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segunda-feira, 31 de outubro de 2022

HABEMUS PAPAM

 

O título desta postagem advém do fato de que a indesejável mistura de política com religião trouxe matizes de conclave a uma sucessão presidencial que a imbecilidade chapada do eleitorado tupiniquim já havia convertido em pleito plebiscitário. Dito isso, segue o texto que escrevi no início da tarde de ontem — antes de conhecer o resultado das urnas, portanto —, convicto de que, parafraseando um inusitado rompante de coerência do ainda presidente, o candidato que tivesse mais votos venceria a disputa. 

 

Uma vez que a polarização infeccionou mais de 80% da récua de muares travestidos de eleitores, é possível (e até provável) que seu candidato a presidente, caríssimo leitor, tenha vencido a disputa. Em sendo o caso, meus parabéns. Ao Brasil, minhas condolências. 


A menos que o imprevisto tenha voto decisivo na assembleia dos acontecimentos, o país do futuro que nunca chega amargará mais quatro anos de desgoverno abjeto e ímprobo (nunca é demais lembrar que maus governantes não brotam nos gabinetes por geração espontânea; se estão lá, é porque foram votados, e se você votou nessa caterva, não pode reclamar de não estar devidamente representado).

 

Mudando de um ponto a outro, depois de ser nomeado bispo por João XXIII e cardeal pelo Papa Paulo VI, Albino Luciani foi eleito papa na terceira votação do conclave que se seguiu à morte de Paulo VI, superando Giuseppe Siri por 99 votos a 11, e entrando para a História como o primeiro pontífice desde Clemente V a recusar uma coroação formal e o pioneiro na adoção de um nome papal duplo — que ele escolheu para homenagear seus dois antecessores, Paulo VI e João XXIII.

 

João Paulo I morreu 33 dias depois de ter sido guindado ao Trono de Pedro e um dia após ter confidenciado ao bispo John Magee, seu secretário, que: "Alguém mais forte que eu, e que merece estar neste lugar, estava sentado à minha frente durante o conclave. Ele virá, porque eu me vou". Esse alguém era o cardeal polonês Karol Wojtyla, que se tornou João Paulo II


Na época, chegou-se a comentar à boca pequena que o finado tinha bom coração, mas não estava à altura do ambiente maquiavélico do Vaticano, e que sua morte decorreu de um complô. Consta que ele sentiu fortes dores no peito durante o chá da tarde do dia 27 de outubro de 1978, e que foi encontrado morto, na manhã seguinte, pela freira que o acordava havia muitos anos (e que fez voto de silencio após esse trágico episódio).  No entanto, a versão oficial do Vaticano dá conta de que um dos secretários do papa — Diego Lorenzi — teria encontrado o corpo, e que a causa mortis fora um infarto do miocárdio (associado às terríveis pressões do cargo). 

 

Essas e outras declarações inconsistentes deram azo a diversas teorias da conspiração. No livro In God's Name, o escritor britânico David Yallop afirma que o papa foi morto porque estava prestes a desvendar escândalos financeiros que envolviam o Vaticano. Passados mais de 40 anos, o mafioso Antoni Raimondi, sobrinho de Lucky Luciano, revelou em seu livro de memórias que envenenou o João Paulo I a mando de seu primo, o arcebispo norte-americano Paul Marcinkus — então presidente do Banco do Vaticano. A ideia era evitar que o pontífice de tornar públicos documentos que comprovavam uma fraude financeira bilionária (ainda segundo o mafioso, João Paulo II não revelou o escândalo do banco do Vaticano por temer pela própria vida, mas isso é outra conversa).


O plano era drogar o chá que João Paulo I tomava antes de dormir, entrar em seus aposentos e lhe administrar uma dose letal de cianeto (essa versão foi dramatizada por Mario Puzzo e Francis Ford Copolla no terceiro capítulo da imperdível trilogia "The Godfather"), e que o arcebispo Marcinkus se encarregou pessoalmente dessa tarefa. Raimondi diz só ficou na porta, pois assassinar o papa com as próprias mãos lhe garantiria um bilhete só de ida para o inferno (o curioso código de ética da Onorata Società será discutido em outra oportunidade).

 

Marcinkus começou sua carreira no Vaticano como secretário de Estado em Roma e chegou a ser um dos guarda-costas de Paulo VI. Em 1971, ele foi nomeado presidente do banco do Vaticano (cargo que ocupou até 1989). Quando assumiu o posto, foi interrogado pelo departamento da Justiça norte-americano sobre seu envolvimento com ações falsas avaliadas em € 13.07 milhões (de um total estimado quase € 1 bilhão), mas não houve provas suficiente para avançar com a investigação  até porque, sob o pretexto de não quebrar o sigilo que envolvia as operações conduzidas pelo banco, o arcebispo se recusou a revelar detalhes sobre o esquema de corrupção. 

 

Observação: Em 1982, Marcinkus foi implicado no escândalo do colapso do Banco Ambrosiano e, mais adiante, nos assassinatos de Roberto Calvi e do jornalista Mino Pecorelli, que vinha escarafunchando a podridão que cercava o banco do Vaticano. Mas sua participação na emissão das ações falsas e nos assassinatos e raptos relacionados com o escândalo não restaram provadas, e ele morreu aos 84 anos, no Arizona, sem ter sido formalmente acusado por crime algum.

 

Voltando ao aviltante cenário político tupiniquim, o desafio, para os pesquisadores, será explicar como este país alcançou um nível de deterioração das instituições democráticas que seria inimaginável em 2018, quando vinha de um traumático processo de impeachment e de um momento marcado por sucessivas acusações de corrupção.

 

As manifestações em prol da deposição de Dilma começaram em 2013, mas a ascensão de Temer ao Planalto, em 2016, não produziu um sentimento de esperança como o de 1992, quando Fernando Collor foi apeado e Itamar Franco assumiu a Presidência. As forças democráticas, desorganizadas, sem lideranças de expressão nacional nem programa político e tendo o PT na oposição, produziram um enorme vazio político, nenhuma renovação frente à dualidade eleitoral, que vinha desde 1994 (entre PT e PSDB), nem quaisquer soluções programática para os problemas nacionais que surgiram após a trágica crise de 2015 e 2016. 

 

Segundo o historiador, youtuber e suplente de deputado federal Marco Antonio Villa, o Brasil virou uma enorme delegacia de polícia, com um entra-e-sai constante de acusados. As propostas de ação político-econômica foram deixadas de lado. Mas não chegamos aonde chegamos por acaso. O desafio, agora, é encontrar o caminho da superação desse descalabro — que, aliás, pode estar numa insuspeita xícara de chá.


Que Deus nos ajude.

sexta-feira, 27 de outubro de 2017

QUEM NÃO APRENDE COM OS ERROS DO PASSADO VOLTA A COMETÊ-LOS NO FUTURO



O PSDB já foi o maior partido de oposição aos governos corruptos de Lula e Dilma. Agora, é tão inútil quanto um casaco de pele, ao meio dia, sob o sol causticante do verão senegalês. 

Consenso, dentro da legenda, é como nota de US$ 100 em bolso de mendigo. Não existe. O tucanato faz reuniões e mais reuniões, mas nada fica decidido. Nem para expulsar o senador corrupto que traiu 51 milhões de eleitores os tucanos prestam. E o mesmo vale para o Senado Federal: na última terça-feira, 24, o senador maranhense João Alberto Souza, presidente da Comissão de Ética do Senado, determinou, com base no parecer da Advocacia Geral da Casa, o arquivamento da representação que pedia a cassação do neto de Tancredo. Ainda cabe recurso ao plenário da Comissão, até porque estamos no Brasil, onde sempre existe uma instância superior a quem se pode recorrer contra uma decisão desfavorável, daí ser fundamental, para a classe política, manter o famigerado foro privilegiado. Numa estimativa otimista, 99% dos recursos contra condenações na esfera penal que chegam até STF caducam, caem de maduro ou morrem de velhice.

O PSDB nasceu de uma costela do PMDB e teve seu momento de glória ao emplacar FHC, que, quando ministro de Itamar, conseguiu vencer a hiperinflação sistêmica. Mas os tucanos deixaram a esquerda criar asas e perderam a presidência para Lula. O sonho de recuperá-la em 2010 até poderia ter se concretizado se eles tivessem se empenhado mais, mas esse cemitério de egos ainda não se conscientizou de que brigar entre si não serve como treinamento para lutar contra os verdadeiros adversários.

