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quarta-feira, 5 de junho de 2019

PSL — EM CASA ONDE FALTA PÃO, TODOS GRITAM E NINGUÉM TEM RAZÃO



Em vez de se empenhar em melhorar as relações com o Congresso em prol da aprovação das reformas que, espera-se, tirarão a economia do fundo do poço, o presidente Jair Bolsonaro especula se “não seria a hora de termos um ministro evangélico no STF” (detalhes no post de ontem). Pelo visto, o capitão acha que nossa mais alta Corte carece de pastores, não de magistrados de reputação ilibada e notável saber jurídico.

Ainda que a aprovação da reforma previdenciária sejam favas contadas — o Congresso não vai querer ser culpado de impedir o país de sair do buraco —, falta garantir, na Câmara, 308 votos entre 513 deputados divididos em experientes fisiologistas e novatos despreparados. E em matéria de articulação política o PSL é uma pérola do humor negro.

A inexperiência do deputado goiano de primeiro mandato Major Vitor Hugo se soma à absoluta falta de decoro que lhe autoriza a compartilhar alegremente, em grupos de WhatsApp, conteúdos que melindram seus pares na Câmara. Há pouco mais de um mês, o parlamentar publicou uma charge que associava articulação política a corrupção. O presidente da Câmara considerou a postagem um ataque ao Congresso, e ficou de mal do deputado pesselista — que tentou se explicar, mas Maia encerrou a reunião quando ele ainda estava falando.

Um líder do governo que não consegue dialogar com o presidente da Câmara representa à perfeição o partido do presidente — uma agremiação política sem unidade orgânica que desperdiça energia com questiúnculas e discussões miúdas. Com 54 deputados, quatro senadores e três governadores — dos quais 70% estão em primeiro mandato —, o PSL é um aglomerado de políticos que ganharam projeção por meio do ativismo digital, se elegeram na onda anti-establishment do bolsonarismo e, agora, são reféns das redes sociais que os ajudaram a chegar a Brasília.

Como desgraça pouca é bobagem — nem vou mencionar o laranjal do PSL —, o partido não é desarticulado apenas no Congresso: em São Paulo, Eduardo Bolsonaro, que substituiu o senador Major Olimpio na presidência estadual da sigla, busca preencher as vagas da executiva paulista com aliados. Zero três é o principal fiador de uma possível candidatura do apresentador José Luiz Datena à prefeitura de Sampa, com o deputado-príncipe Luiz Philippe de Orleans e Bragança de vice. O objetivo seria impedir Joice Hasselmann — com quem o filho do capitão já se estranhou publicamente mais de uma vez — de se lançar ao cargo.

Na segunda-feira 20, Eduardo se reuniu por horas com o ex-assessor e hoje deputado estadual Gil Diniz. Na pauta, a situação da deputada Jamaicana Paschoal, eleita para a Assembleia de São Paulo com mais de 2 milhões de votos, que também era cotada para concorrer à prefeitura, mas irritou o núcleo duro do bolsonarismo ao questionar a sanidade mental do presidente e as manifestações do último dia 26 — e chegou mesmo a insinuar que poderia abandonar o partido, mas depois mudou de ideia.

Segundo a revista Veja, a contrariedade de Janaína com os protestos é fácil de explicar. Se fossem um fiasco, Bolsonaro sairá desmoralizado; se fossem um sucesso, afastariam ainda mais os deputados dos partidos tradicionais, que com boa razão não engolem a pauta original da manifestação, voltada contra o STF e o Congresso. Alvo de diversos memes, Rodrigo Maia irritou-se com a hostilidade ao Legislativo contida nas chamadas originais às manifestações, e já antes disso vinha reunindo deputados do Centrão e da oposição em sua casa para discutir formas de o Congresso tomar a frente do governo em pautas econômicas centrais, como a reforma da Previdência e a reforma tributária.

O PSL não foi convidado para esses encontros. Nem poderia. Como convidar 54 deputados que só pensam em si próprios e em suas redes?

terça-feira, 23 de abril de 2019

AINDA SOBRE A PEC DA PREVIDÊNCIA

ATUALIZAÇÃO - 17h30: 

A 5ª Turma do STJ iniciou o julgamento do REsp de Lula pouco depois das 14 h desta terça-feira. O primeiro a votar foi o ministro Felix Fisher, relator do processo, que já havia rejeitado o recurso monocraticamente, mas agora votou favoravelmente à redução da pena para 8 anos 10 meses e 20 dias de prisão, no que foi acompanhado pelos ministros Jorge Mussi e Reynaldo Soares e Marcelo Navarro Ribeiro Dantas
Pelo Código Penal, Lula pode pedir progressão da pena para o regime domiciliar ou semiaberto após cumprir 1/6 da sentença — o que se dará em setembro próximo. Até lá, se a condenação a 12 anos e 11 meses referente ao sítio de Atibaia for ratificada pelo TRF-4 (e é isso que se espera), o pulha continuará preso em regime fechado. 
Demais disso, ora condenado no STJ, o ex-presidente petralha continuará preso, mesmo que o STF mude a jurisprudência sobre a condenação em 2ª instância e decida que o cumprimento provisório da pena seja iniciado após decisão de terceira instância
Lula ganhou na foice, mas perdeu no machado.

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O objetivo precípuo dos parlamentares é a reeleição. É por isso que eles não se arriscam a contrariar o eleitorado para aderir a apelos emocionais do presidente e de seus ministros (a menos que sejam recompensados por recursos políticos que neutralizem esse risco). E mesmo sabendo que 9 de cada 10 eleitores não lembram em quem votaram para deputado ou senador, e menos ainda como seus representantes votaram projetos de lei de interesse popular.

