STF e o julgamento da chapa Dilma-Temer no TSE — ação proposta pelo PSDB a pretexto de “encher o saco do PT”, conforme revelou o candidato derrotado Aécio Neves numa conversa gravada por (ele de novo!) Joesley Batista, que vinha se arrastando havia anos. 

Por (mais) uma ironia do destino, o partido que se tornou o maior aliado do governo com o impeachment transformou-se em seu algoz. Mas os tucanos mantiveram um pé no poleiro e os olhos no TSE, prontos para bater asas e voar assim que a cassação da presidanta lhes parecesse inevitável.

A procrastinação do julgamento complicou ainda mais a situação de Temer, pois ensejou a inclusão de outros elementos contra ele. Assim, se não havia evidências de que o vice não recebeu dinheiro de caixa 2 para sua campanha, não falavam provas de que a chapa recebeu, e ele se beneficiou dos mesmos recursos que garantiram a reeleição da presidanta. 

Depois de dizer que “os juízes não são de Marte” — dando a entender que seria impossível ignorar o cenário político e as consequências da cassação de (mais) um presidente — Gilmar Mendes adiantou para a imprensa que o julgamento seria “jurídico e judicial”, que o Tribunal não era “joguete de ninguém”, e que não cabia à Corte “resolver crise política”.

Antes do vazamento da delação dos donos da JBS, dava-se de barato que o TSE livraria a pele de Temer. A última coisa que se desejava naquele momento era mais uma troca de comando, mesmo porque o governo vinha tocando as reformas e a economia, dando sinais de recuperação. Mas seria difícil justificar a manutenção de um presidente altamente impopular e, ainda por cima, investigado por corrupção passiva, organização criminosa e obstrução da Justiça.

O ministro-relator Hermann Benjamin — que produziu um calhamaço de mais 1.000 páginas — defendia eleições diretas para a escolha do próximo presidente. Em sua avaliação, se a eleição de 2014 sagrou vencedora uma chapa que comprovadamente fraudara o pleito, a vontade popular fora desrespeitada e a eleição deveria ser anulada, dispensando o cumprimento do art. 81 da Constituição (que estabelece a realização de eleições indiretas no caso de vacância a partir de dois anos do mandato). Acabou que Gilmar Mendes entrou em ação e a chapa foi absolvida por 4 votos a 3 — “por excesso de provas”, como observou posteriormente o relator.

Enquanto houver bambu, vai ter flecha”, avisou o PGR Rodrigo Janot, que simpatizava com Dilma, mas não suportava Temer. Respaldado nos depoimentos de Joesley Batista e Lúcio Funaro (o homem da mala do presidente), Janot apresentou duas denúncias contra o vampiro do Jaburu, mas ambas foram barradas pela Câmara. Temer não foi apeado do cargo porque: 

1) Faltou consenso em torno do seu eventual sucessor (os parlamentares não estavam dispostos a abrir mão das eleições indiretas nem de escolher um de seus pares para o mandato-tampão); 

2) Não houve vontade política dos nobres congressistas; 

3) Não faltam, entre os 513 deputados federais, quem se disponha a votar contra ou a favor de qualquer coisa, desde que haja a "devida reciprocidade".

Continua...

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2022

RESTAURE-SE O IMPÉRIO DA MORALIDADE OU LOCUPLETEMO-NOS TODOS (PARTE XI)


Pessoas normais miram-se no espelho e veem a própria imagem. Ególatras, megalômanos e lunáticos veem aquilo que gostariam de ver — ou de ser. Eis o porquê de certo retirante pernambucano que vendeu laranjas, engraxou sapatos e trabalhou como office-boy antes de se tornar torneiro mecânico, eneadátilo, dirigente sindical, fundador de político e presidente da República se ver como “a alma viva mais honesta do Brasil”.

Os vampiros, como se sabe, não têm a imagem refletida em espelhos, e talvez por isso... bem, vamos por partes. Em dezembro de 2015, o então vice decorativo de Dilma enviou uma carta à chefa (que vazou por obra e graça do próprio missivista e foi largamente reproduzida na mídia) dizendo que “a palavra voa, mas o escrito fica” — daí ele preferir manifestar por escrito o "desabafo que devia ter feito muito antes" — e que sempre teve ciência da absoluta desconfiança da presidanta e do PT em relação a ele e ao PMDB

A nefelibata da mandioca disse que “não via motivos para desconfiar um milímetro de seu vice, que sempre teve um comportamento bastante correto”, mas não demorou a perceber que estava enganada. Depois que a Câmara votou a admissibilidade do impeachment, Temer enviou uma mensagem de voz a parlamentares peemedebistas em que falava como se estivesse prestes a assumir o governo. 

