Tucano que honra a plumagem fica nas matas, não em cima de
muro. O PSDB, que já foi o principal partido de oposição aos
governos corruptos de Lula e Dilma, tornou-se tão
inútil quanto um copo d’água para um afogado.
O verbete “consenso” não
consta do vernáculo dos tucanos, que tiveram seu momento de glória ao eleger
presidente Fernando Henrique Cardoso,
mas deixaram a esquerda criar asas. Indecisos a mais não poder, eles são capazes de mijar no corredor se a casa tiver mais de um banheiro. Depois de perderem a presidência para Lula,
acharam que poderiam recuperá-la em 2010 ― e teriam conseguido se não se tornassem um cemitério de egos que brigam entre si como treinamento para
lutar contra os verdadeiros adversários.
Com a derrota de Aécio em 2014, o partido entrou em parafuso. Sua crise intramuros se aprofundou a tal ponto que ora atinge o estado de São Paulo, maior colégio eleitoral do país e tradicional reduto do tucanato. Em 2006, quando deixou o governo para disputar a presidência, Alckmin tinha com 66% de aprovação, mas foi derrotado por Lula. Agora, com apenas 36% de aprovação, a coisa tende a ficar pior devido ao tsunami da Lava-Jato.
Aécio Neves,
ex-presidente da sigla e investigado em 9 inquéritos, tornou-se réu pela
primeira vez na última terça-feira 17 (detalhes na postagem anterior). Também
na semana passada, Paulo Preto,
operador financeiro dos tucanos, teve a prisão preventiva mantida pelo STJ ― ele é suspeito de envolvimento em
desvio de dinheiro público nas obras do Rodoanel,
cujas investigações atingem também o senador José Serra ― outro tucano de alta plumagem e ex-presidenciável que
caiu em desgraça ― e o chanceler Aloysio
Nunes Ferreira ― apontado como o tucano mais íntimo de Paulo Preto. Nos próximos dias, a Justiça analisará o derradeiro
recurso de Eduardo Azeredo ― que,
como Aécio, também foi presidente do
PSDB e governador de Minas Gerais ―,
e o resultado poderá colocá-lo atrás das grades pela condenação no escândalo
que ficou conhecido como “mensalão
tucano”.
Alckmin,
candidato natural do PSDB à
presidência, quase perdeu a vez para João
Doria ― seu afilhado político e ex-prefeito de Sampa, que desagradou os paulistanos por ter descumprido a promessa
de cumprir integralmente o mandato ao se lançar candidato a governador
(detalhes nesta postagem). Sucessor de Aécio na presidência do partido, o
ex-governador paulista, ungido oficialmente candidato a presidente, não decola
nas pesquisas: seus míseros 6% de intenções de voto representam o pior
resultado obtido por um candidato tucano desde 1989.
Alckmin comemorou
a notícia de que o inquérito que o investiga pelo recebimento de mais de R$ 10 milhões via caixa 2 da Odebrecht foi enviado à Justiça
Eleitoral, mas o alívio durou pouco: na sexta-feira 20, o MP-SP abriu um inquérito civil para investigá-lo por suspeita de
improbidade administrativa. Três delatores da empreiteira acusam Alckmin de ter recebido propina através
de seu cunhado, Adhemar César Ribeiro,
com a finalidade de custear suas campanhas ao governo de São Paulo em 2010 e
2014.
Alckmin diz que “vê a investigação de natureza civil com
tranquilidade, que está à disposição para prestar quaisquer esclarecimentos e
que tem total consciência da correção dos seus atos” ― nada muito diferente
do que a gente ouve de todos os políticos investigados, denunciados e
processados pela Lava-Jato e suas
derivações, e que merece tanto crédito quanto conversa de camelô paraguaio. Com
a movimentação do MP-SP, as acusações
contra ele voltarão a ser apuradas para além da esfera eleitoral, onde as penas
são baixas e os crimes são considerados de mais difícil punição. Respondendo
por improbidade administrativa, ficará sujeito a sanções administrativas, como
a reparação dos danos ao Erário e perda
dos direitos políticos.
São múltiplas as causas da derrocada do PSDB no cenário político-partidário. Dentre outras, destaco sua
demora em aderir à defesa do impeachment contra Dilma ― com a queda da anta vermelha, o partido permitiu que sua
agenda reformista fosse capturada pelo governo de Michel Temer, mas nada fez para influenciar esse governo pouco
confiável, sem grandeza e sem projeto. Isso refletiu na composição ministerial,
gerou turbulências e explodiu com as delações da JBS, levando o Planalto a se sujeitar aos interesses escusos do
Congresso e a se preocupar em esvaziar a Lava-Jato
e recompor oligarquias e práticas clientelistas, trocando a grande política
pela pequena política.
Mesmo diante de tantos revezes, os tucanos tiveram bom
desempenho nas eleições de 2016, quando passaram a governar 24% da população
tupiniquim ― marca recorde desde 2000. Mas seria esperar demais que esse
cenário positivo não se revertesse com as denúncias da Lava-Jato, as divisões internas da sigla, a oposição pífia aos
petistas e a pusilanimidade na hora de decidir se desembarcavam ou não do atual
governo quando o vampiro do Jaburu
foi flagrado com as calças na mão e manchas de batom na cueca pelas gravações
de Joesley Batista.
Mesmo com a imagem seriamente comprometida pelo afastamento
judicial de Aécio Neves ― cuja pose de bom moço enganou meio mundo,
inclusive este que vos escreve ―, a cúpula do PSDB não teve colhões para lhe cassar o mandato. Agora, a transformação
do senador mineiro em réu pelo STF
pode ser vista como um divisor de águas: assim como a prisão de Lula reforçou a jurisprudência sobre a
possibilidade de cumprimento da pena após a condenação em segunda instância, o
recebimento da denúncia contra Aécio
confirmou o entendimento, iniciado no mensalão, de que não é preciso um ato “de ofício” para que se configure crime de
corrupção passiva, e de que as provas obtidas através da delação da JBS continuam valendo, ainda que o
acordo de colaboração e os benefícios concedidos aos delatores tenham sido
suspensos.
Observação: A exigência do ato de ofício livrou o rabo de Collor
em dezembro de 1994, quando, por 5 votos a 3, o STF o absolveu do crime de corrupção passiva por não haver provas
concretas que o ligassem ao esquema de arrecadação ilegal de PC Farias (que posteriormente foi
encontrado morto em circunstâncias que nunca ficaram bem explicadas). Esse
entendimento começou a mudar em 2012, e agora pode complicar a vida de Michel Temer ― que já teve duas
denúncias barradas pela Câmara ―, pois será possível atribuir-lhe “ato de
ofício em potencial” por ter indicado a Joesley
seu assessor Rodrigo Rocha Loures
como interlocutor para tratar dos interesses da J&F em processos do CADE.
O PSDB deu as
costas para a opinião pública e perdeu a oportunidade de resgatar sua imagem de
alternativa lógica para quem não suporta mais corruptos como os do PT e
do PMDB. Agora é tarde, e não adianta chorar sobre o leite
derramado.
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