Jair Messias Bolsonaro sabe melhor que ninguém o que move o baixo-clero da Câmara, até porque fez parte dessa seleta confraria por quase 30 anos. Curiosamente, subir a rampa do Planalto o fez esquecer a importância de uma coalizão de partidos para assegurar a aprovação da agenda do governo. Sobretudo as propostas de emenda constitucional, como a previdenciária, que precisam de 60% dos votos para ser aprovadas. E não há governabilidade possível se o presidente contar apenas com os votos de seu partido, que representam apenas 10% da Câmara e menos que isso no Senado.

Em qualquer sistema político multipartidário, a coalizão é essencial, tanto para garantir a coordenação e a coesão necessárias para obter os votos favoráveis, quanto para promover o compartilhamento do poder. Isso implica o uso de “moedas de troca”, particularmente a distribuição de cargos, e não se trata necessariamente de corrupção. Mas o presidente parece prisioneiro de seu discurso de campanha e das declarações de que não cederá ao “toma lá dá cá” das negociações políticas.

Promessas eleitorais podem ser relevantes para a vitória, e essa é uma delas. Mas insistir em mantê-las a ferro e fogo durante toda a gestão é o atalho mais curto para o fracasso. Pelo bem do país — e do próprio mandato —, Bolsonaro precisa construir uma narrativa que convença os eleitores da necessidade de ajustar o discurso à realidade, pois apelar para o patriotismo dos parlamentares é o segundo atalho mais curto para o fiasco deste governo (e do próxima, e do seguinte, pelo menos enquanto o presidencialismo não der lugar ao parlamentarismo como sistema de governo nesta republiqueta de bananas).

Bolsonaro erra quando diz que a melhor reforma da Previdência é aquela que passar no Congresso. Não é. O cenário mudará rapidamente para pior se a desidratação contrariar as expectativas do mercado, evidenciando que não será interrompida a marcha para o calote da dívida, isto é, o crescimento ininterrupto da relação dívida pública. Sem admitir e promover uma coalizão partidária coesa, o capitão pode amargar uma derrota que definirá, para pior, o futuro de seu governo e, por extensão, deste pobre país.

As negociações do governo com o chamado Centrão — grupo informal composto por PP, PR, PRB, DEM e Solidariedade — em busca de votos favoráveis à reforma da Previdência na CCJ da Câmara complicaram bastante. Já havia praticamente um acerto entre esses partidos e o secretário especial da Previdência, Rogério Marinho, para alterar pontos que não comprometessem a economia estimada pela equipe econômica, mas, segundo o Congresso em Foco, supostos cálculos sigilosos que embasaram a elaboração da proposta teria causado revolta entre deputados. Em princípio, havia um acordo sobre quatro pontos que não causam impacto na economia prevista de R$ 1,1 trilhão em dez anos, esperada com a aprovação da PEC. Com as notícias sobre o sigilo, porém, o Centrão voltou a pressionar pela restrição ao abono salarial e a desconstitucionalização, que já havia aceitado discutir apenas na comissão especial.

Atualização: Agora cedo, saiu a notícia de que deputados da oposição querem barrar a votação da admissibilidade da PEC na CCJ, como noticiou a RENOVA, alegando que a razão do sigilo em torno dos detalhes do projeto enviado pela equipe econômica é motivo para travar o avanço da reforma. O presidente da Câmara tranquilizou a tigrada dizendo que eles terão acesso aos dados detalhados que embasam a proposta de reforma. Pelo Twitter (que neste governo parece ser uma espécie de Diário Oficial informal), Rodrigo Maia postou a seguinte mensagem: “A CCJ é uma comissão apenas de admissibilidade. Conversei com o secretário especial de Previdência, Rogério Marinho, e ele vai apresentar nesta quinta-feira os números que embasam a proposta antes da instalação da comissão especial.”

Ainda sobre essa reforma polêmica, mas indispensável, reproduzo um texto impagável do brilhante J.R. Guzzo:

Depois de ouvir ad nauseam toda essa discussão sobre a “reforma da Previdência”, você está achando que ela é “contra os pobres”? Ou acha que é exatamente o contrário? Ou, ainda, não acha nem uma coisa nem outra, até porque não tem mais paciência para continuar ouvindo essa conversa que não acaba mais? Anime-se: o professor gaúcho Fernando Schüler, conferencista e consultor de empresas, tem a solução definitiva para o seu problema.

Se a reforma da previdência fosse contra os pobres, explicou Schüler dias atrás, já teria sido aprovada há muito tempo, e sem a menor dificuldade. Pela mais simples de todas as razões: tudo aquilo que prejudica o pobre diabo que está tentando não morrer de fome, e não tem tempo para fazer “articulação política”, passa como um foguete da NASA pelas duas casas do Congresso deste país. Passa tão depressa, na verdade, e com tanto silêncio, que ninguém nem fica sabendo que passou.

A reforma proposta pelo governo só está encontrando essa resistência desesperada do PT, dos seus satélites e da massa da politicalha safada porque é, justamente, a favor dos pobres e contra os ricos. Cem por cento contra os ricos no caso, algumas dezenas de milhares de funcionários públicos com salário-teto na casa dos R$ 40 mil por mês, sobretudo nas camadas mais altas do Judiciário e do Legislativo. São esses os únicos que vão perder, e vão perder em favor dos que têm menos ou não têm nada.