O áudio dava a impressão de ser um “comunicado" sobre como ele pretendia conduzir o país. Sua assessoria informou que a mensagem havia sido enviada por engano a um grupo de deputados do partido, mas a desculpa não colou. No dia seguinte, Dilma declarou que "havia um golpe em curso que tinha chefe e vice-chefe" (referindo-se a Temer e a Eduardo Cunha, então presidente da Câmara). Sábias palavras, majestade.

Quando foi promovido a titular, Temer relutou em deixar o Jaburu e se instalar no Alvorada, mas cedeu à pressão de aliados — segundo os quais a mudança “atribuiria legitimidade a seu mandato como presidente”. Só que não chegou a esquentar lugar: a despeito dos mais R$ 20 mil que foram gastos com a adaptação do palácio às necessidades de Michelzinho, o vampiro voltou de mala e cuia para o Jaburu. Segundo ele revelou entrevista à revista Veja, o Alvorada era assombrado. Vampiro com medo de fantasma era só o que nos faltava!

Num primeiro momento, a troca de comando foi como uma lufada de ar fresco numa catacumba. Após 13 anos e fumaça ouvindo os garranchos verbais de um semianalfabeto e as frases desconexas de uma destrambelhada que não era capaz sequer de juntar sujeito e predicado numa frase que fizesse sentido, um presidente que não só sabia falar como até usava mesóclises era um refrigério. Não seria de esperar que os problemas do país fossem solucionados da noite para o dia, mas o fato é que Temer conseguiu reduzir a inflação (que rodava pelos 10% quando ele assumiu) e baixar a Selic e aprovar a PEC do Teto dos Gastos e a Reforma Trabalhista, entre outros “prodígios”. No entanto, o ministério de notáveis que ele prometeu se revelou uma notável agremiação de corruptos — que foram caindo à razão de um por mês.

O primeiro a cair foi Romero Jucá, o “Caju”, colega de partido e amigo de longa data de Temer. Em conversa com o ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado — gravada sem o conhecimento do interlocutor —, ouve-se Jucá dizer defendendo um pacto para “estancar a sangria” (referindo-se à Lava-Jato). Mesmo sem o status de ministro, o político pernambucano continuou no governo, ocupando uma secretaria criada especialmente para preservar seu direito ao foro privilegiado.

Uma semana depois que o caju caiu do pé foi a vez do ministro da Transparência, Fiscalização e Controle, que caiu devido a uma conversa — também gravada à sorrelfa por Machado — em que ele criticava a Lava-Jato e orientava Renan Calheiros sobre como se comportar em relação à PGR.  Junho levou embora o ministro do Turismo — que, segundo a delação premiada de Machado, teria recebido R$ 1,55 milhão em propina entre 2008 e 2014. 

Julho passou batido, mas agosto pegou no contrapé o então Advogado-Geral da União, que foi demitido por conta de uma discussão com o então todo-poderoso ministro-chefe da Casa Civil (o amigão de Temer em cujo apartamento a PF encontrou R$ 51 milhões em caixas de papelão). O imbróglio resultou também na demissão do ministro da Cultura — que alegou ter sido pressionado para aprovar o projeto imobiliário La Vue Ladeira da Barra, onde o chefe da Casa Civil tinha um apartamento. O desgaste decorrente do episódio levou à queda do próprio Geddel, que “se demitiu” uma semana mais tarde. Temer se empenhou em preservar Eliseu Padilha, o “Primo”, e Wellington Moreira Franco, o “Angorá”, que o ajudavam a comandar, nas palavras de Joesley Batista, “a quadrilha mais perigosa do Brasil”. Tutti buona gente!

Michel Temer, que aspirava a entrar para a história como “o cara que recolocou o Brasil nos eixos”, tornou-se o primeiro presidente no exercício do mandato a ser denunciado por crime comum. Mesmo assim, a nauseabunda tropa de choque do Planalto — capitaneada pelo abjeto Carlos Marun — recrutou um coro de 251 marafonas da Câmara para entoar a marcha fúnebre enquanto a segunda denúncia contra o presidente era sepultada, malgrado a caudalosa torrente de indícios de que ele havia mijado fora do penico. 

