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sexta-feira, 23 de novembro de 2018

AINDA SOBRE LULA E O SÍTIO DE ATIBAIA



Doutora, eu sou dono do sítio ou não?

Quem tem de responder isso é o senhor e eu não estou sendo interrogada.

O Ministério Público não denunciou Lula por ocultação de patrimônio. O ex-presidente sabe disso e insistiu em debater a propriedade do sítio porque tem a tara incurável de achar que sua inteligência só é inferior à imbecilidade que atribui aos demais habitantes do planeta. Ele foi denunciado por ser beneficiário como usuário contumaz do sítio das melhorias feitas lá pela OAS na forma de propina oriunda de contratos com o Poder Público.

A concepção de governo e Estado do populista o leva a considerar-se destinatário natural de favores de empresários. A mistura perversa entre público e privado não é exclusividade de Lula, claro; em maior ou menor grau, ela coloniza a alma de quase todos os nossos políticos; em Lula, a coisa culminou em patologia. Me comove, admito, a figura abatida de alguém nessa idade, mas logo me lembro de que se trata de um bandido cujo abatimento não alcançou a convicção de que é superior à lei; de um bandido que, num abraço completo com as elites que passou a integrar, se fingia de homem do povo. No fim, revelou-se nem elite, nem povo apenas escória.

Deve ser condenado nesse caso do sítio e é pequena a chance de conseguir um habeas corpus. Talvez sua esperança de sair da prisão esteja na eventual mudança do STF quanto à prisão depois de condenação em segunda instância a ser decidida no julgamento das Ações Diretas de Constitucionalidade. O assunto divide o mundo jurídico e não serei eu, que não pertenço a essa enfermaria, que saberei dizer o certo a se fazer. Seguir a Constituição é a única coisa certa a fazer, mas a pobre trintona é referência distante e customizada para a Corte que deveria defendê-la. O que sei é que, depois de receber de FHC o país pronto para continuar as reformas e implementar outras que modernizariam o país, Lula preferiu arcaizá-lo ainda mais para se garantir imperador do Brasil. Na voz de uma jovem juíza, ele foi lembrado qual o lugar do imperador das ruínas de si mesmo.

Com Augusto Nunes/Valentina de Botas

EM TEMPO: Em aditamento ao que eu publiquei ontem sobre o projeto do senador Dalirio Beber, que fragiliza a Lei da Ficha-Limpa, o parlamentar catarinense voltou atrás: “Decido, então, portanto, retirar o PLS 396/2017. Certo que jamais quis criar tamanha celeuma nem tampouco causar constrangimento aos meus pares. Não havendo o desejo desta Casa, da sociedade e, especialmente, da população do estado de Santa Catarina na apreciação desta matéria, peço o apoio dos nobres colegas para que retiremos essa proposta.” Menos mal.

segunda-feira, 24 de setembro de 2018

O PT E OS OUTROS




PT continua, não se sabe até onde. O PSDB acabou de desembarcar

O Brasil está dividido entre o PT e os demais partidos. Desde 1989, quando Lula foi para o segundo turno na primeira eleição direta pós-ditadura, o PT consegue ser majoritário na captação dos votos da esquerda. Foi assim nas duas eleições seguintes, quando Lula perdeu no primeiro turno para Fernando Henrique Cardoso mas chegou em segundo lugar, e depois nas quatro que o PT ganhou. O Brasil é PT ou não é. Nos últimos 16 anos tem sido.

No começo, quando perdia eleições, o PT ainda não havia conseguido pintar sua imagem como a do partido da inclusão social, era apenas de esquerda. Na primeira eleição, este papel coube ao caçador de marajás, e nas outras duas foi cumprido pelo criador do Real. Somente depois de Collor e FHC, o PT conseguiria somar ao seu eleitorado de esquerda aqueles que queriam e os que precisavam de um Brasil mais justo.

O PSDB, que havia conduzido com sucesso um dos mais importantes programas de distribuição de renda do mundo, não conseguiu capitalizar o Plano Real e deixou-se transformar, aos olhos dos eleitores, num partido da elite branca. Cometeu muitos erros — como o da polêmica emenda da reeleição —, que contribuíram para que a sigla que construiu a estabilidade da economia acabasse com a imagem de partido paulista.

O “nós contra eles” não foi uma invenção de Lula, existe desde a primeira eleição presidencial. O que Lula fez foi dar uma coloração de classe ao termo. O “nós” são os pobres e as minorias, e o “eles” são os ricos. Discurso simples para um eleitor majoritariamente simples. Discurso que funciona.

Embora não seja o único, claro que o PT é um partido preocupado com os mais pobres. O programa Bolsa Família foi o mais inclusivo da história do país, e o PT soube se valer dele politicamente.

Os demais partidos de esquerda viraram satélites. O PSDB, que depois de FHC perdeu quatro vezes para Lula, conseguiu atrair alguns partidos de centro, não todos. O maior deles, o MDB, ficou com o PT nas duas últimas eleições. Outros partidos de centro e de direita transitaram entre PSDB e PT ao longo dos últimos 16 anos. O PT foi mais competente. Apesar dessa miscigenação ideológica, os militantes orgânicos só enxergam o espectro de esquerda, e os eleitores não militantes só veem Luiz Inácio Lula da Silva quando miram o PT.

A campanha deste ano, ao que tudo indica agora, seguirá o mesmo roteiro, com a diferença que o PSDB perdeu seu protagonismo para Jair Bolsonaro. Dois episódios fundamentais da campanha ajudaram a impulsionar o capitão e o petista indicado por Lula. Bolsonaro foi esfaqueado enquanto era carregado nos ombros por eleitores, e Haddad recebeu a bênção de um ex-presidente preso que reconstruiu sua imagem de corrupto em mártir, injustiçado e perseguido.
É isso o que temos e com isso precisamos nos habituar. Resta saber se a habilidade política do PT será suficiente para ganhar a eleição no segundo turno. É verdade que a subida de Haddad nas pesquisas só ocorreu agora porque antes o candidato era Lula. Tem que se levar isso sempre em conta, mas é fato também que nunca, desde 2002, o PT esteve tão mal nesta fase da campanha. A corrupção ainda pode cobrar sua conta.

Nos quatro pleitos que ganhou, Lula e Dilma lideravam a corrida a esta altura da campanha. Em 2002, na pesquisa Ibope de 17 de setembro, Lula tinha 48% das intenções de voto. Em 2006, no dia 16 de setembro, Lula alcançava 42%. Na eleição de 2010, Dilma tinha 51% da preferência em 17 de setembro. Na sua reeleição, no dia 16 de setembro de 2014, a liderança de Dilma era mais apertada, com 36%, mas ainda assim quase o dobro do que Haddad tem agora.

O PT provou amplamente sua competência, tem seus principais líderes condenados e presos por corrupção, inclusive Lula, mas segue vivo na campanha. O PSDB, por sua vez, comprovou sua fama de incompetente político. Perdeu para Lula quando ele estava nas cordas do mensalão. Perdeu de Dilma quando seus sinais de fadiga já eram evidentes. E agora perde seu lugar na disputa para um novato em eleições presidenciais. E talvez perca também sua hegemonia paulista.

O PT continua, não se sabe até onde. O PSDB acabou de desembarcar.