Não parece possível, humanamente, eliminar de maneira mais clara as dúvidas sobre a reforma da previdência. Alguém já viu, em cerca de 200 anos de existência do Congresso Nacional, alguma coisa a favor de rico dar trabalho para ser aprovada? Ainda há pouco, só para ficar num dos exemplos mais degenerados do estilo de vida dessa gente, deputados e senadores aprovaram o pagamento de 1,7 bilhão de reais para a “campanha eleitoral de 2018” dinheiro vivo, saído diretamente dos seus impostos e entregue diretamente no bolso dos congressistas. São os mesmos, em grande parte, que viraram um bando de tigres para salvar os pobres da reforma.

Poderiam ser mencionados, aí, uns outros 1.000 casos iguais, em benefício exclusivo da manada que tem força para arrancar dinheiro do Erário. No caso da previdência a briga é para conservar os privilégios de ministros, desembargadores, procuradores, auditores, ouvidores, marajás da Câmara dos Deputados, sultões do Senado e toda a turma de magnatas que conseguem ganhar ainda mais que o teto e exigem, ao se aposentar, os mesmos salários que ganham na ativa algo que nenhum outro brasileiro tem.

Não adianta nada, com certeza, apresentar números, fatos e provas materiais que liquidam qualquer dúvida sobre a injustiça rasteira de um sistema que se utiliza da lei para violar o princípio mais elementar das democracias o de que todos os cidadãos são iguais em seus direitos e em seus deveres. A previdência brasileira determina, expressamente, que os cidadãos são desiguais; quem trabalha no setor privado, segundo as regras que se pretende mudar, vale menos que os funcionários do setor público e, portanto, tem de receber aposentadoria menor. Quando se demonstra essa aberração com a aritmética, a esquerda diz que as contas não valem, pois se baseiam em “números ilegais”. Não há, realmente, como continuar uma conversa a partir de um argumento desses e nem há mesmo qualquer utilidade prática em conversar sobre o assunto. Os defensores dos privilégios não estão interessados em discutir número nenhum; estão interessados, apenas, em defender privilégios. Por que raios, então, iriam perder seu tempo se aborrecendo com fatos?

O que existe, no fundo, é uma questão que vai muito além da previdência social. É a guerra enfurecida que se trava no Brasil para manter exatamente como estão todas as desigualdades materiais em favor das castas que mandam no Estado todas as desigualdades, sem exceção, e não apenas a aposentadoria com salário integral. Sua marca registrada é um prodigioso esforço de propaganda para fazer as pessoas acreditarem que o agressor está do lado dos agredidos e que qualquer tentativa séria de defender o pobre é uma monstruosidade que precisa ser queimada em praça pública.

Acabamos de viver, justo agora, um dos grandes momentos na história dessa mentira que faz do Brasil um dos países mais injustos do mundo quando o ministro Paulo Guedes foi à Câmara para explicar, com paciência de monge beneditino e fatos da lógica elementar, a reforma da previdência. O PT fez o possível para impedir o ministro de falar. Ao fim, tentou ganhar pelo insulto. Um deputado de segunda linha faturou seus 15 minutos de fama dizendo que Guedes era “tigrão com “os aposentados”, mas “tchutchuca quando mexe com a turma mais privilegiada do nosso país”.
A grosseria serviu para três coisas. Em primeiro lugar, fez o deputado ouvir que “tchutchuca é a mãe”. Em segundo lugar, levou o ex-presidente Lula a dizer, da cadeia, que estava “orgulhoso” com a agressão mais um sinal, entre tantos, do bem que ele fará pelo Brasil se for solto ou premiado com a prisão domiciliar. Em terceiro lugar, enfim, abriu mais uma avenida-gigante para se dizer quem é quem, mesmo, em matéria de “tchutchuca” com os ricos, parasitas e piratas neste país tchutchuca na vida real, como ela é vivida na crueza do seu dia a dia, e não na conversa de deputado petista. Aí não tem jeito: os fatos, e puramente os fatos, mostram que Lula, guiando o bonde geral da esquerda verde-amarela, foi o maior “tchutchuca” de rico que o Brasil já teve em seus 500 anos de história; ninguém chegou perto dele, e nem de forma tão exposta à luz do sol do meio dia. Pior: o ex-presidente não foi só a grande mãe gentil dos ricos. Foi também a fada protetora dos empreiteiros de obras bandidos, dos empresários escroques e dos variados tipos de ladrão que tanto prosperam em países subdesenvolvidos as criaturas do pântano, como se diz.

O desagradável desta afirmação é que ela tem teores mínimos de opinião; só incomoda, ao contrário, porque sua base é uma lista sem fim de realidades que há muito tempo estão acima de discussão. Vamos lá, então, coisa por coisa. Não há dúvida nenhuma, já que é preciso começar por algum lugar, que o maior corruptor da história do Brasil, o empreiteiro Marcelo Odebrecht, passou de mãos dadas com Lula os oito anos de seu governo noves fora o paraíso que viveu com Dilma Rousseff. Quem diz que Odebrecht é um delinquente em modo extremo não é este artigo; é ele mesmo, que confessou seus crimes, delatou Deus e o mundo e por conta disso está preso até hoje em prisão domiciliar, certo, mas preso. Também não foi o seu filho, nem qualquer cidadão que você conheça, quem conseguiu receber 10 milhões de reais da empreiteira Andrade Gutierrez como investimento numa empresa de vídeo games. Foi o filho de Lula. Os 10 milhões sumiram; a empresa faliu. A Andrade Gutierrez lamenta: o negócio não deu certo, dizem eles, e a gente perdeu todo o dinheiro que deu para o Lulinha. Uma pena, não é? Mas acontece com as melhores empresas do mundo. O empreiteiro Léo Pinheiro, da OAS, réu confesso, delator e hoje presidiário, foi o grande protetor e protegido de quem? De Lula a quem, por sinal, denunciou no fatal triplex do Guarujá. Querem mais? É só chamar o Google.