A honestidade e a lisura no trato da coisa pública — virtudes esperadas de presidentes, ministros, parlamentares, governadores e políticos em geral — há muito fizeram as malas e partiram do Brasil. Para onde? Ninguém sabe, ninguém viu. Prova disso é a sucessão de escândalos-nossos-de-cada-dia, de fazer corar santo de pedra, mas que a população transforma em anedota porque lágrimas não pagam dívidas e a vida precisa continuar. 

Continua...

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2022

RESTAURE-SE O IMPÉRIO DA MORALIDADE OU LOCUPLETEMO-NOS TODOS! (PARTE X)


Em 2012, assistimos estarrecidos (mas esperançosos) à condenação da alta cúpula do Mensalão. Em 2016, livramo-nos de Dilma, que afundou o Brasil na maior recessão da história republicana do país — e está prestes a perder o primeiro lugar no ranking para Bolsonaro, mas isso é outra história.

Quanto ao poste de Lula, nenhuma surpresa: em fevereiro de 1995, quando a paridade cambial entre o real e o dólar favorecia sobremaneira a importação e revenda de badulaques, a calamidade em forma de gente faliu duas lojinhas tipo R$ 1,99 que havia montado em Porto Alegre e batizado com o sugestivo nome de “Pão & Circo” — que remete a uma estratégia romana destinada a entreter a plebe ignara, insatisfeita com os excessos do Império.

Comercializar quinquilharias baratas deveria ser algo trivial para alguém que, 15 anos depois, se apresentaria aos eleitores como a “gerentona” capaz de manter o Brasil no rumo do desenvolvimento. O problema, para Dilma e seus três sócios, é que a futura presidente cuidou da contabilidade da empresa como lidaria mais adiante com as finanças do País: em julho de 1996 seu comercio já não existia mais.

Para começar, a loja foi aberta sem que os donos soubessem ao certo o que seria comercializado ali. Às favas o planejamento — primeiro passo para criação de qualquer negócio que se pretenda lucrativo. A empresa foi registrada para vender de tudo um pouco a preços módicos, entre bijuterias, confecções, eletrônicos, tapeçaria, livros, bebidas, tabaco e até flores naturais e artificiais. Mas Dilma acabou apostando no comércio de brinquedos para crianças, em especial os “Cavaleiros do Zodíaco”.

Os artigos revendidos pela Pão & Circo eram importados de um bazar localizado no Panamá, para onde a grande economista e a sócia e ex-cunhada Sirlei Araújo viajavam regularmente para comprar os produtos. Apesar de a mercadoria custar barato, o negócio era impopular — como Dilma se tornaria mais adiante. 

Ao abrir a vendinha, a mulher sapiens não levou em conta que “o olho do dono engorda o porco”, e só aparecia por lá eventualmente, preferindo dar ordens e terceirizar as tarefas do dia a dia — como fez ao delegar a economia ao ministro Joaquim Levy e a política ao vice Michel Temer — até este desistir da função dizendo-se boicotado pelo (então) ministro-chefe da Casa Civil Aloizio Mercadante.

Na sociedade da Pão & Circo, o equivalente a Mercadante era Carlos Araújo, ex-marido de Dilma, que a aconselhava sobre como turbinar as vendas, mas era tão inepto quanto a futura chefa da Casa Civil e presidenta do Conselho de Administração da Petrobrás no governo de Lula demonstrou ser na negociata de Pasadena. Mesmo assim, a empresária de festim teve uma carreira meteórica: sem saber atirar, virou modelo de guerrilheira; sem ter sido vereadora, virou secretária municipal; sem passar pela Assembleia Legislativa, virou secretária de Estado; sem estagiar no Congresso, virou ministra; sem ter inaugurado nada de relevante, virou estrela de palanque; sem jamais ter tido um único voto na vida até 2010, virou presidente de país.

