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segunda-feira, 31 de outubro de 2022

HABEMUS PAPAM

 

O título desta postagem advém do fato de que a indesejável mistura de política com religião trouxe matizes de conclave a uma sucessão presidencial que a imbecilidade chapada do eleitorado tupiniquim já havia convertido em pleito plebiscitário. Dito isso, segue o texto que escrevi no início da tarde de ontem — antes de conhecer o resultado das urnas, portanto —, convicto de que, parafraseando um inusitado rompante de coerência do ainda presidente, o candidato que tivesse mais votos venceria a disputa. 

 

Uma vez que a polarização infeccionou mais de 80% da récua de muares travestidos de eleitores, é possível (e até provável) que seu candidato a presidente, caríssimo leitor, tenha vencido a disputa. Em sendo o caso, meus parabéns. Ao Brasil, minhas condolências. 


A menos que o imprevisto tenha voto decisivo na assembleia dos acontecimentos, o país do futuro que nunca chega amargará mais quatro anos de desgoverno abjeto e ímprobo (nunca é demais lembrar que maus governantes não brotam nos gabinetes por geração espontânea; se estão lá, é porque foram votados, e se você votou nessa caterva, não pode reclamar de não estar devidamente representado).

 

Mudando de um ponto a outro, depois de ser nomeado bispo por João XXIII e cardeal pelo Papa Paulo VI, Albino Luciani foi eleito papa na terceira votação do conclave que se seguiu à morte de Paulo VI, superando Giuseppe Siri por 99 votos a 11, e entrando para a História como o primeiro pontífice desde Clemente V a recusar uma coroação formal e o pioneiro na adoção de um nome papal duplo — que ele escolheu para homenagear seus dois antecessores, Paulo VI e João XXIII.

 

João Paulo I morreu 33 dias depois de ter sido guindado ao Trono de Pedro e um dia após ter confidenciado ao bispo John Magee, seu secretário, que: "Alguém mais forte que eu, e que merece estar neste lugar, estava sentado à minha frente durante o conclave. Ele virá, porque eu me vou". Esse alguém era o cardeal polonês Karol Wojtyla, que se tornou João Paulo II


Na época, chegou-se a comentar à boca pequena que o finado tinha bom coração, mas não estava à altura do ambiente maquiavélico do Vaticano, e que sua morte decorreu de um complô. Consta que ele sentiu fortes dores no peito durante o chá da tarde do dia 27 de outubro de 1978, e que foi encontrado morto, na manhã seguinte, pela freira que o acordava havia muitos anos (e que fez voto de silencio após esse trágico episódio).  No entanto, a versão oficial do Vaticano dá conta de que um dos secretários do papa — Diego Lorenzi — teria encontrado o corpo, e que a causa mortis fora um infarto do miocárdio (associado às terríveis pressões do cargo). 

 

Essas e outras declarações inconsistentes deram azo a diversas teorias da conspiração. No livro In God's Name, o escritor britânico David Yallop afirma que o papa foi morto porque estava prestes a desvendar escândalos financeiros que envolviam o Vaticano. Passados mais de 40 anos, o mafioso Antoni Raimondi, sobrinho de Lucky Luciano, revelou em seu livro de memórias que envenenou o João Paulo I a mando de seu primo, o arcebispo norte-americano Paul Marcinkus — então presidente do Banco do Vaticano. A ideia era evitar que o pontífice de tornar públicos documentos que comprovavam uma fraude financeira bilionária (ainda segundo o mafioso, João Paulo II não revelou o escândalo do banco do Vaticano por temer pela própria vida, mas isso é outra conversa).


O plano era drogar o chá que João Paulo I tomava antes de dormir, entrar em seus aposentos e lhe administrar uma dose letal de cianeto (essa versão foi dramatizada por Mario Puzzo e Francis Ford Copolla no terceiro capítulo da imperdível trilogia "The Godfather"), e que o arcebispo Marcinkus se encarregou pessoalmente dessa tarefa. Raimondi diz só ficou na porta, pois assassinar o papa com as próprias mãos lhe garantiria um bilhete só de ida para o inferno (o curioso código de ética da Onorata Società será discutido em outra oportunidade).

 

Marcinkus começou sua carreira no Vaticano como secretário de Estado em Roma e chegou a ser um dos guarda-costas de Paulo VI. Em 1971, ele foi nomeado presidente do banco do Vaticano (cargo que ocupou até 1989). Quando assumiu o posto, foi interrogado pelo departamento da Justiça norte-americano sobre seu envolvimento com ações falsas avaliadas em € 13.07 milhões (de um total estimado quase € 1 bilhão), mas não houve provas suficiente para avançar com a investigação  até porque, sob o pretexto de não quebrar o sigilo que envolvia as operações conduzidas pelo banco, o arcebispo se recusou a revelar detalhes sobre o esquema de corrupção. 

 

Observação: Em 1982, Marcinkus foi implicado no escândalo do colapso do Banco Ambrosiano e, mais adiante, nos assassinatos de Roberto Calvi e do jornalista Mino Pecorelli, que vinha escarafunchando a podridão que cercava o banco do Vaticano. Mas sua participação na emissão das ações falsas e nos assassinatos e raptos relacionados com o escândalo não restaram provadas, e ele morreu aos 84 anos, no Arizona, sem ter sido formalmente acusado por crime algum.

 

Voltando ao aviltante cenário político tupiniquim, o desafio, para os pesquisadores, será explicar como este país alcançou um nível de deterioração das instituições democráticas que seria inimaginável em 2018, quando vinha de um traumático processo de impeachment e de um momento marcado por sucessivas acusações de corrupção.

 

As manifestações em prol da deposição de Dilma começaram em 2013, mas a ascensão de Temer ao Planalto, em 2016, não produziu um sentimento de esperança como o de 1992, quando Fernando Collor foi apeado e Itamar Franco assumiu a Presidência. As forças democráticas, desorganizadas, sem lideranças de expressão nacional nem programa político e tendo o PT na oposição, produziram um enorme vazio político, nenhuma renovação frente à dualidade eleitoral, que vinha desde 1994 (entre PT e PSDB), nem quaisquer soluções programática para os problemas nacionais que surgiram após a trágica crise de 2015 e 2016. 

 

Segundo o historiador, youtuber e suplente de deputado federal Marco Antonio Villa, o Brasil virou uma enorme delegacia de polícia, com um entra-e-sai constante de acusados. As propostas de ação político-econômica foram deixadas de lado. Mas não chegamos aonde chegamos por acaso. O desafio, agora, é encontrar o caminho da superação desse descalabro — que, aliás, pode estar numa insuspeita xícara de chá.