Em dezesseis anos de Lula e Dilma não se conhece um único caso de rico prejudicado pelo governo — a não ser os produtores rurais roubados pelos movimentos sociais do PT e outras vítimas da criminalidade oficial. Os banqueiros, por exemplo, jamais ganharam tanto dinheiro na história da economia brasileira como durante o reinado da esquerda. Não apenas foram protegidos contra qualquer espécie de concorrência liberdade econômica, no lulismo bancário, só vale na hora de deixar os bancos cobrarem os juros mais altos do mundo. Foram os maiores beneficiários da dívida pública alucinante que Lula e o PT tanto se orgulham de ter criado, pois na sua cabeça isso é sinal de que “o governo está se endividando para ajudar os pobres” quando na verdade faz a população pagar 100 bilhões de dólares por ano em juros que vão para os bolso dos rentistas, a começar pelos banqueiros.

Também não há precedentes de tanta caridade pública para empresários amigos quanto na era Lula-PT. Quem foi mais “tchutchuca” de Eike Batista, Joesley Batista e outros abençoados do BNDES? Quem inventou a Sete Brasil, uma das aberrações mais espantosas jamais criadas pelo capitalismo de compadres do Brasil? Do começo ao fim, foi apenas uma arapuca para vender sondas imaginárias à Petrobras e “ressuscitar a indústria naval brasileira” vigarice de terceira categoria que fez obras e empregos virarem fumaça quando a ladroagem toda veio abaixo.

A esses bem-aventurados da elite brasileira, de quem a esquerda se diz tão horrorizada, mas a quem serve com a devoção de moleque de senzala, juntam-se os ladrões puros e simples. Em que outra ocasião da história política do Brasil o roubo do Tesouro Nacional viveu dias de tanta glória como nos governos de Lula e seus subúrbios? Basta citar um nome para se entender o processo inteiro: Sérgio Cabral. Precisa mais? O homem soma quase 200 anos de prisão, confessou um caminhão de crimes e tornou-se o governador mais ladrão que a humanidade já conheceu. Mas foi um dos grandes heróis de Lula não se esquecerá jamais o mandamento público do ex-presidente, dizendo que votar em Cabral era um dever moral, ético e político. E quem foi o grande inventor de Antônio Palocci? Nada mais típico do que Palocci, transformado por Lula em vice-rei da sua Presidência. O cidadão se apresentava como “trotskista”, ou, tecnicamente, como militante da extrema esquerda. Roubou tanto, segundo suas próprias confissões, que jamais se saberá ao certo o prejuízo que deu. Só o apartamento em que mora em São Paulo, e onde cumpre hoje sua “prisão domiciliar”, vale mais que o patrimônio que 99% dos brasileiros vão obter durante todas as suas vidas. Isso não é ser rico? E se Palocci não é uma criatura de Lula, de quem seria, então?

A verdade é que durante todo o período em que a esquerda mandou no governo o Brasil continuou sendo um dos países de maior concentração de renda em todo o mundo. Em dezesseis anos de lulismo, foi massacrado sem trégua o principal instrumento de melhoria social que pode existir num país a educação pública. Pelos últimos dados do Banco Mundial, a média da população brasileira só vai atingir o mesmo índice de compreensão da matemática existente nos países desenvolvidos daqui a 75 anos. Essa é a boa notícia; em matéria de leitura, vamos precisar de mais 260 anos para chegar lá. É o resultado direto do abandono da educação dos pobres em benefício da educação dos ricos. Por conta dos programas de “democratização” da universidade de Lula e Dilma, o Brasil gasta quatro vezes mais por ano com um aluno da universidade pública, ou cerca de R$ 21 mil, do que com um garoto que está no ensino básico. Queriam o que, com essa divisão do dinheiro público que se gasta na educação?

Em matéria de ação pró-pobre, houve muita propaganda, muito filminho milionário de João Santana mais um réu confesso de corrupção mostrando a clássica família negra feliz-com mesa farta-carrinho na porta-tomando avião-etc., etc., mas essas fantasias quase só existiam na televisão. Dinheiro, que é bom, foi para o bolso dos nababos, dos Marcelos e Eikes e Geddels. Foi para ditadores da África o filho de um deles, por sinal, é um fugitivo da polícia internacional. Foi para obras em Cuba e na Venezuela. Foi para os “prestadores de serviço”, ONGs amigas e artistas da Lei Rouanet. Foi, num país de 200 milhões de habitantes, para os barões mais bem pagos de um funcionalismo público que já soma quase 12 milhões de pessoas entre União, Estados e Municípios 450.000 só nesse Ministério da Educação que produz a catástrofe descrita acima. Para a plebe sobrou o programa oficial de esmolas do Bolsa Família, ideal para perpetuar a miséria, ou pior que isso segundo o Banco Mundial, de novo, 7 milhões de brasileiros caíram abaixo da linha da pobreza apenas de 2014 para 2016. Quem gerou essa desgraça? Não foi o governo da Cochinchina, nem o ministro Paulo Guedes.

A situação fica definitivamente complicada para os pobres quando quem diz que está cuidando deles serve no exército do inimigo aqueles que têm como principal razão de sua existência, talvez a única, defender direitos e princípios que são apenas presentes pagos com o dinheiro de todos.

sexta-feira, 5 de abril de 2019

A PRISÃO EM SEGUNDA INSTÂNCIA, A PEC DA PREVIDÊNCIA E A TCHUTCHUCA DE DIRCEU JÚNIOR



Ontem pela manhã o presidente do STF despautou o julgamento das ADCs que tratam da prisão após condenação em segunda instância. Oficialmente, Toffoli atendeu a um pedido da OAB — que é autora de uma das ações — que disse precisar de mais tempo para analisar o assunto. Nos bastidores, porém, fala-se que o adiamento se deveu, primeiro, ao fato de que Toffoli, quando pautou o julgamento, imaginava que até abril o STJ já teria apreciado o recurso de Lula; segundo, ao receio da ala garantista de que sus colegas punitivistas formassem maioria e mantivessem o entendimento atual (clique aqui para mais detalhes sobre as mudanças na jurisprudência e aqui para ouvir a opinião de Merval Pereira). Vamos ver se agora o STJ se mexe, porque esse indefinição já está enchendo o saco.