Texto de Ascânio Seleme

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domingo, 23 de setembro de 2018

ELEIÇÕES 2018 - O ABRAÇO DOS AFOGADOS




Para concluir o raciocínio que eu vinha desenvolvendo nas últimas postagens:

A exatos 14 dias do primeiro turno, o que se tem é uma “quase certeza” de que Jair Messias Bolsonaro está escalado para o segundo tempo, mas não se sabe se o jogo será contra Ciro, Haddad, Alckmin ou Marina.

Em tese, o tucano seria o adversário mais provável, mas na prática a teoria é outra. Tanto assim que FHC sugeriu uma união entre os partidos de centro em torno de Alckmin, para evitar uma vitória de Bolsonaro ou de Haddad. Mas foi em vão: ao contrário do que o grão-mestre do tucanato esperava (ou imaginava, ou achava que haveria uma chance, por menor que fosse), ninguém se mostrou minimamente interessado em abdicar da própria candidatura para apoiar a campanha moribunda de um candidato que foi derrotado por Lula em 2006 e a quem sobra vontade, mas faltam atitude, firmeza e competitividade.

No sábado 22, o ex-presidente usou o Twitter para dizer que sua carta foi direcionada “aos eleitores e eleitoras, não aos candidatos ou aos partidos”, e que há meses defende a criação do que chama de centro popular e progressista. “Anda há tempo para deter a marcha da insensatez; como nas Diretas-já, não é o partidarismo, nem muito menos o personalismo, que devolverá rumo ao desenvolvimento social e econômico”, ponderou o tucano dos tucanos — que, aos 87 anos, deveria vestir seu pijama de bolinhas e assistir às patacoadas de seu contemporâneo Sílvio Santos, que só continua à frente do programa homônimo porque é o dono da emissora.

Ciro, terceiro colocado nas pesquisas, disse ser mais fácil “boi voar de costas” do que o chamado centro se unir no primeiro turno. “O FHC não percebe que ele já passou. A minha sugestão para ele, que ele merece, é que troque aquele pijama de bolinhas que está meio estranho por um pijama de estrelinhas”. Marina afirmou que o PSDB passa pelos mesmos problemas do PT e que “fazer um discurso para que haja uma união e dizer que o figurino cabe no candidato do seu partido talvez não seja a melhor forma de falar em nome do Brasil”.

Devido à teimosia de Alckmin, os tucanos perderam a oportunidade de ter um candidato com postura mais combativa, como João Doria, ou mesmo Tasso Jereissati. Aécio, que teve mais de 51 milhões de votos em 2014 (quando perdeu para Dilma por uma diferença de míseros 3,28%), teria sido a escolha natural, mas se tornou personae non grata com a delação de Joesley Batista.

ObservaçãoÉ curioso que um heptarréu condenado e preso fosse campeão absoluto de intenções de voto até a farsa da sua candidatura ser desmontada pelo TSE, enquanto Aécio, que se tornou réu por corrupção passiva e obstrução da justiça em abril deste ano e sequer foi cassado (embora devesse tê-lo sido, mas isso já é outra conversa) se tornou personae no grata a tal ponto que resolveu desistir de disputar a reeleição para concorrer a uma vaga de deputado federal. Quando mais não seja, isso é a prova provada de como funciona a cabeça da militância petista (se é que petista tem cabeça).

Fato é que a famigerada propaganda eleitoral obrigatória vem sendo veiculada desde o início deste mês sem surtir o efeito esperado por Alckmin. Por ser o candidato com maior tempo de exposição no rádio e na TV, o tucano foi considerado o presidenciável mais vivo de 2018, mas revelou-se um vivo tão morto que o eleitorado cativo do PSDB lhe enviou coroas de flores, migrando maciçamente para Bolsonaro. E o grão-mestre do tucanato, com sua carta da última quinta-feira, como que jogou a derradeira pá de terra sobre o esquife do correligionário.

“Ante a dramaticidade do quadro atual”, ponderou FHC, “ou se busca a coesão política, com coragem para falar o que já se sabe e a sensatez para juntar os mais capazes para evitar que o barco naufrague, ou o remendo eleitoral da escolha de um salvador da Pátria ou de um demagogo, mesmo que bem intencionado, nos levará ao aprofundamento da crise econômica, social e política.” 

Na visão de Josias de Souza, tudo faria muito sentido não fosse um singelo detalhe: a raiva do eleitor. Em 2018, os caciques continuam fazendo política com os pés no mundo da Lua. Promovem os mesmos cambalachos de sempre. Em órbita, não se deram conta de que uma parcela considerável da população já não parece disposta a fazer o papel de gado. De repente, a grama da enfermaria do Einstein e da cadeia de Curitiba pareceram mais verdes.

Até o momento, as pesquisas apontam Bolsonaro como franco-favorito, mesmo sem ele ter participado de qualquer ato de campanha desde o dia 7 e de seu tempo na TV mal dar para um piscar de olhos. Paralelamente, o pau-mandado de Lula, que até recentemente não passava de um ilustre desconhecido, já domina as intenções de voto no nordeste. Mas aqui vale lembrar que as características culturais e socioeconômicas do povo nordestino dão mais peso à TV do que às redes sociais, sem falar que o dublê de pai dos pobres e criminoso condenado é tão cultuado por lá quanto o padim Ciço. Enfim, a cada minuto nasce um otário neste mundo, e os que nascem no Brasil vêm com título eleitoral e estrelinha do PT enfiada no rabo.  

Segundo O Globo, a campanha de ataques vai se acirrar na reta final, e a julgar pelo que se viu até aqui o capitão gancho pode sobreviver a novas críticas, embora os tucanos insistam em dizer que ele apenas está capitalizando o voto antipetista. A Alckmin resta concentrar seu poder de fogo contra Bolsonaro e Haddad e rezar para ganhar uns votos e roubar outros. 

Mas esse nunca foi o estilo do picolé de chuchu. E cães velhos não aprendem truques novos.

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segunda-feira, 14 de maio de 2018

SOBRE O STF, GILMAR MENDES, PAULO PRETO, MDB E PSDB



A combinação de um Executivo mambembe com um Legislativo corrupto e corporativista transformou o Judiciário numa tábua de salvação para os esperançosos mais obstinados (este país não tem remédio, só não vê quem não quer). Prova disso é o fato de o povão reconhecer a fuça dos 11 ministros do STF mais facilmente que a dos 11 titulares da seleção brasileira, a despeito de estarmos às vésperas da Copa do Mundo na Rússia.

Felizmente para a senhora de pedra que guarda a entrada do prédio do STF em Brasília ― esculpida por Alfredo Ceschiatti (1918 – 1989) ―, a grossa venda que lhe cobre os olhos também lhe tapa as orelhas, poupando-a de ver e ouvir os conflitos ruidosos que não raro se deflagram nas dependências da Corte, e de corar de vergonha diante da atual composição daquele Tribunal ― talvez a pior desde que foi criado, em 28 de fevereiro de 1891, para substituir o Supremo Tribunal de Justiça do Império.

Dos onze ministros atuais, três são paulistas: Celso de Mello, indicado por Sarney, Dias Toffoli, pelo criminoso Lula, e Alexandre de Moraes, por Michel Temer. Os fluminenses Marco Aurélio Mello, Luiz Fux e Luís Roberto Barroso foram promovidos durante o governo da anta sacripanta, à exemplo da gaúcha Rosa Weber e do gaúcho-paranaense Edson Fachin. Ricardo Lewandowski, nascido no rio, mas criado em São Paulo, e a mineira Cármen Lúcia assumiram o cargo na gestão do sevandija de Garanhuns, e o mato-grossense Gilmar Mendes é herança do governo FHC.