Observação: Até os pedalinhos do Sítio Santa Bárbara, em Atibaia, sabiam desde sempre que Lula institucionalizou a corrupção no Brasil. E quem não sabia ficou sabendo quando o procurador Deltan Dallagnol apresentou à imprensa um PowerPoint tosco, mas elucidativo, demonstrando que o picareta dos picaretas era o comandante máximo da ORCRIM. Dilma foi o maior erro tático que o petista cometeu em sua trajetória política. Dias atrás, ele próprio disse em entrevista à CBN que não pretende incluir a nefelibata da mandioca em sua campanha à Presidência nem em um eventual futuro governo. A obviedade chapada dos motivos dispensa maiores considerações.

Arrogante, pedante, intransigente e mouca à voz da razão, Dilma montou uma arapuca para si mesma, mas levou de embrulho tanto os inconsequentes que a reconduziram ao Planalto quanto a parcela pensante dos brasileiros. Num monumental estelionato eleitoral, sua alteza irreal preços administrados, aumentou gastos com programas eminentemente eleitoreiros e “pedalou” a mais não poder. Somado à irresponsabilidade fiscal, seu apetite eleitoral aumentou o inchaço da máquina pública e resultou na falência do Estado — para se ter uma ideia, enquanto a Casa Branca contava com 468 servidores, o Palácio do Planalto contabilizava 4.487 funcionários.

Em setembro de 2015, nove meses depois do início da segunda (e ainda mais funesta) gestão da estocadora de vento, o Orçamento já acumulava um rombo de R$ 30 bilhões — algo nunca visto até então. Era o começo do fim: a despeito de as pedaladas fiscais terem sido o “motivo oficial” da deposição, a petista foi expelida do cargo pelo conjunto de sua obra e por sua absoluta falta de traquejo no trato com o Parlamento. 

Num primeiro momento, a troca de comando foi como uma lufada de ar fresco numa catacumba. O novo presidente sabia até falar! Considerando que passáramos 13 anos ouvindo os garranchos verbais de um semianalfabeto e as frases desconexas de uma destrambelhada que não era capaz de juntar sujeito e predicado numa frase que fizesse sentido, ter um mandatário que usava até mesóclises era um refrigério. 

Embora fosse impossível consertar o país da noite para o dia, Temer conseguiu debelar a inflação (que rodava pelos 10% quando ele assumiu), reduzir de maneira “responsável” a Selic e aprovar a PEC do Teto dos Gastos e a Reforma Trabalhista. Mas seu ministério de notáveis revelou-se uma notável agremiação de corruptos — que foram caindo à razão de um por mês.

O primeiro a cair foi Romero Jucá, o “Caju”, que deixou o Ministério do Planejamento uma semana após a nomeação — só que continuou no governo, ocupando uma secretaria criada especialmente para preservar seu direito ao foro privilegiado. Na sequência, demitiram-se ou foram demitidos Fabiano SilveiraHenrique Eduardo AlvesGeddel Vieira Lima e mais meia dúzia de ministros e/ou assessores de primeiro escalão. Temer moveu mundos e fundo$ para preservar Eliseu Padilha, o “Primo”, e Wellington Moreira Franco, o “Angorá”, que o ajudavam a comandar “a quadrilha mais perigosa do Brasil”, como disse Joesley em entrevista à revista Época.   

Livramo-nos de Dilma, mas herdamos Michel Temer, que jamais conquistou a simpatia dos brasileiros. E nem poderia, tendo sido vice de quem foi e presidido o PMDB por 15 anos. Após o julgamento do impeachment, a imprensa publicou vários artigos acusando o procurador Deltan Dallagnol, coordenador da Lava-Jato em Curitiba, de defender um “direito autoritário, próprio das tiranias” e a “relativização do direito de defesa”. Curiosamente, esses mesmos veículos de comunicação não manifestaram a mesma preocupação quando a petista era presidente. Coisas do Brasil.

Em fevereiro de 2017 o partido de Temer indicou Edison Lobão para presidir a CCJ do Senado, numa evidente estratégia de frear os avanços da operação anticorrupção. Lobão era defensor ferrenho da anistia ao caixa 2 e crítico figadal das delações premidas (uma das principais ferramentas da força-tarefa), e dizia que acordos de colaboração haviam virado “um inquérito universal” e poderiam levar o Brasil à “tirania”. Para surpresa de ninguém, partidos investigados se empenharam em bloquear um eventual terceiro mandato de Janot e a possível escolha de alguém próximo a ele para chefiar a PGR.