O ministro Paulo Guedes foi enxovalhado por um grupelho de esquerdopatas na audiência de quarta-feira na CCJ da Câmara dos Deputados — que, aliás, deveria focar a análise da  constitucionalidade da proposta de reforma previdenciária, já que o mérito será avaliado mais adiante, na Comissão Especial. Mas isso não impediu que os deputados de esquerda — alguns munidos de cartazes com os dizeres PEC da Morte, Pé na Cova e outras bobagens — tumultuassem a sessão de forma grotesca, aproveitando-se do absenteísmo dos parlamentares supostamente alinhados com o governo e que reconhecem a importância — ou a inevitabilidade — da reforma.

Guedes foi literalmente atirado às feras — não vou dizer leões para não ofender o rei dos animais — sem que ninguém o defendesse. Ele engoliu diversos sapos, mas paciência tem limite. Quando o deputado Zeca Dirceu — filho de certo dublê de guerrilheiro de araque, rapinador do Erário e condenado a quase 30 anos de cadeia — o acusou de ser “tigrão” para cortar aposentadorias de trabalhadores e “tchutchuca” para cortar privilégios de ricos e banqueiros do país, Guedes perdeu as estribeiras: "Tchutchuca é a mãe, é a avó, respeita as pessoas. […] Isso é ofensa. Eu respeito quem me respeita. Se você não me respeita, não merece meu respeito."  Ato contínuo, o ministro deixou o recinto, e o presidente da comissão encerrou a sessão (confira no vídeo que encabeça este post).

Dezessete dos 24 deputados que dirigiram perguntas ao ministro ao longo das intermináveis 7 horas de sessão eram da oposição. O centrão e seus satélites não deram um pio, porque ainda não ouviram de Bolsonaro o que o governo tem a lhes oferecer em troca de apoio à reforma. Guedes esfregou na fuça dos adversários os erros e as omissões dos governos de Lula e Dilma. Em outras circunstâncias, bate-bocas como esses serviriam para quebrar a monotonia; no cenário atual, todavia, dada a relevância da reforma em questão, eles são inadmissíveis.

Como bem resumiu Josias de Souza, ficou sobejamente demonstrado que do mato do PT já não sai coelho, saem cobras, lagartos e Zeca Dirceu. Quando falam, os petistas dão a impressão de que procuram ideias desesperadamente, como cachorros que esconderam ossos e esqueceram a localização do esconderijo. O PT não aprendeu a lição das urnas de 2018. Empenhada em desqualificar o ministro e a proposta de reforma previdenciária, a patuleia esqueceu de qualificar o partido como uma força política habilitada a retornar ao Planalto. Sobre o tema, o brilhante professor e candidato derrotado à presidência, Fernando Haddad, eterno boneco de ventríloquo do presidiário de Curitiba e sem emprego conhecido desde outubro, produziu a seguinte pérola em entrevista ao canal no YouTube inaugurado por Lindbergh Farias e Vanessa Grazziotin:

“O Brasil é muito maior que esse projeto que está no poder. O Bolsonaro representa um retrocesso muito grande no imaginário do brasileiro em relação ao seu próprio país. Eles não estão no poder há três meses: o que o Bolsonaro representa está há três anos no poder. O Paulo Guedes é um Michel Temer radical, um Henrique Meirelles radical. A gente cobra resultado porque faz três meses que eles prometeram que a PEC do Teto e a reforma trabalhista iam resolver os problemas. Eles vivem mentindo para as pessoas”. O ex-prefeito de um só mandato parece ter esquecido que Michel Temer foi duas vezes vice de Dilma, e que Henrique Meirelles presidiu o Banco Central nos 8 anos do governo Lula.  

Em algum momento de sua trajetória política, Bolsonaro disse que “o único erro [do governo militar] foi torturar e não matar” — referindo-se aos comunistas em geral e a FHC em particular. Diante de situações como a que presenciamos ontem, eu me pergunto se ele não tem razão.

quinta-feira, 4 de abril de 2019

E LA NAVE VA — PARTE V



A audiência pública na CCJ da Câmara, convocada para Paulo Guedes esclarecer dúvidas dos deputados sobre a PEC da Previdência, virou um campo de batalha onde esquerdopatas inadjetiváveis massacrarem implacavelmente o ministro. 
Saltava aos olhos que o propósito de um grupelho, munido de cartazes com dizeres PEC da Morte, Pé na Cova e outras bobagens, era tumultuar a sessão e desestabilizar o convidado, mas ficou ainda mais claro (e foi ainda mais revoltante) o total absenteísmo dos deputados do PSL, do Centrão e outros que supostamente apoiam o governo. Guedes foi literalmente atirado às feras (não vou dizer leões para não ofender o rei dos animais) e ninguém acorreu para defendê-lo.
No início da noite, o deputado Zeca Dirceu — que acontece de ser filho do dublê de guerrilheiro de araque e rapinador do Erário José Dirceu, ex-ministro de Lula e condenado a quase 30 anos de cadeia — acusou o ministro de ser “tigrão” para cortar aposentadorias de trabalhadores e “tchutchuca” para cortar privilégios de ricos e banqueiros do país, e ouviu dele que tchutchuca eram “sua mãe e sua avó”. Em meio ao tumulto que se formou, o presidente da comissão, deputado Felipe Franceschini, encerrou a sessão.
Em algum momento de sua trajetória política, o hoje presidente da República afirmou que “o único erro [do governo militar] foi torturar e não matar” — referindo-se aos comunistas em geral e a FHC em particular. Em situações como a de ontem, eu fico pensando se sua excelência não tem uma certa razão.