Que Deus nos ajude.

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2025

AINDA SOBRE PAPAS E ESCÂNDALOS

MEIAS VERDADES BEM CONTADAS PODEM LEVAR ALGUÉM A CULPAR O INOCENTE E APLAUDIR O MENTIROSO.

 

Poder e corrupção sempre andaram de mãos dadas. Na Igreja Católica, a ascensão política e econômica se deu através de alianças com impérios, manipulação de monarcas, interesses escusos e casos de corrupção de deixar a banda podre do Congresso Nacional se roendo de inveja. Mas nada se compara ao pontificado de Alexandre VI (r. 1492-1503), que foi marcado por acusações de nepotismo, promiscuidade, simonia e corrupção. Não à toa, ele é lembrado como o papa mais corrupto de todos os tempos (detalhes nesta postagem).

Pedro, cujo nome original era Simão, foi o primeiro chefe da Igreja Católica, mas jamais recebeu o título de "papa" e foi crucificado por ordem do imperador Nero, o déspota crossdresser, cruel e violento que governou Roma de 54 a 68 e, dizem as más-línguas, assistiu ao grande incêndio dedilhando sua lira e cantando. 

Depois que Calígula foi assassinado, Cláudio subiu ao trono e se casou com Agripina, mãe de Nero, que já tramava a ascensão do filho ao trono imperial. Com a morte "misteriosa" do marido e Nero no poder, a maquiavélica achou que seria a éminence grise, mas morreu esfaqueada a mando do filho, que se suicidou quando o Senado o declarou inimigo público.
 
Nos primeiros séculos do cristianismo, a Igreja conviveu com a perseguição romana. Em 313, o imperador Constantino legalizou a fé cristã, e Silvestre I assumiu o papado no ano seguinte. Com a queda do Império Romano do Ocidente (476), os papas passaram a atuar como líderes políticos, e a Igreja se tornou a instituição mais poderosa da Europa, detendo, inclusive, o poder de coroar e excomungar reis. 

A rivalidade entre pontífices e governantes era flagrante, e a simonia (comercialização de cargos eclesiásticos) e a interferência na política feudal, tão corriqueiras quanto a corrupção na política dos dias atuais. Leão I (r. 461-468) ficou conhecido por convencer Átila a não saquear Roma em troca de uma pilha de saques. Formosus (r. 891-896) foi exumado em 897, vestido com trajes completos, sentado em um trono papal, levado a julgamento e condenado, seus éditos papais foram considerados inválidos, os dedos que ele usava para oficiar sacramentos foram decepados. Seus restos mortais foram jogados no rio Tibre.
 
Consta que o papa João (r. 855-877) teria sido uma mulher, mas não há provas que sustentem essa versão. Em 964, cansados do comportamento corrupto e venal dos pontífices, os romanos guindaram Bento V ao Trono de Pedro, mas ele renunciou quando o Rei Otto elegeu Leão VIII como "antipapa". Já Bento IX foi papa em três ocasiões entre 1032 e 1048 e o
 primeiro a vender papado.
 
Vários papas morreram dias ou semanas depois do conclave — entre os quais Estêvão (752), Damásio II (1048) e Celestino IV (1241) —, mas o reinado mais breve da história foi o de Urbano VII (1590), que durou apenas 12 dias. 

João Paulo I foi encontrado morto em seus aposentos 33 dias após a unção. Na véspera, dizem, ele havia confidenciado a seu secretário que "alguém mais forte e que merecia estar em seu lugar sentou-se a sua frente durante o conclave". Esse alguém era o cardeal polonês Karol Wojtyla, que se tornou João Paulo II (mais detalhe no próximo capítulo).

sexta-feira, 27 de outubro de 2017

QUEM NÃO APRENDE COM OS ERROS DO PASSADO VOLTA A COMETÊ-LOS NO FUTURO



O PSDB já foi o maior partido de oposição aos governos corruptos de Lula e Dilma. Agora, é tão inútil quanto um casaco de pele, ao meio dia, sob o sol causticante do verão senegalês. 

Consenso, dentro da legenda, é como nota de US$ 100 em bolso de mendigo. Não existe. O tucanato faz reuniões e mais reuniões, mas nada fica decidido. Nem para expulsar o senador corrupto que traiu 51 milhões de eleitores os tucanos prestam. E o mesmo vale para o Senado Federal: na última terça-feira, 24, o senador maranhense João Alberto Souza, presidente da Comissão de Ética do Senado, determinou, com base no parecer da Advocacia Geral da Casa, o arquivamento da representação que pedia a cassação do neto de Tancredo. Ainda cabe recurso ao plenário da Comissão, até porque estamos no Brasil, onde sempre existe uma instância superior a quem se pode recorrer contra uma decisão desfavorável, daí ser fundamental, para a classe política, manter o famigerado foro privilegiado. Numa estimativa otimista, 99% dos recursos contra condenações na esfera penal que chegam até STF caducam, caem de maduro ou morrem de velhice.

O PSDB nasceu de uma costela do PMDB e teve seu momento de glória ao emplacar FHC, que, quando ministro de Itamar, conseguiu vencer a hiperinflação sistêmica. Mas os tucanos deixaram a esquerda criar asas e perderam a presidência para Lula. O sonho de recuperá-la em 2010 até poderia ter se concretizado se eles tivessem se empenhado mais, mas esse cemitério de egos ainda não se conscientizou de que brigar entre si não serve como treinamento para lutar contra os verdadeiros adversários.

Depois da derrota de Aécio em 2014, o partido entrou em parafuso. Ainda que tenha contribuído para o impeachment de Dilma, que o tenha feito em nome da estabilidade, da governança, da austeridade, da “salvação nacional”, que tenha apoiado a ideia de se ter um governo de transição que, mantendo de pé uma “pinguela” reformista, atravessasse a pior fase da crise e entregasse o país em melhores condições para o presidente a ser eleito em 2018, o PSDB nada fez para influenciar ou direcionar esse governo. Um governo de perfil “parlamentar”, mas com uma base pouco confiável, sem grandeza e sem projeto, que se refletiu na composição ministerial, gerou turbulências e explodiu com as delações da JBS, que se deixou impregnar pelos interesses escusos do Congresso e pela preocupação em esvaziar a Lava-Jato e recompor oligarquias e práticas clientelistas, trocando a grande política pela pequena política. 