Depois da derrota de Aécio em 2014, o partido entrou em parafuso. Ainda que tenha contribuído para o impeachment de Dilma, que o tenha feito em nome da estabilidade, da governança, da austeridade, da “salvação nacional”, que tenha apoiado a ideia de se ter um governo de transição que, mantendo de pé uma “pinguela” reformista, atravessasse a pior fase da crise e entregasse o país em melhores condições para o presidente a ser eleito em 2018, o PSDB nada fez para influenciar ou direcionar esse governo. Um governo de perfil “parlamentar”, mas com uma base pouco confiável, sem grandeza e sem projeto, que se refletiu na composição ministerial, gerou turbulências e explodiu com as delações da JBS, que se deixou impregnar pelos interesses escusos do Congresso e pela preocupação em esvaziar a Lava-Jato e recompor oligarquias e práticas clientelistas, trocando a grande política pela pequena política. 

O PSDB ficou ainda mais desmoralizado com o afastamento judicial de Aécio Neves, cuja imagem de bom moço enganou meio mundo (e aí se inclui este que vos escreve). Agora, seus caciques vão empurrando com a barriga a decisão de podar as asinhas do mineirinho safado, que continua senador e presidente afastado da sigla ― e como seu amiguinho e aliado de ocasião Michel Miguel Elias Temer Lulia, não pode nem ouvir falar em renúncia.

Os tucanos deram as costas para a opinião pública e deixaram passar a oportunidade de resgatar a imagem de alternativa lógica para quem não suporta mais corruptos como os do PT e do PMDB. Hoje, criticar o governo é como um roto falar mal de um esfarrapado, mas apoiar Michel Temer foi mais um tijolo na obra de desconstrução do tucanato ― algo que certamente cobrará seu preço, tanto do partido, que prolongou sua indefinição, quanto da política nacional, que perdeu outro personagem que poderia fazer a diferença. Ou será que a sociedade, a opinião pública e o eleitorado perdoarão os tucanos nas próximas eleições?

Falando em erros crassos, embora não me agrade nem um pouco falar na patuleia ignara, vale registrar que supostas conversas de bastidores do PT davam conta de que Temer não sairia vivo do hospital ― onde foi internado na última quarta-feira, 25, devido a problemas urinários. Mas faltou um chazinho como aquele que, dizem, abreviou o pontificado do papa João Paulo I. Afinal, rezar e acender vela até pode ajudar, mas se não jogar pedra nos cachorros é mordida na certa.

Para o PT, interessava a permanência de Temer na presidência, não só porque ambos querem enterrar a Lava-Jato, mas também porque os petralhas acham que a impopularidade do presidente acabará enterrando de vez a já combalida economia. Mas não é o que se vê. Mesmo que a gestão do vampiro do Jaburu não passe de um “terceiro tempo” dos governos de Lula e Dilma, o mercado, sabiamente, precificou o dito-cujo. Prova disso é que, no dia seguinte ao sepultamento da segunda denúncia, a bolsa abriu em alta e a cotação do dólar recuou. 

Faltou o PT combinar com o mercado ― e dar o tal chazinho revigorante a sua insolência, naturalmente.

Aliás, segundo a Folha, em sua peregrinação por Minas Gerais o incansável candidato eneadáctilo esteve numa aldeia indígena em Coronel Murta, onde foi benzido por Benvina Pankararu, cacique da tribo. Ela teria dito que o indigitado “precisa mesmo ser rezado”. Mas nem reza brava vai impedir sua condenação pelo TRF-4. Vade retro, Satanás!

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sábado, 12 de março de 2022

NÃO CONFUNDA PALHAÇO PRESIDENTE COM PRESIDENTE PALHAÇO


Não é justo atribuir aos políticos a culpa pelas mazelas dos brasileiros. Políticos não brotam em seus gabinetes por geração espontânea; se os três Poderes da República foram tomados por criminosos de colarinho-branco (pode-se argumentar que os juízes de cortes superiores não são eleitos pelo voto popular, mas quem os indica e quem chancela a indicação o são), a culpa é de um eleitorado incapaz de tirar água de uma bota, mesmo com as impressas no calcanhar.

O brasileiro já votou em rinoceronte para vereador, em macaco para prefeito, em palhaço de circo para deputado e — a cereja do bolo — num analfabeto, num poste e num dublê de mau militar e parlamentar medíocre para presidir este país. É graças a essa caterva (falo da récua de muares munidos de título eleitoral) que a eleição de outubro próximo tem tudo para ser uma reedição piorada do pleito plebiscitário de 2018.

Situações surreais como essas não são exclusividade nacional. Nos EUA, Donald Trump venceu Hillary Clinton em 2016 (apesar de a candidata democrata ter obtido mais votos) e uma corja de vândalos invadiu o Capitólio, quatro anos depois, para protestar contra a derrota de seu ídolo. Questionado sobre a situação no leste europeu, Trump afirmou que Putin não teria invadido a Ucrânia se ele ainda estivesse na Casa Branca. Como se costuma dizer, presunção e água benta, cada um toma a que quer.

Sobre Vladimir Putin, o buraco é ainda mais embaixo. Três dias após a invasão da Ucrânia, Diogo Mainardi escreveu em sua coluna que o carniceiro russo já havia sido derrotado. Que havia perdido o rublo, a Copa do Mundo, o ouro do Banco Central, as estantes Ikea, o primeiro bailarino do Bolshoi, os cintos da Gucci, a sucursal do New York Times, as villas no lago de Como, o Facebook, os parlamentares de direita e esquerda na Europa e nos Estados Unidos, o centroavante Lukaku. Até as empresas que tentaram resistir ao boicote, como Pepsi e McDonald’s, tiveram de fechar suas lojas na Rússia, constrangidas por seus consumidores e acionistas. E isso tudo em apenas duas semanas. Até o Brasil, que faz parte de outro sistema solar, condenou déspota. 

Uma pesquisa divulgada dias atrás mostrou que, enquanto Bolsonaro e Lula abanavam o rabo para o tirano eslavo, o povo brasileiro queria mais era mijar no seu túmulo. O problema é que esse сукин сын continuará matando pessoas (inclusive civis) até alguém lhe dar uma dose de seu próprio próprio veneno — um chazinho como aquele que "acalmou ad aeternum" o papa João Paulo I estaria de bom tamanho, e talvez fosse até bom essa moda pegar.

Por aqui, um aumento brutal no preço dos combustíveis foi prontamente repassado por donos de postos (não todos), pouco se importando com o fato de o combustível servido nas bombas ter sido comprado antes do reajuste (isso se chama “crime contra a economia popular”). Esse "reajuste" terá efeitos nefastos na inflação e afetará a população em geral, já que praticamente tudo que é produzido no Brasil é transportado através de nossa esburacada, enlameada e detonada malha rodoviária (salvo raras e honrosas exceções).

Os combustíveis e o gás de cozinha vinham subindo de preço descontroladamente, e não só devido à alta do dólar. O problema, como sempre, é a falta de previsão de um mandatário que só tem olhos para a reeleição, e que prefere participar de motociatas e andar de jet-ski a dar expediente no Palácio do Planalto. E como Lula, que institucionalizou a compra de apoio parlamentar com o Mensalão e sangrou a Petrobrás com o PetrolãoBolsonaro se vale do nefando Orçamento Secreto (cerca de R$ 17 bilhões por ano) para comprar votos das marafonas do Parlamento, e isso enquanto a população mais carente sequer têm o que comer.

Voltando aos combustíveis, “em casa onde falta pão todos gritam e ninguém tem razão”. O que se vê é um jogo de empurra. O capetão culpa o ICMS, os governadores culpam o governo federal, todos culpam a Petrobrás — que distribui bilhões aos acionistas e paga ao general Silva e Lula um salário nababesco (mais de R$ 200 mil) — e ninguém faz nada. Ou, quando faz, faz o que Dilma fez durante sua campanha à reeleição.