No último dia primeiro (que acontece de ser 1ª de abril, o dia dos trouxas), o presidente Jair Messias Bolsonaro completou três meses no cargo. De janeiro até agora, ele esteve na Suíça, nos Estados Unidos, no Chile e em Israel, deu uma passadinha rápida em casa (no Rio), e outra no Hospital Sírio Libanês (em São Paulo). Em Brasília, foi cinema com a primeira dama e a ministra Damares na manhã da terça-feira, 26 de março (que, até onde se sabe, não era feriado no DF), em plena articulação da reforma da Previdência e em meio à estúpida guerra de egos que levaria o presidente da Câmara desengavetar e a pôr em votação a PEC do Orçamento Impositivo (detalhes no post anterior), criada originalmente para conter os arroubos dilmistas. A proposta foi aprovada em dois turnos em menos de 3 horas, com 3 votos contrários e 6 no segundo. O próprio partido do presidente contribuiu para a acachapante derrota do governo votando em peso a favor do projeto, talvez porque a maioria dos 54 deputados pesselistas esteja em seu primeiro mandato e não tinha a menor ideia do que estava fazendo.

Rodrigo Maia ergueu a bandeira branca — “Peço ao presidente que pare” — e depois disso os ânimos serenaram. O dólar parou de subir e o Ibovespa, mesmo longe da marca história dos 100 mil pontos que atingiu semanas atrás, quando tudo indicava que a PEC da Previdência caminhava a passos de gigante, ao menos parou de cair. Paulo Guedes explicou a reforma previdenciária aos senadores — depois de faltar ao compromisso marcado com os deputados, segundo ele porque ainda não havia um relator —, e as relações entre Maia e Moro mudaram de guerra quase declarada para paz armada. Mas já dizia o velho Magalhães Pinto que “política é como nuvem; você olha e ela está de um jeito, olha de novo e ela já mudou”.

O fato é que, se crises fosse tijolos, o presidente, seus filhos e alguns ministros que o chefe do Executivo foi buscar só Deus sabe onde seriam uma olaria. Com a oposição combalida no Congresso e nas ruas, o maior adversário do governo é a desarticulação de sua própria base. A eleição formou uma vasta maioria de centro-direita nas duas Casas do Legislativo. Na Câmara, os partidos de esquerda somados contabilizam pouco mais de 130 deputados, número que seria inofensivo para um governo bem articulado com suas bases. O problema é que, diante da implosão das pautas federais provocadas pelo próprio Bolsonaro, a minoria consegue fazer barulho e protelar discussões.

Diante da possibilidade de novas rusgas, aliados de Bolsonaro e de Rodrigo Maia devem agendar uma conversa entre os dois após a volta do presidente volte de Israel — onde, para alívio do agronegócio, ele anunciou apenas a abertura de um escritório em Jerusalém. Enfim, se não houver nenhuma intercorrência mais séria, a reforma previdenciária (ou o que restar dela depois de ser submetida ao crivo dos deputados e senadores) pode ser aprovada ainda no primeiro semestre. A expectativa é que o texto seja votado na CCJ no próximo dia 17, a fim de pressionar o início dos trabalhos na Comissão Especial (que ainda não foi instaurada), onde certamente haverá novos embates e negociações. Dois pontos do texto já estão na lista de mudanças dos parlamentares: a aposentadoria rural e o Benefício de Prestação Continuada. Esses itens são considerados muito caros, sobretudo, para a bancada do Nordeste, que vem ganhando força pela alteração das regras desses temas. É fundamental, portanto, que o relator da comissão especial seja alguém sensível à causa, ou haverá ainda mais divergência e demora na apreciação do texto.

Se quiser aprovar a “nova Previdência”, Bolsonaro terá de mostrar aos deputados como é a articulação na “nova política”. Mas a falta de diálogo com as lideranças é notória. Prova disso é que, durante a escolha da relatoria na CCJ, os parlamentares de partidos de centro e de direita se esquivaram da missão, que acabou caindo no colo do Delegado Marcelo Freitas, do PSL mineiro, que é um deputado de primeiro mandato, sem experiência legislativa anterior. Para que os parlamentares recuperem a confiança no Executivo, Bolsonaro e seu entorno precisam baixar o tom e tentar manter uma relação harmoniosa com o Congresso. Nunca é demais lembrar que bater de frente com o Legislativo custou o cargo a Collor e Dilma. Se não descer do palanque, não botar trela na filharada e nem passar a agir como o presidente de todos os brasileiros, e não dos 57,8 milhões que votaram contra o PT — dos quais uns 10% são bolsomínions legítimos — o presidente corre o risco de perder o bonde (e o cargo). Em conversas no Congresso, representantes de dois dos maiores Bancos do país chegaram a perguntar ao líder do Cidadania na Câmara, Daniel Coelho, se “a solução não seria Mourão”.

Observação: Dos 147,3 milhões de eleitores aptos a votar nas eleições passadas, apenas 39,2% votaram em Jair Bolsonaro. Ao todo, 31,3 milhões não compareceram às urnas, o equivalente a 21,3% do total de eleitores. Se a legitimidade de sua eleição é inquestionável, a da eleição e da reeleição de Dilma em 2010 e 2014 também foi, e ainda assim ela não conseguiu concluir seu segundo mandato. As pedaladas fiscais serviram de desculpa para derrubá-la. Ela caiu, de fato, porque perdeu as mínimas condições de governar.