O PSDB ficou ainda mais desmoralizado com o afastamento judicial de Aécio Neves, cuja imagem de bom moço enganou meio mundo (e aí se inclui este que vos escreve). Agora, seus caciques vão empurrando com a barriga a decisão de podar as asinhas do mineirinho safado, que continua senador e presidente afastado da sigla ― e como seu amiguinho e aliado de ocasião Michel Miguel Elias Temer Lulia, não pode nem ouvir falar em renúncia.

Os tucanos deram as costas para a opinião pública e deixaram passar a oportunidade de resgatar a imagem de alternativa lógica para quem não suporta mais corruptos como os do PT e do PMDB. Hoje, criticar o governo é como um roto falar mal de um esfarrapado, mas apoiar Michel Temer foi mais um tijolo na obra de desconstrução do tucanato ― algo que certamente cobrará seu preço, tanto do partido, que prolongou sua indefinição, quanto da política nacional, que perdeu outro personagem que poderia fazer a diferença. Ou será que a sociedade, a opinião pública e o eleitorado perdoarão os tucanos nas próximas eleições?

Falando em erros crassos, embora não me agrade nem um pouco falar na patuleia ignara, vale registrar que supostas conversas de bastidores do PT davam conta de que Temer não sairia vivo do hospital ― onde foi internado na última quarta-feira, 25, devido a problemas urinários. Mas faltou um chazinho como aquele que, dizem, abreviou o pontificado do papa João Paulo I. Afinal, rezar e acender vela até pode ajudar, mas se não jogar pedra nos cachorros é mordida na certa.

Para o PT, interessava a permanência de Temer na presidência, não só porque ambos querem enterrar a Lava-Jato, mas também porque os petralhas acham que a impopularidade do presidente acabará enterrando de vez a já combalida economia. Mas não é o que se vê. Mesmo que a gestão do vampiro do Jaburu não passe de um “terceiro tempo” dos governos de Lula e Dilma, o mercado, sabiamente, precificou o dito-cujo. Prova disso é que, no dia seguinte ao sepultamento da segunda denúncia, a bolsa abriu em alta e a cotação do dólar recuou. 

Faltou o PT combinar com o mercado ― e dar o tal chazinho revigorante a sua insolência, naturalmente.

Aliás, segundo a Folha, em sua peregrinação por Minas Gerais o incansável candidato eneadáctilo esteve numa aldeia indígena em Coronel Murta, onde foi benzido por Benvina Pankararu, cacique da tribo. Ela teria dito que o indigitado “precisa mesmo ser rezado”. Mas nem reza brava vai impedir sua condenação pelo TRF-4. Vade retro, Satanás!

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sábado, 12 de março de 2022

NÃO CONFUNDA PALHAÇO PRESIDENTE COM PRESIDENTE PALHAÇO


Não é justo atribuir aos políticos a culpa pelas mazelas dos brasileiros. Políticos não brotam em seus gabinetes por geração espontânea; se os três Poderes da República foram tomados por criminosos de colarinho-branco (pode-se argumentar que os juízes de cortes superiores não são eleitos pelo voto popular, mas quem os indica e quem chancela a indicação o são), a culpa é de um eleitorado incapaz de tirar água de uma bota, mesmo com as impressas no calcanhar.

O brasileiro já votou em rinoceronte para vereador, em macaco para prefeito, em palhaço de circo para deputado e — a cereja do bolo — num analfabeto, num poste e num dublê de mau militar e parlamentar medíocre para presidir este país. É graças a essa caterva (falo da récua de muares munidos de título eleitoral) que a eleição de outubro próximo tem tudo para ser uma reedição piorada do pleito plebiscitário de 2018.

Situações surreais como essas não são exclusividade nacional. Nos EUA, Donald Trump venceu Hillary Clinton em 2016 (apesar de a candidata democrata ter obtido mais votos) e uma corja de vândalos invadiu o Capitólio, quatro anos depois, para protestar contra a derrota de seu ídolo. Questionado sobre a situação no leste europeu, Trump afirmou que Putin não teria invadido a Ucrânia se ele ainda estivesse na Casa Branca. Como se costuma dizer, presunção e água benta, cada um toma a que quer.

Sobre Vladimir Putin, o buraco é ainda mais embaixo. Três dias após a invasão da Ucrânia, Diogo Mainardi escreveu em sua coluna que o carniceiro russo já havia sido derrotado. Que havia perdido o rublo, a Copa do Mundo, o ouro do Banco Central, as estantes Ikea, o primeiro bailarino do Bolshoi, os cintos da Gucci, a sucursal do New York Times, as villas no lago de Como, o Facebook, os parlamentares de direita e esquerda na Europa e nos Estados Unidos, o centroavante Lukaku. Até as empresas que tentaram resistir ao boicote, como Pepsi e McDonald’s, tiveram de fechar suas lojas na Rússia, constrangidas por seus consumidores e acionistas. E isso tudo em apenas duas semanas. Até o Brasil, que faz parte de outro sistema solar, condenou déspota. 

Uma pesquisa divulgada dias atrás mostrou que, enquanto Bolsonaro e Lula abanavam o rabo para o tirano eslavo, o povo brasileiro queria mais era mijar no seu túmulo. O problema é que esse сукин сын continuará matando pessoas (inclusive civis) até alguém lhe dar uma dose de seu próprio próprio veneno — um chazinho como aquele que "acalmou ad aeternum" o papa João Paulo I estaria de bom tamanho, e talvez fosse até bom essa moda pegar.

Por aqui, um aumento brutal no preço dos combustíveis foi prontamente repassado por donos de postos (não todos), pouco se importando com o fato de o combustível servido nas bombas ter sido comprado antes do reajuste (isso se chama “crime contra a economia popular”). Esse "reajuste" terá efeitos nefastos na inflação e afetará a população em geral, já que praticamente tudo que é produzido no Brasil é transportado através de nossa esburacada, enlameada e detonada malha rodoviária (salvo raras e honrosas exceções).

Os combustíveis e o gás de cozinha vinham subindo de preço descontroladamente, e não só devido à alta do dólar. O problema, como sempre, é a falta de previsão de um mandatário que só tem olhos para a reeleição, e que prefere participar de motociatas e andar de jet-ski a dar expediente no Palácio do Planalto. E como Lula, que institucionalizou a compra de apoio parlamentar com o Mensalão e sangrou a Petrobrás com o PetrolãoBolsonaro se vale do nefando Orçamento Secreto (cerca de R$ 17 bilhões por ano) para comprar votos das marafonas do Parlamento, e isso enquanto a população mais carente sequer têm o que comer.