Lula insiste na falácia da autossuficiência brasileira em petróleo e atribui a alta dos preços à privatização da BR-Distribuidora, mas, para surpresa de ninguém, ele não menciona que faltam refinarias e que ele e seu espúrio partido foram os responsáveis pela cleptocracia que quase quebrou a Petrobras. Esperar o que de um egun mal despachado, um ex-sindicalista malandro, amante da vida fácil e expert na arte de enganar trouxas

Em 2018, o ainda candidato Bolsonaro disse que o preço dos combustíveis já havia ultrapassado todos os limites — mas, uma vez eleito e empossado, não se preocupou em criar o tal fundo de estabilização no início de sua execrável gestão. Mesmo assim, o ministro Paulo Guedes alardeava que o botijão de gás deveria custar cerca de R$ 30 — e já tem gente pagando R$ 150. O que nem um nem o outro disseram é que somente um governo competente e responsável seria capaz de resolver esse e um sem-número de outros problemas. 

Observação: O PL 1.472/2021, em trâmite no Senado, prevê a criação de um fundo de equilíbrio para controlar a volatilidade do preço dos derivados de petróleo. A ideia é utilizar recursos da União (dividendos que a Petrobras paga ao governo federal) como uma espécie de “colchão", visando manter o preços estáveis — ou, no mínimo, reduzir o percentual de aumento  em situações adversas como a atual.

Ao trágico governo em curso restam nove meses, e a nós, decidir entre suportar mais 4 anos de incompetência chapada ou amargar a volta da ladroagem institucionalizada. Não que não exista corrupção nem corruptos no mar de lama que se tornou a Praça dos Três Poderes. Essa falastrice não passa de mera cantilena para dormitar bovinos e já não convence sequer nem mesmo os poucos fãs do “mito” com Q.I. superior ao de um repolho. Na última quarta-feira a Transparência Internacional Brasil apresentou um relatório à OCDE denunciando retrocessos no combate à corrupção, e mencionou, dentre outros descalabros, os R$17 bi (do tal Orçamento Secreto) que o governo federal usou para comprar deputados.

A alta dos combustíveis propiciou mais uma troca de farpas entre os presidenciáveis. Enquanto os bolsonaristas comemoraram a mudança do cálculo do ICMS, o ex-presidiário de Curitiba tuitou: “Agora você tem empresas importando gasolina dos Estados Unidos em dólar enquanto temos auto suficiência (sic) e produzimos petróleo em reais". 

Observação: O ICMS (que é um imposto estadual) terá a alíquota unificada em todo o Brasil e incidirá nos combustíveis apenas uma vez. O pacote aprovado no Senado também incluiu a isenção do PIS e da Cofins (que são tributos federais) sobre o diesel e o gás de cozinha até o final do ano. Na prática, as duas medidas juntas representarão uma redução de R$ 0,60 por litro de diesel. Governadores já anunciaram que vão questionar judicialmente o projeto, alegando queda na arrecadação. Com a mudança, o governo pode evitar, pelo menos por enquanto, a criação de um programa de subsídio direto da a gasolina, algo que o Posto Ipiranga de fancaria quer deixar de lado e disse que só será considerado se a se a guerra no leste europeu continuar por mais "30, 60 dias". Enquanto isso, Bolsonaro voltou a atacar a política de preços da Petrobras (sim, de novo) e chamou o reajuste de ontem de “absurdo”.

Sobre o tuíte do ex-presidiário, o pré-candidato pelo Partido Novo, Felipe D'Ávila, escreveu: "um tweet, quatro mentiras". Sergio Moro também tuitou: "Sabe por que a Petrobras ainda existe, Lula? Porque a Lava-Jato impediu que o governo do PT continuasse saqueando e desviando recursos da maior estatal do Brasil". E Ciro Gomes: "Enquanto isso todos brasileiros sofrem, mesmo vivendo num país que tem uma das maiores reservas de petróleo do mundo, e vendo concessionárias da Petrobras vendidas a preço de banana. Até quando vamos suportar este absurdo?".

Do alto de sua inesgotável sabedora, o vereador Carlos Bolsonaro comemorou a decisão do desgoverno do pai, alegando que a mudança (no cálculo do ICMS) fará com que “o povo pague mais barato" e criticou governadores que não querem abrir mão da arrecadação em ano eleitoral.

Para não encompridar ainda mais este texto, falo sobre o palhaço que se tornou presidente no post de amanhã.

terça-feira, 7 de maio de 2019

A PÁTRIA AMADA E O DIABO ATRÁS DA IGREJA




O Brasil é dirigido por um bando de maluco” (sic), afirmou Lula em recente entrevista a dois veículos de comunicação “cumpanhêros”. “Pelo menos não é um bando de cachaceiros, né?”, replicou Bolsonaro, que em seguida emendou: “Olha eu acho que o Lula, primeiro, não deveria falar. Falou besteira. Maluco? Quem era o time dele? Grande parte está preso ou está sendo processado. Tinha um plano de poder onde, nos finalmentes, nos roubaria a nossa liberdade, ok? Eu acho um equívoco, um erro da Justiça ter dado direito a dar uma entrevista. Presidiário tem que cumprir sua pena”. O capitão já disse muita bobagem nestes cento e poucos dias de governo, mas esse comentário o redimiu, como esclarecer uma plateia eivada de esquerdopatas que “Lula está preso, babacas!” fez subir no meu conceito o político sobralense Cid Gomes, irmão candidato derrotado Ciro Gomes, que é “cearense” de Pindamonhangaba (para quem não percebeu minha ironia, Pindamonhangaba é um munício paulista).

Já que o nome do criminoso mais emblemático desta banânia veio à baila, o togado supremo Ricardo Lewandowski, sempre disposto a prestar vassalagem àquele que o nomeou para o ápice da carreira, foi quem autorizou o petralha a dar entrevista aos jornais FOLHA DE S.PAULO e EL PAÍS. Também foi ele, segundo José Nêumanne,  que tornou presencial o julgamento de um habeas corpus impetrado em favor de seu ex-patrão, depois que a 5ª Turma do STJ reduziu sua pena de 12 anos e 1 mês para 8 anos, 10 meses e 20 dias. Outras fontes apontam Gilmar Mendes como mentor intelectual de mais essa maracutaia perversa, mas isso é de somenos: o que importa mesmo é o objetivo, qual seja aumentar as chances de o recurso de Lula ser acolhido, já que no plenário virtual a rejeição era quase certa. Aliás, outro pedido similar, protocolado por 29 advogados piauienses sem qualquer relação com a defesa de Lula, foi negado na última sexta-feira pelo ministro Edson Fachin. Não custa lembrar que o nordeste é tradicionalmente pró-Lula e que o Piauí ocupa o terceiro lugar no ranking dos estados mais miseráveis deste país, atrás somente do Maranhão (feudo do clã Sarney) e de Alagoas (feudo dos Collor de Mello e dos Calheiros). 

Falando nas peculiaridades do cenário político tupiniquim, VEJA desta semana dá conta de que toda quarta-feira às 8 horas o plenário da Câmara dos Deputados se converte em igreja. O culto de 27 de março, por exemplo, começou com aleluias e glórias ao senhor, enquanto a deputada e cantora gospel capixaba Lauriete Rodrigues, ex-mulher do ex-senador Magno Malta, puxava o louvor com seu violão. Na sequência, o deputado e pastor pernambucano Francisco Eurico da Silva, capelão da bancada evangélica, fez a pregação do dia, antes de ter início a votação para a escolha do novo líder da Frente Parlamentar Evangélica, composta hoje de 120 deputados ativos — um recorde desde a sua fundação, em 2002, e maior, muito maior, do que qualquer partido político no Congresso Nacional. Ainda segundo a reportagem, não há nem nunca houve votação para o posto de líder da frente religiosa: após discussões por vezes ásperas, o deputado amazonense Silas Câmara foi sagrado por aclamação. A despeito de diferenças e divisões na frente, a unidade de ação da bancada, nesta legislatura, vem amparada por uma convicção renovada na força política que o eleitorado evangélico demonstrou ao sustentar a eleição de Jair Bolsonaro — que vem dando repetidas mostras de alinhamento com o setor — dias atrás, ele matou no nascedouro a ideia de um novo imposto que incidiria também sobre as igrejas.