Para encerrar, transcrevo o texto magistral que Dora Kramer publicou na revista Veja desta semana:

Não obstante o alarido do bolsonarês castiço que assola a República, a reforma da Previdência vai passar. Não porque o presidente Jair Bolsonaro esteja particularmente empenhado nisso. Não será uma obra dele nem de seus três auxiliares falastrões que por uma dessas conjunturas inusitadas são filhos com questões familiares um tanto mal resolvidas e detentores de mandato parlamentar. Se dependesse desses quatro, caminharíamos de modo irremediável para o “buraco” em que o general Rêgo Barros disse recentemente que cairemos caso a reforma não seja feita.

Ela será feita, cedo ou tarde, de um jeito ou de outro, porque o mundo do dinheiro, dos negócios e da alta esfera política concorda com a fala do porta-voz. Funciona mais ou menos como a derrubada da inflação no governo FHC e a manutenção da política econômica do antecessor na gestão Lula: ou é isso ou não tem governo. Quiçá país, na interpretação dos entendidos no assunto.

Prefeito do Rio por três vezes, Cesar Maia, pai do presidente da Câmara, aponta três eixos de sustentação efetiva do governo: Economia (Paulo Guedes), Justiça e Segurança (Sergio Moro) e administração substantiva (os militares do Planalto). Note agora o leitor que todos eles atuaram na última semana para desconstruir a barafunda que parecia levar a reforma a pique.

Moro e Guedes entenderam-se com Rodrigo Maia sobre a necessidade de a proposta da Previdência tramitar soberana, o vice-presidente Hamilton Mourão tranquilizou o PIB com encontro em São Paulo e o general Augusto Heleno certamente foi o autor oculto do apelo à “pacificação” feito por Bolsonaro em seguida a intenso tiroteio com o presidente da Câmara.

Os movimentos desse pessoal são o que realmente conta para medir a ampliação ou a redução de danos à reforma. O jogo aqui é de sobrevivência, uma vez que a aprovação do projeto é o primeiro passo, sem o qual não se vai a lugar algum. Sem ele, por exemplo, Moro não consegue nada com seu pacote de legislação anticrimes. Rodrigo Maia tampouco conseguirá imprimir relevância à sua terceira passagem pela presidência da Câmara (fundamental para o impulso do futuro) se a Previdência ficar empacada. Guedes também não levará adiante sua proposta de desvinculação constitucional das receitas da União.

Donde é de concluir que as coisas fluirão. A menos que o presidente da República resolva livrar-se de seus pilares, ou vice-versa, numa exacerbação de seu jeito rudimentar de ser, e, não sabendo exatamente do que se compõe a nova política, siga na trajetória malsã de negar-se ao exercício da boa política. Nesta, já apontaram diversos autores credenciados, existe um caminho do meio a ser trilhado entre a hostilidade e a ilegalidade. Para tanto, porém, há que ter visão estratégica, inteligência, paciência, ponderação, noção dos limites do poder e, sobretudo, plano de voo claro e detalhado. E é aí que a fêmea da espécie dos suínos corre o risco de retorcer a própria cauda e pôr tudo irremediavelmente a perder.

quarta-feira, 3 de abril de 2019

E LA NAVE VA - PARTE IV


Articulação política”, no Brasil, vai desde o diálogo entre o Executivo e o Legislativo sobre propostas em tramitação no Parlamento até o pagamento de vantagens ilícitas aos congressistas em troca de votos — como no caso do Mensalão —, passando pela oferta de cargos e uma série de outras benesses. Os parlamentares cobram “articulação política” do governo para a aprovação da PEC da Previdência porque são devotos de São Francisco de Assis (aquele do “é dando que se recebe”), e só sabem fazer política na base do toma-lá-dá-cá. Basta lembrar que Michel Temer conseguiu neutralizar as denúncias do então procurador-geral Rodrigo Janot (postergá-las, na verdade,  pois os esqueletos já começam a sair do armário para assombrá-lo) mediante a compra do apoio das marafonas do Congresso.   

Bolsonaro prometeu combater o toma-lá-dá-cá, mas está vendo agora que é mais fácil falar do que fazer, sobretudo num país onde: 1) uma aberração que atende por Justiça Eleitoral (e que, por decisão de outras aberrações, passará a julgar processos da Lava-Jato conectados a crimes de caixa 2) não vê problema em registrar mais de 30 partidos políticos; 2) o Planalto não tem uma base aliada que lhe assegure maioria nas votações, nem um projeto de governo em torno do qual os parlamentares orbitem sem que seja preciso atraí-los a poder de conchavos espúrios.

Depois de dias a fio trocando farpas com Bolsonaro, Rodrigo Maia requentou uma PEC de 2015 e a aprovou em dois turnos, numa votação relâmpago. O projeto precisa ser aprovado no Senado — e se o for, só surtirá efeito no próximo ano (e não no próximo governo, como Rodrigo Maia afirmou erroneamente). Mas não se trata de o Congresso impor um Orçamento ao governo, como alguns têm dito, e sim de tornar impositivas as emendas das bancadas, a exemplo de como acontece com as individuais. Mas foi uma derrota retumbante para o Planalto. Seja como for, Bolsonaro demorou para entender o recado: “Tem político que não quer largar a velha política”, disparou, além de endossar zero dois ao afirmar que Maia “está um pouco abalado com questões pessoais”. O deputado rebateu dizendo que o Presidente está “brincando de governar”; Bolsonaro retrucou que “não existe brincadeira da minha parte”, e assim foi até que o presidente da Câmara declarou: “Pare, chega, peça ao entorno para parar de criticar”.