Voltando aos combustíveis, “em casa onde falta pão todos gritam e ninguém tem razão”. O que se vê é um jogo de empurra. O capetão culpa o ICMS, os governadores culpam o governo federal, todos culpam a Petrobrás — que distribui bilhões aos acionistas e paga ao general Silva e Lula um salário nababesco (mais de R$ 200 mil) — e ninguém faz nada. Ou, quando faz, faz o que Dilma fez durante sua campanha à reeleição.

Lula insiste na falácia da autossuficiência brasileira em petróleo e atribui a alta dos preços à privatização da BR-Distribuidora, mas, para surpresa de ninguém, ele não menciona que faltam refinarias e que ele e seu espúrio partido foram os responsáveis pela cleptocracia que quase quebrou a Petrobras. Esperar o que de um egun mal despachado, um ex-sindicalista malandro, amante da vida fácil e expert na arte de enganar trouxas

Em 2018, o ainda candidato Bolsonaro disse que o preço dos combustíveis já havia ultrapassado todos os limites — mas, uma vez eleito e empossado, não se preocupou em criar o tal fundo de estabilização no início de sua execrável gestão. Mesmo assim, o ministro Paulo Guedes alardeava que o botijão de gás deveria custar cerca de R$ 30 — e já tem gente pagando R$ 150. O que nem um nem o outro disseram é que somente um governo competente e responsável seria capaz de resolver esse e um sem-número de outros problemas. 

Observação: O PL 1.472/2021, em trâmite no Senado, prevê a criação de um fundo de equilíbrio para controlar a volatilidade do preço dos derivados de petróleo. A ideia é utilizar recursos da União (dividendos que a Petrobras paga ao governo federal) como uma espécie de “colchão", visando manter o preços estáveis — ou, no mínimo, reduzir o percentual de aumento  em situações adversas como a atual.

Ao trágico governo em curso restam nove meses, e a nós, decidir entre suportar mais 4 anos de incompetência chapada ou amargar a volta da ladroagem institucionalizada. Não que não exista corrupção nem corruptos no mar de lama que se tornou a Praça dos Três Poderes. Essa falastrice não passa de mera cantilena para dormitar bovinos e já não convence sequer nem mesmo os poucos fãs do “mito” com Q.I. superior ao de um repolho. Na última quarta-feira a Transparência Internacional Brasil apresentou um relatório à OCDE denunciando retrocessos no combate à corrupção, e mencionou, dentre outros descalabros, os R$17 bi (do tal Orçamento Secreto) que o governo federal usou para comprar deputados.

A alta dos combustíveis propiciou mais uma troca de farpas entre os presidenciáveis. Enquanto os bolsonaristas comemoraram a mudança do cálculo do ICMS, o ex-presidiário de Curitiba tuitou: “Agora você tem empresas importando gasolina dos Estados Unidos em dólar enquanto temos auto suficiência (sic) e produzimos petróleo em reais". 

Observação: O ICMS (que é um imposto estadual) terá a alíquota unificada em todo o Brasil e incidirá nos combustíveis apenas uma vez. O pacote aprovado no Senado também incluiu a isenção do PIS e da Cofins (que são tributos federais) sobre o diesel e o gás de cozinha até o final do ano. Na prática, as duas medidas juntas representarão uma redução de R$ 0,60 por litro de diesel. Governadores já anunciaram que vão questionar judicialmente o projeto, alegando queda na arrecadação. Com a mudança, o governo pode evitar, pelo menos por enquanto, a criação de um programa de subsídio direto da a gasolina, algo que o Posto Ipiranga de fancaria quer deixar de lado e disse que só será considerado se a se a guerra no leste europeu continuar por mais "30, 60 dias". Enquanto isso, Bolsonaro voltou a atacar a política de preços da Petrobras (sim, de novo) e chamou o reajuste de ontem de “absurdo”.

Sobre o tuíte do ex-presidiário, o pré-candidato pelo Partido Novo, Felipe D'Ávila, escreveu: "um tweet, quatro mentiras". Sergio Moro também tuitou: "Sabe por que a Petrobras ainda existe, Lula? Porque a Lava-Jato impediu que o governo do PT continuasse saqueando e desviando recursos da maior estatal do Brasil". E Ciro Gomes: "Enquanto isso todos brasileiros sofrem, mesmo vivendo num país que tem uma das maiores reservas de petróleo do mundo, e vendo concessionárias da Petrobras vendidas a preço de banana. Até quando vamos suportar este absurdo?".

Do alto de sua inesgotável sabedora, o vereador Carlos Bolsonaro comemorou a decisão do desgoverno do pai, alegando que a mudança (no cálculo do ICMS) fará com que “o povo pague mais barato" e criticou governadores que não querem abrir mão da arrecadação em ano eleitoral.

Para não encompridar ainda mais este texto, falo sobre o palhaço que se tornou presidente no post de amanhã.

sexta-feira, 17 de janeiro de 2025

PONTOS A PONDERAR...

DE PENSAR MORREU UM BURRO.

Quem leu O Príncipe sabe que o bem deve ser feito aos poucos e mal, de uma só vez. Mas a récua de muares que atende por "eleitorado" certamente não leu, e repete a cada dois anos o que Pandora fez uma única vez.
 
Churchill ensinou que a democracia é a pior forma de governo, exceto por todas as outras já tentadas, mas ressaltou que o melhor argumento contra ela é uma conversa de cinco minutos com um eleitor mediano. Se tivesse conhecido o eleitor brasileiro, o estadista britânico certamente reduziria esse tempo para 30 segundos.

CONTINUA DEPOIS DA POLÍTICA

Em entrevista publicada pelo The New York Times, Bolsonaro disse que estava tão animado com o convite do Trump que nem ia mais tomar Viagra. Mas tomou na tarraqueta: horas depois, alegando que em diversas ocasiões o indiciado manifestou-se favoravelmente à fuga de condenados no caso do 8 de janeiro e admitiu em entrevista a UOL a hipótese de ele próprio "evadir-se e solicitar asilo político para evitar eventual responsabilização penal no Brasil", Moraes indeferiu o pedido de liberação de seu passaporte
O ministro anotou ainda que Zero Três, intermediário do convite da família Trump ao pai, também endossou a defesa da fuga de condenados. Na véspera, a PGR havia se manifestado contra a ida do capetão à posse de seu ídolo, sustentando que a viagem serve ao "interesse privado" do ex-presidente, em contraposição ao "interesse público", que "se opõe à saída do requerente do país". A defesa de Bolsonaro recorreu, mas Moraes manteve sua decisão
A manifestação de Gonet e as decisões de Xandão são prenúncios do que vem pela frente na excursão do refugo da escória da humanidade pelos nove círculos do inferno. Em outras palavras, o que o PGR e o supremo togado disseram foi que não convém fornecer material para a fuga de um ex-presidente da República que frequenta o inquérito do golpe como uma condenação criminal esperando na fila par acontecer. Nesse entretempoBolsonaro escalou Celso Vilardi, um dos criminalistas mais experientes do país, reforçar o time de defensores do indefensável.
 