Cortejados pelos mais diversos partidos, os evangélicos têm ambições que não raro transcendem as vantagens tributárias, alvarás de templos e concessões de rádio. Silas Câmara surgiu como um nome de compromisso entre candidatos de ramos rivais da Assembleia de Deus, e foi por isso que ganhou, deixando claro que a lealdade desses deputados não está com caciques políticos, mas com pastores e bispos. Não é de hoje que se nota o interesse desses religiosos pela política partidária. Em meados da década de 1980, ávidos por recursos públicos, barganhas e alianças com candidatos e partidos e governantes, eles participaram dos debates da Assembleia Nacional Constituinte e ajudaram Sarney a ampliar o mandato de quatro para cinco anos em troca de concessões de emissoras e rádio e verbas públicas; no segundo turno das eleições de 1989, apoiaram Collor, e de lá para cá a instrumentalização recíproca entre esses grupos tem se intensificado, como compravam a transformação de templos em comitês eleitorais e a fundação de partidos por igrejas. 

Para quem faltou às aulas de história, vale lembrar que a Igreja foi a instituição mais poderosa da idade Média — quando a riqueza era medida pela quantidade de terras, o Papa e o cardinalato controlavam quase dois terços das terras da Europa ocidental. Seu poder da no mundo medieval é exaltado pelas grandes catedrais construídas nos séculos XII e XIII em várias regiões da Europa, todas ricamente decoradas com ouro maciço e pedras preciosas em profusão. Ainda assim, os batinas falam em caridade e em voto de pobreza, como que escarnecendo dos fiéis, que contribuem para multiplicar a riqueza da organização com o pagamento do dízimo e outros óbolos compulsórios, enquanto quase metade da população mundial vive abaixo da linha de pobreza.

Fechando o foco para nossa republiqueta de bananas, até o fim do Império o catolicismo era a religião oficial do Estado e tutelada por ele, o que limitava sua liberdade de ação. Com a constituição republicana, ela passou a ter um poder imenso. Para a Constituinte de 1934, foi criada a Liga Eleitoral Católica, que elegeu diversos representantes da própria igreja — que, por seu turno, legislaram em causa própria para conseguir uma série de privilégios. Em essência, esse descalabro foi preservado pela malfadada Constituição Cidadã, ainda que com outra formulação. Nas últimas décadas, sobretudo a partir dos anos 1980, o pluralismo religioso passou a vigorar de fato no Brasil, e a Igreja Católica se viu obrigada a competir no mercado religioso. Mas isso é outra conversa.

A lei proíbe as igrejas de dar apoio eleitoral, mas a Universal apoiou Collor para presidente em 1989, Marcelo Crivella e Celso Russomano nas eleições para prefeito do Rio e de Sampa, respectivamente, em 2016, sem falar em um sem-número de candidatos a cargos legislativos. Não é de hoje que ela funciona como comitê, conforme ficou claro nas últimas eleições presidenciais
Pode-se mesmo afirmar que Bolsonaro deve sua vitória mais ao apoio dos evangélicos do que a sua postura antipetista. Declaradamente católico, o capitão é o primeiro presidente eleito com a retórica evangélica pentecostal. Antes dele, houve dois presidentes protestantes — Café Filho (presbiteriano) e Ernesto Geisel (luterano), mas nenhum deles chegou ao poder pelo voto direto e tampouco falava de religião. Bolsonaro há tempos cortejava os evangélicos com gestos de forte simbolismo; em 2016, por exemplo, foi batizado nas águas do Rio Jordão pelo pastor (e presidente nacional do PSC) Everaldo, da Assembleia de Deus. Sendo católico e muito identificado com os evangélicos, o presidente conseguiu unir os dois polos; se fosse só evangélico, talvez não tivesse conseguido tantos votos dos católicos, e vice-versa.

Os evangélicos frequentam mais seus templos do que os fiéis de outras religiões, chegam a doar seis vezes mais do que os católicos em dízimo e costumam buscar orientação de seus líderes para temas cotidianos, aí incluída a política. Esse manancial não passou despercebido pela oposição, mas o o fato é que a esquerda não soube explorá-lo. Gleisi “Crazy” Hoffmann, presidente nacional do PT, no mês passado usou uma linguagem marcadamente religiosa para criticar as propostas de Paulo Guedes ao dizer que a reforma previdenciária era um “pecado” e que Jesus foi crucificado porque “confrontou o templo, um sistema de dominação e exploração dos pobres”, mas suas declarações repercutiram mal entre pentecostais e neopentecostais.

Diz-se que Deus, em sua infinita sabedoria, criou o amor e a fé, e o diabo, invejoso, o casamento e as religiões. Há muito que a exploração da fé se tornou um negócio como outro qualquer. Balzac dizia que “por trás de toda grande fortuna há sempre um crime”, e no Vaticano a coisa parece não ser muito diferente. Basta relembrar a morte súbita de João Paulo I em 1978, 33 dias após ter sido escolhido para ocupar o Trono de Pedro, que vagou com a morte de Paulo VI. Esse episódio foi retratado na parte final da trilogia de “O Poderoso Chefão”, na qual Francis Ford Coppola capturou magistralmente a essência da Máfia Siciliana descrita no imperdível best seller do escritor ítalo americano Mario Gianluigi Puzo

Em tempo: Se você acha que a história do chazinho envenenado não passa de teoria da conspiração, lembre-se: A VERDADE NÃO ESTÁ NEM AÍ PARA O QUE VOCÊ ACREDITA.

sexta-feira, 24 de abril de 2020

SOBRE A RENÚNCIA DE MORO E DE VOLTA À RENÚNCIA DE JÂNIO, SUAS CONSEQUÊNCIAS E OUTRAS CURIOSIDADES — PARTE IV


Ontem, após ficar bastante volátil com notícias envolvendo o remédio Remdesivir, o Ibovespa passou a cair mais de 2% com a informação divulgada pela FOLHA, no meio da tarde, de que o ministro Sergio Moro havia pedido demissão após ser informado por Bolsonaro da iminente troca da diretoria-geral da Polícia Federal, atualmente ocupada por Maurício Valeixo. Ainda segundo a notícia, Bolsonaro estaria tentando reverter a situação e os ministros Braga Netto (Casa Civil) e Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo) foram escalados para convencer Moro a recuar da decisão.  Cerca de uma hora depois, a GloboNews noticiou que Moro não chegou a pedir demissão, mas ameaçou deixar o cargo caso o presidente realizasse a troca na PF. Oficialmente, o ministério da Justiça disse que o ministro não se demitiu.

ATUALIZAÇÃO: Bolsonaro demitiu Valeixo em plena madrugada. A exoneração foi publicada na manhã desta sexta-feira no D.O.U. Nela, consta que a demissão se deu "a pedido", mas não foi decisão de Valeixo deixar o cargo neste momento. Nos bastidores, comenta-se que dessa forma a demissão evitaria ainda mais desgastes a Sergio Moro, que deve se pronunciar sobre sua permanência ou não no cargo ainda nesta manhã (as 11h desta manhã). Especula-se que Moro tenha ficado extremamente incomodado com a ida de Bolsonaro à manifestação do último domingo e de o presidente abrir as portas de seu gabinete aos líderes do Centrão. A ingerência do capitão na PF foi apenas a gota que fez transbordar o copo. Especula-se também que o ministro ficará no governo caso possa escolher o substituto do agora ex-diretor-geral da PF.

Pelo visto (e pelos filhos), Bolsonaro é capaz de tudo. Até de pôr seu próprio governo em xeque (para o bem do Brasil, tomara que seja xeque-mate). Mas o presidente não terá vida fácil diante da PF depois de demitir seu diretor-geral. Sobretudo porque o verdadeiro motivo, como é público e notória, foi a PF cumprir seu trabalho em vez de proteger a família do presidente de investigações incômodas. A intenção do capitão é nomear um lambe-botas sob medida para seus objetivos. O problema é que, pela tradição da PF, o diretor-geral que sai indica uma série de nomes (em geral seus assessores mais próximos, superintendentes regionais ou adidos no exterior) ao ministro da Justiça, que leva o seu escolhido ao presidente da República, que chancela a indicação. A ideia de subverter esse jogo e a nomeação vir diretamente de Bolsonaro não é só uma humilhação (mais uma) que Moro não parece disposto a aceitar — mas é também algo que a corporação deve rejeitar com vigor.