Observação: Em qualquer democracia que se preze, o Executivo e o Legislativo trabalham juntos pela aprovação do Orçamento. Aqui, o que se tem é uma peça de ficção na qual o Planalto escolhe o que quer ou não pagar. Tecnicamente, quem define o Orçamento é o Executivo; se os parlamentares quiserem implementar mudanças, devem negociar com ele ou formar maioria para derrotá-lo no plenário. Na prática, porém, antes de cada votação importante uma chusma de políticos faz fila no Planalto para oferecer apoio em troca da liberação de verbas e outras benesses. Com isso, partidos de todas as ideologias (ou sem qualquer ideologia) recebem ministérios e cargos sem sequer saberem qual programa irão conduzir.

Trocas de farpas como as que presenciamos nos últimos dias seria admissíveis em bordéis de quinta classe — ou no STF, onde ministros se acusam mutuamente de vender habeas corpus, de envergonhar o Tribunal, etc. Não que o Legislativo e o Executivo sejam farinha de outro saco, mas daí a fomentar picuinhas enquanto a economia patina e a nau dos insensatos depende das bendita reforma previdenciária para evitar de ir a pique... tenha santa paciência! O propósito de Maia ao articular a aprovação do engessamento do Orçamento era demarcar território — como um cachorro mijando pelos cantos ou um galo que estufa o peito, bate as asas e canta para mostrar quem manda naquele terreiro. Como 9 entre 10 políticos brasileiros, o deputado tem receio de ser denunciado por corrupção, e é por isso que ele e tantos outros são contra a Lava-Jato e o projeto anticrime de Moro. E é também por isso que falam em “articulação política” quando na verdade estão fazendo chantagem para obter a impunidade.

Rodrigo Maia, filho de César Maia, é investigado em dois inquéritos oriundos da Lava-Jato, identificado como “Botafogo” nas planilhas do departamento de propina da Odebrecht e marido da enteada do ex-ministro Moreira Franco — preso juntamente com o ex-presidente Temer na semana passada, mas solto dias depois por um desembargador especialista em libertar ladrões do erário (que ficou sete anos afastado da magistratura por acusações de praticar estelionato). Talvez ele tenha ficado ainda mais puto ao saber que Bolsonaro foi ao cinema (!?) e estava mais preocupado com a comemoração, ou rememoração, do golpe militar de 1964 (aquele que jamais aconteceu) do que com sua demonstração de poder. Seria cômico se não fosse trágico, mas é trágico porque Bolsonaro não tem um projeto de governo, nem base aliada, nem muito menos maioria no Congresso. O que ele tem é a PEC da Previdência do ministro da Fazenda e o Pacote Anticrime e Anticorrupção do ministro da Justiça, além, é claro, de uma vocação inata para fazer merda: toda vez que abre a boca, uma crise se avizinha.

A PEC da Previdência e o pacote anticrime e anticorrupção são projetos do Executivo, mas só terão força de lei quando e se forem aprovados pelo Congresso. Bater de frente com o Legislativo, portanto, é uma péssima ideia, sobretudo neste “presidencialismo de cooptação”. Foram o temperamento beligerante e a falta de jogo de cintura no trato com o parlamento que garantiu a Collor e Dilma, cada qual a seu tempo, um providencial pé na bunda. Aliás, a eleição de políticos como esses é a prova provada de que Pelé estava certíssimo quando afirmou que “o brasileiro não sabe votar” — embora tenha dito a coisa certa pelos motivos errados, já que, na ocasião, ele opinava sobre a decisão da ditadura militar (aquela que nunca existiu) de suspender eleições diretas para cargos do Executivo, mas isso é outra conversa.

"O Brasil não é para amadores", dizia o saudoso Tom Jobim. E governar o país também não é. Bolsonaro teve uma longa carreira parlamentar em Brasília, mas ela se resumiu basicamente e a representar o corporativismo militar. Na Presidência, ele parece mais interessado em insuflar suas hordas extremistas, colhendo o aplauso fácil da ala fanática de seus apoiadores, do que governar com sobriedade, com seriedade e com eficácia. Parafraseando o Papa Francisco, "o papa, os bispos e os padres não são príncipes, mas servidores do povo de Deus". Mutatis mutandis, o mesmo se aplica aos políticos e aos membros dos Três Poderes, que parece ainda não terem se dado conta disso.
Na Carta ao Leitor da edição desta semana, Veja resume a coisa da seguinte maneira:

Com apenas três meses de governo, há ainda um longo caminho pela frente. Bolsonaro tem, portanto, condições de corrigir seus erros, acertar o rumo e amadurecer seu entendimento da política. Uma segunda hipótese, muito mais preocupante, é que aquilo que aqui se aponta como erro do bolsonarismo não seja exatamente um erro, mas a sua essência. Algo que, se eliminado, elimina também o próprio bolsonarismo. Para o bem do Brasil, ­fiquemos todos com a primeira hipótese.

Não vejo como discordar.

Atualização — A informação a seguir foge ao assunto em pauta, mas nem por isso deixa de ser importante: O juiz federal Marcelo Bretas, responsável pelos processos da Lava-Jato no Rio de Janeiro, aceitou nesta terça-feira, 2, as duas denúncias apresentadas pelo MPF contra Michel Temer, pelos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e peculato. As investigações que levaram o ex-presidente a ser preso, denunciado e, agora, tornar-se réu, apuraram supostos esquemas de corrupção nas obras da usina de Angra-3 e contratos da Eletronuclear, estatal que recebia influência política de Temer e seu grupo.