Mesmo com a podridão aflorando no seu entorno, o presidente seguia adiante, levando a Nau dos Insensatos pelas águas revoltas da crise como um timoneiro experimentado. Sob seu comando, dizia, o Brasil chegaria são e salvo às próximas eleições e seria entregue fortalecido ao próximo dirigente. 

A coisa até funcionou durante algum tempo, a despeito da pecha da ilegitimidade — uma falácia petista, pois quem votou em Dilma votou na chapa; como vice da anta, Temer não só era seu substituto eventual como encabeçava a linha sucessória presidencial. O que ele fez para ser promovido a titular e o fato de seu governo ter degringolado já é outra conversa.

Mas o nosferatu que jurou que não interferiria na Lava-Jato, que afastaria quem fosse denunciado e exoneraria quem se tornasse réu deu um salvo-conduto aos assessores citados nas delações, pois precisava deles para blindar o governo. Só que faltou combinar com os russos, ou melhor, com Joesley Batista: Em maio de 2017, Temer foi abatido em seu voo de galinha pela delação premiada do moedor de carne bilionário e de outros seis altos executivos da JBF/J&F.

Nossa história recomenda darmos mais atenção à figura do vice-presidente. Em 15 de novembro de 1889, um golpe militar capitaneado pelo marechal Deodoro da Fonseca apeou D. Pedro II do trono e substituiu a monarquia constitucionalista pela república presidencialista. Deodoro presidiu o país até 1891, quando então "foi convidado a renunciar" e substituído pelo vice — o também marechal Floriano Peixoto —, que concluiu o mandato-tampão e foi sucedido por Prudente de Moraes, que entrou para a história não só como o primeiro civil a presidir o país, mas também como o primeiro presidente eleito pelo voto direto.

Seria pedir demais aos eleitores brasileiros — que raramente se lembram em que votaram para deputado — analisarem cuidadosamente a composição das chapas que disputam a Presidência, mas o fato é que nove vices terminaram os mandatos de seus titulares: Floriano PeixotoNilo Peçanha, Delfim Moreira, Café Filho, João Goulart, José SarneyItamar Franco e Michel Temer.

Claro que, não fossem os vices, outros sucessores e outras formas de sucessão haveria, mas seria oportuno questionar a real necessidade da figura do vice nos tempos atuais. Para o reserva é ótimo: a vice-presidência rende palácio à beira do lago, diversas mordomias e, em caso de infortúnio do titular, até a Presidência. Para o país, no entanto, essa peça serve apenas para decoração, quando não para conspirar contra o titular, como fez Michel Temer.

Filho imigrantes libaneses, Michel Miguel Elias Temer Lulia nasceu em Tietê (SP), graduou-se em Direito pela USP, atuou como advogado trabalhista e lecionou na PUC-SP e na Faculdade de Direito de Itu antes de ingressar na vida pública como oficial de gabinete de Ataliba Nogueira, então secretário de Educação do governo de São Paulo. Em 1981, filiou-se ao PMDB (hoje MDB); em 1983, foi nomeado procurador-geral do Estado de São Paulo pelo então governador Franco Montoro; no ano seguinte, assumiu a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo; dois anos depois, disputou uma vaga na Câmara Federal, conseguiu uma suplência e assumiu a cadeira do deputado licenciado Tidei de Lima, tornando-se constituinte.

Ao longo de seis mandatos, Temer presidiu a Câmara em 1997, 1999 e 2009 e o PMDB de 2001 até o final de 2010, quando se licenciou do cargo para assumir a vice-presidência da República. Em maio de 2016, quando Dilma foi afastada, passou de “vice decorativo” a presidente interino e acabou efetivado no cargo em agosto, depois que a titular foi devida e definitivamente defenestrada.

Continua...

quinta-feira, 28 de outubro de 2021

NÃO PODE DAR CERTO — DÉCIMA SEGUNDA PARTE



Em 2003, quando Lula assumiu a presidência, a inflação havia baixado para 12,53% ao ano — donde a folclórica "herança maldita" que o PT canta em verso e prosa até hoje nunca passou de conversa mole para boi dormir. Em 2014quando FHC criticou Lula pelo baixo nível da campanha de Dilma, o molusco abjeto respondeu: “Vi o ex-presidente falar com a maior desfaçatez: ‘É preciso acabar com a corrupção’. Ele devia dizer quem é que estabeleceu a maior promiscuidade entre Executivo e Congresso quando ele começou a comprar voto para ser aprovada a reeleição”.