Internamente, os delegados mais graduados lembram o desastre de uma tentativa recente de mudar a tradição na nomeação do diretor-geral. No início de 2018, Fernando Segóvia foi demitido do comando da PF, pelo recém empossado ministro Raul Jungmann, depois de apenas 99 dias no cargo. Segóvia fora escolhido por Michel Temer, atendendo à indicação de emedebistas enrolados na Lava-Jato e passando por cima da opinião do então ministro da Justiça, Torquato Jardim. Já na cerimônia de posse disse a que veio: botou em dúvida fatos das investigações sobre Rodrigo Rocha Loures, aquele assessor de Temer que foi filmado recebendo uma mala com R$ 500 mil das mãos de um diretor da JBS. A partir daí, foi crise em cima de crise. Segóvia tentou, mas nunca conseguiu liderar a PF nos três meses que esteve à frente dela. Durante o seu tempo como diretor-geral, não conseguiu controlar a PF do jeito que Temer e parte do MDB queriam.

Vamos aguardar para ver que bicho dá.

Quando cursava o primário — como eram denominados os primeiros quatro anos do que hoje se chama ensino fundamental —, aprendi uma forma verbal chamada "condicional", que mais adiante seria rebatizada de "futuro do pretérito", já que expressa tanto uma situação quanto uma condição. Um exemplo do primeiro caso é: “eu compraria aquele carro, se o preço fosse mais baixo”; e do segundo: “anos atrás eu não tinha certeza se compraria o carro que tenho hoje”.

Em ambos os casos o verbo se comporta da mesma forma, mas com sentidos diversos, o que não deixa dúvidas acerca da exatidão das duas designações. Ainda assim, há quem entenda que o condicional não indica uma condição

No primeiro exemplo, temos duas orações, e a condicional não é a primeira, onde está o verbo no modo condicional, mas a segunda, indicada pela conjunção subordinativa condicional ou causal “se”. Na esteira desse raciocínio, parece-me realmente mais apropriado chamar o tempo verbal em questão de “futuro do pretérito”.

Embora o termo pretérito seja usado como sinônimo de passado, ele não remete ao presente em que vivemos, mas a um presente em que viveríamos se, por exemplo, numa encruzilhada do passado, tivéssemos virado à esquerda em vez de à direita, ou retrocedido até a encruzilhada anterior. 

Nessa linha de raciocínio, a pergunta que se impõe é: como seria o Brasil de hoje se Tancredo tivesse tomado posse, governado pelos cinco anos que a Constituição de então lhe garantia e, ao final, passado a faixa para (aí, sim) o primeiro presidente escolhido pelo voto popular desde a eleição de Jânio em 1960 (que seria... ???). The answer, my friends, is blowing in the wind.

Muita coisa poderia dar errado no capítulo final da novela da transição da ditadura militar para a democracia. Em 1984, em conversa com o ex-secretário de Estado norte-americano Henry Kissinger, o então presidente-general Figueiredo teria dito que, naquele momento, “as Forças Armadas estavam divididas em dois grupos: um que apoiava fortemente a volta do governo civil e outro que estava disposto a impedir o que via como um avanço da esquerda”. Kissinger questionou se algo poderia acontecer antes ou depois das eleições, em janeiro de 1985. Figueiredo respondeu: “Sim, dependendo do desenrolar dos acontecimentos”, e salientou que “as Forças Armadas não falhariam ao compromisso de impedir, nas palavras dele, que esquerdistas tomassem o país, e que, se os militares tivessem que intervir, o país poderia ser levado a uma guerra civil”. Figueiredo via Tancredo como “uma pessoa capaz e moderada”, mas “cercada e apoiada por muitos radicais de esquerda”, e tinha receio de que, quando assumisse o poder, se eleito fosse, o político mineiro “não conseguisse controlá-los”.

Muito se cogitou da hipótese de Tancredo ser assassinado, mas — eis aí a gargalhada do capeta —, pelo menos até onde eu sei, ninguém previu que ele seria internado 12 horas antes da cerimônia de posse e morresse 38 dias (e sete cirurgias) depois. Mesmo assim, essa ironia do destino deu margem a um sem-número de teorias conspiratórias, a exemplo do ocorrido com o Papa João Paulo I em 1978 — 33 dias depois de ser nomeado papa, o cardeal Albino Luciani foi encontrado morto em seus aposentos, na manhã do dia 28 de setembro daquele ano, depois de ter tomado uma inocente chávena de chá na noite anterior.

A posse de Sarney soou como a “gargalhada do diabo” nos estertores da ditadura militar (na prática, a Nova República só teria início três anos depois, com a promulgação da Constituição Cidadã — criada durante a ressaca dos 21 anos de ditadura; portanto, compreensivelmente apinhada de direitos em seus 250 artigos que são não apenas o obelisco da prolixidade, mas uma colcha de retalhos.

A Carta Magna promulgada em 1988 foi remendada mais de uma centena de vezes (a título de comparação, a constituição norte-americana, promulgada em 1787, tem apenas 7 artigos e recebeu 27 emendas nos últimos 220 anos), e distribuiu diretos a rodo, mas sem apontar de onde viriam os recursos para bancá-los. A propósito: a palavra “Direito” é mencionada 76 vezes, enquanto "Dever" surge apenas 4 oportunidades e "Produtividade” e “Eficiência” aparecem duas e uma vez, respectivamente. Daí a pergunta: o que esperar de um país que tem 76 direitos, quatro deveres, duas produtividades e uma eficiência? A resposta: na melhor das hipóteses, uma política pública de produção de leis, regras e regulamentos que quase nunca guardam relação com o mundo real.

Com a morte de Tancredo, o vice José Sarney — que estava no lugar certo na hora certa — assumiu a presidência, a despeito de Figueiredo se recusar a lhe passar a faixa (por considerar traição ele ter abandonado a ARENA e se filiado ao MDB para integrar a chapa de Tancredo). Como se vê, a mosca azul não perdoa ninguém. Mas o político maranhense jamais imaginou o tamanho da encrenca em que se metera ao assumir a presidência sem ter indicado os ministros ou tido qualquer tipo de ingerência no plano de governo, sem contar com o apoio do Congresso, e (a cereja do bolo) com o país amargando uma inflação galopante de 200% ao ano.

Cinco anos e quatro planos econômicos mais adiante, Sarney passou o cetro e a coroa ao caçador de marajás de araque, juntamente com uma inflação 80% ao mês (quase 1.800% ao ano, considerando os doze meses finais do seu governo). Durante sua desditosa gestão, enfrentou mais de 12 mil greves, foi vítima de pelo menos um atentado e, certa vez, um sequestrador tentou jogar um Boeing sobre o palácio. Mas teve jogo de cintura e sempre manteve diálogo com os militares, o Congresso e a oposição. Em recente entrevista a Veja, declarou: Na história do Brasil, muitos presidentes foram eleitos para ser depostos — e eu não podia ser mais um”.

Tivesse feito essa profecia durante seu governo, Sarney teria se revelado um profeta, pois seu vaticínio se materializaria dali a poucos anos, com impeachment de seu sucessor, Fernando Collor de Mello. Mas isso já é conversa para o próximo capítulo.

sábado, 29 de abril de 2017

O MITO DESNUDADO ― PARTE II

A novela do triplex de Lula começou em 2009, com a quebra da Cooperativa Habitacional dos Bancários de São Paulo, que deixou na mão centenas de famílias ― mas não a Famiglia Lula da Silva, que tinha comprado a unidade 141. Para não prejudicar o capo di tutti i capi, o então presidente da cooperativa, João Vaccari, transferiu para a OAS a incumbência de concluir as obras do Edifício Solaris, e Leo Pinheiro destinou a Lula a cobertura 164-A, assumindo a diferença de R$ 1,15 milhão e bancando os quase R$ 900 mil cobrados pela Tallento Construtora para fazer alterações no projeto original ― que incluíram até mesmo um elevador privativo ― e decorar luxuosamente o tríplex.

Em seu depoimento, Pinheiro declarou também que Lula o mandou destruir qualquer documento que evidenciasse o pagamento do imóvel por Vaccari com dinheiro de propinas (segundo a ISTOÉ, o “presente” fez parte dos R$ 87,6 milhões que a OAS pagou ao PT em troca dos R$ 6,7 bilhões em obras realizadas entre 2003 e 2015).

Ao perguntar ao depoente se o réu havia deixado algum objeto pessoal no apartamento ― buscando provocar uma resposta negativa que, na sua concepção, comprovaria a tese da defesa (embora o bom senso sugira que ninguém deixa objetos pessoais num imóvel inacabado, ainda em fase de construção) ―, Cristiano Zanin, advogado de Lula, acabou involuntária e indiretamente robustecendo a prova de que o sítio de Atibaia era mesmo do ex-presidente, dada a profusão de objetos pessoais de Lula encontrados na propriedade, da adega de vinhos trazida de Brasília a canecas com o logo do Corinthians, time do coração do molusco mentiroso. Em outras palavras, o causídico foi buscar lã saiu tosquiado.