Em momentos distintos da ditadura, Pelé Figueiredo alertaram para o risco de misturar brasileiros e urnas em eleições presidenciais. Ambos foram muito criticados, mas como contestá-los se lutamos tanto pelo direito de votar para Presidente e elegemos gente como Lula, Dilma, Bolsonaro?
 
Não se sabe como o Brasil estaria hoje se golpe de Estado de 1889 não acontecesse, Ou se a renúncia de Jânio Quadros não levasse ao golpe de 64 e subsequentes 21 anos de ditadura militar. Ou se Tancredo Neves não fosse internado horas antes de tomar posse e batesse as botas 38 dias e 7 cirurgias depois, levando para a sepultura a esperança de milhões de brasileiros e deixando de herança um neto que envergonharia o país e um vice que promoveu a anarquia econômica e administrativa que levou à vitória de um pseudo caçador de marajás sobre um desempregado que deu certo na eleição solteira de 1989.
 
Usamos o tempo verbal "futuro do pretérito" (chamado de "condicional" até 1959) para falar de eventos cuja concretização depende de uma condição ou para fazer pedidos de forma educada. Embora usemos as palavras "pretérito" e "passado" de forma intercambiável no dia a dia, elas possuem nuances diferentes. Assim, o futuro do pretérito é um futuro que poderia ter acontecido, mas não aconteceu porque estava condicionado a algo que não se concretizou. 
 
No imaginário nacional, Tancredo foi o melhor de todos os presidentes, já que, a exemplo da Viúva Porcina no folhetim Roque Santeiro, "foi sem nunca ter sido" — mutatis mutandis, é como nos discursos fúnebres, onde virtudes que o falecido nunca teve são exaltadas. Conta-se que um padre recém-ordenado assumiu sua paróquia um dia antes da morte do prefeito, que era corrupto, rabugento e malquisto pelos locais. Sem elementos para embasar a homília fúnebre, o batina exortou os presentes a relembrar as qualidades do "nosso querido alcaide". Como ninguém se manifestou, a viúva, constrangida, ponderou: "O pai dele era ainda pior."
 
Muita coisa podia dar errado no capítulo final da novela da ditadura. Em 1984, numa conversa com Henry Kissinger, o ainda presidente João Figueiredo confidenciou que uma parte das Forças Armadas apoiava a volta do governo civil e a outra parte estava disposta a tudo para evitar que "os esquerdistas tomassem o país". Figueiredo considerava Tancredo uma pessoa capaz e moderada, mas cercada e apoiada por muitos radicais de esquerda que talvez não conseguisse controlar. 
 
Como estaríamos hoje se Tancredo tivesse presidido o Brasil? The answer, my friends, is blowing in the wind. De 15 de janeiro de 1985 — quando a raposa mineira derrotou o turco lalau, que era apoiado pelos militares, por 480 a 180 votos de um Colégio Eleitoral composto por deputados federais, senadores e delegados das Assembleias Legislativas dos Estados — até 14 de março, quando baixou ao hospital, ecoaram rumores de que os militares não deixariam o presidente eleito tomar posse, e os boatos ganharam força depois o general Newton Cruz revelou que, a três meses da votação, Maluf o havia procurado para propor um golpe 
 
Alguns conspirólogos alardearam que Tancredo havia sido baleado enquanto assistia a uma missa na Catedral de Brasília (faltou luz durante a cerimônia, e alguns presentes disseram ter ouvido um tiro), outros, que ele havia sido envenenado por militares apoiados pela CIA (por uma estranha coincidência, seu mordomo morreu dias depois, vítima de complicações gastrointestinais). A alteração da causa mortis de "infecção generalizada" para "síndrome da resposta inflamatória sistêmica" deixou muita gente com a pulga atrás da orelha — lembrando que alguns anos antes o papa João Paulo I, com apenas 33 dias de pontificado, foi encontrado morto em seus aposentos (após tomar uma mui suspeita xícara de chá0.
 
Observação: No livro "In God's Name", David Yallop popularizou a tese de envenenamento, mas as evidências em que ele se escorou não foram confirmadas pelas investigações, que apontaram "infarto fulminante" como causa mortis. Outras teorias sugerem que o assassinato foi orquestrado por grupos maçônicos ou resultou de uma conspiração envolvendo cardeais que se opunham a suas ideias e às reformas que ele pretendia implementar no Banco do Vaticano. A falta de autópsia e de uma investigação transparente alimentou as teorias conspiratórias, mas a maioria delas se baseia em especulações, rumores e testemunhos duvidosos.
 
A posse de Sarney ecoou como a "gargalhada do diabo" nos estertores da ditadura — que só terminou três anos depois, com a promulgação da Constituição Cidadã, que distribuiu diretos a rodo sem apontar de onde viriam os recursos para bancá-los (e que foi remendada mais de uma centena de vezes em 136 anos, enquanto a constituição norte-americana, que tem apenas 7 artigos, recebeu 27 emendas em 237 anos).
 
Observação: A palavra "direito" é mencionada 76 vezes na Carta, enquanto "dever" aparece apenas quatro e "produtividade" e "eficiência". duas e uma vez, respectivamente. O que esperar de um país que tem 76 direitos, 4 deveres, 2 produtividades e 1 eficiência? Na melhor das hipóteses, uma política pública de produção de leis, regras e regulamentos que quase nunca guardam relação com o mundo real.
 
O último dos 5 generais-presidentes da ditadura — que dizia preferir o cheiro dos cavalos ao cheiro do povo e que daria um tiro no coco se fosse criança e seu pai ganhasse salário-mínimo — se recusou a transferir a faixa para Sarney (faixa a gente transfere para presidente, não para vice, e esse é um impostor), lembrando que o obelisco da política de cabresto nordestina trocou a ARENA pelo MDB para integrar a chapa de oposição.