Observação: O então presidente e hoje presidiário Lula chegou a nomear oito ministros, e a ex-presidente e presidiária-to-be Dilma, cinco, devido em parte às aposentadorias precoces de Francisco Rezek, Nelson Jobim, Ellen Gracie e Joaquim Barbosa ― um surto de debandadas que respingou desprestígio na mais alta corte do país, em princípio propiciadora do ápice do mais honroso posto de uma carreira jurídica (leia mais sobre as “virtudes” de alguns ministros da Corte nesta e nesta postagem).

Depois de proferir o voto que formou maioria no julgamento virtual do recurso que buscava libertar Lula da cadeia, concluído pela 2ª Turma do STF no último dia 10, Gilmar Mendes, com a avidez de um alcoólatra afastado da garrafa por dias a fio, deu vazão a seus instintos laxantes mandando soltar Paulo Preto, que estava preso desde 6 de abril em razão das suspeitas de desvios nas obras do Rodoanel Sul, Jacu Pêssego e Nova Marginal Tietê, realizadas nos governos dos tucanos José Serra, Alberto Goldman e Geraldo Alckmin. A defesa de Paulo Preto recorreu ao TRF-3 e ao STJ, mas não logrou êxito em soltá-lo. No Supremo, no entanto, Gilmar Mendes concedeu o habeas corpus por entender que é "patente o constrangimento ilegal", e que "a justificação processual da prisão preventiva não encontra amparo em fatos". 

Observação: Preto é amigo de Aloysio Nunes Ferreira há mais de 25 anos e foi durante pelo menos uma década o homem forte do tucanato. De engraxate em seus mais verdes anos, ele se tornou assessor especial da Presidência da República e, mais adiante, diretor da Dersa. Seu patrimônio deu um prodigioso salto de R$ 113 milhões (depositados em 4 contas na Suíça, segundo a promotoria daquele país).

Apontado como operador do dinheiro ilícito que irrigou as campanhas de candidatos do PSDB em 2006 e 2010, Preto vinha se queixando de desamparo. Enviou para fora do xadrez recados que soaram como o canto do carcará ― aquela ave que pega, mata e come. Foi como se quisesse renovar um aviso que emitira em 2010, quando tucanos “ingratos” fingiam que não o conheciam: “Não se deixa um líder ferido na estrada a troco de nada.”

Quem conhece Paulo Preto acredita que, se mantido preso, Paulo Preto não hesitaria em negociar um acordo de colaboração e, para valorizar sua delação, concentraria seu poder de fogo em Geraldo Alckmin ― ex-governador de São Paulo, candidato à presidência em 2006 (quando foi derrotado por Lula) e pré-candidato nas próximas eleições (quando será derrotado por si mesmo e pelo seu estúpido partido). Se o alvará de soltura expedido por Mendes revela alguma coisa, é que o operador do tucanato pode estar ferido, mas não foi largado à beira da estrada.

Solto, Preto tende a prender a língua. A hipótese de se tornar um delator continua viva no jogo, mas acaba de se tornar uma carta embaralhada. Sua delação poderia produzir efeitos deletérios na candidatura de Alckmin, que já não entusiasmava o eleitorado antes de ser investigado na Justiça Eleitoral por suspeitas de caixa-dois ― segundo as pesquisas, o tucano tem entre 5 e 7 por cento das intenções de voto).

Michel Temer, que é unha e carne com Gilmar Mendes, aventou a possibilidade de se candidatar à reeleição, certamente movido pela esperança de manter o foro privilegiado e adiar indefinidamente o julgamento dos processos oriundos das denúncias apresentadas por Janot, que foram bloqueadas pela Câmara até o final do mandato presidencial. No entanto, sua prodigiosa impopularidade e seus pífios 5% de intenções de voto levaram-no a considerar uma aliança com o ex-governador de São Paulo. Essa união renderia mais prejuízo do que lucro a Alckmin, mas traria uma montanha de minutos no horário eleitoral obrigatório. Por outro lado, alguns a veem como um “abraço de afogados” ― segundo a revista Veja, um dirigente tucano que pediu anonimato ponderou que “de nada adianta ter um tempo gigantesco na TV e só fruta podre para vender”.

Observação: A desistência de concorrer à reeleição não foi exatamente uma opção de Michel Temer, que, crivado de acusações de corrupção e reprovado por sete em cada dez brasileiros, não teria chance sequer de passar para o segundo turno. Falando no presidente, semana passada, durante uma palestra na Escola Superior de Propaganda e Marketing em São Paulo, ele tentou explicar por que, embora o desemprego tenha diminuído, o desemprego aumentou. A plateia saiu de lá com uma certeza: ninguém convive impunemente por tanto tempo com Dilma Rousseff.

Do lado do MDB, de seus 27 diretórios estaduais, 20 são contrários à aliança nacional com os tucanos ― o que deve levar Temer a tratar com menos desapreço a candidatura do ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles, que trocou o PSD pelo MDB para disputar o Planalto. Mas o fato é que, a cinco meses da eleição, é impossível arriscar um palpite sobre o que vai acontecer. O PSDB, finalmente na mira da Lava-Jato, quer um aliado limpo, o que, em tese, excluiria Temer ou outro nome de destaque do MDB, já que o partido como um todo está imerso até os beiços no atoleiro da corrupção. Já os emedebistas querem um candidato viável que aceite defender o legado de Temer. Juntos ou separados, ambos buscam pela mercadoria que lhes é mais cara no feirão da política: o voto dos eleitores.

Voltaremos a conversar (com mais vagar) sobre Gilmar Mendes, talvez já na próxima postagem.

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terça-feira, 24 de abril de 2018

A LAVA-JATO CHEGA AO TUCANATO ― 2ª PARTE




Tucano que honra a plumagem fica nas matas, não em cima de muro. O PSDB, que já foi o principal partido de oposição aos governos corruptos de Lula e Dilma, tornou-se tão inútil quanto um copo d’água para um afogado. 

O verbete “consenso” não consta do vernáculo dos tucanos, que tiveram seu momento de glória ao eleger presidente Fernando Henrique Cardoso, mas deixaram a esquerda criar asas. Indecisos a mais não poder, eles são capazes de mijar no corredor se a casa tiver mais de um banheiro. Depois de perderem a presidência para Lula, acharam que poderiam recuperá-la em 2010 ― e teriam conseguido se não se tornassem um cemitério de egos que brigam entre si como treinamento para lutar contra os verdadeiros adversários. 

Com a derrota de Aécio em 2014, o partido entrou em parafuso. Sua crise intramuros se aprofundou a tal ponto que ora atinge o estado de São Paulo, maior colégio eleitoral do país e tradicional reduto do tucanato. Em 2006, quando deixou o governo para disputar a presidência, Alckmin tinha com 66% de aprovação, mas foi derrotado por Lula. Agora, com apenas 36% de aprovação, a coisa tende a ficar pior devido ao tsunami da Lava-Jato.