Em determinado momento, como Pinheiro insistisse que Lula era o proprietário do imóvel, Zanin perguntou: O senhor entende que deu a propriedade do apartamento para o presidente? A resposta: Eu não dei nada. O apartamento era do presidente Lula. Desde o dia que me passaram para estudar os empreendimentos da Bancoop já foi me dito que era do presidente Lula e sua família, e que eu não comercializasse e tratasse aquilo como propriedade do presidente. Perguntado se Lula havia conversado com ele sobre o pagamento das obras, Pinheiro foi didático: nunca conversou com Lula sobre o assunto, mas sim com Vaccari, que era o tesoureiro do PT. E Vaccari, depois de conversar com Lula, disse que o custo poderia ser descontado da conta do PT: Usei valores de pagamento de propinas para poder fazer encontro de contas. Em vez de pagar X, paguei X menos despesas que entraram no encontro de contas. Só isso. Houve apenas o não pagamento do que era devido de propina.

Outras colaborações que desconstruíram a fábula petista foram a de Marcelo Odebrecht ― sobre a qual eu já tratei aqui ― e a dos marqueteiros João Santana e Monica Moura, que detalharam como Lula, a Odebrecht e a OAS se juntaram numa agremiação criminosa que saqueou os cofres públicos e comprou o poder tanto no Brasil quanto em Angola, El Salvador, Panamá e Venezuela. Aliás, o casal de publicitários confirmou também que a reeleição de Lula em 2006, a eleição Dilma em 2010 e sua reeleição em 2014 foram bancadas com dinheiro sujo, e que ambos os petistas tinham pleno conhecimento desse fato ― tanto Lula quanto Dilma negam os malfeitos, naturalmente, como todos os integrantes da extensa lista de Fachin, que repudiam as acusações e acusam os colaboradores de mentir (só não deixam claro qual seria o propósito dessa mentira, pois é público e notório que os delatores perdem o direito aos benefícios caso não a veracidade dos fatos delatados não seja comprovada).

Para quem tem olhos para e um par de neurônios funcionais, Lula jamais passou de um oportunista disposto a se dar bem, e isso desde os tempos do sindicalismo e dos protestos contra o regime militar. Segundo o jornalista Rodrigo Constantino, os fatos trazidos à tona pela videoteca da Lava-Jato mostram como as pessoas foram ingênuas, como preferiram acreditar nas aparências em detrimento da caudalosa enxurrada de evidências contrárias.

Para a imensa maioria, porém, ficou claro quem é Lula e quem ele sempre foi. Muitos dos que nele acreditaram se sentem traídos e, como os que desde sempre enxergaram o lobo que se escondia sob a pele do cordeiro, querem vê-lo exemplarmente punido por todo o mal que causou ao país.

O fato de Lula estar desmoralizado não significa que outro Lula não possa surgir das cinzas: enquanto houver gente disposta a sacrificar os fatos em prol de suas ilusões, sempre haverá um oportunista de plantão, pronto para explorar demagogicamente essa característica tão intrínseca ao pouco esclarecido eleitorado tupiniquim.

Para concluir, seguem atualizações sobre a audiência em que Lula e o juiz Sergio Moro ficarão face-to-face pela primeira vez:

― A PF e a SSP do Paraná pediram o adiamento do interrogatório, “tendo em vista notícias de possível deslocamento de movimentos populares para a capital paranaense em virtude da semana de comemoração do Dia do Trabalhador, o que pode gerar problemas de segurança pública, institucional e pessoal”
 (mais detalhes neste vídeo). Não há até o momento [em que eu estou redigindo este texto] qualquer informação sobre a nova data.

Em despacho publicado na última segunda-feira, Moro afirmou que irá rever a decisão de exigir a presença de Lula nas audiências de oitiva das 87 testemunhas arroladas por sua defesa, mas desde que seja igualmente revisto o rol de testemunhas arroladas e discriminadas circunstanciadamente as razões pelas quais sua oitiva é mesmo necessária, pois poderiam ser aproveitados os depoimentos por elas já prestados. O magistrado ressaltou que é dever do acusado comparecer a todas as audiências, apesar do pedido da defesa do ex-presidente afirmar que isso não é necessário.

Na verdade, Lula montou duas estratégias: uma política, que é enviar milhares de petistas e outros baderneiros (recrutados nas fileiras da CUT, do MST, do MTST e por aí afora) para cercar o local do depoimento; outra, jurídica, de convocar um número astronômico de testemunhas, visando, obviamente, atrasar o julgamento (e se o juiz Moro se recusar a ouvir essa renca, os advogados do petralha certamente alegarão cerceamento de defesa). Cá entre nós, como é quase impossível defender o indefensável, os advogados de sua insolência lutam com as armas que têm. Afinal, cobram caro e precisam mostrar serviço.

O resto fica para a próxima. Até lá.

Confira minhas atualizações diárias sobre política em www.cenario-politico-tupiniquim.link.blog.br/

quinta-feira, 20 de maio de 2021

COMO SE LIVRAR DE LIGAÇÕES ABORRECIDAS

A CIÊNCIA SERVE PARA NOS DAR UMA IDEIA DE QUÃO EXTENSA É A NOSSA IGNORÂNCIA.

Empresas de telemarketing,  de telefonia e de TV por assinatura, entre muitas outras, obrigam-nos a interromper o que estamos fazendo para atender ligações que, se não caem, brindam-nos com uma gravação (não dá nem para a gente xingar o interlocutor) que busca nos empurrar goela abaixo produtos que não queremos comprar e serviços que não desejamos contratar.

Se você é vítima contumaz desses chatos, aqui vai uma boa notícia (coisa rara hoje em dia): A partir das muitas queixas diárias recebidas pelo Procon — para que se tenha ideia da dimensão do problema, apenas em 2017 foram registradas cerca de 16 mil reclamações sobre serviços de telemarketing em São Paulo —, foi implementado um serviço gratuito, muito útil, mas pouco conhecido, que está disponível em São Paulo e nos estados do Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Espírito Santo e Minas Gerais. 

Para manter essas gralhas a distância, acesse o site do Procon e cadastre seu telefone (é possível inscrever até cinco números por consumidor, que podem ser de terminais fixos ou móveis). Se, passados 30 dias da data do cadastro, alguma empresa de telemarketing que insistir em perturbá-lo, você pode formalizar uma denúncia (para mais detalhes, clique aqui), mas note que essa proibição não se aplica a ligações de pedidos de doações nem de empresas que precisem entrar em contato para fazer pesquisas de satisfação ou cobranças.

Nos telefones fixos — que vêm perdendo espaço nas residências em virtude da versatilidade dos smartphones — o BINA (sigla de “B Identifica o Número de A”) permite visualizar o número de quem está ligando. Ou de quem ligou, já que o aparelho registra as chamadas não atendidas. O problema é que essa informação não basta para você saber quem ligou, a menos que seja capaz de associar o número em questão ao usuário da linha. Demais disso, algumas operadoras deixaram de disponibilizar o BINA (como é o caso da VIVO, pelo menos na região onde eu moro).

No caso de ligações recorrentes, não custa pesquisar o número do chato no Google, já que telefones divulgados na Internet por usuários e empresas costumam ser indexados. A depender do caso, os resultados podem ser bastante detalhados — com nome, razão social e até mesmo endereço físico. Serviços de buscas ligados à Deep Web oferecem mais chances de sucesso, mas requerem um navegador capaz de singrar por aquelas águas e alguma expertise para evitar... enfim, isso é conversa para outra hora.

No celular, o número de quem está ligando (ou quem ligou quando seu dispositivo estava desligado, sem bateria ou sem serviço, p.ex.) é exibido no display, mas o titular da linha só é identificado se estiver na sua lista de contatos. Ademais, sempre existe ainda a possibilidade de o número não ser exibido, pois há quem configure o aparelho para ocultar a ID. Não há nada de errado nisso, mas tenha em mente que algumas pessoas não atenderão suas ligações, pois associam “número privado” a trotes ou a golpes. Nem sempre é o caso, mas até aí morreu o Neves.