Observação: Lula reclamar de corrupção em governo alheio é o mesmo que Marcola, chefe do PCC, imputar crimes à facção arquirrival Comando Vermelho, mas enfim...  

Vinte e três anos após a aprovação da PEC, o sultão do Tucanistão, do alto de seus 89 anos, escreveu no Estadão que a mudança foi um erro: "Cabe aqui um ‘mea culpa’. Permiti, e por fim aceitei, o instituto da reeleição […]. Sabia, e continuo pensando assim, que um mandato de 4 anos é pouco para ‘fazer algo’. Tinha em mente o que acontece nos Estados Unidos. Visto hoje, entretanto, imaginar que os presidentes não farão o impossível para ganhar a reeleição é ingenuidade”.

Há algumas imprecisões nessa cantilena. O fato de FHC sofismar, citando um fato verdadeiro para negar outro, não excludente e igualmente verídico, não apaga a miríade de provas documentais da compra de votos. Segundo ele "de nada vale desmentir que a maioria da população e do Congresso era favorável à minha reeleição: temiam a vitória… do Lula”. Mas isso nos leva à seguinte pergunta: se o Congresso era a favor, por que seria necessário comprar votos?

É fato que em 1997 o Plano Real estava no seu momento mais positivo e que havia ampla oposição ao petralha. Só que a praxe no Congresso era (e continua sendo) trocar votos por verbas e cargos no governo. No caso em tela, não faltam provas de que uma parte dos deputados foi realmente comprada com dinheiro vivo.

Em gravações (e não se trata de grampos telefônicos, mas de gravações presenciais), os deputados federais Ronivon Santiago e João Maia, ambos do Acre e à época filiados ao PFL, hoje DEM, relatavam ter recebido R$ 200 mil em dinheiro para votar a favor da reeleição. Outros 3 deputados eram citados de maneira explícita e dezenas de congressistas também participaram do esquema. Nenhum deles foi investigado e muito menos punido pelo Congresso.

Apesar disso, o então engavetador-geral da República, Geraldo Brindeiro, rejeitou os pedidos para que uma denúncia contra FHC fosse apresentada ao STF, e uma CPI foi abafada pelo Planalto através da... distribuição de cargos para partidos alinhados com o governo.

Em 2016, no 2º volume de seus “Diários da Presidência”, FHC voltou ao tema: "As compras de votos, se houve — e pode ter havido —, não foram feitas pelo governo, pelo PSDB e muito menos por mim". Quatro anos depois, ele negou taxativamente o episódio em artigo publicado em O Estado.

Os deputados gravados citavam 3 nomes: o ministro das Comunicações à época, Sérgio Motta (que era amigo pessoal de FHC e seu principal articulador político), e os então governadores do Amazonas, Amazonino Mendes, e do Acre, Orleir Cameli, que eram aliados do Palácio do Planalto. "Serjão" morreu em 1998 e Orleir, em 2013. Amazonino tem 80 anos e continua sendo influente no Amazonas. Nenhum deles jamais foi investigado e todos seguem negando qualquer envolvimento na compra de votos a favor da emenda da reeleição.

Em maio de 1997, 8 dias depois de o caso ter sido publicado pela Folha, os dois deputados gravados renunciaram ao mandato. Ambos enviaram ofícios idênticos ao então presidente da Câmara, alegando "motivos de foro íntimo". Em comentário irônico à época, o então deputado federal Delfim Netto disse: "Nunca vi ganhar um boi para entrar e uma boiada para sair". Dias depois, tomaram posse como ministros Eliseu Padilha (Transportes) e Iris Rezende (Justiça). Ambos eram do PMDB — partido que mais contribuiu para a impedir a instalação da CPI sobre a compra de votos. Pouco antes de o caso eclodir, FHC se negava peremptoriamente a indicar os nomes do PMDB para a Esplanada dos Ministérios.

Em 27 de junho de 1997, Geraldo Brindeiro foi reconduzido à PGR, que comandou durante 8 anos, de julho de 1995 a junho de 2003, indicado todas as vezes por FHC. E viva o povo brasileiro.

Continua...