Aécio Neves, ex-presidente da sigla e investigado em 9 inquéritos, tornou-se réu pela primeira vez na última terça-feira 17 (detalhes na postagem anterior). Também na semana passada, Paulo Preto, operador financeiro dos tucanos, teve a prisão preventiva mantida pelo STJ ― ele é suspeito de envolvimento em desvio de dinheiro público nas obras do Rodoanel, cujas investigações atingem também o senador José Serra ― outro tucano de alta plumagem e ex-presidenciável que caiu em desgraça ― e o chanceler Aloysio Nunes Ferreira ― apontado como o tucano mais íntimo de Paulo Preto. Nos próximos dias, a Justiça analisará o derradeiro recurso de Eduardo Azeredo ― que, como Aécio, também foi presidente do PSDB e governador de Minas Gerais ―, e o resultado poderá colocá-lo atrás das grades pela condenação no escândalo que ficou conhecido como “mensalão tucano”.

Alckmin, candidato natural do PSDB à presidência, quase perdeu a vez para João Doria ― seu afilhado político e ex-prefeito de Sampa, que desagradou os paulistanos por ter descumprido a promessa de cumprir integralmente o mandato ao se lançar candidato a governador (detalhes nesta postagem). Sucessor de Aécio na presidência do partido, o ex-governador paulista, ungido oficialmente candidato a presidente, não decola nas pesquisas: seus míseros 6% de intenções de voto representam o pior resultado obtido por um candidato tucano desde 1989.

Alckmin comemorou a notícia de que o inquérito que o investiga pelo recebimento de mais de R$ 10 milhões via caixa 2 da Odebrecht foi enviado à Justiça Eleitoral, mas o alívio durou pouco: na sexta-feira 20, o MP-SP abriu um inquérito civil para investigá-lo por suspeita de improbidade administrativa. Três delatores da empreiteira acusam Alckmin de ter recebido propina através de seu cunhado, Adhemar César Ribeiro, com a finalidade de custear suas campanhas ao governo de São Paulo em 2010 e 2014.

Alckmin diz que “vê a investigação de natureza civil com tranquilidade, que está à disposição para prestar quaisquer esclarecimentos e que tem total consciência da correção dos seus atos” ― nada muito diferente do que a gente ouve de todos os políticos investigados, denunciados e processados pela Lava-Jato e suas derivações, e que merece tanto crédito quanto conversa de camelô paraguaio. Com a movimentação do MP-SP, as acusações contra ele voltarão a ser apuradas para além da esfera eleitoral, onde as penas são baixas e os crimes são considerados de mais difícil punição. Respondendo por improbidade administrativa, ficará sujeito a sanções administrativas, como a reparação dos danos ao Erário e perda dos direitos políticos.

São múltiplas as causas da derrocada do PSDB no cenário político-partidário. Dentre outras, destaco sua demora em aderir à defesa do impeachment contra Dilma ― com a queda da anta vermelha, o partido permitiu que sua agenda reformista fosse capturada pelo governo de Michel Temer, mas nada fez para influenciar esse governo pouco confiável, sem grandeza e sem projeto. Isso refletiu na composição ministerial, gerou turbulências e explodiu com as delações da JBS, levando o Planalto a se sujeitar aos interesses escusos do Congresso e a se preocupar em esvaziar a Lava-Jato e recompor oligarquias e práticas clientelistas, trocando a grande política pela pequena política.

Mesmo diante de tantos revezes, os tucanos tiveram bom desempenho nas eleições de 2016, quando passaram a governar 24% da população tupiniquim ― marca recorde desde 2000. Mas seria esperar demais que esse cenário positivo não se revertesse com as denúncias da Lava-Jato, as divisões internas da sigla, a oposição pífia aos petistas e a pusilanimidade na hora de decidir se desembarcavam ou não do atual governo quando o vampiro do Jaburu foi flagrado com as calças na mão e manchas de batom na cueca pelas gravações de Joesley Batista.

Mesmo com a imagem seriamente comprometida pelo afastamento judicial de Aécio Neves ― cuja pose de bom moço enganou meio mundo, inclusive este que vos escreve ―, a cúpula do PSDB não teve colhões para lhe cassar o mandato. Agora, a transformação do senador mineiro em réu pelo STF pode ser vista como um divisor de águas: assim como a prisão de Lula reforçou a jurisprudência sobre a possibilidade de cumprimento da pena após a condenação em segunda instância, o recebimento da denúncia contra Aécio confirmou o entendimento, iniciado no mensalão, de que não é preciso um ato “de ofício” para que se configure crime de corrupção passiva, e de que as provas obtidas através da delação da JBS continuam valendo, ainda que o acordo de colaboração e os benefícios concedidos aos delatores tenham sido suspensos.

Observação: A exigência do ato de ofício livrou o rabo de Collor em dezembro de 1994, quando, por 5 votos a 3, o STF o absolveu do crime de corrupção passiva por não haver provas concretas que o ligassem ao esquema de arrecadação ilegal de PC Farias (que posteriormente foi encontrado morto em circunstâncias que nunca ficaram bem explicadas). Esse entendimento começou a mudar em 2012, e agora pode complicar a vida de Michel Temer ― que já teve duas denúncias barradas pela Câmara ―, pois será possível atribuir-lhe “ato de ofício em potencial” por ter indicado a Joesley seu assessor Rodrigo Rocha Loures como interlocutor para tratar dos interesses da J&F em processos do CADE.   

O PSDB deu as costas para a opinião pública e perdeu a oportunidade de resgatar sua imagem de alternativa lógica para quem não suporta mais corruptos como os do PT e do PMDB. Agora é tarde, e não adianta chorar sobre o leite derramado.

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segunda-feira, 23 de abril de 2018

A LAVA-JATO CHEGA AO TUCANATO ― AÉCIO E COMPANHIA, TREMEI!



A diferença entre o “mortadela” e o “coxinha” é que o primeiro quer ver o criminoso Lula na presidência, e o segundo quer ver o “criminoso Aécio na cadeia.

Observação: Lula é réu em 7 ações e já foi condenado a 12 anos e 1 mês de prisãoAécio se tornou réu pela primeira vez na semana passada. Se o tucano é culpado dos crimes que lhe são imputados, a Justiça é que vai decidir, daí porque eu escrevi “criminoso” Aécio entre aspas. Mas volto a lembrar que não simpatizo com partido algum, acho que lugar de político corrupto é na cadeia e que todos devem pagar por seus crimes, não importa a sigla, a ideologia, o credo religioso, a marca da gravata ou do relógio.

Acho curioso as pesquisas apontarem que 84% dos brasileiros são a favor da Lava-Jato (e, por extensão, contra a corrupção) e, ao mesmo tempo, que 37% dos pesquisados se dizem propensos a votar em Lula. Faça as contas. Demais disso, por que diabos continuam incluindo o demiurgo de Garanhuns na lista de "presidenciáveis" se ele está preso, é ficha-suja e não poderá disputar as eleições?

Depois de ter sido engaiolado, Lula caiu 6 pontos porcentuais nas pesquisas. No melhor cenário, há 31% de idiotas dispostos a votar nele. Não é pouco se considerarmos que Bolsonaro e Marina estão empatado tecnicamente com 17% e 15%, Alckmin não sai dos 6% e Joaquim Barbosa ― que não é oficialmente candidato ― tem 10%. Mas essas pesquisas, além de não serem 100% confiáveis (basta ver o que aconteceu nas eleições municipais de Sampa em 2016), retratam o momento em que foram realizadas; se, como diz a Band News, em 20 minutos tudo pode mudar, imagine quanta água vai rolar até outubro.