Observação: A expressão “Até aí morreu o Neves” não tem a ver com a morte de Tancredo Neves. Na verdade, nenhum dos estudiosos da fraseologia da língua portuguesa sabe que Neves é esse. O sentido da frase, como sabemos, é pacífico: diz-se “Até aí morreu o Neves” quando se quer dizer algo como “E daí? O que você diz não traz novidade nenhuma”. Sua origem, no entanto, é obscura. A única tese sobre isso é a do filólogo João Ribeiro, um dos maiores estudiosos brasileiros da matéria, em seu livro “Frases feitas — Estudo conjetural de locuções, ditados e provérbios”. A hipótese vale pela ousadia de ensaiar uma explicação para algo tão nebuloso. Depois de ressalvar que “não há na história ou na lenda nenhum Neves famoso que eu conheça” e que “pode ser que [a frase] tenha origem em algum entremez, vaudeville ou comédia”, Ribeiro apresenta o que chama de “conjetura”: a de que a expressão tenha surgido como variante de outra frase feita clássica da língua portuguesa, “Morreu Inês” ou, na versão mais usada hoje, “Inês é morta”, que significa “Agora é tarde demais”. Inês, ao contrário de Neves, sabe-se quem é: a fidalga Inês de Castro, a “rainha morta”, amante do futuro rei de Portugal D. Pedro I (não confundir com o nosso), assassinada em 1355 a mando do pai deste, D. Afonso IV. A tragédia de Inês tem gorda presença na história, na literatura, na lenda e na imaginação popular. De acordo com a curiosa especulação de Ribeiro, um mal-entendido — motor clássico de invenções linguísticas — poderia ter transformado “morreu Inês” em “morreu o Neves”. Antenor Nascentes disse que a tese de Ribeironão parece muito provável”. Mas o fato de ser a única disponível não nos permite descartá-la depressa demais.

Como eu dizia antes de tratar da morte do Neves, o fato de a ID de quem está ligando não ser exibida não significa necessariamente que a chamada seja maliciosa. Aliás, “ID” é um diminutivo da palavra inglesa “identity”, que significa “identidade” na tradução literal para a língua portuguesa, mas remete à identificação do usuário em serviços online, redes sociais e dispositivos computacionais.

Para não espichar demais este texto, deixo a conclusão para a próxima postagem.

terça-feira, 19 de janeiro de 2021

O SUCESSO TEM MUITOS PAIS. O FRACASSO É ÓRFÃO


"É... Acho que eu exagerei..." (comentário de Sergio Cabral ao retornar à cela após ser condenado pela enésima vez). Bolsonaro também exagerou na dose de mentiras, agressões e crimes contra a vida dos brasileiros, como evidenciou o panelaço da sexta, 15, comparável às “homenagens” prestadas à nefelibata da mandioca nas semanas que antecederam seu afastamento, só que com requintes de gritos de "Assassino!", "Genocida!", "Fora Bolsonaro!"...

O jornalista Ricardo Kotscho publicou em sua coluna que "genocida não é só Bolsonaro, mas toda a sua equipe de ineptos e cretinos que desmoralizam as Forças Armadas, produzem o desemprego e a queimada das florestas e pantanais, a destruição do ensino público, da cultura, da ciência e da soberania nacional e promovem a desindustrialização de um país condenado a morrer, de Covid ou de fome, enquanto mais de 35 milhões de pessoas já foram vacinadas mundo afora".

Diante deste cenário fúnebre, o professor de história, escritor e compositor Luiz Antonio Simas desabafou nas redes sociais: "Apoio qualquer coisa contra esse governo: passeata, guerrilha, panelaço, greve, jantar beneficente, sujeito gritando sozinho no banheiro, desabafo em analista, despacho na encruza, novena, frente ampla, mandinga do livro de capa de aço de São Cipriano, ciranda, bingo e bazar".

Segundo o sempre bem informado Ricardo Noblat, é crescente o número de deputados e senadores de todos os partidos que "passaram a levar a sério a abertura de um processo de impeachment, porque o desgoverno chegou a um ponto insustentável, colocando em risco a vida da população". E com efeito.

O empenho do capitão-cloroquina em menosprezar a Covid e ignorar os protocolos de segurança renderam-lhe o título de pior líder global no enfrentamento da pandemia, e suas convicções negacionistas levaram-no a boicotar o quanto pôde e enquanto pôde a campanha de vacinação. Porém, depois que manauaras começaram a morrer feito moscas e o Airbus A330-900neo da Azul — que deveria trazer da Índia 2 milhões de doses da vacina da AstraZeneca/Oxford — não recebeu sinal verde do governo indiano, o capitão-inveja percebeu que não seria ele, mas sim o governador João Doria, quem sairia na foto ao lado do primeiro brasileiro vacinado contra a Covid (que na verdade foi uma brasileira).

A exemplo do aleijado que culpa a muleta por claudicar, o ministro insalubre da Saúde atribuiu a tragédia amazônica à falta de tratamento precoce — embora não exista tratamento precoce contra a Covid — e, no melhor estilo “pajé Bolsonaro“, pressionou a secretaria municipal da Saúde de Manaus a administrar fármacos sem eficácia comprovada no combate ao Sars-CoV-2, ignorou o pedido de discrição feito pelo governo indiano e trombeteou aos quatro ventos a compra do imunizante, além de mandar colar uma faixa de 64 metros de comprimento (vide imagem) na fuselagem do Airbus.

A despeito do contrato firmado com o Brasil, o governo indiano queria evitar a divulgação da venda de vacinas num momento em que a imunização de sua população não havia sequer começado. Graças à indiscrição "do um que manda e do outro que obedece", o assunto chegou ao conhecimento da imprensa indiana. Agora já não se sabe quando — nem se — os 2 milhões de doses da vacina produzida naquele país chegarão até nós. 

Diante desse cenário, o general que recebe ordens do capitão determinou o confisco da CoronaVac no paiol do inimigo. Na sexta-feira 15, o ministro mandou um ofício ao Butantan exigindo a entrega imediata de 6 milhões de doses da vacina. O instituto respondeu que só disponibilizaria o estoque depois que a pasta esclarecesse quanto do contingente já ficaria em São Paulo e o governador tucano aguardava apenas a aprovação da Anvisa para recorrer ao STF. 

"Aqui o Ministério da Saúde não manda nem intimida ninguém. Neste jogo pela vida, quem errou e perdeu até agora foi o Ministério da Saúde e seu déspota Jair Bolsonaro", ouvia-se pelos corredores do Palácio dos Bandeirantes.

No domingo 17, tanto a CoronaVac quando a vacina da AstraZeneca/Oxford tiveram o uso emergencial aprovado pela Anvisa. O Butantan já tem 10,8 milhões de doses disponíveis para aplicação, enquanto a Fiocruz aguarda chegada do imunizante vindo da Índia, ainda sem data prevista.

A Anvisa devolveu os documentos apresentados pelo laboratório União Química, responsável pela vacina Sputnik V, por não apresentar condições mínimas para submissão e análise pela agência. Por causa disso, o Fundo Russo de Investimento Direto anunciou que em até uma semana irá entregar todas as informações adicionais para o pedido de uso emergencial no Brasil. Isso inclui a permissão para iniciar os ensaios clínicos de fase 3 no país. Esse tipo de estudo é uma das exigências da Anvisa para liberar a utilização emergencial de um antígeno contra a Covid. Nove países já registraram o imunizante desenvolvido pelo Instituto Gamaleya.

O governo federal se comprometeu a distribuir as vacinas para todos os estados e municípios "de maneira exclusiva e simultânea". No entanto, considerando que o ministro intendente da Saúde já se mostrou capaz — dentre outros prodígios — de “esquecer” quase 7 milhões de testes RT-PCR num depósito federal em Guarulhos... sei não.

O furdunço está longe de acabar. Em recado ao governador de São Paulo, o residente da República afirmou que a vacina produzida pelo Butantan "não é de nenhum governador, é do Brasil— o que não deixa de ser um progresso considerável para quem até pouco tempo atrás se referia ao imunizante como “vacina chinesa do Dória”. 

No domingo, o governador paulista protagonizou na capital do estado um evento que marcou o início simbólico da vacinação no país. Irritado, Pazuello o acusou de deslealdade e de promover uma "jogada de marketing" em desacordo com a lei. Disse ainda essa sumidade: 

"Senhores governadores, não permitam movimentos político-eleitoreiros se aproveitando da vacinação em seus estados. O nosso único objetivo neste momento tem de ser o de salvar mais vidas, e não o de fazer propaganda própria". 