Sarney nem imaginava o tamanho da encrenca que seria assumir a presidência sem ter indicado os ministros nem participado da elaboração do plano de governo, mas herdado dos militares uma inflação de 220% a.a. Durante sua aziaga gestão, ele enfrentou mais de 12 mil greves e foi vítima de pelo menos um atentado. Em março de 1990, além da faixa presidencial, ele entregou a Collor uma superinflação de 1.800% a.a. e mudou seu domicílio eleitoral do Maranhão para o recém-criado estado do Amapá, onde conseguiu se eleger senador. Em 2014, aos 83 anos, deixou a vida pública para se dedicar à literatura em tempo integral — conta-se que um belo dia a governadora Roseana Sarney telefonou para informar que um dilúvio havia deixado metade do Maranhão debaixo d’água, e ouviu do pai a singela pergunta: "Sua metade ou a minha?
 
Tancredo, Ulysses e Covas lideraram a campanha pelas "Diretas Já", que reuniu mais de 1 milhão de pessoas no Anhangabaú em 1984. O movimento fracassou, mas o político mineiro foi escolhido pelo Colégio Eleitoral. Se ele, e não Sarney, tivesse presidido o Brasil de abril de 1985 a março de 1990, talvez a estabilidade econômica alcançada em 1994 com o Plano Real (conquista que Lula 3 vem tentando reverter) tivesse chegado mais cedo, livrando-nos dos nefastos planos Cruzado, Bresser, Verão e Collor.

Talvez Collor não se elegesse presidente e Lula assistisse à visita de Obama ao Brasil pela TV — sem à oposição ao "Rei-Sol", é possível que xamã da petralhada continuasse como deputado federal (cargo para o qual ele foi eleito em 1986) ou se aboletasse no Senado. Sem Collor, sem Zélia nem sequestro dos ativos financeiros e o congelamento da poupança, que derrubou quase à metade a venda de imóveis residenciais. 
Sem essas medidas heterodoxas e a sucessão de planos econômicos escorados no congelamento de preços e salários, a redução da miséria brasileira poderia ter começado muito antes, e hoje mais gente teria casa para morar.

Nada garante que seria assim, mas poderia ter sido. Só que não foi. 

Triste Brasil.

terça-feira, 7 de maio de 2019

A PÁTRIA AMADA E O DIABO ATRÁS DA IGREJA




O Brasil é dirigido por um bando de maluco” (sic), afirmou Lula em recente entrevista a dois veículos de comunicação “cumpanhêros”. “Pelo menos não é um bando de cachaceiros, né?”, replicou Bolsonaro, que em seguida emendou: “Olha eu acho que o Lula, primeiro, não deveria falar. Falou besteira. Maluco? Quem era o time dele? Grande parte está preso ou está sendo processado. Tinha um plano de poder onde, nos finalmentes, nos roubaria a nossa liberdade, ok? Eu acho um equívoco, um erro da Justiça ter dado direito a dar uma entrevista. Presidiário tem que cumprir sua pena”. O capitão já disse muita bobagem nestes cento e poucos dias de governo, mas esse comentário o redimiu, como esclarecer uma plateia eivada de esquerdopatas que “Lula está preso, babacas!” fez subir no meu conceito o político sobralense Cid Gomes, irmão candidato derrotado Ciro Gomes, que é “cearense” de Pindamonhangaba (para quem não percebeu minha ironia, Pindamonhangaba é um munício paulista).

Já que o nome do criminoso mais emblemático desta banânia veio à baila, o togado supremo Ricardo Lewandowski, sempre disposto a prestar vassalagem àquele que o nomeou para o ápice da carreira, foi quem autorizou o petralha a dar entrevista aos jornais FOLHA DE S.PAULO e EL PAÍS. Também foi ele, segundo José Nêumanne,  que tornou presencial o julgamento de um habeas corpus impetrado em favor de seu ex-patrão, depois que a 5ª Turma do STJ reduziu sua pena de 12 anos e 1 mês para 8 anos, 10 meses e 20 dias. Outras fontes apontam Gilmar Mendes como mentor intelectual de mais essa maracutaia perversa, mas isso é de somenos: o que importa mesmo é o objetivo, qual seja aumentar as chances de o recurso de Lula ser acolhido, já que no plenário virtual a rejeição era quase certa. Aliás, outro pedido similar, protocolado por 29 advogados piauienses sem qualquer relação com a defesa de Lula, foi negado na última sexta-feira pelo ministro Edson Fachin. Não custa lembrar que o nordeste é tradicionalmente pró-Lula e que o Piauí ocupa o terceiro lugar no ranking dos estados mais miseráveis deste país, atrás somente do Maranhão (feudo do clã Sarney) e de Alagoas (feudo dos Collor de Mello e dos Calheiros). 

Falando nas peculiaridades do cenário político tupiniquim, VEJA desta semana dá conta de que toda quarta-feira às 8 horas o plenário da Câmara dos Deputados se converte em igreja. O culto de 27 de março, por exemplo, começou com aleluias e glórias ao senhor, enquanto a deputada e cantora gospel capixaba Lauriete Rodrigues, ex-mulher do ex-senador Magno Malta, puxava o louvor com seu violão. Na sequência, o deputado e pastor pernambucano Francisco Eurico da Silva, capelão da bancada evangélica, fez a pregação do dia, antes de ter início a votação para a escolha do novo líder da Frente Parlamentar Evangélica, composta hoje de 120 deputados ativos — um recorde desde a sua fundação, em 2002, e maior, muito maior, do que qualquer partido político no Congresso Nacional. Ainda segundo a reportagem, não há nem nunca houve votação para o posto de líder da frente religiosa: após discussões por vezes ásperas, o deputado amazonense Silas Câmara foi sagrado por aclamação. A despeito de diferenças e divisões na frente, a unidade de ação da bancada, nesta legislatura, vem amparada por uma convicção renovada na força política que o eleitorado evangélico demonstrou ao sustentar a eleição de Jair Bolsonaro — que vem dando repetidas mostras de alinhamento com o setor — dias atrás, ele matou no nascedouro a ideia de um novo imposto que incidiria também sobre as igrejas.

Cortejados pelos mais diversos partidos, os evangélicos têm ambições que não raro transcendem as vantagens tributárias, alvarás de templos e concessões de rádio. Silas Câmara surgiu como um nome de compromisso entre candidatos de ramos rivais da Assembleia de Deus, e foi por isso que ganhou, deixando claro que a lealdade desses deputados não está com caciques políticos, mas com pastores e bispos. Não é de hoje que se nota o interesse desses religiosos pela política partidária. Em meados da década de 1980, ávidos por recursos públicos, barganhas e alianças com candidatos e partidos e governantes, eles participaram dos debates da Assembleia Nacional Constituinte e ajudaram Sarney a ampliar o mandato de quatro para cinco anos em troca de concessões de emissoras e rádio e verbas públicas; no segundo turno das eleições de 1989, apoiaram Collor, e de lá para cá a instrumentalização recíproca entre esses grupos tem se intensificado, como compravam a transformação de templos em comitês eleitorais e a fundação de partidos por igrejas. 