Joaquim Barbosa ficou conhecido no julgamento do mensalão e tem tudo para chegar ao segundo turno, sobretudo porque sua imagem é associada ao combate à corrupção. Ele pode granjear votos tanto dos órfãos de Lula que não votariam no PT de jeito nenhum quando dos que não se identificam com Bolsonaro. O problema é que ele não é uma unanimidade (nem mesmo dentro do PSB), e ainda está arriscado a perder o bonde se continuar nessa cruel indecisão ― o que favoreceria Marina Silva, a eterna sonhática, ou o próprio Alckmin, o eterno picolé de chuchu. Ciro Gomes (que Deus nos livre e guarde de mais essa desgraça) também tem potencial, mas seu temperamento explosivo não ajuda. Sem Lula no páreo, ele teria melhores chances se conquistasse o apoio dos demais partidos de esquerda, mas o PCdoB quer Manuela D’Ávila, e o PSOL, Guilherme-sem-terra- Boulos.

É provável que o cenário fosse outro se Aécio Neves não estivesse mergulhado até os beiços em suspeitas de corrupção. Depois de quase vencer a anta vermelha em 2014 ― e eu ainda acho que ele perdeu devido a um número significativo de urnas eletrônicas com opinião própria e tendências esquerdistas ―, a pergunta não era se o tucano seria presidente, mas quando. Agora, feito réu no STF, ele terá que se dar por feliz se conseguir uma vaga de deputado federal (isso se não for preso antes do pleito). Aliás, para o atual presidente nacional do PSDB, Aécio deveria desistir de qualquer pretensão eleitoral, fosse à reeleição ao Senado, fosse para deputado.

A poucos meses do pleito mais imprevisível das últimas 3 décadas, a desgraça que se abateu sobre Aécio desgraçou também o partido dos tucanos (não que a sigla precisasse de ajuda para se trumbicar, como se pode inferir das considerações que eu expendi nesta postagem). Investigado em 9 inquéritos, o mineirinho safo se tornou réu por decisão unânime da 1ª Turma do STF, que aceitou a denúncia da PGR por corrupção passiva e obstrução de Justiça.

ObservaçãoAécio foi gravado pedindo R$ 2 milhões a Joesley Batista, dono da JBS. O valor foi entregue em parcelas a pessoas próximas ao senador, sendo que a PF chegou a filmar a entrega de dinheiro vivo a seu primo Frederico Pacheco ― que é corréu no processo, juntamente com a irmã do tucano, Andrea Neves da Cunha, e Mendherson Souza Lima, ex-assessor do também senador tucano Zezé Perrella.

Aécio pode vir a ser processado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso de Furnas; por gestão fraudulenta, falsidade ideológica, corrupção passiva e lavagem de dinheiro na CPI dos Correios, por pedir R$ 6 milhões em propina à Odebrecht nas eleições de 2014; por corrupção passiva e ativa e lavagem de dinheiro também no pleito de 2014; por receber propina para beneficiar a Odebrecht no leilão das usinas de Santo Antonio e Jirau; por armar um cartel nas obras da sede do governo de Minas para obter propina; e por receber propina entre 2014 e 2016 da JBS, além de atuar para ocultar a origem do dinheiro.

Mas não é só. O açougueiro bilionário disse à PGR que pagou R$ 50 mil por mês ao tucano, ao longo de dois anos, por meio de uma rádio da qual o senador era sócio (o dinheiro para “custeio mensal das despesas do senador”, segundo o dono da JBS). Pela soma das notas fiscais, o total chegou a R$ 864 mil. Reportagem da Folha de 13 de março revelou que Aécio vendeu suas cotas da rádio Arco Íris para Andrea Neves, sua irmã, por R$ 6,6 milhões em setembro de 2016. Nas declarações de Imposto de Renda do tucano, obtidas pela PGR mediante quebra de sigilo autorizada pelo Supremo, o valor declarado das mesmas cotas em 2014 e 2015 foi de R$ 700 mil. Com essa negociata, o patrimônio declarado de Aécio chegou a R$ 8 milhões em 2016.

Resumo da ópera: Como bem pontuou Roberto Pompeu de Toledo, o avô Tancredo Neves não conseguiu assumir a presidência em 1985 e, pela razão que se sabe, não teve oportunidade de tentar novamente. O neto Aécio obteve 51 milhões de votos em 2014, o que lhe daria uma segunda chance em condições vantajosas, mas dissipou-a nos descaminhos, pontilhados de um trambique aqui, outro acolá, que os políticos vão percorrendo em paralelo à carreira, conforme prova a Lava-Jato.

Como este post já está longo demais, vou deixar Alckmin para uma próxima oportunidade.

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quinta-feira, 19 de abril de 2018

AÉCIO E CIA. RÉUS NO SUPREMO E O JULGAMENTO DO HC DE MALUF E RESPECTIVOS DESDOBRAMENTOS



Na última terça-feira, a 1.ª Turma do STF aceitou por unanimidade a denúncia por corrupção passiva contra o senador Aécio Neves, sua irmã, seu primo e um ex-assessor do também senador tucano Zezé Perrella. A acusação por obstrução da Justiça, que envolvia apenas Aécio, foi acolhida por 4 votos a 1, vencido o ministro Alexandre de Moraes. Foram negados os pedidos da defesa para levar o caso ao plenário e para declarar nulas as provas da delação da JBS.

Aécio foi o primeiro membro do alto tucanato a se tornar réu por corrupção no STF, embora não tenha sido o primeiro presidente nacional do partido ― nem o primeiro ex-governador de MG ― a ser processado criminalmente (o outro é Eduardo Azeredo, egresso do mensalão, que já foi condenado em primeira e segunda instâncias). Aliás, nenhum político com foro privilegiado, réu em processo oriundo da Lava-Jato e suas derivações, foi julgado pelo Supremo até agora. Eduardo Cunha está preso desde outubro de 2016 porque foi cassado, perdeu o direito ao foro especial e foi condenado por Moro e pelo TRF-4. O senador Renan Calheiros também é réu no Supremo, só que por peculato e num processo que não faz parte da Lava-Jato. Os casos que estão mais adiantados na são os de Gleisi Hoffmann e Nelson Meurer, cujos julgamentos dependem somente da liberação pelo revisor, ministro Celso de Mello.

Aécio teve o mandato suspenso por duas vezes. Em maio de 2017, o ministro Fachin indeferiu o pedido de prisão contra ele, mas determinou seu afastamento do cargo de senador (mais adiante, por não ter ligação direta com a Lava-Jato, o processo foi redistribuído para o ministro Marco Aurélio). Em setembro do mesmo ano, Janot pediu novamente a prisão do tucano, alegando que ele poderia usar o cargo para atrapalhar as investigações. A 1.ª Turma tornou a afastá-lo cargo e determinou seu recolhimento noturno, o que resultou num imbróglio danado. Finalmente, no dia 17 do mês seguinte, a Corte reconheceu a competência do Senado, que logo devolveu o mandato ao parlamentar (com o voto decisivo foi da ministra Cármen Lúcia, que, visivelmente constrangida, decidiu a favor do mineirinho safo para evitar o agravamento da crise entre o Legislativo e o Judiciário).

A abertura da ação penal contra Aécio se deu logo depois de Lula ter começado a cumprir pena e de Geraldo Alckmin passar a ser investigado por crime de caixa dois. O fato de o destino do ex-governador de São Paulo e candidato do PSDB à presidência estar nas mãos da Justiça Eleitoral é visto pelo PT e seus satélites como evidência de seletividade, mas se essa caterva insiste em dizer que o molusco foi condenado sem provas e que ele e mais ninguém será o candidato do partido para disputar a presidência nas próximas eleições... O que esperar de gente assim?