Doria rebateu: "A vacina é uma lição para vocês, autoritários que desprezam a vida, que não têm compaixão, que desprezam a atenção, a dedicação e a necessidade de proteger os brasileiros. Vocês não fizeram isso".

Integrantes do Palácio do Planalto admitem em caráter reservado que Doria venceu a batalha neste momento, mas o governo federal vai trabalhar para reverter a situação e capitanear, para o presidente da República, os méritos de uma vacinação em massa a partir de agora. Conforme um assessor palaciano, “perdemos a batalha, mas não a guerra”. Outro trunfo esperado pelo Planalto é o nível de eficácia da vacina de Oxford, que demonstrou eficácia de 70% após a aplicação da primeira dose. Dessa forma, integrantes do governo federal acreditam que, apesar de ela chegar mais tarde, sua efetividade será maior que a da CoronaVac. E isso tende a ser capitalizado por Bolsonaro.

A PGR abriu uma apuração preliminar para analisar a conduta do ministro da Saúde ante a notícia de que ele teria sido previamente avisado “sobre a escassez crítica de oxigênio em Manaus por integrantes do governo do Amazonas, pela empresa que fornece o produto e até mesmo por uma cunhada [...] mas não agiu”. 

Na semana passada Pazuello reconheceu publicamente a crise do oxigênio: “Quando cheguei na minha casa ontem, estava a minha cunhada. O irmão não tinha oxigênio nem para passar o dia. 'Ah, acho que chega amanhã. O que você vai fazer?' Nada. Você e todo mundo vai esperar chegar o oxigênio para ser distribuído”.

Pazuello ainda não é formalmente investigado, mas Aras pode pedir ao STF a abertura de inquérito, como já pediu ao STJ que investigue o governador do Amazonas e a prefeitura de Manaus pelo colapso no sistema de saúde. Bolsonaro, porém, foi poupado pelo PGR.

A conferir.

segunda-feira, 14 de novembro de 2016

DICAS ― UTILIDADE PÚBLICA

O GRANDE ACONTECIMENTO DO SÉCULO FOI A ASCENSÃO ESPANTOSA E FULMINANTE DO IDIOTA.

 As dicas de hoje fogem um pouco ao nosso habitual, mas resolvi publicá-las por motivos que a leitura da postagem se encarregará de esclarecer. Todas elas focam a cobrança abusiva à luz dos direitos do consumidor, e a primeira remete ao fato de bares, restaurantes e assemelhados incluírem na conta uma taxa de couvert sem informar previamente os clientes de que esse adicional será cobrado.

Segundo o Código de Defesa do Consumidor, para que o estabelecimento tenha o direito de realizar essa cobrança, é imprescindível que o garçom pergunte ao cliente se ele está disposto a assistir ao show e informe quanto isso lhe custará, ou, no mínimo, exibir essa informação em local visível, preferencialmente na entrada do estabelecimento.

E o mesmo vale para o couvert  “não-artístico” ― aquela entrada servida como “aperitivo” para o cliente degustar enquanto espera o prato pedido ser trazido à mesa. Nesse caso, a cobrança só é legal se o cliente for informado previamente do valor que será cobrado e se concordar expressamente em pagá-lo, até porque fornecer um produto ou serviço sem prévia autorização o mesmo que oferecer uma amostra grátis.

Já a gorjeta (os famosos 10% incluídos na nota) é uma questão controversa, embora seja uma velha conhecida dos frequentadores de bares, restaurantes e similares. Via de regra, servir bem é uma obrigação do garçom, de modo que não faz sentido gratificá-lo por fazer um trabalho pelo qual ele já é remunerado pelo empregador, a não ser quando o serviço realmente supera as expectativas. No entanto, a cobrança desse adicional ajuda a incrementar o ganho dos funcionários (pelo menos em tese, porque alguns maus empresários não lhes repassam o dinheiro) e é imposta à clientela com o argumento de a gorjeta é prevista nas convenções coletivas firmadas entre patrões e empregados e homologadas pela Justiça do Trabalho.

Ocorre que os acordos/convenções/dissídios trabalhistas normatizam as relações entre patrões e empregados, mas não produzem efeitos em relação a terceiros e, portanto, não têm o condão de tornar a gorjeta obrigatória para os clientes. Demais disso, a Constituição Federal, em seu art. 5º, § II, determina que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei” (princípio da legalidade). Sobre o tema, o TRF da 1ª Região já decidiu a respeito, conforme se infere da seguinte ementa:

CONSTITUCIONAL, CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ESTABELECIMENTOS COMERCIAIS. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. COBRANÇA DE ACRÉSCIMO PECUNIÁRIO (GORJETA). PORTARIA Nº. 4/94 (SUNAB). VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE E AO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.
I – O pagamento de acréscimo pecuniário (gorjeta), em virtude da prestação de serviço, possui natureza facultativa, a caracterizar a ilegitimidade de sua imposição, por mero ato normativo (Portaria nº. 4/94, editada pela extinta SUNAB), e decorrente de convenção coletiva do trabalho, cuja eficácia abrange, tão-somente, as partes convenientes, não alcançando a terceiros, como no caso, em que se pretende transferir ao consumidor, compulsoriamente, a sua cobrança, em manifesta violação ao princípio da legalidade, insculpido em nossa Carta Magna (CF, art. 5º, II) e ao Código de Defesa do Consumidor (Lei nº. 8.078/90, arts. 6º, IV, e 37, § 1º), por veicular informação incorreta, no sentido de que a referida cobrança estaria legalmente respaldada (Apelação Cível AC 2001. 1.00.037891-8/DF, rel. Desembargador Federal Souza Prudente. Tribunal Regional Federal da 1ª Região. Publicado em 13/10/2008).

Dessa forma, o pagamento do acréscimo de 10% sobre a conta é mera liberalidade, não sendo exigível por não ser obrigatório.
Por último, mas não menos importante, nenhum lojista ou prestador de serviços pode cobrar do consumidor tarifas pela “emissão do boleto bancário” ou qualquer outro custo assemelhado, mesmo quando o repasse está previsto no contrato, pois cláusulas leoninas (que estabelecem obrigações injustas e/ou coloquem o consumidor em desvantagem) são nulas de pleno direito. Assim, caso você tenha sido cobrado pela emissão de um boleto, o Código de Defesa do Consumidor lhe assegura o direito de receber em dobro o valor cobrado, acrescido de juros e correção monetária.

VACCARI ABSOLVIDO ― ou O LEPROSO E A VERRUGA

Condenado em três ações penais a 31 anos de prisão, o ex-tesoureiro petralha João Vaccari Neto, preso na carceragem da PF em Curitiba desde 2015, foi novamente indiciado por corrupção e associação criminosa em investigações que envolvem a empresa Carioca Engenharia.

Em contrapartida, entendendo que não restaram devidamente demonstrados alguns fatos descritos na denúncia por crimes de formação de quadrilha, estelionato, falsidade ideológica e lavagem de dinheiro relacionados à BANCOOP, a juíza Cristina Costa, da 5ª Vara Criminal de São Paulo, resolveu absolvê-lo nesse processo.

A notícia foi logo replicada em sites e blogs mortadeleiros e nos Petralha-News da vida, que tentam vender a ideia espúria e absurda de que o ex-tesoureiro do PT teria sido preso injustamente, que a justiça persegue o partido, e blá, blá, blá. Para Vaccari, todavia, comemorar a decisão da juíza paulista ― contra a qual, vale lembrar, cabe recurso ― seria como um leproso coberto de chagas festejar a queda de uma verruga.

A propósito, uma das peculiaridades que destaca o PT dos demais partidos corruptos é o fato de ter 3 ex-tesoureiros presos e outros tantos ex-ministros da Casa Civil nas mesmas condições. Pelo jeito, a carceragem da PF em Curitiba vai ficar pequena para tanto “cumpanhêro”. Dias atrás, o juiz Sérgio Moro aceitou a denúncia contra Sílvio Pereira, ex-secretário-geral do partido, que havia sido indiciado na 27ª fase da Lava-Jato.

Como diriam os defensores ignaros da petralhada, KKKKKKKKKKK!

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Um ótimo dia a todos.