Para quem faltou às aulas de história, vale lembrar que a Igreja foi a instituição mais poderosa da idade Média — quando a riqueza era medida pela quantidade de terras, o Papa e o cardinalato controlavam quase dois terços das terras da Europa ocidental. Seu poder da no mundo medieval é exaltado pelas grandes catedrais construídas nos séculos XII e XIII em várias regiões da Europa, todas ricamente decoradas com ouro maciço e pedras preciosas em profusão. Ainda assim, os batinas falam em caridade e em voto de pobreza, como que escarnecendo dos fiéis, que contribuem para multiplicar a riqueza da organização com o pagamento do dízimo e outros óbolos compulsórios, enquanto quase metade da população mundial vive abaixo da linha de pobreza.

Fechando o foco para nossa republiqueta de bananas, até o fim do Império o catolicismo era a religião oficial do Estado e tutelada por ele, o que limitava sua liberdade de ação. Com a constituição republicana, ela passou a ter um poder imenso. Para a Constituinte de 1934, foi criada a Liga Eleitoral Católica, que elegeu diversos representantes da própria igreja — que, por seu turno, legislaram em causa própria para conseguir uma série de privilégios. Em essência, esse descalabro foi preservado pela malfadada Constituição Cidadã, ainda que com outra formulação. Nas últimas décadas, sobretudo a partir dos anos 1980, o pluralismo religioso passou a vigorar de fato no Brasil, e a Igreja Católica se viu obrigada a competir no mercado religioso. Mas isso é outra conversa.

A lei proíbe as igrejas de dar apoio eleitoral, mas a Universal apoiou Collor para presidente em 1989, Marcelo Crivella e Celso Russomano nas eleições para prefeito do Rio e de Sampa, respectivamente, em 2016, sem falar em um sem-número de candidatos a cargos legislativos. Não é de hoje que ela funciona como comitê, conforme ficou claro nas últimas eleições presidenciais
Pode-se mesmo afirmar que Bolsonaro deve sua vitória mais ao apoio dos evangélicos do que a sua postura antipetista. Declaradamente católico, o capitão é o primeiro presidente eleito com a retórica evangélica pentecostal. Antes dele, houve dois presidentes protestantes — Café Filho (presbiteriano) e Ernesto Geisel (luterano), mas nenhum deles chegou ao poder pelo voto direto e tampouco falava de religião. Bolsonaro há tempos cortejava os evangélicos com gestos de forte simbolismo; em 2016, por exemplo, foi batizado nas águas do Rio Jordão pelo pastor (e presidente nacional do PSC) Everaldo, da Assembleia de Deus. Sendo católico e muito identificado com os evangélicos, o presidente conseguiu unir os dois polos; se fosse só evangélico, talvez não tivesse conseguido tantos votos dos católicos, e vice-versa.

Os evangélicos frequentam mais seus templos do que os fiéis de outras religiões, chegam a doar seis vezes mais do que os católicos em dízimo e costumam buscar orientação de seus líderes para temas cotidianos, aí incluída a política. Esse manancial não passou despercebido pela oposição, mas o o fato é que a esquerda não soube explorá-lo. Gleisi “Crazy” Hoffmann, presidente nacional do PT, no mês passado usou uma linguagem marcadamente religiosa para criticar as propostas de Paulo Guedes ao dizer que a reforma previdenciária era um “pecado” e que Jesus foi crucificado porque “confrontou o templo, um sistema de dominação e exploração dos pobres”, mas suas declarações repercutiram mal entre pentecostais e neopentecostais.

Diz-se que Deus, em sua infinita sabedoria, criou o amor e a fé, e o diabo, invejoso, o casamento e as religiões. Há muito que a exploração da fé se tornou um negócio como outro qualquer. Balzac dizia que “por trás de toda grande fortuna há sempre um crime”, e no Vaticano a coisa parece não ser muito diferente. Basta relembrar a morte súbita de João Paulo I em 1978, 33 dias após ter sido escolhido para ocupar o Trono de Pedro, que vagou com a morte de Paulo VI. Esse episódio foi retratado na parte final da trilogia de “O Poderoso Chefão”, na qual Francis Ford Coppola capturou magistralmente a essência da Máfia Siciliana descrita no imperdível best seller do escritor ítalo americano Mario Gianluigi Puzo

Em tempo: Se você acha que a história do chazinho envenenado não passa de teoria da conspiração, lembre-se: A VERDADE NÃO ESTÁ NEM AÍ PARA O QUE VOCÊ ACREDITA.

sábado, 8 de fevereiro de 2025

SOBRE PAPAS E ESCÂNDALOS (FINAL)

TALVEZ EXISTA UM DEUS, MAS EU DUVIDO QUE SEJA O DEUS QUE MOISÉS DESCREVEU NO VELHO TESTAMENTO E QUE AS RELIGIÕES PERPETUARAM POR INTERESSES ESCUSOS.

Durante o Renascimento, Inocêncio VIII (r. 1484-1492) e Leão X (r. 1513-1521) abusaram de indulgências para financiar seus luxos e campanhas militares, mas o caso mais notório foi o de Rodrigo Bórgia, nomeado cardeal pelo tio Calisto III e eleito papa no conclave de 1492, quando passou a atender por Alexandre VI

Seus filhos Cesare Lucrécia foram a personificação do nepotismo e da corrupção — ele abandonou o cardinalato para se tornar um líder militar implacável (inspirando Maquiavel a escrever O Príncipe), enquanto ela foi usada como peça de barganha nas alianças do clã, mediante conspirações e casamentos políticos. 

Apesar da fama de cruel e manipuladora, Lucrécia era uma administradora habilidosa e mecenas das artes. Seus atributos negativos podem ter sido exagerados por desafetos e pela propaganda anticlerical da época. Como peça fundamental nas alianças políticas dos Bórgia, ela foi casada três vezes, sempre de acordo com os interesses de sua família. Seu primeiro marido, Giovanni Sforza, foi descartado quando deixou de ser útil; o segundo, Alfonso de Aragão, assassinado em circunstâncias suspeitas (supõe-se que a mando de seu irmão, Cesare Bórgia); o terceiro, Alfonso d’Este, garantiu-lhe uma vida mais estável e respeitável. Apesar das acusações de envenenamento e incesto, sua fama de femme fatale parece ter sido mais fruto da lenda do que da realidade.