Aécio por pouco não venceu Dilma na disputa presidencial de 2014, mas seu capital político se esvaneceu, e agora lhe resta disputar uma das duas vagas ao Senado por Minas Gerais. Talvez consiga se eleger, porque o nível do nosso eleitorado é o que se sabe, mas não há dúvidas de que o PSDB ficou chamuscado, sobretudo porque não afastou Aécio quando deveria tê-lo feito, e, pior, se empenhou em lhe restituir o cargo assim que o Supremo determinou que a decisão caberia ao Senado. Agora, dizer que a Lava-Jato e o Judiciário são seletivos, que focam apenas em Lula e nos políticos do PT, isso é uma falácia que não tem tamanho. Mas, volto a dizer, o que esperar de gente que acha que Lula foi preso injustamente, que foi condenado sem provas, que existe um complô contra ele, pobrezinho, para impedir que volte ao Palácio do Planalto?

Sobre o julgamento do habeas corpus de Maluf, voltarei ao assunto oportunamente (estou escrevendo este texto antes da sessão no STF ter começado), mas saliento que esse debate tem como pano de fundo o cabimento (ou não) de embargos infringentes nas decisões das turmas e a possibilidade de um ministro reformar, no todo ou em parte, a decisão de outro ministro, como fez Dias Toffoli ao conceder prisão domiciliar a Maluf, desautorizando seu colega Edson Fachin.

Observação: De acordo com a súmula 606 do STF, “não cabe habeas corpus originário para o tribunal pleno de decisão de turma, ou do plenário, proferida em habeas corpus ou no respectivo recurso”. À luz desse entendimento, quando um ministro decide, ele está “falando pelo Supremo”, e a reversão de sua decisão por outro ministro cria um juízo de censura e causa constrangimento. Fachin entendeu que o recurso da defesa não poderia ter vindo na forma de HC, mas sim como recurso ordinário ― que a defesa do turco preferiu evitar, porque tem tramitação mais lenta e poderia cair novamente nas mãos do próprio Fachin, que já havia determinado a execução da pena antes que os tais embargos infringentes (cujo cabimento também é questionável) fosse apreciados.

A depender do que ficar decidido, pode-se abrir um novo flanco para a defesa de réus no Supremo. Em outras palavras, se o plenário considerar admissível que um ministro, em habeas corpus, contrarie uma decisão monocrática de outro ministro, os advogados poderão colocar em prática tal estratégia para soltar clientes cujos recursos ainda não se esgotaram na Justiça. E isso certamente seria explorado pela defesa de certo ex-presidente criminoso: não por acaso, desde que o tema foi pautado, pipocaram especulações sobre possíveis benefícios a Lula, que, como todos sabem, está preso na sede da PF em Curitiba desde o último dia 7.
   
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quinta-feira, 15 de março de 2018

FERNANDO HENRIQUE REDESCOBRE UM LULA QUE NUNCA EXISTIU


O Lula que o ex-presidente Fernando Henrique deu para elogiar de uns tempos para cá é um homem imaginário. Até agora ninguém parece ter entendido direito o que ele está querendo dizer com essa súbita descoberta de virtudes no personagem que até outro dia, pelo menos em público, o tratava como o político mais desprezível do Brasil.

Lula, na verdade, passou anos a fio cuspindo em Fernando Henrique. Jamais admitiu que o seu antecessor na presidência da República tivesse tido o menor mérito em nada do que fez durante os oito anos em que esteve no governo. Ao contrário: inventou a mentira de que tinha recebido dele uma “herança maldita”, responsável por tudo que havia de errado no Brasil. Dirigiu-lhe ofensas pesadas. Tratou-o sempre com rancor, despeito e inveja. Mais que tudo, Lula agiu no Palácio do Planalto de maneira oposta às ideias gerais de Fernando Henrique. Agora, sem que se saiba por que, tornou-se um líder político exemplar na opinião do adversário de sempre. Mudou Lula ou mudou FHC?

Lula, com certeza não mudou nada ― ou melhor, mudou para muito pior do que jamais foi em toda a sua carreira. Quem mudou, então, foi FHC. É melancólico. Mas a vida tem dessas coisas ― como mostra tão bem a experiência, o cérebro humano não é necessariamente um lugar coerente.

Na falta de uma explicação capaz de fazer algum nexo, o que se pode imaginar, com base no “Manual de Psicologia Para Amadores”, é que Fernando Henrique está de volta aos seus sonhos de 40 anos atrás. Lembram-se dele? Era, então, o retrato acabado do intelectual de esquerda brasileiro enquanto jovem ― ou, se preferirem, mais ou menos jovem. Trazia na alma e na mente as fantasias clássicas do socialista de Terceiro Mundo, armado de leituras europeias e à procura de um regime que até hoje só existiu na imaginação das salas de aula da universidade: o “socialismo com liberdade”. Ou, então, uma nova “ditadura do proletariado”, que viesse só com proletariado e sem ditadura.

Na São Bernardo do final dos anos 70, FHC e seus pares se deslumbravam com a possibilidade de ver um operário de carne e osso, ou pelo menos um líder sindical, virar uma força política de verdade. Até então, como tantos dos intelectuais brasileiros, talvez nunca tivesse visto um operário ao vivo e a cores. De repente, não só vê, mas descobre que um “homem do povo” como Lula pode crescer num sistema de liberdades, com eleições, direitos individuais, separação de poderes, etc. Bom demais, não é mesmo? Encantada, a classe intelectual da época “pirou”, como se diz.

Depois, na vida real, Fernando Henrique esqueceu por completo a figura da fábula ― ao constatar que Lula, o herói das massas populares que iria fazer a “passagem pacifica para o socialismo”, era apenas uma invenção. Pior do que um simples equívoco, Lula era uma falsificação, como ficou comprovado assim que passou a mandar. Junto com o PT, transformou o seu governo, e o da sucessora que inventou, numa caçamba de lixo a serviço de empreiteiras de obras públicas, fornecedores da Petrobras e outros marginais hoje na cadeia, réus confessos e condenados por corrupção em massa. Onde acabou caindo o líder operário? Foi apenas mais uma quimera desfeita ― só isso.

No percurso entre São Bernardo e a 13ª. Vara Criminal de Curitiba rolou uma vida inteira. Lula e FHC passaram a ser inimigos ― os mais extremados da política brasileira moderna. Agora, aos 87 anos de idade, Fernando Henrique faz um salto espetacular rumo ao passado ― e passa a orar para um herói que nunca existiu, nem na época e muito menos agora. Justamente agora, aliás, Lula está no seu ponto mais baixo ― condenado como ladrão em três instâncias, por nove magistrados diferentes, abandonado pelas “massas” e necessitado de um golpe no Supremo para não acabar na cadeia.

O ex-presidente, ex-sonhador e ex-inimigo migrou para o seu lado do demiurgo criminoso e condenado, é verdade, mas nenhum dos dois parece ter muito a ganhar com isso. Se Lula se livrar da penitenciária, ninguém do PT e da “esquerda”, e muito menos o próprio Lula, vai dizer uma única palavra de agradecimento a FHC. Se não se livrar, o seu apoio não terá servido para coisa nenhuma. Esse mundo é mesmo injusto.

Com J.R. GUZZO.

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terça-feira, 14 de novembro de 2017

AÉCIO E A HISTÓRIA DO NOME AÉCIO


O senador Aécio Neves, afastado por suspeitas de corrupção e reempossado por uma decisão absurda de seus pares, embasada na decisão ainda mais absurda do STF ― obrigado, ministra Cármen Lúcia, por seu estapafúrdio Voto de Minerva ―, foi alvo de críticas e palavras de ordem dos tucanos paulistas, no último domingo, durante a convenção estadual do partido. No plenário e nos corredores da Assembleia Legislativa, militantes gritavam Fora, Aécio!

Se esta Banânia fosse realmente um país civilizado, o conselho de ética do Senado jamais teria... Bom, deixa pra lá... Afinal, o que esperar de um país governado por um presidente duplamente denunciado por corrupção, associação criminosa e obstrução à Justiça; um país que tem como pré-candidato à sucessão presidencial um criminoso condenado e réu em mais 6 ações penais; um país onde a Justiça Eleitoral ignora provas cabais contra uma chapa que abusou do poder econômico para se eleger ― e financiou sua companha com dinheiro roubado ― simplesmente porque o presidente do TSE é amiguinho do presidente da República; um país cuja mais alta é integrada por figuras como Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli?

Voltando a Aécio, o neto de Tancredo ― que a esta altura deve estar se revirando na tumba ―, o professor Dionísio da Silva tece algumas considerações curiosas sobre a origem do nome, como você pode conferir no blog do jornalista Augusto Nunes ou ler no texto transcrito a seguir:

De onde veio este nome tão memorável para um senador que está fazendo tanta coisa feia? Nome é uma das primeiras coisas que não escolhemos na vida, ao lado dos pais que temos, do país em que nascemos e das primeiras escolas que frequentamos.
O nome Aécio começa com “A” porque veio do Latim escrito Aetius, que é dito “Écius”. Se viesse do Latim falado, seria Écio, como tantos outros no Português se chamavam e se chamam.
Aetius é palavra que veio do Grego Aétios para o Latim. Quem tornou este nome muito popular foi o general Aécio (Flavius Aetius, diz-se “Flávius Aécius”, era seu nome em Latim). Ele comandou o exército romano na vitória sobre Átila na segunda metade do século V.
O rei dos hunos, cujo cavalo impedia que a grama crescesse por onde ele passava, estava fazendo mais um arrastão no poderoso império romano e vencendo todas as batalhas. Dalton Trevisan, atento observador de tudo, diz que o cavalo de Átila era uma égua.
Mas não tinha ainda enfrentado Aécio, que, em face de um exército imperial destruído, comandava tropas sem um único soldado regular. O que o general Aécio fez passou à História como grande lição militar e de vida: procurou alianças. Primeiro com chefes militares e depois com aristocratas.
E assim derrotou o temível Átila, rei dos hunos, que assombrava o império romano liderando os povos bárbaros e perpetrando as maiores atrocidades.
A famosa Batalha dos Campos Catalúnicos foi travada no dia 20 de junho do ano 451, em território hoje pertencente à França. Aécio teve piedade com o derrotado e permitiu que ele escapasse. A causa da batalha? Como a de tantas outras, uma ninharia. Mas vamos seguir a famosa recomendação: Cherchez la femme (Procurai a mulher).
Justa Grata Honória, irmã complicada do imperador romano Valenciano III, estava casada desde há alguns anos com um senador chamado Herculano, que, muito ciumento, não a deixava sair de casa para nada. Honória enviou, então, uma mensagem ao rei dos hunos pedindo socorro. Houve problemas de tradução do Latim para o Huno, língua hoje extinta, da qual sobraram poucas palavras, a maioria nomes de pessoas.
Átila entendeu que era uma proposta de casamento. Por isso, exigiu de dote para a noiva a metade dos domínios do imperador romano Valenciano III, que naturalmente recusou. E Átila lançou mais um de suas campanhas contra o já não tão poderoso império romano. Mas, então, se ferrou, como se diz popularmente, cuja variante é obscena e não deve ser aqui registrada.
Átila morreu na noite de núpcias dois anos depois de derrotado por Aécio. Segundo alguns, envenenado por inimigos presentes à festa das bodas. Segundo os historiadores romanos e as sagas lendárias, atravessado pela adaga da noiva, que se chamava Gudrun. Ela ainda tocou fogo no palácio, matando muita gente.
A história diz uma coisa, as narrativas lendárias dizem outras. E Gudrun foi parar na famosa Canção dos Nibelungos, agora com o nome de Kriemhild, que veio para o Português com dupla grafia: Cremilde e Cremilda.
No Germânico, Cremilda é aquela que luta com a cara encoberta. Quer dizer, sem cara dura. Duro é só o elmo que a protege. Assim, poderia dispensar o óleo de peroba.
O antigo Aécio tinha vergonha na cara e ninguém lhe recomendaria óleo de peroba, como prescrevem tantos hoje nas redes sociais ao senador Aécio Neves, derrotado por Dilma Rousseff na eleição presidencial de 2014. “Ele iludiu mais de 50 milhões de brasileiros” e “voltou a escancarar a face escura”, observou o jornalista Augusto Nunes, acrescentando que agora só resta aos tucanos dignos “abandonar o ninho infestado de vigaristas”.

*Deonísio da Silva é diretor do Instituto da Palavra e Professor Titular Visitante da Universidade Estácio de Sá.

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segunda-feira, 13 de novembro de 2017

ELEIÇÕES 2018 ― SANATÓRIO GERAL


O Brasil vire uma era gangrenada, em que as pessoas têm medo de ficar em casa e ser assaltadas por bandidos comuns, e de ir votar para presidente e ser assaltadas pela falta de opções. Uma era em que o presidente ― o primeiro da nossa história a ser denunciado por crime comum no exercício do cargo ― sobrevive graças a tudo que existe de ruim na caixa de ferramentas do poder; em que um deputado acompanha mulheres de chefões do tráfico até o ministro da Justiça para propor a retomada das visitas íntimas; em que uma ministra decorativa (?!) pugna pela mudança da lei de proventos em benefício próprio.

A sociedade assiste, inerte, a todos esses desmandos, mas, embora muitos ladrem nas redes sociais, poucos saem às ruas para morder. E, pior: diante da inexistência de um remédio que dê jeito, já se pensa em amputação ― e, pior ainda: com o risco de a democracia ir de embrulho.

Do mequetrefe seboso e hepta-réu em plena pré-candidatura antecipada e ilegal ao político militar da reserva ― cujo nome do meio é “Messias” ―, nossa falta de opção envolve nomes testados e reprovados ― como o de Marina Silva, da Rede que não pega peixe, e de Geraldo Alckmin, o tucano da asa quebrada. Sem falar nos neófitos Luciano Huck, que promete trocar o ENEM pelo SOLTERANDO; o engenheiro, administrador de empresas, economista, palestrante e fundador do Partido Novo João Amoedo; e ― pasmem! ― o médico Robert Rey, vulgo Dr. Hollywood, que se autodefine como “a última esperança” e, dentre outras bobagens, quer tornar obrigatória a execução do Hino Nacional todas as manhãs, quando todos deverão ficar em pé e colocar a mão direita no lado esquerdo do peito. É ou não um SANATÓRIO GERAL?!

Some-se a isso o fato de nossa mais alta Corte abrigar ministros do quilate de Gilmar Mendes, o divino, e dar a chave galinheiro às raposas. E como se não bastasse, o que parecia ser a luz no fim do túnel é, sabe-se agora, o farol da locomotiva que vem em desabalada carreira: o PSDB, que já foi a nossa esperança de pôr fim à espúria administração lulopetista ― que roubou a mais não poder e, por obra e graça da incompetenta que sucedeu ao bandido, quebrou o país ―, não sabe para que lado se atira. 