CONTINUA DEPOIS DA POLÍTICA

Há situações em que virar a página não basta. É preciso arrancá-la. O terceiro mandato de Lula é uma delas, pois prova que eguns mal despachados sempre voltam para nos assombrar. 

Diz um velho ditado que a justiça tarda, mas não falha, No Brasil, ela nem sempre chega, e, quando chega, pode pode mudar de ideia. Foi o que aconteceu com a condenação de Lula, depois que uma epifania revelou ao ministro Fachin, com cinco anos de atraso, que a 13ª Vara Federal de Curitiba não era a vara competente para processar, julgar e condenar o xamã petista. 

Bolsonaro é outro egun mal despachado. Ele fala como se não estivesse inelegível e já fosse candidato à presidência em 2026. Por mal dos nossos pecados, o PL definiu como prioridade a aprovação do Projeto de Lei Complementar 141/2023, que esvazia a Lei da Ficha Limpa e reduz de 8 para 2 anos o período de inelegibilidade dos condenados por abuso de poder político, como é o caso do refugo da escória da humanidade.

Bolsonaro e outros 39 aspirantes a golpistas estão na bica se tornarem réus no STF. Se for condenado pela 1ª turma por abolição do estado democrático de direito, roubo e venda de joias do acervo da União e falsificação de cartões de vacina contra Covid, o ex-mandatário pode ser agraciado com até 28 anos de prisão. 

As chances de votos divergentes seriam maiores no plenário, já que André Mendonça e Nunes Marques devem suas togas ao capetão. Mas o ministro Luís Roberto Barroso, presidente de turno da Corte, deixou claro que o caso só irá a plenário se o relator (Alexandre de Moraes) assim o desejar. 


Liderada por Martinho Lutero em 1517, a revolta protestante resultou na fragmentação do cristianismo ocidental. O Concílio de Trento (1545-1563) tentou reformar a Igreja, mas a estrutura de poder permaneceu intacta. Com a Revolução Francesa (1789) e a unificação da Itália (1870), o poder político dos pontífices foi reduzido, e o fim dos Estados Papais limitou a Igreja às questões espirituais. Mesmo assim, sua influência persistiu, apesar dos escândalos financeiros e de abusos sexuais que abalaram sua credibilidade do Vaticano.
 
Atualmente, a Igreja Católica tende ao conservadorismo, mas sua história de corrupção e ingerência política continua a influenciar o mundo ocidental — com a omissão de Pio XII diante do avanço do nazismo durante a 2ª Guerra Mundial. A renúncia de Bento XVI, em 2013, foi a primeira desde 1415, quando Gregório XII abdicou ao Trono de Pedro o Concílio de Constança. O primeiro papa a abdicar foi Ponciano (r. 230-235), que foi exilado na Sardenha e morreu em decorrência dos maus-tratos impostos pelo imperador Máximo, e o penúltimo foi Gregório XII (r. 1406-1415), que renunciou para pôr fim à crise que levou a Igreja a ter até três papas disputando a autoridade máxima simultaneamente. 
 
Voltando agora à morte de João Paulo I, o Vaticano informou que sua santidade sofreu um ataque cardíaco enquanto dormia, que seu corpo foi encontrado pela manhã pelo bispo irlandês John Magee, seu secretário pessoal, e que a família se opôs à autópsia. Mais adiante, soube-se que quem encontrou o cadáver foi uma das freiras que cuidavam de afazeres domésticos (e que fez voto de silêncio), que o papa morreu no escritório e que o laudo da autópsia não foi divulgado porque acusou envenenamento. Somada ao breve pontificado (33 dias), essa sequencia de contradições, erros e imprecisões deram azo a diversas teorias conspiratórias. 
 
Passados mais de 40 anos, o mafioso Antoni Raimondi, sobrinho de Lucky Luciano, revelou em seu livro de memórias que envenenou o papa a mando do arcebispo norte-americano Paul Marcinkus, seu primo e então presidente do Banco do Vaticano, para evitar que um fraude financeira bilionária viesse a público. Em In God's Name, o escritor britânico David Yallop anota que plano era drogar o chá que o pontífice tomava antes de dormir, entrar em seus aposentos e lhe administrar uma dose letal de cianeto (versão foi dramatizada por Mario Puzzo e Francis Ford Copolla no terceiro capítulo da imperdível trilogia "The Godfather"), e que o Marcinkus se encarregou pessoalmente dessa tarefa.
 
Marcinkus começou sua carreira como secretário de Estado em Roma e presidiu o Banco do Vaticano de 1971 até 1989. Foi investigado por envolvimento com ações falsas avaliadas em mais de 13 milhões de euros, por participação no escândalo do colapso do Banco Ambrosiano e pelo assassinato do banqueiro Roberto Calvi e do jornalista Mino Pecorelli. Mas as investigações não seguiram adiante por falta de provas de provas, e ele morreu aos 84 anos, no Arizona, sem jamais ter sido formalmente acusado. 
 
Ao longo da história, o nepotismo tem sido uma prática tão comum quanto condenável. Desde os tempos antigos, líderes políticos, religiosos e monarcas favoreceram parentes com cargos, títulos e privilégios, frequentemente à revelia da competência ou do interesse público. O termo, aliás, tem raízes na Igreja Católica, onde papas concediam benesses a sobrinhos ("nipoti"), consolidando um sistema que perduraria por séculos. Mais recentemente, o termo "nepobaby" passou a ser usado para aludir a filhos/parentes de pessoas famosas, que prosperam na carreira graças ao vínculo familiar.
 
Os papas transformaram o nepotismo em arte — caso mais notório foi o de Alexandre VI, mas Júlio IIPaulo III e tantos outros seguiram o mesmo roteiro, distribuindo bispados e fortunas a parentes, muitas vezes sem o menor escrúpulo —, mas muitas monarquias seguiram suas pegadas, garantindo que o sangue valesse mais do que a capacidade. No absolutismo francês, a nobreza se perpetuava com privilégios herdados, enquanto o povo arcava com os custos da corte. No Império Otomano, o sistema de sucessão frequentemente envolvia intrigas e assassinatos dentro da própria família real para garantir que o poder ficasse em mãos "seguras".
 
Com a ascensão das democracias, esperava-se que o mérito finalmente superasse os laços de sangue, mas o nepotismo se adaptou, e dinastias familiares continuam garantindo que o poder permaneça entre os seus — como bem sabe quem acompanha a abjeta política tupiniquim. Nos setores privado e público, filhos de empresários e apadrinhados políticos recebem vantagens que não raro os colocam à frente de candidatos mais qualificados. 
Afinal, vícios e velhos hábitos são difíceis de erradicar.