Com sua vocação inata para se envolver em processos indecisórios, o partido que ganhou a disputa ao Planalto por duas vezes consecutivas (e no primeiro turno) e ficou em segundo lugar nos quatro pleitos subsequentes tem agora quatro ministros indesejados, um presidente afastado (Aécio), cuja imoral salvação do mandato abriu as portas da impunidade para políticos do país afora, um presidente substituto (Jereissati) que passou de candidato a efetivo a destituído; um postulante ao cargo (Perillo) que clama por elegância e um presidente de honra macróbio (FHC), mas lúcido o bastante para alertar o tucanato do risco de o partido virar linha auxiliar do PMDB. Isso para não mencionar os baixos índices de intenção de voto de três políticos mais do que conhecidos nacionalmente (Serra, Alckmin e o próprio Aécio),  

Vivemos num país de chatos, onde se vai inventando, de cima para baixo, uma sociedade mal-humorada, neurastênica e hostil à liberdade de expressão, que convive mal com a observação dos fatos, a ciência e o raciocínio lógico. Às vésperas do apagar das luzes de 2017, temos um cenário político ainda pior do que o de 2016, cujo fim a gente aguardava ansiosamente, acreditando que tudo seria melhor a partir do ano novo.

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quinta-feira, 9 de novembro de 2017

SOBRE MICHEL TEMER E O QUADRILHÃO DO PMDB

A despeito do que pensam algumas pessoas de visão monocromática, incapazes de distinguir as nuanças que separam o preto do branco no nosso polarizado cenário político, o fato de eu abominar Lula e o PT não significa que sou partidário dos tucanos, nem que o governo Temer ou ― menos ainda ― que estou propenso a votar em Bolsonaro no ano que vem. Como dizia Mário Quintana, “a burrice é invencível”, de modo que não vale a pena perder tempo com as toupeiras vermelhas. Até porque, na minha avaliação, todos os corruptos, independentemente de suas convicções político-partidárias, deveriam ser despojados dos bens que acumularam ilicitamente e devidamente encarcerados, deportados, exilados, esquartejados e jogados num rio apinhado de piranhas, tanto faz, desde que nunca mais a gente ouvisse falar deles (e delas, porque Dilmanta, Graça Foster, Gleisi Hoffmann, Jandira Feghali, Katia Abreu, Vanessa Grazziotin, dentre outras tantas, também ocupam posições de destaque na minha listinha). Dito isso, sigamos adiante.

Michel Temer, que aspirava a entrar para a história como “o cara que recolocou o Brasil nos eixos”, fá-lo-á pela porta dos fundos, como “o primeiro presidente no exercício do mandato a ser denunciado por crime comum”. Mesmo assim, sob a batuta competente da nauseabunda tropa de choque do Planalto, um coro de 251 marafonas da Câmara entoou a marcha fúnebre enquanto a segunda denúncia contra o peemedebista era sepultada, a despeito da caudalosa torrente de indícios de que ele mijou fora do penico.
 
Na verdade, a denúncia contra Temer e seus ministros não “morreu”; apenas ficará em “animação suspensa” ― como os vampiros durante o dia, quando, dizem, se recolhem a seus caixões nos porões do Jaburu, digo, dos castelos da Transilvânia (que agora se chama Romênia, mas enfim...).

Devido ao deplorável foro privilegiado, TemerMoreira Franco e Eliseu Padilha serão julgados sabe lá Deus quando ― certamente não antes de 2019, a não ser que este governo não dure até o apagar das luzes do ano que vem ― afinal, estamos no Brasil, onde até o passado é imprevisível. Os demais integrantes da tal quadrilha do PMDB Eduardo Cunha, Henrique Alves, Geddel Vieira Lima e Rodrigo Rocha Loures, para citar os mais notórios ―, que não têm prerrogativa de foro, devem responder por seus atos mais cedo, já que o ministro Fachin decidiu remeter ao juiz Sérgio Moro a parte da denúncia por associação criminosa que lhes toca (a parte que versa sobre obstrução à investigação de organização criminosa que envolve Joesley Batista e Ricardo Saud ficará com a Justiça Federal em Brasília).

Gostemos ou não, Temer é presidente que temos e que teremos até o final do ano que vem. E como mais vale acender uma vela do que amaldiçoar a escuridão, melhor torcer para que as manobras imorais da tropa de choque palaciana produzam estabilidade política suficiente para que a equipe econômica continue a fazer seu trabalho. Mesmo que a inflação de 3% a.a. seja conversa pra boi dormi ― como bem sabe quem vive no mundo real, frequenta supermercados, restaurantes, postos de combustíveis, e por aí afora (aliás, de junho até agora o preço do gás de cozinha aumentou mais de 50%) ―, é inegável que a situação do país melhorou muito depois que anta incompetenta foi exorcizada e Temer assumiu o comando da nau dos insensatos. Agora, porém, depois que fez o trato com o diabo e se tornou refém dos parlamentares, a coisa ficou mais complicada.

O lado bom dessa história ― se é que existe algum ― é que não faltam novas emoções, pois fatos novos (e estarrecedores) se reproduzem no lamaçal da política como coelho nas campinas. Como salientou o jornalista Augusto Nunes, errou redondamente quem imaginou, nesta virada de outubro para novembro do ano da graça de 2017, que o feriadão de Finados (com a consequente desativação dos três Poderes) lhe permitiria descansar dos absurdos que inundam diariamente o noticiário jornalístico. A folga foi para o espaço a bordo de maluquices de estarrecer até os napoleões-de-hospício. Confira:

Geddel Vieira Lima, que exerce desde a infância o ofício de delinquente, solicitou ao Supremo Tribunal Federal a identificação do autor da denúncia que levou à descoberta dos mais de R$ 51 milhões guardados num prédio em Salvador e as notas que comprovam a existência de suas impressões digitais na dinheirama (só faltou pedir que lhe devolvessem a bufunfa). A ideia do inventor do apartamento com vista para o mar de dinheiro roubado só serviu para confirmar que no faroeste à brasileira o vilão é que persegue o mocinho.

Sérgio Cabral, recordista mundial de ladroagem em extensão, altura e abrangência, foi previsivelmente salvo por Gilmar Mendes da mudança para um presídio atulhado de criminosos que, perto do saqueador do Rio, parecem coroinhas que só furtam o vinho do padre. Continua hospedado no hotel-presídio que lhe oferece, entre outros mimos cinco estrelas, até os serviços de um mordomo. Alex ― esse e o nome do diligente mucamo ― realiza desde a faxina da cela até um serviço diário de chá da tarde. Tamanha elegância não existe nem nas cadeias de Paris.

Numa discurseira em Belo Horizonte, Lula prometeu trazer de volta ao Brasil a democracia que está por aqui desde 1989, responsabilizou Michel Temer pelo que o orador e sua sucessora fizeram, exigiu um tratamento mais carinhoso para a Petrobras que assaltou e jurou que tanto a alma viva mais pura do país quanto a falecida Marisa Letícia não nasceram para roubar ― verbo que conjugaram incessantemente depois da chegada à vida adulta.

Tom Jobim já dizia que o Brasil não é para amadores, mas agora isto aqui está ficando esquisito até para os mais devotados profissionais.

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